Dispensa da garantia do juízo nos embargos à execução fiscal por inexistência de bens
Inicialmente, cumpre observar que os embargos são o meio de defesa do executado contra a cobrança da dívida tributária ou não tributária da Fazenda Pública, mas que "não serão admissíveis ... antes de garantida a execução" (art. 16, § 1º, da Lei n. 6.830/1980). Verifica-se, portanto, que a garantia do juízo é condição de procedibilidade dos embargos, nos termos da legislação de regência. Com o julgamento do recurso especial 1.272.827/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, submetido ao rito dos recursos repetitivos, a Primeira Seção sedimentou orientação pelo afastamento do art. 736 do CPC/1973 (nova redação dada pela Lei 11.382/2006) às execuções fiscais. Na ocasião, consolidou-se o entendimento segundo o qual, "em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/1973, a nova redação do art. 736 do CPC dada pela Lei n. 11.382/2006 – artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos – não se aplica às execuções fiscais diante da presença de dispositivo específico, qual seja, o art. 16, § 1º, da Lei n. 6.830/1980, que exige expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal". Não obstante esse entendimento, vendo a questão jurídica sob outro ângulo, verifica-se que a Constituição Federal de 1988 resguarda a todos os cidadãos o direito de acesso ao Poder Judiciário, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, CF/1988), tendo esta Corte Superior, com base em tais princípios constitucionais, mitigado a obrigatoriedade de garantia integral do crédito executado para o recebimento dos embargos à execução fiscal. E esse tema, mutatis mutandis, também foi definido na Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.127.815/SP, na sistemática dos recursos repetitivos. Conquanto o caso julgado tratasse de reforço de penhora, as razões de decidir podem ser aplicadas a todos os casos comprovados de hipossuficiência patrimonial do devedor. Por fim, em um raciocínio sistemático da legislação federal aplicada, pelo simples fato do executado ser amparado pela gratuidade judicial não estaria autorizado a opor embargos à execução fiscal sem garantir o juízo, pois, de acordo com o disposto na Lei n. 1.060/1950, que estabelece as normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados, definindo como tal aquele que não possuísse condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo próprio e da família, a exemplo das custas e honorários advocatícios, não há previsão expressa autorizando a oposição dos embargos sem a garantia do juízo. Logo, pelo princípio da especialidade das leis, a conclusão que deve prevalecer é a norma impositiva da LEF, quanto à exigência da segurança do juízo. A controvérsia, a despeito dessa conclusão, não deve ser resolvida com enfoque no fato de o executado ser beneficiário, ou não, da justiça gratuita, mas, sim, pelo lado da sua hipossuficiência, pois, se se adotar tese contrária, chegar-se-á à hipótese, como bem delineado no repetitivo citado anteriormente, "que tal implicaria em garantir o direito de defesa ao 'rico', que dispõe de patrimônio suficiente para segurar o Juízo, e negar o direito de defesa ao 'pobre'".
Ilegalidade de restrição infralegal estadual ao crédito de ICMS da LC 87/1996
A LC n. 87/1996, em harmonia com a CF/1988, assegura o direito à compensação, levando em consideração o imposto devido em cada operação na qual haja circulação de mercadoria ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, sem impor que a operação antecedente refira-se a uma determinada mercadoria ou serviço. Destarte, a regra contida em regulamento estadual que inova no ordenamento jurídico, ao exigir que a compensação ocorra entre produtos agropecuários da mesma espécie da que originou o respectivo crédito (não estorno), cria regra nova de compensação do ICMS (por ato infralegal), que não é prevista nem na Constituição Federal nem na LC n. 87/1996. Desse modo, viola o art. 20, § 6º, da LC n. 87/1996 a disposição contida em norma infralegal estadual que restrinja seu âmbito de aplicação, criando regra nova de compensação do ICMS, sobretudo porque tal matéria é reservada à lei complementar.
