Manutenção da qualidade de segurado em gozo de benefício previdenciário sem contribuições e sem prazo
Em regra, a tutela antecipada ou de urgência figura como provimento judicial provisório e reversível (art. 273, § 2º, do CPC/1973 e arts. 296 e 300, § 3º, do CPC/2015), pelo que, a rigor, a revogação da decisão que concede o mandamento provisório produz efeitos imediatos e retroativos, impondo o retorno à situação anterior ao deferimento da medida, cujo ônus deve ser suportado pelo beneficiário da tutela. Como o cumprimento provisório ocorre por iniciativa e responsabilidade do autor, cabe a este, em regra, suportar o ônus decorrente da reversão da decisão precária, na medida em que, a rigor, pode, de antemão, prever os resultados de eventual cassação da medida, escolher sujeitar-se a tais consequências e até mesmo trabalhar previamente para evitar ou mitigar os impactos negativos no caso de reversão. Essa regra (de total reversibilidade/restituição ao estado anterior), porém, não pode ser aplicada em relação ao segurado em gozo de benefício previdenciário por incapacidade laborativa, concedido por meio de tutela de urgência posteriormente revogada, na medida em que, nesses casos, o ônus (de perder a condição de segurado) não é completamente previsível, evitável ou mitigável. Portanto, não é de todo previsível porque o art. 15, I, da Lei n. 8.213/1991 assegura que, independentemente de contribuições, quem está em gozo de benefício (qualquer que seja a natureza da concessão, porque o dispositivo não diferenciou), mantém a qualidade de segurado, sem limite de prazo, isto é, não seria razoável exigir do segurado de boa-fé considerar que tal previsão expressa fosse afastada automaticamente na ocasião da revogação da medida de caráter precário. Ademais, o ônus (de perder a qualidade de segurado) não é mitigável ou evitável, pois enquanto o segurado está em gozo de benefício previdenciário por incapacidade laborativa, concedido por meio de tutela de urgência, não pode recolher contribuições previdenciárias, uma vez que, em tal condição, não se insere na previsão dos arts. 11 ou 13 da Lei n. 8.213/1991.
Afastamento da prisão domiciliar a gestantes e mães de menores de 12 exige fundamentação idônea
O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que a validade da segregação cautelar está condicionada à observância, em decisão devidamente fundamentada, aos requisitos insertos no art. 312 do Código de Processo Penal, revelando-se indispensável a demonstração de em que consiste o periculum libertatis. Não bastasse a compreensão já sedimentada nesta Casa, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 143.641/SP, concedeu habeas corpus coletivo "para determinar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar - sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 do CPP - de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas, ou mães de crianças e deficientes sob sua guarda, nos termos do art. 2º do ECA e da Convenção de Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto Legislativo 186/2008 e Lei 13.146/2015), relacionadas nesse processo pelo DEPEN e outras autoridades estaduais, enquanto perdurar tal condição, excetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício (...)" (STF, HC 143.641/SP, relator Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 20/2/2018, DJe de 21/2/2018). No caso, a prisão preventiva está justificada, pois, segundo a decisão que a impôs, foi apreendida grande quantidade e variedade de drogas, a saber, 2kg (dois quilos) de maconha, 8g (oito gramas) de crack e 18g (dezoito gramas) de cocaína. Dessarte, evidenciadas a periculosidade da ré e a necessidade da segregação como forma de acautelar a ordem pública. Ademais, o decreto de prisão preventiva salienta que, embora a autuada não possua antecedentes criminais, a elevada quantidade de drogas apreendidas invibializa a concessão da liberdade provisória (art. 310, II, CPP). Com efeito, a negativa da prisão domiciliar à acusada teve como lastro o fato de o delito ter sido cometido em sua própria residência, com armazenamento de grande quantidade e variedade de drogas em ambiente onde habitava com os filhos, colocando-os em risco, circunstância apta a afastar a aplicação do entendimento da Suprema Corte.
