Exoneração do fiador: termo inicial na ciência efetiva da sublocação, dispensada comunicação do locatário sub-rogado
O § 2º do art. 12 da Lei n. 8.245/1991 estabelece a existência de um prazo de 30 dias (contado do recebimento da comunicação da sub-rogação) para o fiador exonerar-se da garantia prestada, ficando responsável pelos efeitos da fiança durante 120 dias após a notificação do locador sobre a exoneração. A formalidade da comunicação do fiador, não obstante o art. 12, § 2º, da Lei n. 8.245/1991 disponha que o referido ato deve ser realizado pelo locatário sub-rogado, é passível de relativização por meio da aplicação do princípio da instrumentalidade das formas. Assim, é possível manter a validade do ato realizado de forma diversa do previsto na lei, quando for alcançada sua finalidade, consoante o art. 244 do CPC/1973 (art. 277 do CPC/2015).
Cobertura obrigatória de despesas de acompanhante para idoso em internação hospitalar
Cinge-se a controvérsia a discutir a quem compete o custeio das despesas do acompanhante de paciente idoso no caso de internação hospitalar. A figura do acompanhante foi reconhecida pelo art. 16 do Estatuto da Pessoa Idosa - Lei n. 10.741/2003, que estabelece que ao paciente idoso que estiver internado ou em observação é assegurado o direito a um acompanhante, em tempo integral, a critério do médico. No âmbito da saúde suplementar, contudo, a Lei n. 9.656/1998, em seu art. 12, II, f , previu que, na hipótese em que o contrato de plano de saúde incluir internação hospitalar, a operadora é responsável pelas despesas de acompanhante. Por sua vez, o Ministério da Saúde, antes mesmo do advento da Lei n. 10.741/2003, editou a Portaria MS/GM n. 280/1999 determinando que os hospitais contratados ou conveniados ao Sistema Único de Saúde permitam a presença de acompanhante para os pacientes internados maiores de 60 (sessenta) anos e autorizando ao prestador do serviço a cobrança das despesas previstas com o acompanhante de acordo com as tabelas do SUS, nas quais estão incluídas a acomodação adequada e o fornecimento das principais refeições. Cumpre observar que, embora a Lei dos Planos inclua a obrigação de cobertura de despesas de acompanhante apenas para pacientes menores de 18 (dezoito) anos, a redação desse dispositivo é de 1998, portanto, anterior, ao Estatuto do Idoso, de 2003. Nesse contexto, diante da obrigação criada pelo referido estatuto e da inexistência de regra acerca do custeio das despesas de acompanhante de paciente idoso usuário de plano de saúde, a Agência Nacional de Saúde Suplementar definiu, por meio das Resoluções Normativas n. 211/2010, n. 387/2015 e n. 428/2017, que cabe aos planos de saúde o custeio das despesas referentes ao acompanhante desse paciente, as quais devem incluir a totalidade dos serviços oferecidos pelo prestador de serviço e relacionadas com a permanência do acompanhante na unidade de internação. Dessa forma, ainda que o contrato seja anterior ao Estatuto da Pessoa Idosa, inafastável a obrigação da operadora do plano de saúde de custear as despesas do acompanhante, pois a Lei n. 10.741/2003 é norma de ordem pública, de aplicação imediata.
Número incorreto da fatura na duplicata e perda da exigibilidade executiva extrajudicial
Controverte-se acerca da validade de duplicatas cujo campo relativo ao número da fatura foi preenchido de maneira equivocada, com numerações diversas daquelas das respectivas faturas. Em decorrência dos princípios da literalidade, da cartularidade, da incorporação, da autonomia, da independência e da tipicidade, os títulos de crédito desempenham a sua finalidade maior de promover a circulação de riquezas. Isso porque, abstraídos da causa que lhes tenha dado origem, cumpridos os requisitos legais para a formação da cártula, o título de crédito goza dos atributos da circulabilidade, da negociabilidade, da exigibilidade e da executoriedade, indispensáveis para que os princípios retromencionados possam se concretizar. Segundo dispõe o art. 2º, § 1º, da Lei n. 5.474/1968 (Lei das Duplicatas), são requisitos das duplicatas: "(...) § 1º A duplicata conterá: I - a denominação 'duplicata', a data de sua emissão e o número de ordem; II - o número da fatura; III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista; IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador; V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso; VI - a praça de pagamento; VII - a cláusula à ordem; VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo comprador, como aceite, cambial; IX - a assinatura do emitente." De fato, como se observa na leitura do inciso II acima transcrito, a data da fatura é requisito legal da duplicata. Com efeito, a incorreção no preenchimento desse campo específico no título de crédito torna-o inválido e inexigível no que se refere, especialmente, ao atributo da executoriedade, disposto no art. 15 da Lei das Duplicatas, visto que ferido o princípio da literalidade.
