Validade e efeitos processuais do julgamento não concluído nos tribunais
Cinge-se a controvérsia a analisar o recolhimento de custas em embargos de divergência em matéria criminal. Em decisão monocrática, verificou-se que o recurso de embargos de divergência não foi instruído com a guia de custas e o respectivo comprovante de pagamento. Constatada a referida irregularidade no recolhimento do preparo, a parte foi intimada para regularizar o óbice. Porém, embora regularmente intimada, quedou-se inerte. Dessa forma, entendeu-se que os embargos de divergência não foram devida e oportunamente preparados. Defendeu-se que, ainda que manejado no âmbito de processo criminal, os embargos de divergência "previstos no artigo 266 e seguintes do Regimento Interno do STJ, não se incluem na denominação "processo criminal" e tampouco são modalidade de recurso previsto na legislação processual penal. Não sendo espécie recursal catalogada no Código de Processo Penal ou em legislação processual penal especial, mas mero meio geral de impugnação interna, aos Embargos de Divergência não se aplica a isenção estipulada no artigo 7º da Lei n. 11.636/2007 ou a inexigência de antecipação de custas de que trata o artigo 806 do CPP, sendo lícita a imposição de recolhimento antecipado da importância" (AgRg nos EAREsp 1.196.846/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 20/11/2019, DJe 04/12/2019). Após o manejo do Agravo Regimental, o Min. Relator manteve a decisão guerreada. A Min. Laurita Vaz, por seu turno, demonstrou a existência de notória divergência sobre a matéria na Corte o que demonstraria a necessidade de revisitar a matéria para definir o posicionamento do STJ. Defendeu que, considerando os princípios que norteiam o processo penal, em se tratando de matéria penal pública não deveria ser exigida a cobrança de custas processuais. Após os votos da Sra. Ministra Laurita Vaz e do Sr. Ministro João Otávio de Noronha dando-lhe provimento ao agravo regimental, pediu vista antecipada o Sr. Ministro Herman Benjamin.
Prazo decadencial de 90 dias para nulidade de sentença arbitral contado da notificação
A controvérsia refere-se à incidência do prazo decadencial de 90 (noventa) dias previsto no art. 33, § 1º, da Lei de Arbitragem à impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, para o propósito de suscitar as hipóteses de nulidade da sentença arbitral). À parte sucumbente é possível veicular, perante o Poder Judiciário, a pretensão de anular sentença arbitral, desde que fundada nas hipóteses taxativas - todas de ordem pública -, especificadas no art. 32 da Lei n. 9.307/1996, e desde que o faça de imediato, no prazo decadencial de 90 (dias). Sob o signo da celeridade, da efetividade e da segurança jurídica especialmente perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral, a pretensão de anular a sentença arbitral deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão decidida tornar-se imutável, porquanto não mais passível de anulação pelo Poder Judiciário, a obstar, inclusive, que o Juízo arbitral profira nova decisão sobre a matéria. Sem respaldo legal, e absolutamente em descompasso com a inerente celeridade do procedimento arbitral, supor que a parte sucumbente, única interessada em infirmar a validade da sentença arbitral, possa, apesar de não promover a ação anulatória no prazo de 90 (noventa) dias, manejar a mesma pretensão anulatória, agora em impugnação à execução ajuizada em momento posterior a esse lapso, sobretudo porque, a essa altura, o direito potestativo (de anular) já terá se esvaído pela decadência. Por consectário, pode-se afirmar que a veiculação da pretensão anulatória em impugnação só se afigura viável se a execução da sentença arbitral for intentada, necessariamente, dentro do prazo nonagesimal, devendo a impugnante, a esse propósito, bem observá-lo, em conjunto com o prazo legal para apresentar sua peça defensiva. Assim, embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo art. 525, § 1º, do CPC, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no art. 32 da Lei 9.307/1996.
