Exclusão da receita de alienação de bens de leasing da base de PIS e COFINS
Durante a vigência do arrendamento mercantil, a sociedade empresária arrendadora é proprietária dos bens arrendados, os quais integram o seu ativo permanente (não circulante), nos termos do art. 3º da Lei n. 6.099/1974. O art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 6.099/1974, conceitua a operação de arrendamento mercantil da seguinte maneira: "Art. 1º - O tratamento tributário das operações de arrendamento mercantil reger-se-á pelas disposições desta Lei. Parágrafo único - Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta". Conforme assentado pela Segunda Seção do STJ no julgamento do REsp 1.099.212/RJ, submetido ao regime de recursos repetitivos, o "arrendamento mercantil é a cessão do uso de um bem, por um determinado prazo, mediante contrato, pelo qual, via de regra, a instituição financeira (arrendante) adquire um bem escolhido pelo cliente (arrendatário) e, em seguida, o aluga a este último. Ao término do contrato o arrendatário pode optar por renová-lo por mais um período, por devolver o bem arrendado à arrendadora ou dela adquirir o bem, pelo valor de mercado ou por um valor residual garantido previamente definido no contrato" (Tema n. 500, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 27/02/2013, DJe 04/04/2013). Por sua vez, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em precedente de caráter vinculante, assentou a existência de três modalidades de arrendamento mercantil, quais sejam, o leasing financeiro, o leasing operacional e o lease-back (Tema n. 125, RE 592.905/SC, Rel. Ministro Eros Grau, j. 02/12/2009, DJe 05/03/2010). O primeiro modelo corresponde à concepção clássica dessa espécie contratual, na qual uma instituição financeira arrendadora adquire um bem e, posteriormente, cede o seu uso temporário ao arrendatário mediante o pagamento de determinada quantia a título de aluguel, facultando-se, ao final do prazo pactuado, a opção entre renovação da avença, a aquisição do bem pelo arrendatário ou sua devolução à arrendadora. No leasing operacional, a seu turno, o bem já integra o patrimônio da arrendadora, a qual o transfere onerosamente a terceiros com a exigência de contraprestação pelo uso da coisa e pela prestação de serviços específicos manutenção e conservação. Por fim, no lease-back, uma sociedade empresária aliena determinado bem à arrendadora que, posteriormente, cede a coisa de volta em arrendamento mercantil à alienante, mecanismo normalmente utilizado para incrementar o capital de giro da arrendatária. Conquanto haja tais peculiaridades, verifica-se traço comum a todas as modalidades de leasing, qual seja, a atribuição da propriedade dos bens arrendados à arrendadora, porquanto a transferência do domínio é condicionada à opção de compra pelo arrendatário. Segundo a doutrina, "os bens, ao final do contrato, podem ser transferidos, a título oneroso, do domínio do intermediário financeiro à empresa arrendatária, desde que esta expresse a opção de compra mediante o pagamento de um custo residual". Por esse motivo, os bens destinados ao leasing são escriturados no ativo imobilizado da arrendadora, consoante o disposto no art. 3º da Lei n. 6.099/1974. Cabe ressaltar, outrossim, que o ativo imobilizado compreende os "direitos que tenham por objeto bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exercidos com essa finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram à companhia os benefícios, riscos e controle desses bens" (art. 179, IV, da Lei n. 6.404/1976). Além disso, na redação original da Lei n. 6.404/1976 (Lei das Sociedade por Ações) o ativo imobilizado integrava o conceito de ativo permanente (art. 178, § 1º, c). Com as alterações promovidas pela Lei n. 11.941/2009, o ativo permanente passou a ser denominado ativo não circulante, o qual é composto, entre outros, pelo ativo imobilizado (art. 178, § 1º, II). À vista desse panorama, como a pessoa jurídica cujo objeto social consiste na prática de operações de leasing é proprietária dos bens arrendados, os quais se destinam à manutenção de suas atividades, a escrituração destes como parte do ativo imobilizado atende às exigências das leis tributárias e empresariais. A receita decorrente da alienação dos bens objeto de operação de leasing na qual a instituição financeira figura como arrendadora é excluída da base de cálculo da contribuição ao PIS e COFINS. No