Competência das Turmas de Direito Público do STJ em ACP sobre SAC e serviços regulados
Busca-se compelir a prestadora de serviços de televisão por assinatura a dar cumprimento ao Decreto n. 6.523/2008 e à Portaria n. 2.014/2008 a fim de que preste adequadamente o Serviço de Atendimento ao Consumidor - SAC, nos termos destas normas regulamentadoras, que não são lei em sentido estrito (ADI n. 4118/RJ), mas atos administrativos normativos. Por oportuno, colhe-se a seguinte passagem doutrinária "a regulação (art. 174 da CRFB) não se confunde com a regulamentação (art. 84, IV, da CRFB). Enquanto a regulação representa uma função administrativa, processualizada e complexa, que compreende o exercício de função normativa, executiva e judicante, a regulamentação é caracterizada como função política, inerente ao chefe do Executivo, que envolve a edição de atos administrativos normativos (atos regulamentares), complementares à lei". A delimitação da causa também não deixa de conter viés que envolve a observância da regulação do direito, pois se trata do exame de normas do SAC que incidem sobre a prestação de serviço regulado pelo Poder Público federal; e o serviço de televisão por assinatura, embora tenha regramento próprio previsto na Lei n. 12.485/2011, é serviço de telecomunicações que está sujeito ao Direito Regulatório (Lei n. 9.472/1997, art. 60, § 1º). Assim, evidencia-se que a relação jurídica controvertida entre o Órgão estadual que fiscaliza a implementação e manutenção adequada do serviço gratuito SAC, por telefone, "lei do call center ", e o prestador de serviço regulado pelo Poder Público federal - serviço de televisão por assinatura, que, na sua essência, é serviço de telecomunicações, possui contornos eminentemente públicos, quer sob a perspectiva do cumprimento de atos regulamentares específicos a disciplinar o Serviço de Atendimento ao Consumidor - SAC, quer sob a ótica da regulação do direito a serviço de telecomunicação (Lei n. 9.472/1997). Em acréscimo, registra-se que a Corte Especial deste Tribunal Superior, na sessão de 16 de junho de 2021, examinou o Conflito de Competência interna n. 178.687, Relator Ministro Raul Araújo, no qual havia também controvérsia a respeito de ofensa à norma do Decreto n. 6.523/2008, diante do suposto descumprimento do dever de informar o número do SAC em cartões de crédito, oportunidade em que se fixou a competência da Primeira Turma , que compõe a Primeira Seção desta Corte, para processar e julgar o feito. Conclui-se, portanto, que a controvérsia está contida no inciso XIV do § 1º do artigo 9º do Regimento Interno desta Corte Superior.
Juros moratórios de precatórios do FUNDEF/FUNDEB para pagamento de honorários contratuais
A controvérsia diz respeito à possibilidade do pagamento dos honorários contratuais com a verba dos precatórios já depositados, nas causas judiciais envolvendo verbas do FUNDEF/FUNDEB. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADPF n. 528, vedou o pagamento de honorários advocatícios contratuais com recursos alocados no FUNDEF/FUNDEB, embora tenha ressalvado o pagamento de honorários advocatícios contratuais valendo-se da verba correspondente aos juros de mora incidentes sobre o valor do precatório devido pela União em ações propostas em favor dos Estados e dos Municípios. Isso porque "a vinculação constitucional em questão não se aplica aos encargos moratórios que podem servir ao pagamento de honorários advocatícios contratuais devidamente ajustados, pois conforme decidido por essa Corte, 'os juros de mora legais têm natureza jurídica autônoma em relação à natureza jurídica da verba em atraso'" (RE n. 855.091 - Repercussão Geral, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 15/03/2021, DJe de 08/04/2021). Nesse passo, evidencia-se que o STF superou parcialmente o entendimento pacificado no âmbito das duas Turmas que compõem a Primeira Seção, notadamente na possibilidade de utilização dos juros moratórios dos precatórios para pagamento dos honorários contratuais, à vista da natureza autônoma dos juros em relação à verba principal.
