Legalidade de prazo máximo para requerimento do seguro-desemprego em ato normativo infralegal
A controvérsia consiste em definir se há legalidade na fixação, por ato normativo infralegal, de prazo máximo para o trabalhador requerer o seguro-desemprego e apresentar a documentação necessária. Explica a doutrina que "o seguro-desemprego é um benefício previdenciário que tem por finalidade promover a assistência financeira temporária do trabalhador desempregado em virtude de ter sido dispensado sem justa causa, inclusive a indireta", além de se destinar "a auxiliar os trabalhadores na busca de emprego, promovendo, para tanto, ações integradas de orientação, recolocação e qualificação profissional". Quanto à regulamentação do benefício, a normatização não se exaure no plano legal, considerando que a legislação autoriza o exercício do poder regulamentar da Administração para edição de atos normativos derivados. A Lei n. 7.998/1990 atribuiu expressamente ao Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador - CODEFAT a competência para regulamentar seus dispositivos, sendo ínsito a tal poder a possibilidade de complementar o diploma legal relativamente a situações procedimentais necessárias à sua adequada consecução. Nesse sentido, a fixação, por ato normativo infralegal, de prazo máximo para o trabalhador formal requerer o seguro-desemprego, não extrapola os limites da outorga legislativa; antes, mostra-se razoável e proporcional, considerando a necessidade de se garantir a efetividade do benefício e de se prevenir - ou dificultar - fraudes contra o programa, bem como assegurar a gestão eficiente dos recursos públicos. Deveras, a dispensa sem justa causa do trabalhador deflagra, para o empregador, a obrigação de comunicá-la oficialmente, momento a partir do qual o órgão responsável pelo controle e processamento dos requerimentos terá ciência formal da potencial solicitação - itinerário procedimental, aliás, que justifica a previsão legal de prazo mínimo para se efetuar o requerimento. Logo, a prescrição de prazo máximo para se requerer a habilitação ao benefício permite à Administração otimizar o gerenciamento e a alocação dos recursos para o custeio da despesa, previsibilidade essa que ficaria prejudicada sem a definição de um limite temporal, comprometendo, em último plano, a adequada execução da lei. Assim, conclui-se que o estabelecimento de termo final em sede infralegal confere maior flexibilidade e capacidade de adaptação do sistema de seguro-desemprego às demandas e mudanças do contexto socioeconômico, na medida em que torna possível, eventualmente, ajustar o prazo conforme as necessidades e a realidade do mercado de trabalho, equilibrando, dessa forma, a proteção ao trabalhador formal desempregado e a sustentabilidade do sistema. Ademais, o transcurso do prazo fixado sem a manifestação do potencial beneficiário não extingue o direito ao benefício, que poderá ser novamente requerido quando implementadas as condições para um novo período aquisitivo (art. 4º, § 1º, da Lei n. 7.998/1990).