Prioridade processual como direito subjetivo do idoso e legitimidade exclusiva
Para dar efetividade ao art. 230 da Constituição Federal, a Lei nº 10.471/2003 - Estatuto do Idoso - estabelece a preferência no processamento dos feitos nos quais figura como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. Assim, o idoso fará jus ao benefício nos processos em que atuar como parte - autor, réu ou litisconsorte - ou como interveniente, assim considerado aquele que ingressa nos autos por meio da assistência, da denunciação da lide ou do chamamento ao processo, etc (arts. 119 a 132 do CPC/2015). De acordo com a dicção legal, cabe ao idoso postular a obtenção do benefício fazendo prova da sua idade. Depende, portanto, de manifestação de vontade do interessado, por se tratar de direito subjetivo processual. A necessidade do requerimento é justificada pelo fato de que nem toda tramitação prioritária será benéfica ao idoso, especialmente em processos nos quais há alta probabilidade de que o resultado lhe seja desfavorável. Cabe ao titular do direito à preferência, por meio de pedido dirigido ao magistrado, demonstrar o seu interesse em fazer jus ao benefício legal. Se a lei exige a iniciativa do idoso, aquele que carece dessa condição não pode requerer a prioridade em nome de outrem por faltar-lhe legitimidade. No caso dos autos, a exequente - pessoa jurídica - postula a prioridade na tramitação da execução de título extrajudicial pelo fato de um dos executados ser pessoa idosa. Desse modo, correto o entendimento de que lhe falta legitimidade e interesse para formular o mencionado pedido visto que a lei concede a legitimidade exclusiva ao idoso ao estabelecer que somente o interessado, fazendo a comprovação da sua idade, pode postular o referido benefício legal.
Responsabilidade civil de instituições financeiras por vício do produto em comprovantes termossensíveis
O Código de Defesa do Consumidor, para além da responsabilidade decorrente dos acidentes de consumo (arts. 12 a 17), cuja preocupação primordial é a segurança física e patrimonial do consumidor, regulamentou também a responsabilidade pelo vício do produto ou do serviço (arts. 18 a 25), em que a atenção foi voltada à análise da efetiva adequação à finalidade a que se destina. Diante do conceito legal de "defeito na prestação do serviço", a instituição financeira, ao emitir comprovantes de suas operações por meio de papel termossensível, acabou atraindo para si a responsabilidade pelo vício de qualidade do produto. Isso porque, por sua própria escolha, em troca do aumento dos lucros - já que a impressão no papel térmico é mais rápida e bem mais em conta -, passou a ofertar o serviço de forma inadequada, emitindo comprovantes cuja durabilidade não atendem as exigências e necessidades do consumidor, vulnerando o princípio da confiança. Outrossim, é da natureza específica do tipo de serviço prestado emitir documentos de longa vida útil, a permitir que os consumidores possam, quando lhes for exigido, comprovar as operações realizadas. Nesse contexto, condicionar a durabilidade de um comprovante às suas condições de armazenamento, além de incompatível com a segurança e a qualidade que se exigem da prestação de serviços, torna a relação excessivamente onerosa para o consumidor, que, além dos custos de emitir um novo recibo em outra forma de impressão (fotocópia), teria o ônus de arcar, em caso de perda, com uma nova tarifa pela emissão da segunda via do recibo, o que se mostra abusivo e desproporcional. Assim, o reconhecimento da falha do serviço não pode importar, por outro lado, em repasse pelo aumento de tarifa ao consumidor nem em prejuízos ao meio ambiente.
Exoneração do fiador na locação com prazo de 120 dias contado da indeterminação
A interpretação do art. 40 da Lei n. 8.245/1991 deve ser sistemática, e, ainda, guardar sintonia com a teleologia das alterações realizadas pela Lei n. 12.112/2009, édito que veio, inegavelmente, a trazer maiores garantias ao locador em se tratando do contrato de fiança. Assim, faz sentido concluir-se que os efeitos da resilição unilateral somente poderão ser produzidos no contrato de locação - e, consequentemente, de fiança - de prazos indeterminados. No período em que a locação se desenvolve por prazo determinado, a vinculação do fiador às obrigações do contrato de locação, a ele estendidas pelo contrato de fiança, não decorre da extensão conferida pelo art. 40 da Lei n. 8.245/1991, mas do contrato pelo qual se comprometeu a garantir a solvência das obrigações do afiançado nascidas no período da locação ou no período determinado do contrato de fiança. A melhor interpretação do art. 40, inciso X, da Lei n. 8.245/1991 é a de que, primeiro, não é imprescindível que a notificação seja realizada apenas no período da indeterminação do contrato, podendo, assim, os fiadores, no curso da locação com prazo determinado, notificarem o locador de sua intenção exoneratória, mas os seus efeitos somente poderão se projetar para o período de indeterminação do contrato. Nessa hipótese, notificado o locador ainda no período determinado da locação acerca da pretensão de exoneração dos fiadores, os efeitos desta exoneração somente serão produzidos após o prazo de 120 dias da data em que se tornou indeterminado o contrato de locação, e não da notificação.