Este julgado integra o
Informativo STF nº 964
Comentário Damásio
Conteúdo Completo
O Plenário, por unanimidade, converteu o julgamento da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito e, em seguida, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 40 da Lei 13.155/2015 na parte em que altera o art. 10, §§ 1º, 3º e 5º, da Lei 10.671/2003 (1). Manteve a vigência e a eficácia de todos os demais dispositivos impugnados em face de sua compatibilidade com o texto constitucional (Informativo 937). O art. 40 da lei impugnada estabelece o atendimento a requisitos de natureza fiscal (apresentação de Certidão Negativa de Débitos) como critério técnico para a habilitação de entidade de prática desportiva, até mesmo com a possibilidade de rebaixamento de divisão às agremiações que não cumprirem tais requisitos não desportivos (fiscais e trabalhistas) – os quais não apresentam nenhuma relação com o desempenho esportivo da entidade. Para o colegiado, o referido dispositivo legal falece de proporcionalidade e razoabilidade. Isso porque essas previsões constituem formas de cobrança de tributos por intermédio de limitações arbitrárias, com a utilização de meios gravosos e indiretos de coerção estatal destinados a compelir o contribuinte inadimplente a pagar o tributo. Isso configura sanção política, o que afronta diversos entendimentos sumulados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) (2). Ademais, o Tribunal considerou que a imposição de decesso a categoria inferior da competição esportiva acarreta a verdadeira morte civil do clube, diante dos imediatos e drásticos efeitos sobre as receitas a serem por ele obtidas, como direitos de imagem, direito de arena e patrocínios. Há, em razão disso, uma grave desproporcionalidade na consequência prevista na lei para o comportamento do clube. Se eventual inadimplência do clube – que deve ser cobrada pelas vias normais – resultasse na sua automática exclusão do campeonato do ano seguinte, isso inviabilizaria a percepção de seus rendimentos e, consequentemente, o pagamento de suas dívidas. Também prejudicaria a União, que não receberia mais os valores relativos a refinanciamentos ou a atuais tributos; os atletas e funcionários da entidade esportiva, que não seriam mais pagos; e a própria ideia de fomentar o desporto. Quanto aos demais artigos impugnados, o Plenário concluiu que a lei previu tratamento favorável ao parcelamento e ao pagamento de débitos fiscais das entidades perante a União, e de obrigações relativas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Dessa forma, a exigência de contrapartidas por parte das entidades aderentes se afigura plenamente constitucional. A lei pretendeu, com isso, promover a melhoria do padrão de gestão do futebol profissional, mas sem interferência na autonomia das entidades assegurada pelo art. 217 da Constituição Federal (CF) (3). Ressaltou, por fim, que a adesão a esse regime de cooperação se deu de forma voluntária pelos clubes. Por ser uma adesão facultativa ao regime fiscal benéfico, não se poderia, portanto, admitir que aqueles que aderiram obtivessem o refinanciamento de suas dívidas sem se submeter às regras de contrapartida disciplinadoras de rigor financeiro e de gestão. Essas regras não constituem nenhuma intervenção externa, haja vista que são os dirigentes eleitos da própria entidade que continuam a administrar. Além do caráter voluntário da adesão, as exigências estabelecidas no Profut atenderam ao princípio da razoabilidade, porquanto respeitadas as necessárias proporcionalidade, justiça e adequação entre os dispositivos impugnados e as normas constitucionais protetivas da autonomia desportiva. O legislador visou à probidade e à transparência da gestão do desporto e, sobretudo, à recuperação e à manutenção dessas entidades desportivas, que, se tivessem prosseguido como estavam, não teriam conseguido manter suas atividades. Registrou que dos vinte clubes profissionais de elite do futebol brasileiro que aderiram ao programa dezenove possuem dívidas gigantescas. (1) Lei 13.155/2015: “Art. 40. A Lei n. 10.671, de 15 de maio de 2003, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 10. (...) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em razão de: I – colocação obtida em competição anterior; e II – cumprimento dos seguintes requisitos: a) regularidade fiscal, atestada por meio de apresentação de Certidão Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União – CND; b) apresentação de certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS; e c) comprovação de pagamento dos vencimentos acertados em contratos de trabalho e dos contratos de imagem dos atletas. (...) § 3º Em campeonatos ou torneios regulares com mais de uma divisão, serão observados o princípio do acesso e do descenso e as seguintes determinações, sem prejuízo da perda de pontos, na forma do regulamento: I – a entidade de prática desportiva que não cumprir todos os requisitos estabelecidos no inciso II do § 1º deste artigo participará da divisão imediatamente inferior à que se encontra classificada; II – a vaga desocupada pela entidade de prática desportiva rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo será ocupada por entidade de prática desportiva participante da divisão que receberá a entidade rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo, obedecida a ordem de classificação do campeonato do ano anterior e desde que cumpridos os requisitos exigidos no inciso II do § 1º deste artigo. (...) § 5º A comprovação da regularidade fiscal de que trata a alínea a do inciso II do § 1º deste artigo poderá ser feita mediante a apresentação de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União – CPEND.” (2) Enunciado 70 da Súmula do STF: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo. ”; Enunciado 323 da Súmula do STF: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. ”; Súmula 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.” (3) CF: “Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: I – a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II – a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento; III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não profissional; IV – a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional.”
Legislação Aplicável
CF: Art. 217 Lei 13.155/2015: Art. 40 Súmula 70/STF
Informações Gerais
Número do Processo
5450
Tribunal
STF
Data de Julgamento
18/12/2019