Irretratabilidade da opção pela CPRB não vincula Administração e revogação respeita anterioridade nonagesimal
A controvérsia consiste em saber se a irretratabilidade prevista no § 13 do art. 9º da Lei n. 12.546/2011 é dirigida apenas aos contribuintes ou se também vincula a Administração Tributária, bem como se a revogação da escolha de tributação da contribuição previdenciária pelo sistema da Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB), trazida pela Lei 13.670/2018, feriu direitos do contribuinte. Verifica-se que a CPRB é contribuição substitutiva, facultativa, em benefício do contribuinte, instituída como medida de política fiscal para incentivar a atividade econômica, cuja renúncia fiscal é expressiva e da ordem de 83 bilhões de reais, no período de 2012 a julho de 2017. Contudo não há direito adquirido à desoneração fiscal. O mesmo raciocínio deve ser aplicado à desoneração por lei ordinária. A desoneração prevista na Lei n. 12.546/2011 não era condicional nem por prazo certo, de modo que a sua revogação poderia ser feita a qualquer tempo, respeitando-se a anterioridade nonagesimal, o que ocorreu, porquanto a Lei n. 13.670/2018 foi publicada em 30 de maio de 2018 e seus efeitos apenas começaram a ser produzidos em setembro de 2018. Dessa forma, não prospera a alegação de que a irretratabilidade da opção ao regime da CPRB (art. 9º, § 13, da Lei n. 12.546/2011) também se aplicaria à Administração. Isso porque seria aceitar que o legislador ordinário pudesse estabelecer limites à competência legislativa futura do próprio legislador ordinário, o que não encontra respaldo no ordenamento jurídico, seja na Constituição Federal, seja nas leis ordinárias. Assim, a alteração promovida pela Lei n. 13.670/2018 não caracteriza violação à segurança jurídica, mas sim a exclusão de uma das opções de regime de tributação que a lei disponibilizava ao contribuinte. De outro lado, a jurisprudência consolidou-se no sentido de que não se revoga isenção tão somente nas hipóteses de prazo certo ou onerosidade pré-determinada em forma de condição. Dessa forma, a regra da irretratabilidade da opção pela CPRB descrita no § 13 do art. 9º, da Lei n. 12.546/2011 destina-se apenas ao beneficiário do regime, e não à Administração, também não fere direitos do contribuinte, pois foi respeitada a anterioridade nonagesimal.
Multa apenas cumulativa em crimes de violência doméstica e familiar contra a mulher
A controvérsia consiste em definir se a vedação constante do art. 17 da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) obsta a imposição, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de pena de multa isoladamente, ainda que prevista de forma autônoma no preceito secundário do crime de ameaça. Essa norma dispõe que "é vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa". A intenção do legislador ao impedir a aplicação exclusiva da pena de multa foi a de ampliar a função de prevenção geral das penas impostas nos casos de crimes cometidos nesse contexto. Dessa forma, pretende-se demonstrar à sociedade que a prática de agressão contra a mulher acarreta consequências graves para o autor, que vão além do aspecto financeiro. Tal interpretação implica na compreensão de que a proibição legal também se aplica à hipótese de multa estabelecida como uma pena autônoma na parte secundária do tipo penal, como é o caso do crime de ameaça (art. 147 do Código Penal). Com efeito, a imposição desse tipo de penalidade (multa) em crimes cometidos de acordo com o artigo 5º da Lei n. 11.340/2006 só pode ocorrer de forma cumulativa, nunca de maneira isolada.
Aplicação da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos municipais e cumulação com Decreto-Lei 201/1967
Segundo entendimento pacífico do STJ, os agentes políticos municipais se submetem aos ditames da Lei de Improbidade Administrativa, sem prejuízo da responsabilização política e criminal estabelecida no DL n. 201/1967. Nesse sentido, confira-se: [...] 2. A orientação desta Corte Superior firmou-se no sentido de que os Prefeitos Municipais, apesar do regime de responsabilidade político-administrativa previsto no Decreto-Lei 201/67, estão submetidos à Lei de Improbidade Administrativa, em face da inexistência de incompatibilidade entre as referidas normas. [...] (AgRg no REsp n. 1.425.191/CE, rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 16/3/2015). A propósito do tema, a Suprema Corte, em 13/9/2019, quando do julgamento do Tema 576, submetido ao regime de repercussão geral, firmou a tese de que o processo e o julgamento de prefeito municipal por crime de responsabilidade (Decreto-lei 201/1967) não impedem sua responsabilização por atos de improbidade administrativa previstos na Lei n. 8.429/1992, em virtude da autonomia das instâncias (RE n. 976.566/PA, rel. Ministro Alexandre De Moraes, Plenário, DJe 25/9/2019).
