Risco de Covid-19 em acolhimento institucional como fundamento para manutenção da criança com família substituta
Inicialmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA -, ao preconizar a doutrina da proteção integral (art. 1º da Lei n. 8.069/1990), torna imperativa a observância do melhor interesse da criança. No caso, não há nenhum perigo na permanência do menor com os impetrantes, que buscam regularizar a guarda provisória, já que existe a possibilidade de se investigar, em paralelo, eventual interesse de família natural extensa em acolher o menor ou até mesmo colocá-lo em outra família adotiva, ao menos até o trânsito final dos processos de guarda e acolhimento. Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que, salvo evidente risco à integridade física ou psíquica do infante, não é de seu melhor interesse o acolhimento institucional ou o acolhimento familiar temporário. Portanto, a criança deve ser protegida de abruptas alterações, sendo certo que no presente momento é preferível mantê-la em uma família que a deseja como membro do que em um abrigo, diante da pandemia da Covid-19 que acomete o mundo.
Direito ao FGTS de servidores estatutários efetivados por lei inconstitucional em Minas Gerais
No julgamento do RE 596.478/RR, realizado sob a sistemática da repercussão geral, o STF declarou a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n. 8.036/1990, garantindo o direito ao depósito de FGTS aos empregados admitidos sem concurso público por meio de contrato nulo. Também sob a sistemática da repercussão geral, a Suprema Corte, (RE 705.140/RS), firmou a seguinte tese: "A Constituição de 1988 comina de nulidade as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público (CF, art. 37, § 2º), não gerando, essas contratações, quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos empregados contratados, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei n. 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS". O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 4.876/DF, declarou a inconstitucionalidade dos incisos I, II, IV e V, do art. 7º, da Lei Complementar do Estado de Minas Gerais n. 100/2007, sob o fundamento de que o referido diploma legal tornou titulares de cargo efetivo servidores que ingressaram na administração pública sem a observância do preceito do art. 37, II, da CF/1988. O STJ, por sua vez, firmou o entendimento de que o "efeito prospectivo de parte da decisão proferida na ADI 4876/DF, para definir que a sua eficácia só começasse a surtir efeitos a partir daquele momento específico (dezembro de 2015), nos termos do art. 27 da Lei n. 9.868/1999, não retirou o caráter retroativo da decisão (ex tunc), tendo apenas postergado a incidência desse efeito em razão na necessidade de continuidade do serviço público e do grande volume de servidores envolvidos" (REsp 1.729.648/MG, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 25/10/2018). Verifica-se dos entendimentos citados que o efeito da declaração de inconstitucionalidade, proferida na ADI 4.876, retroagiu desde o nascimento da LCE n. 100/2007, tornando nulo o provimento de cargo efetivo e, em consequência, nulo o vínculo com o ente federativo firmado com nítido caráter de definitividade, em desrespeito ao preceito estampado no art. 37, II, da CF/1988. Impende consignar que a modulação dos efeitos prospectivos da declaração de inconstitucionalidade, não afasta o regramento previsto no art. 19-A da Lei n. 8.036/1990, porquanto teve por finalidade apenas evitar eventual prejuízo à prestação de serviços essenciais à sociedade mineira. Diante disso, é irrelevante para a aplicação do art. 19-A da Lei n. 8.036/1990, o fato de o servidor ter sido submetido ao regime estatutário, o que é fundamental é que tenha sido declarada a nulidade da efetivação para os quadros do Estado mineiro. Assim, o fato de ter sido mantido o vínculo estatutário do servidor por determinado período, não exclui o direito ao depósito do FGTS, já que, uma vez declarado nulo o ato incompatível com a ordem constitucional, nulo está o contrato firmado entre as partes.
Limite de 30% na compensação de prejuízos fiscais do IRPJ e CSLL na incorporação societária
A legislação do IRPJ e da CSLL permite que eventuais prejuízos fiscais apurados em períodos anteriores sejam compensados com os lucros apurados posteriormente, estabelecendo que a referida compensação é limitada a 30% (trinta por cento) do lucro real, por ano-calendário. Analisando o tema, o STF considerou que a natureza jurídica da compensação de prejuízos fiscais do IRPJ e da base de cálculo negativa da CSLL é de benefício fiscal, decidindo pela constitucionalidade da lei que impôs o limite de 30% (trinta por cento) para que a compensação pudesse ser efetivada. Contudo, é importante ressaltar que a Suprema Corte não adentrou no exame da matéria ora discutida qual seja, se há amparo legal que permita a compensação integral dos prejuízos fiscais, sem observância do limite de 30% a que se referem os arts. 15 e 16 da Lei n. 9.065/1995, quando ocorre o desaparecimento da empresa, por incorporação, cisão ou extinção da sociedade empresária. Sobre essa questão, não se pode perder de vista que o princípio da legalidade, se de um lado impõe a exigência de cobrança de tributo só por lei expressa, nos termos previstos na Constituição Federal, em seu art. 5º, II, e, especificamente, no seu art. 150, II, de outro, também deve ser de observância obrigatória para que haja permissão da compensação de prejuízos com lucros para fins tributários, de modo que esta compensação deve ocorrer somente com autorização legislativa expressa. E, do arcabouço jurídico que rege a matéria, não se dessume nenhuma autorização legal para que, na hipótese de extinção da empresa por incorporação, os seus prejuízos fiscais possam ser compensados sem qualquer limitação. No direito tributário, ramo do direito público, a relação jurídica só pode decorrer de norma positiva, sendo certo que o silêncio da lei não cria direitos nem para o contribuinte nem para o Fisco e, sendo a compensação um benefício fiscal, a interpretação deve ser restritiva, não se podendo ampliar o sentido da lei nem o seu significado, nos termos do art. 111 do Código Tributário Nacional. Desse modo, havendo norma expressa que limita a compensação de prejuízos fiscais do IRPJ e bases de cálculo negativas da CSLL a 30% (trinta por cento) do lucro líquido ajustado do exercício em que se der a compensação, sem nenhuma ressalva à possibilidade de compensação acima desse limite nos casos de extinção da empresa, não pode o Judiciário se substituir ao legislador e, fazendo uma interpretação extensiva da legislação tributária, ampliar a fruição de um benefício fiscal.