Responsabilidade civil do locador por impedir funcionamento de imóvel comercial com acesso independente na pandemia
A controvérsia consiste em definir se a proibição de acesso a imóvel comercial imposta pelo locador, sob a justificativa de cumprimento às normas de restrição sanitária pela Covid-19, constitui ato ilícito apto à indenização do locatário. Como cediço, as obrigações impostas aos contratantes nas locações não residenciais estão previstas nos arts. 22 e 23 da Lei n. 8.245/1991. É possível extrair dos referidos dispositivos, que a responsabilidade pelo uso do imóvel é do locatário, restringindo-se a obrigação do locador à entrega do imóvel ao locatário em conformidade com a destinação do imóvel, garantindo a manutenção da destinação durante a execução do contrato. A moldura fática apresentada pelas instâncias ordinárias aponta que o restaurante locatário, embora estivesse localizado dentro do Jockey Club, locador, possuía acesso autônomo e independente do clube. Nesse sentido, a Corte de origem consignou que o contrato "não vinculava o funcionamento do aludido restaurante aos dias e horários em que o clube estivesse aberto, nem aos eventos que nele viessem a ocorrer". Extrai-se dos autos que era viável assegurar o acesso do público exclusivamente à área destinada ao restaurante, mantendo-se fechadas as demais áreas do clube, incluindo aquelas em que eram realizadas as atividades do turfe, tornando-se irrelevante, em tal medida, a proibição do funcionamento do clube. Vale destacar que o recorrente não teria nem sequer que implementar medidas para "isolar" o local, o qual já se encontrava cercado e, portanto, separado das demais áreas. Estabelecidas, portanto, as premissas em torno da atuação indevida do recorrente, revelou-se, de igual maneira, desprovida de razoabilidade ou proporcionalidade, tendo em vista que a conduta do locador acarretou ônus excessivo ao locatário, mediante sacrifício da retomada de suas atividades econômicas, não havendo se falar em "exercício regular de seu direito reconhecido na condição de locador". No que tange ao argumento de que restrição da pandemia serviria como excludente da responsabilidade civil, o recorrido agiu amparado em diploma normativo adequado ao exercício de suas atividades, não se extraindo dos autos, por outro lado, qualquer situação excepcional de risco concreto à saúde dos frequentadores do Jockey Club que autorizasse a atuação do recorrente fora dos limites que lhe eram previstos. O ato, portanto, é ilícito, na forma do que preveem os arts. 186, 187 e 188 do Código Civil, não tendo o recorrente agido sob o amparo de qualquer excludente de responsabilidade civil. Ademais, é bem de ver que a diretriz da boa-fé que rege as relações contratuais foi descumprida pelo recorrente, tendo em vista que o ato praticado se revelou, a um só tempo, desmesurado e impeditivo do alcance da função do contrato, alijando por completo o locatário de exercer os poderes inerentes ao uso e gozo da coisa, conforme o art. 565 do CPC. Dessa forma, sendo incontroversa a ocorrência de danos ao locatário em decorrência do período em que permaneceu fechado por ato exclusivo do recorrente, deve o recorrente indenizar o recorrido pelos danos sofridos, nos termos do art. 927 c/c 402, todos do Código Civil.
Art. 12 do Código de Ética da Magistratura não limita liberdade de expressão judicial
Ao regulamentar a relação entre os membros do Poder Judiciário e a imprensa, o Código de Ética da Magistratura Nacional (Resolução CNJ n. 60/2008) estabelece critérios que assegurem, de um lado, a força normativa dos princípios da liberdade de expressão e da publicidade dos atos emanados do Estado (art. 5º, IV, art. 37, caput , e art. 93, IX, da CF/1988), e, de outro, a prudência, atributo inerente ao exercício da judicatura. Na hipótese tem-se que a Corte de origem constatou que a magistrada não discorreu, em entrevista à imprensa, diretamente sobre o conteúdo dos autos, motivo pelo qual considerou que a defesa não demonstrou como a magistrada teria incorrido em uma das hipóteses legalmente previstas, que motivasse eventual suspeição para o julgamento da causa. Nesse sentido, da atenta análise do art. 12 do Código de Ética da Magistratura Nacional, aprovado pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ, em linha com o que estabelece o art. 36, III, da Lei Complementar n. 35/1979, destaque-se que não há impedimento ao livre exercício do direito de manifestação do Juiz.
Bloqueio via BacenJud mantém natureza acautelatória no CPC/2015 e requisitos antes da citação
Cinge-se a controvérsia a definir se o art. 854 do CPC/2015 representava evolução na percepção da natureza jurídica do bloqueio de dinheiro. Dito de outro modo, centra-se a análise se tal instrumento - como medida preparatória à penhora - deixaria de possuir caráter acautelatório e passaria a representar mecanismo destinado a promover maior grau de celeridade e efetividade na prestação jurisdicional executiva. Isso dispensaria a demonstração do preenchimento dos requisitos concernentes ao fumus boni iuris e ao periculum in mora - seja porque, caso a intenção do executado fosse a de realizar o pagamento, após a citação, a efetivação do bloqueio não lhe causaria prejuízo, seja porque a nomeação de bens à penhora, assim como a penhora propriamente dita, deve recair prioritariamente sobre dinheiro (art. 11, I, da Lei 6.830/1980 e art. 835, I, do CPC/2015), exceto se o devedor comprovar, à luz do princípio da menor onerosidade, que a Execução deve prosseguir com a constrição sobre outros bens de menor liquidez. No entanto, a jurisprudência das Turmas que compõem as Seções de Direito Público e Privado do STJ se firmou no sentido de que o novo Código de Processo Civil (CPC/2015) não alterou a natureza jurídica do bloqueio de dinheiro via Bacen Jud , permanecendo a natureza acautelatória e a necessidade de comprovação dos requisitos para sua efetivação em momento anterior à citação. Nesse sentido, destaca-se que o Tribunal a quo concluiu pela impossibilidade de se proceder à constrição de ativos do executado antes da sua citação ou, ao menos, uma nova tentativa de realizá-la. O referido entendimento está em consonância com a jurisprudência desta Corte superior, que é sedimentada no sentido de que deve haver a citação do executado antes da determinação da penhora ou arresto de valores em seu nome. Isso porque devem ser respeitados os princípios da ampla defesa e do contraditório e o devido processo legal, bem como ser preservado o caráter acautelatório da medida. Ademais, salienta-se que "a medida de bloqueio de dinheiro, via BACENJUD, à luz do CPC/2015, não perdeu a natureza acautelatória, sendo necessária, antes da citação do executado, a demonstração dos requisitos que autorizam a sua concessão" (AgInt no AREsp n. 1.467.775/GO, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 13/03/2020)".