Inadmissibilidade de instauração do IRDR após conclusão do julgamento de mérito do processo
A instauração do IRDR é cabível quando um dos legitimados do art. 977 do CPC/2015 demonstrar, simultaneamente, a efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica (art. 976, I e II, do CPC/2015). Ademais, o art. 978, parágrafo único, do mesmo Código dispõe que o órgão colegiado incumbido de analisar o mérito do incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso que o originou. Por essa razão, a doutrina afirma que o cabimento do IRDR condiciona-se à pendência de julgamento, no tribunal, de uma causa recursal ou originária. Se já encerrado o julgamento, não caberá mais a instauração do IRDR, senão em outra causa pendente; mas não naquela que já foi julgada. A propósito o Fórum Permanente de Processualistas Civis editou o Enunciado n. 344, que assim dispõe: "A instauração do incidente pressupõe a existência de processo pendente no respectivo tribunal". A pendência do julgamento dos embargos de declaração contra o acórdão do agravo de instrumento revela um momento processual em que já houve quase que o esgotamento da apreciação do mérito, tratando-se de momento inicial inadequado para a formação do precedente do jaez do IRDR. O diferimento da análise da seleção da causa e admissibilidade do IRDR para o momento dos embargos de declaração importaria prejuízo à paridade argumentativa processual, considerando que esse desequilíbrio inicial certamente arriscaria a isonômica distribuição do ônus argumentativo a ser desenvolvido, mesmo que os argumentos fossem pretensamente esgotados durante o curso do incidente.
Exceção à impenhorabilidade do bem de família por crédito de empreitada de construção residencial
O artigo 3º, inciso II, da Lei n. 8.009/1990, dispõe que a impenhorabilidade do bem de família é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato. Para os efeitos estabelecidos no citado dispositivo legal, o financiamento referido pelo legislador abarca operações de crédito destinadas à aquisição ou construção do imóvel residencial, podendo essas serem stricto sensu - decorrente de uma operação na qual a financiadora, mediante mútuo/empréstimo, fornece recursos para outra a fim de que essa possa executar benfeitorias ou aquisições específicas, segundo o previamente acordado - como aquelas em sentido amplo, nas quais se inclui o contrato de compra e venda em prestações, o consórcio ou a empreitada com pagamento parcelado durante ou após a entrega da obra, pois todas essas modalidades viabilizam a aquisição/construção do bem pelo tomador que não pode ou não deseja pagar o preço à vista. Em todas essas situações, dá-se a constituição de uma operação de crédito, efetiva dívida para a aquisição/construção do imóvel na modalidade parcelada.
Inoponibilidade das limitações da Lei de Proteção de Cultivares às patentes de transgenia
O propósito recursal é definir se produtores de soja podem, sem que haja violação dos direitos de propriedade intelectual, reservar livremente o produto da soja transgênica Roundup Ready (soja RR) para replantio em seus campos de cultivo, vender a produção desse cultivo como alimento ou matéria-prima e, com relação apenas a pequenos produtores, doar a outros pequenos produtores rurais ou com eles trocar as sementes reservadas. A Lei n. 9.456/1997 (Lei de Proteção aos Cultivares - LPC) prevê situações em que, como forma de conferir equilíbrio à exclusividade outorgada pelo Certificado de Proteção de Cultivar, são impostas certas limitações à proteção dos direitos do melhorista. É o caso do chamado "privilégio do agricultor". Trata-se de exceção que confere aos agricultores o direito de livre acesso, em determinadas circunstâncias que não configurem exploração comercial à variedade vegetal protegida. Por outro lado, a Lei de Propriedade Industrial (LPI) - em consonância com as diretrizes traçadas no plano internacional e na esteira do dever imposto pela norma do art. 5º, XXIX, da Constituição Federal de 1988 - autoriza o patenteamento de micro-organismos transgênicos, a fim de garantir, ao autor do invento, privilégio temporário para sua utilização. Ressalta-se que patentes e proteção de cultivares são diferentes