Penhorabilidade das verbas recebidas por escolas de samba em parcerias público-privadas
O Código de Processo Civil de 2015 estabelece que são impenhoráveis "os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução", bem como "os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social" (art. 833, I, IX). Igualmente, "não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis" (art. 832). Por se tratar de artigos referentes a impenhorabilidades sua interpretação deve ser restritiva, sempre com foco no núcleo essencial que justifica a própria instituição da regra, isto é, o almejado equilíbrio entre a satisfação do crédito para o credor e a menor onerosidade para o devedor. O art. 35, § 5º, da Lei n. 13.019/2014 dispõe que os "equipamentos e materiais permanentes" adquiridos com recursos provenientes da celebração da parceria serão gravados com cláusula de inalienabilidade. Portanto, não são os recursos o objeto da restrição legal, mas o produto do seu investimento necessário à consecução do projeto de parceria. Nesse sentido, também afasta-se a hipótese de bens não sujeitos à execução por ato voluntário, pois as verbas adquiridas pela escola de samba seguem regramento estabelecido na Lei n. 13.019/2014, sem qualquer dispositivo que faça menção de sua impenhorabilidade. Saliente-se que é inquestionável o valor social, cultural, histórico e turístico do carnaval brasileiro, uma das maiores expressões artísticas nacionais com alcance mundial. Este reconhecimento de envergadura nacional e internacional, todavia, não autoriza dizer por lei que sua promoção visa compulsoriamente à educação e à assistência social. A própria Lei n. 13.019/14 considera que a parceria entre a administração pública e as organizações da sociedade civil é feita "para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco" (art. 2º, III) jamais restringindo seu âmbito "para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social" (art. 833, IX, do CPC).
Obrigação de provedores de conexão e aplicação de guardar e apresentar porta lógica de origem
Os endereços IPs são essenciais na arquitetura da internet, que permite a bilhões de pessoas e dispositivos se conectarem à rede, permitindo que trocas de volumes gigantescos de dados sejam operadas com sucesso. Nesses termos, a doutrina define que "o endereço IP ( internet protocol) é a cédula de identidade de cada terminal, somente sendo admitido um terminal para cada número IP disponível, de modo que seja impossível a conexão de dois dispositivos à rede com o mesmo número, o que gera conflitos na transmissão e recepção de dados e, comumente, faz com que a própria rede derrube o acesso de todos os dispositivos com números colidentes". Para o próprio funcionamento da internet, é essencial que todos os identificadores sejam realmente únicos. Em especial, os números IPs ainda são utilizados para a identificação dos usuários da internet que tenham cometido atos ilícitos de qualquer natureza. No entanto, os números IPs - assim como outros recursos críticos da internet - são finitos, necessitando de adaptações e novas versões que permitam sua expansão. Historicamente, os números IPs da versão 4 foram distribuídos de forma irregular entre as diversas regiões mundo. Os números alocados para a América Latina e do Caribe se esgotaram em 2014. Em outras regiões do globo, os IPs se esgotaram ainda mais rapidamente. Na tentativa de resolver esse problema, diversas ferramentas foram desenvolvidas para permitir que provedores de conexão continuassem expandindo o acesso em suas regiões de atuação. Uma delas é oferecida pelo sistema de Tradução de Endereço de Rede (Network Address Translation - NAT), que permite que o mesmo número IP seja utilizado por diversos terminais. Para a correta compreensão do que seja a porta lógica de origem associada ao número IP é necessário ter em mente que, na expansão do IPv4, uma quantidade determinada de endereços foi reservada para "IPs privados", que seriam utilizados em redes não conectadas à internet. Além desses, um número de IPs públicos ou globais também foi designado, e são esses IPs públicos os utilizados para realizar a maioria das conexões na internet . Como mencionado, é utilizado o sistema NAT (Network Address Translation) a fim de permitir que múltiplos IPs privados sejam conectados à internet global por meio de um único IP público. Para esse compartilhamento, o sistema NAT cria uma tabela de correspondência entre os diversos IPs privados e o IP público comum, por meio do acréscimo de um número ao final do endereço IP. Esse número adicional é a chamada porta lógica de origem. Nesse contexto, no Marco Civil da internet , há duas categorias de dados que devem ser obrigatoriamente armazenados: os registros de conexão e os registros de acesso à aplicação. A previsão legal para guarda desses dados objetiva facilitar a identificação de usuários da internet pelas autoridades competentes e mediante ordem judicial, porque a responsabilização dos usuários é um dos princípios do uso da internet no Brasil, conforme o art. 3º, VI, da mencionada lei. Como afirmado acima, apenas esse número da porta de origem é capaz de fazer restabelecer a univocidade dos números IP na internet e, assim, é dado essencial para o correto funcionamento da rede e de seus agentes operando sobre ela. Portanto, sua guarda é fundamental para a preservação de possíveis interesses legítimos a serem protegidos em lides judiciais ou em investigações criminais. Por fim, a partir da recomendação do grupo de trabalho criado no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações, tanto os provedores de conexão quanto os provedores de aplicação necessitam desse número adicional, a porta de origem, para realizarem suas atividades na internet . De fato, apenas com as duas pontas da informação - conexão e aplicação - é possível resolver a questão da identidade de usuários na internet, que estejam utilizam um compartilhamento da versão 4 do IP. Portanto, é inegável que ambas as categorias de provedores de que dispõe o Marco Civil da Internet possuem a obrigação de guarda e fornecimento das informações da porta lógica de origem associada ao endereço IP.