regime cumulativo, a base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS corresponde à receita bruta da pessoa jurídica, nos moldes dos arts. 2º e 3º, § 1º, da Lei n. 9.718/1998. Por sua vez, na redação vigente à época dos fatos geradores, o inciso IV do § 2º do art. 3º desse diploma normativo excluía da base de cálculo das mencionadas contribuições a receita decorrente da venda de bens do ativo permanente. Após a vigência da Lei n. 13.043/2014, foi conferida nova redação ao dispositivo em apreço, para determinar a exclusão das receitas "[...] decorrentes da venda de bens do ativo não circulante, classificado como investimento, imobilizado e intangível" da base de cálculo das mencionadas contribuições, sem que houvesse, contudo, alteração do conteúdo normativo anterior, pois a mudança legislativa teve por escopo adequar a legislação tributária à classificação dos ativos das companhias delineada pela já destacada Lei n. 11.941/2009. Nessa linha, sendo os bens destinados ao arrendamento mercantil classificados como parte do ativo imobilizado e, por força do art. 3º da Lei n. 6.099/1974, como elemento do ativo permanente (não circulante) da arrendadora, a receita decorrente de sua alienação não é alcançada pela incidência dos tributos em exame. Relevante destacar que tal exegese restou acolhida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, como se extrai dos arts. 1º, III, e 7º, V, da Instrução Normativa RFB n. 1.285/2012 e da atual redação dos arts. 662 e 667, V, da Instrução Normativa RFB n. 1.911/2019. Outrossim, a conclusão também é abraçada pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), inclusive sob o regime de recursos administrativos repetitivos (cf. art. 47, § 1º, da Portaria MF n. 343/2015), tratando-se, portanto, de matéria pacífica no âmbito da Administração Tributária Federal. Dessarte, a par da expressa dicção legal, a orientação vigente em âmbito administrativo é no sentido de que as receitas decorrentes da alienação de bens do ativo não circulante - mesmo quando oriundas da venda dos bens destinados ao arrendamento mercantil - estão excluídas da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS no regime cumulativo. As instituições financeiras descritas no art. 22, § 1º, da Lei n. 8.212/1991 podem deduzir da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS as receitas oriundas da alienação de bens do ativo permanente. Os §§ 5º e 6º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998 estabelecem hipóteses específicas de dedução da base de cálculo das contribuições em exame quanto às pessoas jurídicas equiparadas a instituições financeiras pelo art. 22, § 1º, da Lei n. 8.212/1991. No entanto, essa disciplina não impede que as empresas de arrendamento mercantil usufruam do disposto no § 2º do art. 3º da mesma Lei n. 9.718/1998, porquanto o caráter especial dos dispositivos não tem o condão de inviabilizar a aplicação das normas gerais de delimitação da receita bruta, mormente em face da ausência de incompatibilidade entre as disposições comuns e as específicas. Com efeito, a diretriz do art. 3º, § 2º, da Lei n. 9.718/1998 se dirige à determinação da base imponível da contribuição ao PIS e da COFINS na sistemática cumulativa, mediante a identificação de rubricas excluídas da noção de receita bruta quanto a todos os sujeitos passivos. Por sua vez, o regramento previsto nos §§ 5º e 6º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998 permite, após o encontro da receita bruta, a dedução de despesas incorridas por instituições financeiras da base de cálculo das exações, com o intuito de reduzir o montante devido por essas entidades. Desse modo, não há contradição entre o dispositivo delimitador da noção de receita bruta para os fins das contribuições sociais em exame e as normas que, após a quantificação da base imponível, deduzem desse montante determinadas parcelas exclusivamente em relação a alguns contribuintes. Ademais, a razão subjacente à criação de parâmetros próprios aplicáveis às instituições financeiras condiz com a especificidade das atividades bancárias. Nesse sentido, as deduções e exclusões previstas nos §§ 5º e 6º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998 são pertinentes a negócios jurídicos reservados, por lei, a tais entidades, razão pela qual o legislador tributário editou casuística própria para citado segmento econômico. Essas hipóteses de dedutibilidade se