Termo inicial da usucapião na posse ad usucapionem afastada actio nata subjetiva
Cinge-se a controvérsia a definir se a teoria da actio nata é aplicável à prescrição aquisitiva, notadamente quando a violação ao direito de propriedade é constatado somente após ação demarcatória. De acordo com o art. 189 do Código Civil (CC/2002), o prazo prescricional é contado, em regra, a partir do momento em que configurada a lesão ao direito subjetivo, independentemente do momento em que seu titular tomou conhecimento pleno do ocorrido e da extensão dos danos. Entretanto, a referida regra é excepcionada quando a própria lei estabeleça o termo inicial da prescrição de forma diversa, como no caso do art. 200 do CC ou quando a própria natureza da relação jurídica torna impossível ao titular do direito adotar comportamento diverso da inércia, haja vista a absoluta falta de conhecimento do dano. A compreensão conferida à teoria da actio nata sob o viés subjetivo encontra respaldo em boa parte da doutrina nacional e é admitida em julgados do Superior Tribunal de Justiça, justamente por conferir ao dispositivo legal sob comento interpretação convergente à finalidade do instituto da prescrição, isto é, o surgimento da pretensão reparatória dá-se no momento em que o titular do direito violado detém o pleno conhecimento da lesão, termo em que sua pretensão passa a ser efetivamente exercitável. Entretanto, a perspectiva subjetiva da teoria da actio nata deve ser aplicada com muita prudência, sob pena de se subverter o escopo da teoria e do desígnio da própria prescrição, qual seja, instituir segurança jurídica e estabilidade às relações jurídicas, já que, se aplicada de forma inadvertida, poderá gerar injustiças não desejadas. Na hipótese em análise, não se vislumbra a excepcionalidade necessária para sua aplicação, pois, não obstante a ação demarcatória tenha demonstrado a existência de demarcação irregular entre os lotes, a violação do direito dos recorrentes era passível de constatação desde o momento em que as cercas foram estabelecidas irregularmente entre os imóveis. O proprietário do imóvel invadido teria condições de, a todo tempo, constatar a irregularidade e manifestar oposição à manutenção da posse, principalmente por possuir o título de propriedade do bem, mas não cuidou de confirmar a correção da área demarcada dentro do prazo fatal, não podendo se considerar que o pleno conhecimento da lesão e possibilidade de efetivamente exercer sua pretensão se deram apenas com a ação demarcatória. Especificamente quanto à propriedade e a sua perda, pode-se afirmar que não há sua perda pelo seu desuso ou a prescrição em promover a ação reivindicatória, havendo, na verdade, o surgimento de um direito em favor de um terceiro quando preenchidos os requisitos necessários à usucapião. Em contraposição aos direitos pessoais, que decorrem das relações humanas mediante o exercício do direito pelo credor contra o devedor, os direitos reais recaem sobre bens corpóreos, mediante o exercício de poderes imediatos e diretos sobre os bens, em caráter permanente e com direito de sequela. Assim, não se verifica a prescrição dos direitos reais do titular sobre o bem ou o direito de reaver a coisa, independentemente do período de tempo em que ficou afastado da posse ou do simples uso. O que se verifica, na verdade, é a perda do bem diante do surgimento de algum direito em favor de uma terceira pessoa perante o mesmo bem, como é o caso da usucapião. A usucapião é um modo de aquisição originária da propriedade, tornando irrelevante quaisquer direitos que terceiros tenham sobre o bem, bastando estar demonstrada a posse contínua, mansa e pacífica durante o prazo legal, com animus domini e sem contestação, independentemente do conhecimento ou não da posse pelo antigo proprietário, não havendo discussão quanto ao elemento subjetivo das partes. Desse modo, não se está a afirmar que houve a prescrição do direito de ação dos autores para demarcar ou reivindicar bem de sua propriedade, mas, na verdade, é que o decurso de determinado prazo para sua manifestação ou oposição deu ensejo ao surgimento do direito à usucapião dos ora recorridos, pois o reconhecimento do seu direito na ação demarcatória não tem o condão de fazer nascer sua pretensão.