Recuperação judicial de SPE de incorporação imobiliária sem patrimônio de afetação

STJ
737
Direito Civil
Direito Empresarial
Geral
2 min de leitura
Atualizado em 25 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STJ 737

Tese Jurídica

A sociedade de propósito específico que atua na incorporação imobiliária e que não administra patrimônio de afetação pode submeter-se a recuperação judicial desde que: não utilize a consolidação substancial como forma de recuperação; a incorporadora não tenha sido destituída pelos adquirentes (art. 43, IV, da Lei 4.591/1964).

Comentário Damásio

Resumo

A atividade de incorporação imobiliária está geralmente estruturada na forma de uma holding que controla diversas sociedades de propósito específico (SPEs), cada uma constituída para o desenvolvimento de um empreendimento específico. Os pedidos de recuperação judicial são feitos pelo grupo empresarial e, uma vez satisfeitos os requisitos para o seu processamento, devem ser deferidos. A Lei n. 11.101/2005 não traz em seu art. 2º vedação quanto à submissão de sociedades incorporadoras ao regime da recuperação judicial. Ademais, conquanto a LFRE tenha como princípio a preservação da empresa, dando a ideia de que se dirige a atividades com características de perpetuidade, não veda a sua concessão a sociedades constituídas por prazo determinado, como é o caso das SPEs. A atividade empresarial será prestigiada enquanto perdurar, gerando empregos, beneficiando consumidores e recolhendo tributos. É oportuno mencionar, ademais, que a atividade de incorporação se desenvolve como um todo. Finalizada uma obra, outra é iniciada, muitas vezes com os mesmos trabalhadores e fornecedores. Sob essa perspectiva, trata-se de uma atividade contínua. Não bastasse isso, o deferimento do processamento da recuperação judicial não significa que a atividade conseguirá se soerguer, nem tampouco que, mesmo recuperada, será mantida posteriormente por seus titulares, o que não obsta que lhe seja concedida a recuperação. Assim, não parece haver impedimento para o pedido sob esse fundamento. No caso de haver sociedades de propósito específico com patrimônio de afetação entre as integrantes do grupo, na parte a ele relativa continuarão a desenvolver suas atividades de forma independente, com observância das regras estabelecidas pela Lei n. 4.591/1964. Com efeito, a Lei de Incorporações criou um regime de incomunicabilidade que é incompatível com o da recuperação judicial. Os créditos oriundos dos contratos de alienação das unidades imobiliárias, assim como as obrigações decorrentes da atividade de construção e entrega dos referidos imóveis são insuscetíveis de novação. Ademais, o patrimônio de afetação não pode ser contaminado pelas outras relações jurídicas estabelecidas pelas sociedades do grupo. A separação do patrimônio como mecanismo de proteção dos adquirentes e dos demais credores traz diversos benefícios à incorporadora, como atrair mais clientes, obter financiamentos em melhores condições, apurar individualmente os lucros de cada empreendimento, ter redução da carga tributária (Lei n. 10.931/2004) e manter transparência na gestão. Em contrapartida, reduz sua liberdade, pois lhe retira a disponibilidade sobre o patrimônio afetado. Encerrada a obra e entregues as unidades aos adquirentes, o patrimônio de afetação se exaure. Eventuais sobras voltarão a integrar o patrimônio geral da incorporadora e, somente a partir desse momento, poderão ser utilizadas para o pagamento de outros credores. É oportuno mencionar que, no caso de decretação da quebra da incorporadora, a falência não atingirá as incorporações submetidas à afetação, cabendo aos adquirentes optar pela continuação da obra ou liquidação do patrimônio de afetação, na forma do art. 31-F da Lei n. 4.591/1964. No caso de a sociedade de propósito específico não administrar patrimônio de afetação, não há, a princípio, óbice para a novação dos créditos, sendo vedado apenas estruturar a recuperação em consolidação substancial. A estipulação da sociedade de propósito específico tem sua razão de ser na execução de um objeto social único, evitando a confusão entre o seu caixa e as obrigações dos diversos empreendimentos criados pela controladora. Diante disso, não se mostra possível a reunião de seus ativos e passivos com os das outras sociedades do grupo em consolidação substancial, salvo se os credores considerarem essa situação mais benéfica. No mais, a recuperação judicial pode se processar normalmente, salvo se a obra estiver paralisada. Nos termos do art. 43, VI, da Lei n. 4.591/1964, na hipótese de a obra estar paralisada por mais de 30 (trinta) dias, sem justa causa, ou o incorporador retardar excessivamente o seu andamento, o Juiz poderá notificá-lo para que reinicie a obra. Desatendida essa determinação, o incorporador pode ser destituído pela maioria absoluta dos votos dos adquirentes, que darão prosseguimento à obra, com a extinção dos contratos de compromisso de compra e venda. Nessa situação, não há atividade a ser preservada. Caso os adquirentes não optem pela destituição, a recuperação judicial pode ter seu curso.

Conteúdo Completo

A sociedade de propósito específico que atua na incorporação imobiliária e que não administra patrimônio de afetação pode submeter-se a recuperação judicial desde que: não utilize a consolidação substancial como forma de recuperação; a incorporadora não tenha sido destituída pelos adquirentes (art. 43, IV, da Lei 4.591/1964).

Informações Gerais

Número do Processo

REsp 1.975.067-SP

Tribunal

STJ

Data de Julgamento

17/05/2022

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