relacionam, por exemplo, com despesas, perdas e deságios suportados pelas pessoas jurídicas mencionadas no art. 22, § 1º, da Lei n. 8.212/91, sempre de modo vinculado a atividades próprias do respectivo setor, tais como a intermediação financeira e a operação com títulos de renda fixa ou variável. Não obstante, apesar da previsão de regramento especial, não há óbice ao aproveitamento das diretrizes gerais pelas entidades em tela, pois a redação do § 2º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998, além de se direcionar ao delineamento da noção de receita bruta, não restringe sua aplicação a grupo específico de contribuintes - detendo, portanto, aspecto abrangente. Tal forma de apuração do crédito tributário detém caráter especial e, não sendo voltada a delimitar a materialidade da hipótese de incidência, assume aspecto de benefício fiscal. Trata-se, em verdade, de aparente conflito de normas que, a rigor, não denotam o mesmo âmbito de incidência, sendo uma geral e outra especial, aplicando-se, in casu, o disposto no § 2º do art. 2º do Decreto-Lei n. 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB), segundo o qual "[...] a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior". Dessa forma, é aparente a antinomia entre as normas que delimitam a materialidade da hipótese de incidência da contribuição ao PIS e da COFINS no regime cumulativo - aplicáveis, em caráter geral, a todos os contribuintes sujeitos às exações - e os §§ 5º e 6º do art. 3º da Lei n. 9.718/1998, porquanto o regramento especial assume diretriz exonerativa, com natureza jurídica de benefício fiscal redutor da base de cálculo dos tributos em exame apenas em relação às entidades descritas no art. 22, § 1º, da Lei n. 8.212/1991.
Limites da coisa julgada em relações de trato continuado com alterações supervenientes
Cinge-se a controvérsia a definir se a questão do cumprimento do contrato e da prestação do serviço está acobertada pela coisa julgada e, se estiver, se o Tribunal de origem, ao manter a sentença de extinção da execução, violou a imutabilidade dessa decisão. Sobre o tema, observa-se que o decidido pelo Tribunal foi que, no momento em que analisada a relação jurídica existente entre as partes, o contrato, que era de trato sucessivo, vinha sendo cumprido. Isso não quer dizer, contudo, que as obrigações da contratada seriam, para sempre, cumpridas. Não foi outro o entendimento da Corte de origem na análise da apelação interposta contra a decisão que julgou os embargos e extinguiu a execução. Verifica-se, portanto, que o pronunciamento original da Corte de origem, nos autos da ação de rescisão, tem uma limitação de ordem temporal, pois proferido de forma parcial, apenas com base na situação fática delineada até ali, em nada decidindo a respeito da execução completa do contrato, cujas obrigações se protraíram no tempo, inclusive para período posterior à ação. Desse modo, na ausência de pronunciamento judicial definitivo acerca da integralidade da relação jurídica estabelecida entre as partes, não há falar em imutabilidade ou coisa julgada sobre a execução do contrato como um todo, mas apenas quanto à parte analisada naquela oportunidade. Como explica a doutrina, nesses casos de relações jurídicas de trato continuado, não se pode falar em violação da coisa julgada anterior, pois os procedimentos não são idênticos, visto que a causa de pedir próxima será diferente na segunda ação, devido às alterações fáticas e jurídicas supervenientes. Ademais, se o pacto seguiu vigente, os fatos supervenientes, alheios ao pronunciamento anterior e que têm aptidão para alterar o contexto jurídico e a relação entre as partes, não podem ficar imunes à jurisdição. Nesse sentido, o art. 505, I, do CPC/2015. Assim, não se mostra contraditório o julgamento posterior que reconheceu a inexigibilidade e extinguiu a execução dos títulos vinculados ao contrato se, a despeito do juízo inicial de improcedência da rescisão, pois as obrigações vinham sendo atendidas, não se formou juízo final e de certeza quanto à inteireza da relação jurídica existente entre as partes. Com efeito, novo pronunciamento, que leva em consideração alteração fática superveniente, não ofende a imutabilidade da decisão anterior, que, ao apreciar obrigações continuadas e ainda não finalizadas, traz consigo, implicitamente, uma cláusula rebus sic stantibus, que autoriza a adaptação de eventual novo provimento à nova realidade.