Prioridade do penhor de frutos registrado sobre direitos da parceria agrícola posterior
A controvérsia está em decidir se o penhor sobre os frutos de parceria agrícola, constituído exclusivamente pelo parceiro outorgado em favor de terceiro, depende de consentimento do parceiro outorgante para recair sobre a sua cota, na hipótese em que o contrato de parceria foi firmado antes, mas registrado depois da garantia. O art. 56 do Decreto n. 59.566/1966 não inclui, em sua redação, a eventual negociação jurídica anterior, devidamente registrada, referente à expedição de cédula de produto rural, portanto não se pode partir da presunção de que tal redação legal obrigatoriamente despreza uma entabulação como essa, pois tal proceder deixaria de respeitar princípios jurídicos de um negócio jurídico probo, como a boa-fé, a confiança legítima depositada entre as partes e a segurança jurídica. O dispositivo em comento em nenhum momento afirma que a ausência de consentimento em contrato não registrado atinge anterior cédula de produto rural devidamente registrada, situação na qual não tinha como o terceiro prejudicado saber que anterior negociação eventualmente poderia ter sido entabulada. Então, tal possibilidade de situação fática, qual seja, anterior registro de cédula de produto rural, não está prevista na exceção inserta no referido dispositivo legal, não podendo haver dedução de tal conclusão jurídica desconectada dos princípios que regem o proceder das contratações, conforme o sistema civil previsto no Código Civil. Conforme o princípio da boa-fé objetiva, brocardo jurídico sustentáculo do desenho dos negócios jurídicos, deve-se garantir confiança e expectativas legítimas entre as partes em todas as fases da contratação. É relevante lembrar do teor do art. 422 do Código Civil, o qual nos ensina que os contratantes são obrigados a guardar os princípios de probidade e boa-fé, tanto na conclusão do contrato como em sua execução. Assim, não se pode perquirir tão somente acerca da segurança jurídica dos contratantes do contrato de parceria agrícola, mas também se deve levar em conta a segurança jurídica do contratante da cédula de produto rural que, mediante conduta pautada pela boa-fé, entabulou negócio jurídico, sem nenhuma ciência de outros terceiros que pudessem ser afetados, até por que não tinha como sabê-lo. Se o contrato de parceria rural nem sequer havia sido registrado, era impossível, o conhecimento por parte de terceiros. Ademais, a Lei n. 6.015/1973 prescreve que o registro determina a prioridade do título.
Indenização por serviços à Administração sem licitação e contrato formal, com subcontratação e benefício comprovados
Cinge-se a controvérsia a definir se é devida ou não a indenização pelos serviços executados, bem como pelos subcontratados, ambos sem observância da Lei n. 8.666/1993 (vigente à época dos fatos). A jurisprudência do STJ é no sentido de que, mesmo que seja nulo o contrato realizado com a Administração Pública, por ausência de prévia licitação, é devido o pagamento pelos serviços prestados, desde que comprovados, nos termos do art. 59, parágrafo único, da Lei n. 8.666/1993, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração. O STJ reconhece, ademais, que, ainda que ausente a boa fé do contratado e que tenha ele concorrido para nulidade, é devida a indenização pelo custo básico do serviço, sem margem alguma de lucro. Assim, a inexistência de autorização da Administração para subcontratação, não é suficiente para afastar o dever de indenizar, no caso, porque a própria contratação foi irregular, haja vista que não houve licitação e o contrato foi verbal.
Responsabilidade patrimonial do cônjuge na comunhão universal por dívida do outro, com meação preservada
Cinge-se a controvérsia a determinar se é possível a penhora de valores em conta corrente da esposa do devedor, casados sob o regime da comunhão universal de bens, resguardando-se a respectiva meação. No regime da comunhão universal, todos os bens que os cônjuges adquirirem antes e durante o matrimônio, bem como as respectivas dívidas, pertencerão a ambos, com exceção do disposto nos incisos I a V do art. 1.668 do Código Civil (CC). De acordo com a doutrina, "através da comunhão universal forma-se uma massa patrimonial única para o casal, estabelecendo uma unicidade de bens, atingindo créditos e débitos e comunicando os bens pretéritos e futuros. Cessa a individualidade do patrimônio de cada um, formando-se uma universalidade patrimonial entre os consortes, agregando todos os bens, os créditos e as dívidas de cada um. É uma verdadeira fusão de acervos patrimoniais, constituindo um condomínio. Cada participante terá direito à meação sobre todos os bens componentes dessa universalidade formada, independentemente de terem sido adquiridos antes ou depois das núpcias, a título oneroso ou gratuito". Dessa maneira, formando-se um único patrimônio entre os consortes, o qual engloba todos os créditos e débitos de cada um individualmente, com exceção das hipóteses do art. 1.668 do CC, revela-se perfeitamente possível a constrição judicial de bens do cônjuge do devedor, casados sob o regime da comunhão universal de bens, ainda que não tenha sido parte no processo, resguardada, obviamente, a sua meação. Não há que se falar em responsabilização de terceiro (cônjuge) pela dívida do executado, pois a penhora recairá sobre bens de propriedade do próprio devedor, decorrentes de sua meação que lhe cabe nos bens em nome de sua esposa, em virtude do regime adotado. Caso a medida constritiva recaia sobre bem de propriedade exclusiva do cônjuge do devedor, o meio processual para impugnar essa constrição, a fim de se afastar a presunção de comunicabilidade, será pela via dos embargos de terceiro, a teor do que dispõe o art. 674, § 2º, inciso I, do Código de Processo Civil, cabendo à esposa o ônus de comprovar isso.