Responsabilidade do arrendante por despesas de remoção e estadia em pátio privado de veículo apreendido
Cinge-se a controvérsia a definir se o arrendante é responsável pelo pagamento das despesas de remoção e estadia de veículo em pátio de propriedade privada quando a apreensão do bem deu-se, por ordem judicial, no bojo de ação de reintegração de posse por ele ajuizada em desfavor do arrendatário, dado o inadimplemento contratual. No que concerne à propriedade do bem objeto de contrato de arrendamento mercantil, tem-se que, enquanto perdurar o arrendamento mercantil, o arrendante é o seu proprietário para efeitos financeiros (REsp 1.725.404/SP, Segunda Turma, DJe 23/05/2018). Sobre o tema, vale lembrar que as despesas decorrentes do depósito do veículo em pátio privado referem-se ao próprio bem, ou seja, constituem obrigações propter rem. Essa espécie de obrigação provém "da existência de um direito real, impondo-se a seu titular", de maneira que independe da manifestação expressa ou tácita da vontade do devedor. Na espécie, isso equivale a dizer que as despesas com a remoção e a guarda dos veículos objeto de contrato de arrendamento mercantil estão vinculadas ao bem e a seu proprietário, ou seja, ao arrendante. Este é, inclusive, o mesmo entendimento adotado por este STJ quando se trata de veículo alienado fiduciariamente. Sendo hipótese diversa, frise-se a inaplicabilidade do entendimento firmado no REsp 1.114.406/SP, julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos, uma vez que tal precedente amolda-se às hipóteses em que a busca e apreensão do veículo decorre do cometimento de infrações administrativas de trânsito, situação em que as despesas relativas à remoção, guarda e conservação do veículo arrendado não serão de responsabilidade da empresa arrendante, mas sim do arrendatário, que, nos termos da Resolução n. 149/2003 do Contran, se equipara ao proprietário enquanto em vigor o contrato de arrendamento. Por fim, é importante ter em vista, ainda, que os referidos gastos foram presumivelmente destinados à devida conservação do automóvel, cuja propriedade é do próprio arrendante, como já consignado. Portanto, não se tratando de apreensão de veículo em razão do cometimento de infração de trânsito, deve-se manter o entendimento de que a responsabilidade pelo pagamento das despesas de remoção e estadia do veículo em pátio privado é da empresa arrendante.
Exceção à impenhorabilidade do bem de família por dívida tributária do imóvel
Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a penhora de imóvel, no bojo de ação de cobrança em fase de cumprimento de sentença, em razão da exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/1990. No caso, celebrou-se entre as partes um contrato particular de permuta de imóveis urbanos, em que seria transmitida uma casa residencial em troca de um lote de terreno. Por ocasião da celebração do referido contrato, pactuou-se que cada parte assumiria os tributos e taxas que viessem a incidir sobre os imóveis permutados, responsabilizando-se pela existência de débitos pendentes. Após a concretização da permuta e transferência da posse, constatou-se que o imóvel cedido por uma das partes possuía débitos de IPTU relacionados a anos anteriores à celebração do contrato. Assim, a parte adversa quitou os débitos fiscais junto à Municipalidade e ajuizou ação de cobrança contra o ora recorrente buscando o reembolso dos valores pagos, a qual foi julgada procedente pelas instâncias ordinárias. Na fase de cumprimento de sentença, o imóvel transferido ao recorrente (casa residencial), que antes pertencia aos recorridos, e que não possuía débitos tributários, foi penhorado para garantia da dívida objeto da referida ação de cobrança, com base no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/1990, o qual dispõe que poderá ser penhorado o bem de família "para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar". Não obstante, para a aplicação da exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no aludido dispositivo legal é preciso que o débito de natureza tributária seja proveniente do próprio imóvel que se pretende penhorar. Em outras palavras, era preciso que os débitos de IPTU fossem do próprio imóvel penhorado. Na hipótese, contudo, o imóvel penhorado não tinha qualquer débito tributário. Ademais, o débito referente ao IPTU do imóvel repassado pelo recorrente foi integralmente quitado pela outra parte, razão pela qual não se está cobrando "impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas", mas, sim, o reembolso dos valores pagos pelos autores em função do não cumprimento de cláusula contratual pelo recorrente, a qual estabelecia que a permuta dos imóveis deveria ser efetivada sem qualquer pendência fiscal. Com efeito, por se tratar de norma de exceção à ampla proteção legal conferida ao bem de família, a interpretação do art. 3º, inciso IV, da Lei n. 8.009/1990, deve se dar de maneira restritiva, não podendo ser ampliada a ponto de alcançar outras situações não previstas pelo legislador.