Natureza trabalhista dos créditos por danos morais na recuperação judicial
O propósito recursal é definir se os créditos decorrentes de condenação por danos morais, em razão de intoxicação alimentar, imposta às recuperandas na Justiça do Trabalho devem ser classificados como trabalhistas ou quirografários. Verifica-se que a obrigação da recuperanda em reparar o dano causado ao empregado foi a consequência jurídica aplicada pela Justiça especializada em razão do reconhecimento da ilicitude do ato por ela praticado, na condição de empregadora, durante a vigência do contrato de trabalho. Convém lembrar que há disposições específicas na legislação trabalhista que obrigam a empresa empregadora a garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores, bem como a fornecer condições adequadas de higiene e conforto para o desempenho das atividades laborais. Assim, para a inclusão do empregado no rol dos credores trabalhistas, não importa que a solução da lide que deu origem ao montante a que tem direito dependa do enfrentamento de questões de direito civil, mas sim que o dano tenha ocorrido no desempenho das atividades laborais, no curso da relação de emprego. Importa consignar que a própria CLT é expressa - em seu art. 449, § 1º - ao dispor que "a totalidade dos salários devidos aos empregados e a totalidade das indenizações a que tiver direito" constituem créditos com o mesmo privilégio. No particular, destarte, por se tratar de crédito constituído como decorrência direta da inobservância de um dever sanitário a que estava obrigada a recuperanda na condição de empregadora, afigura-se correta - diante da indissociabilidade entre o fato gerador da indenização e a relação trabalhista existente entre as partes - a classificação conforme o disposto no art. 41, I, da LFRE.
Aplicação do art. 187 do Decreto 3.048/1999 na aposentadoria por direito adquirido pré-EC 20/1998
O Regulamento da Previdência Social, Decreto 3.048/1999, prevê duas possibilidades de cálculo do salário de benefício pelo direito adquirido, ambas amparadas nos artigos 187 e 188-B: (1) em razão do advento da Emenda Constitucional n. 20/1998, tendo em conta as alterações dos requisitos para concessão de aposentadoria; (2) pelo advento da Lei n. 9.876/1999. Assim, quando a aposentadoria for deferida com suporte tão somente no tempo de serviço prestado até 16.12.1998, vale dizer, com base no direito adquirido anterior à vigência da Emenda Constitucional n. 20/1998, a atualização dos salários de contribuição integrantes do período básico de cálculo deverá observar como marco final a data ficta de dezembro de 1998 e não a data efetiva da implantação em folha de pagamento. Apurando-se a renda mensal inicial na época do implemento das condições preestabelecidas e reajustando-a posteriormente pelos mesmos índices aplicados aos benefícios previdenciários em manutenção, conforme parâmetros trazidos no artigo 187, parágrafo único, do Decreto n. 3.048/1999. Com efeito, a data de entrada do requerimento norteará unicamente o início do pagamento do benefício. Por outro lado, se o segurado optar pela aposentadoria pelas regras vigentes até a edição da Lei n. 9.876/1999, deve ser observada a redação do artigo 188-B do referido Decreto. Em qualquer dos casos deve ser calculada a renda mensal inicial do benefício na data em que reunidos os requisitos necessários para sua concessão, a partir daí, a renda mensal inicial deverá ser reajustada pelos índices de correção monetária dos benefícios previdenciários até a efetiva implantação em folha de pagamento. Vale ressaltar que o critério entabulado pelo art. 187 do Decreto n. 3.048/1999, ampara o segurado com correção monetária até o início do benefício. Em sentido contrário, a adoção do critério da correção dos salários de contribuição até o início do benefício, o requerimento administrativo no caso, resultaria na adoção de hibridismo de regimes, incompatível com o Regime Geral de Previdência Social. Isso porque o segurado reúne as condições para aposentadoria de regime extinto, e sob a regência dele é que deve ser calculada a renda mensal inicial do benefício. Essa interpretação decorre de julgamento do STF sob a sistemática da Repercussão Geral: RE 575.089, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 10.9.2008, DJe 23/10/2008.