Atipicidade do art. 34 da Lei de Drogas por posse de instrumentos para consumo pessoal
O crime capitulado no art. 34 da Lei n. 11.343/2006 se destina a punir atos preparatórios e, portanto, é tido como subsidiário em relação ao crime previsto no art. 33 da mesma Lei, sendo por este absorvido quando as ações são praticadas em um mesmo contexto fático. É possível, no entanto, que o crime previsto no art. 34 da Lei de Drogas se consuma de forma autônoma, circunstância na qual [d]eve ficar demonstrada a real lesividade dos objetos tidos como instrumentos destinados à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, ou seja, relevante analisar se os objetos apreendidos são aptos a vulnerar o tipo penal em tela." (AgRg no AREsp 303.213/SP, Rel. Ministro Marco Aurelio Bellizze, Quinta Turma, DJe 14/10/2013). Significa dizer que a lesão ao bem jurídico - saúde pública - somente ocorrerá quando a ação envolvendo os objetos (possuir, guardar, adquirir, entre outras) tenha o especial fim de fabricar, preparar, produzir ou transformar drogas, visando o tráfico. Portanto, ainda que o crime previsto no art. 34 da Lei n. 11.343/2006 possa subsistir de forma autônoma, não é possível que o agente responda pela prática do referido delito quando a posse dos instrumentos se configura como ato preparatório destinado ao consumo pessoal de entorpecente. Com efeito, as condutas previstas no art. 28 da Lei de Drogas recebem tratamento legislativo mais brando, razão pela qual não há respaldo legal para punir com maior rigor as ações que antecedem o próprio consumo pessoal do entorpecente. Considerando que, nos termos do §1º do art. 28 da Lei de Drogas, nas mesmas penas do caput incorre quem cultiva a planta destinada ao preparo de pequena quantidade de substância ou produto (óleo), seria um contrassenso jurídico que a posse de objetos destinados ao cultivo de planta psicotrópica, para uso pessoal, viesse a caracterizar um crime muito mais grave, equiparado a hediondo e punido com pena privativa de liberdade de três a dez anos de reclusão, além do pagamento de vultosa multa. A toda evidência, aquele que cultiva uma planta naturalmente faz uso de ferramentas típicas de plantio, tais como a maior parte dos itens apreendidos no caso (vasos, substrato de plantas, gotejador, lona, hastes de estufa, fibra de coco), razão pela qual se deve concluir que a posse de tais objetos está abrangida pela conduta típica prevista no aludido §1º do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 e, portanto, não é capaz de configurar delito autônomo. Por fim, é consenso jurídico que o legislador, ao despenalizar a conduta de posse de entorpecente para uso pessoal, conferiu tratamento penal mais brando aos usuários de drogas. Nesse contexto, se a própria legislação reconhece o menor potencial ofensivo da conduta do usuário que adquire drogas diretamente no mercado espúrio de entorpecentes, não há como evadir-se à conclusão de que também se encontra em situação de baixa periculosidade o agente que sequer fomentou o tráfico, haja vista ter cultivado pessoalmente a própria planta destinada à extração do óleo, para seu exclusivo consumo.
Inadmissibilidade da pronúncia no Tribunal do Júri baseada exclusivamente em testemunhos indiretos por ouvir dizer
Discute-se nos autos se, na primeira fase do rito do Júri, em que prevalece o princípio do jus accusationis, consubstanciado no brocardo in dubio pro societate, de forma que a dúvida razoável acerca da autoria delitiva, enseja a submissão do caso controvertido ao Tribunal do Júri, órgão responsável por perquirir, em profundidade, a prova angariada nos autos, seria viável a imputação do crime ao acusado baseada, exclusivamente, em testemunho indireto, ou seja, em relatos de terceiros que ouviram dizer sobre a autoria delitiva. Entretanto, entende-se que para a pronuncia, não obstante a exigência da comprovação da materialidade e da existência de indícios suficientes de autoria nos crimes submetidos ao rito do Tribunal do Júri, órgão constitucionalmente competente para julgar os crimes dolosos contra a vida, sabe-se que esta Corte Superior não admite a pronúncia fundada, apenas, em depoimento de "ouvir dizer", sem que haja indicação dos informantes e de outros elementos que corroborem tal versão. Nesse sentido: "Muito embora a análise aprofundada dos elementos probatórios seja feita somente pelo Tribunal Popular, não se pode admitir, em um Estado Democrático de Direito, a pronúncia baseada, exclusivamente, em testemunho indireto (por ouvir dizer) como prova idônea, de per si, para submeter alguém a julgamento pelo Tribunal Popular"(REsp 1674198/MG, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 05/12/2017, DJe 12/12/2017).
marca sem alto renome não pode impedir registro idêntico em segmentos mercadológicos distintos
Cinge-se a controvérsia em definir sobre a possibilidade de se reconhecer proteção contra diluição da marca que, embora famosa, não goze de alto renome. Vale destacar que a diluição, fenômeno de existência reconhecida no Direito de Marcas, consiste na perda gradual da força distintiva de determinado signo, decorrente do uso, por terceiros, da mesma marca para produtos ou serviços distintos, ainda que não haja confusão, tornando cada vez menos exclusivo o uso do signo, que virtualmente se dilui em meio a tantos outros usos. Em razão disso, a proteção contra a diluição surgiu da verificação de que as marcas, além de exercerem a função de identificar a origem comercial de produtos e de serviços, também podem servir de veículo de comunicação ao consumidor, veiculando valores, imagens e sensações, tornando-se agente criador de sua própria fama e reputação. Assim, quando uma marca se torna especialmente famosa, passando a ter mais valor do que o próprio produto ou serviço a que se refere, maior se torna sua exposição a tentativas de aproveitamento parasitário, do que decorre uma necessidade de maior proteção. Essa proteção especial foi disciplinada no plano internacional apenas em 1994 no Acordo TRIPS, sendo que já se encontrava garantida no ordenamento jurídico brasileiro desde 1967, para marcas notoriamente conhecidas, isto é, marcas que tivessem atingido um determinado grau de fama e de reconhecimento perante o público consumidor. Por outro lado, a regra do art. 125 da LPI, ao prever exceção ao princípio da especialidade, conferindo à marca de alto renome proteção em todos os ramos de atividade, configura a positivação, no ordenamento jurídico brasileiro, da proteção contra a diluição Vale dizer que a proteção contra a diluição, no Brasil, se encontra umbilicalmente relacionada à marca hoje denominada de alto renome, tendo sido criada apenas a ela e em razão dela. Com efeito, se uma marca não teve reconhecido esse status, ainda que seja famosa, não pode impedir o registro da mesma marca em segmentos mercadológicos distintos, sem que haja possibilidade de confusão. Ademais, mesmo que seja reconhecido a posteriori, o alto renome não tem o condão de atingir marcas já depositadas à época em que publicada a decisão administrativa de seu reconhecimento.