Representação estudantil: competência privativa da União e autonomia universitária – 3

STF
920
Direito Constitucional
Geral
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Atualizado em 14 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STF 920

Comentário Damásio

Conteúdo Completo

O Plenário, por maioria, ao julgar procedente, em parte, pedido formulado em ação direta, declarou a inconstitucionalidade do art. 5º da Lei paranaense 14.808/2005 e conferiu interpretação conforme à Constituição Federal (CF) aos arts. 1º a 4º da mencionada norma, excluindo do seu âmbito de incidência as instituições federais e particulares de ensino superior (Informativo 774).

A Lei 14.808/2005, em seu art. 1º, assegura a livre organização dos centros e diretórios acadêmicos nos estabelecimentos de ensino superior, públicos e privados. No art. 2º, dispõe ser de competência exclusiva dos estudantes a definição das formas, dos critérios, dos estatutos e demais questões referentes a sua organização. Esses dois artigos são constitucionais, não dispõem sobre matéria atinente a direito civil e versam apenas sobre liberdade de associação. Dessa maneira, ausente violação à competência da União (CF, art. 22, I (1)).

O art. 3º preceitua que os estabelecimentos de ensino devem ceder espaço para instalações dos centros e diretórios acadêmicos e garantir: livre divulgação dos jornais e outras publicações (inciso I); participação nos conselhos universitários (inciso II); acesso à metodologia da elaboração das planilhas de custos (inciso III); e acesso dos representantes das entidades estudantis às salas de aula (inciso IV). O art. 4º preconiza que os espaços cedidos devem ser preferencialmente nos prédios correspondentes aos cursos. Ambos os dispositivos não invadem a autonomia universitária (CF, art. 207). Ao contrário, concretizam os valores constitucionais de liberdade de expressão, associação e reunião, asseguram a gestão democrática das universidades públicas e, por conseguinte, permitem a construção de tais universidades como um espaço de reflexão, de exercício da cidadania e de fortalecimento democrático.

O ministro Dias Toffoli (relator), ao reajustar seu voto na linha do proferido pelo ministro Roberto Barroso, esclareceu que a participação dos centros acadêmicos e diretórios nos conselhos fiscais e consultivos das instituições de ensino pode ser lida de várias formas, não no sentido de ter direito a voto.

Por sua vez, o ministro Edson Fachin assinalou que a autonomia da universidade delimitará a densidade da participação. O art. 209 da CF – que garante o ensino, a livre iniciativa – determina o atendimento de algumas condições, entre as quais o cumprimento de normas gerais da educação. Nessas normas, está, precisamente, a gestão democrática (art. 206, VI), que se concilia com a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial (CF, art. 207). No tocante à metodologia, ressaltou não se tratar de interferir na gestão.

O Colegiado deu interpretação conforme à Constituição aos arts. 1º a 4º para excluir do seu âmbito de incidência as instituições federais e particulares de ensino superior, haja vista integrarem o sistema federal de que tratam os arts. 209 e 211 (2) da CF combinados com os arts. 16 e 17 (3) da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).

Além disso, assentou a inconstitucionalidade do art. 5º da lei paranaense, no qual se prevê a aplicação de multa às instituições particulares que não observem as regras contidas nos artigos anteriores. A norma viola a competência legislativa da União para dispor sobre o sistema federal, bem como a isonomia, uma vez que estabelece multa exclusivamente em desfavor das universidades privadas.

Vencidos, parcialmente, o ministro Alexandre de Moraes, que julgou formalmente inconstitucionais também os incisos II e III do art. 3º da citada lei, e o ministro Marco Aurélio, que concluiu pela inconstitucionalidade formal de toda a legislação.

O ministro Alexandre de Moraes vislumbrou clara intervenção estatal na autonomia universitária, da qual faz parte a estruturação interna da universidade. A participação nos conselhos fiscais e consultivos das instituições de ensino e o acesso à metodologia são possíveis dentro da discussão universitária não por imposição legislativa do estado à revelia da universidade. Para o ministro Marco Aurélio, o tema deve ter tratamento linear no País. A normatização paranaense, em geral, implica avanços, considerado o que previsto no art. 206 (4) da CF.

(1) CF: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;”
(2) CF: “Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I – cumprimento das normas gerais da educação nacional; II – autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público. (...) Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. § 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. (...)”
(3) Lei 9.394/1996: “Art. 16. O sistema federal de ensino compreende: I – as instituições de ensino mantidas pela União; II – as instituições de educação superior criadas e mantidas pela iniciativa privada; III – os órgãos federais de educação. Art. 17. Os sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal compreendem: I – as instituições de ensino mantidas, respectivamente, pelo Poder Público estadual e pelo Distrito Federal; II – as instituições de educação superior mantidas pelo Poder Público municipal; III – as instituições de ensino fundamental e médio criadas e mantidas pela iniciativa privada; IV – os órgãos de educação estaduais e do Distrito Federal, respectivamente. Parágrafo único. No Distrito Federal, as instituições de educação infantil, criadas e mantidas pela iniciativa privada, integram seu sistema de ensino. ”
(4) CF: “Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; IV – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; V – valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Constitucional 53, de 2006) VI – gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII – garantia de padrão de qualidade. VIII – piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal. Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. ”

Legislação Aplicável

CF, arts. 22, I; 206; 209; 211.
Lei 9.394/1996, art. 16.

Informações Gerais

Número do Processo

3757

Tribunal

STF

Data de Julgamento

17/10/2018

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