espécies de direitos de propriedade intelectual, que objetivam proteger bens intangíveis distintos. Não há incompatibilidade entre os estatutos legais que os disciplinam, tampouco prevalência de um sobre o outro, pois se trata de regimes jurídicos diversos e complementares, em cujos sistemas normativos inexistem proposições contraditórias a qualificar uma mesma conduta. A marcante distinção existente entre o regime da LPI e o da LPC compreende, dentre outros, o objeto protegido, o alcance da proteção, as exceções e limitações oponíveis aos titulares dos respectivos direitos, os requisitos necessários à outorga da tutela jurídica, o órgão responsável pela análise e emissão do título protetivo e o prazo de duração do privilégio. O art. 2º da LPC impede o que se convencionou chamar de dupla proteção. Isso quer dizer que uma mesma variedade vegetal não pode ser protegida simultaneamente por uma patente e por um direito sui generis , tal qual o direito de proteção de cultivares. Ocorre que o âmbito de proteção a que está submetida a tecnologia desenvolvida não se confunde com o objeto da proteção prevista na Lei de Cultivares: as patentes não protegem a variedade vegetal, mas o processo de inserção e o próprio gene por elas inoculado nas sementes de soja RR. A proteção da propriedade intelectual na forma de cultivares abrange o material de reprodução ou multiplicação vegetativa da planta inteira, enquanto o sistema de patentes protege, especificamente, o processo inventivo ou o material geneticamente modificado. Pelo princípio da exaustão, em regra, uma vez que o adquirente tenha obtido o produto colocado licitamente no mercado, com o consentimento do titular, esgota-se o direito de patente sobre aquele produto específico e, via de consequência, não mais poderão ser opostas, dali em diante, a quem quer que seja, as vedações do art. 42 da LPI na futura exploração comercial do bem. Todavia, a parte final do inc. VI do art. 43 da LPI expressamente prevê que não haverá exaustão na hipótese de o produto patenteado ser "utilizado para multiplicação ou propagação comercial da matéria viva em causa". O "privilégio do agricultor" previsto na LPC, portanto, não é oponível ao titular de patentes de produto e/ou processo na hipótese de ser utilizada a matéria viva a elas relacionada para fins de multiplicação ou propagação comercial, pois não se trata de limitação estabelecida aos direitos tutelados pelo regime jurídico sobre o qual está assentado o sistema de patentes adotado pelo Brasil.
Flexibilização da diferença etária mínima de 16 anos entre adotante e adotado por socioafetividade
A diferença etária mínima de 16 (dezesseis) anos entre adotante e adotado é requisito legal para a adoção (art. 42, § 3º, do ECA). No entanto, a adoção é sempre regida pela premissa do amor e da imitação da realidade biológica, sendo o limite de idade uma forma de evitar confusão de papéis ou a imaturidade emocional indispensável para a criação e educação de um ser humano e o cumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar. Dessa forma, incumbe ao magistrado estudar as particularidades de cada caso concreto a fim de apreciar se a idade entre as partes realiza a proteção do adotando, sendo o limite mínimo legal um norte a ser seguido, mas que permite interpretações à luz do princípio da socioafetividade, nem sempre atrelado às diferenças de idade entre os interessados no processo de adoção.
Cabimento de agravo de instrumento contra decisão sobre distinção em processos sobrestados por recursos repetitivos
Na vigência do CPC/1973, o STJ consolidou entendimento de que a decisão que determinava o sobrestamento dos recursos extraordinários e recursos especiais repetitivos não selecionados como paradigmas era irrecorrível. No entanto, com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, houve uma severa mudança de entendimento a partir do disposto no art. 1.037, § 13, inciso I, que prevê o agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que resolve o requerimento de distinção entre a questão a ser decidida no processo e aquela a ser julgada no recurso especial ou extraordinário afetado (§ 9º), no caso de sobrestamento de processos em razão de recursos repetitivos.