Insuficiência da mera menção a feriado local para comprovar a tempestividade do recurso especial
A comprovação da existência de feriado local que dilate o prazo para interposição de recursos dirigidos ao STJ deverá ser realizada por meio de documentação idônea, não sendo suficiente a simples menção ou referência nas razões recursais. Para fins de incidência da regra do art. 1.003, §6º, do CPC/2015, é irrelevante que o alegado feriado local tenha previsão em Regimento Interno ou em Código de Organização Judiciária do Estado, pois esses normativos, juntamente com os provimentos, os informativos, as portarias, os atos normativos e afins, são apenas espécies do gênero normativo local expressamente abrangido pela regra processual. A regra do art. 376 do CPC/2015 (antigo art. 337 do CPC/1973), segundo a qual a parte que alega direito local somente lhe provará teor, vigência e conteúdo se houver determinação judicial, situa-se no âmbito da teoria geral da prova e serve às instâncias ordinárias na atividade instrutória da causa, não se aplicando, todavia, ao juízo de admissibilidade de recurso dirigido ao Superior Tribunal de Justiça, que possui regra específica.
Equiparação de créditos de serviços contábeis a trabalhistas na recuperação judicial
Cinge-se a controvérsia em definir se créditos decorrentes da prestação de serviços contábeis e afins podem ser equiparados aos trabalhistas para efeitos de sujeição ao processo de recuperação judicial da devedora. Segundo a definição encontrada em dicionários técnico-jurídicos, o termo honorários alude à compensação pecuniária devida em razão de serviços prestados por profissionais liberais, como advogados, médicos, contadores, engenheiros etc. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 146.318 (Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 04/04/1997), manifestou entendimento no sentido de que verbas honorárias possuem natureza alimentar, tendo consignado, nessa assentada, que, "embora a honorária não tenha a natureza jurídica do salário, dele não se distingue em sua finalidade, que é a mesma. A honorária é, em suma, um salário ad honorem pela nobreza do serviço prestado. Tem, portanto, caráter alimentar, porque os profissionais liberais dele se utilizam para sua mantença e de seu escritório ou consultório". É certo, igualmente, que o STJ, ao se deparar com a questão atinente à ordem de classificação dos créditos em processos de execução concursal, tem conferido a esses honorários tratamento análogo àquele dispensado aos créditos trabalhistas. Essa posição da jurisprudência decorre do reconhecimento de que tanto a verba honorária quanto créditos de origem trabalhista constituem rubricas que ostentam a mesma natureza alimentar. Como consequência dessa afinidade ontológica, impõe-se dispensar-lhes tratamento isonômico, de modo que aqueles devem seguir os ditames aplicáveis às quantias devidas em virtude da relação de emprego. Há, todavia, na hipótese, outra especificidade que precisa ser considerada: o fato de a verba honorária ora discutida ser devida a uma sociedade simples, formada por contadores. Em primeiro lugar, não é de todo inusitado que seja reconhecida às receitas auferidas por uma pessoa jurídica natureza alimentar, do que é exemplo a remuneração recebida por representantes comerciais, equiparada, para fins falimentares, aos créditos trabalhistas (art. 44 da Lei n. 4.886/1965), muito embora os representantes comerciais possam se organizar em torno de uma sociedade (art. 1º da mesma lei). Em segundo lugar, uma sociedade simples, como a da hipótese, é um tipo de sociedade não empresária, constituída sobretudo para a exploração da atividade de prestação de serviços decorrentes da atividade intelectual correspondente à especialização profissional de seus membros (no particular, a atividade é estritamente ligada à contabilidade). Portanto, as sociedades simples constituem sociedades nas quais o caráter pessoal é que predomina - cujo único objeto possível, no particular, é o exercício da atividade de contabilidade. Nesse panorama, considerando que as receitas auferidas pela sociedade são provenientes de uma única atividade - assessoria contábil - cuja remuneração é considerada de caráter alimentar, inexiste motivo para classificar os créditos por ela titularizados, no processo de recuperação judicial da devedora, de maneira diversa daquela que seriam classificados aqueles devidos às pessoas físicas no desempenho das mesmas atividades.
Ação monitória: descumprimento de emenda para apresentar original não autoriza extinção total
No caso, o processo foi extinto com fundamento no art. 284, parágrafo único, combinado com o art. 267, I, ambos do CPC/1973, tendo em vista o descumprimento do autor de proceder a emenda à petição inicial para que fosse juntado aos autos documento original de nota promissória. Na análise do recurso de apelação, reconheceu-se a correção da sentença de extinção com relação ao título supracitado, concluindo por sua reforma no tocante às demais notas promissórias, por terem sido apresentados os respectivos originais. Tal entendimento se coaduna com os princípios da celeridade e da economia processual, uma vez que a monitória foi embasada em quatro notas promissórias, das quais somente uma foi apresentada por cópia. Assim, o descumprimento da ordem judicial para trazer aos autos o original da referida cártula não pode macular o pedido inicial na parte em que o processo foi instruído corretamente, nos termos do art. 283 do CPC/1973.