Supremo Tribunal Federal • 19 julgados • 19 de dez. de 2019
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O Plenário, por maioria, conheceu de conflito de competência firmado entre a justiça do trabalho e a justiça comum e declarou a competência da justiça comum para processar e julgar a causa. A demanda envolve servidor público municipal, admitido mediante concurso, sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O colegiado entendeu que o vínculo do servidor com a municipalidade tem natureza jurídico-administrativa. Trata-se, portanto, de servidor público estatutário, de modo que a justiça competente para processar e julgar a causa é a comum. Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator), Edson Fachin, Rosa Weber e Dias Toffoli, que consideraram competente a justiça do trabalho para julgar o pleito, uma vez que a relação jurídica é regida pela CLT.
O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento ao agravo regimental interposto contra decisão proferida nos autos de recurso extraordinário, paradigma de repercussão geral (Tema 1.016), mediante a qual foi deferido pedido de suspensão nacional dos processos que envolvam discussão sobre expurgos inflacionários dos planos econômicos em depósitos judiciais (Informativo 951). O Tribunal manteve a decisão anteriormente proferida que assentava que, reconhecida a repercussão geral, impende a suspensão do processamento dos feitos pendentes que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. Vencido o ministro Marco Aurélio, que deu provimento ao recurso. Para ele, o art. 1.035, § 5º, do Código de Processo Civil (CPC) (1) confere poder extremado a um julgador. Por essa razão, o dispositivo carece de razoabilidade, proporcionalidade, além de estar em conflito com a garantia constitucional do cidadão de livre acesso ao Judiciário. Nesse sentido, o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal (CF) revela que a lei não pode excluir do Judiciário lesão a direito ou ameaça de lesão a direito. Essa garantia encerra a tramitação do processo de forma regular numa marcha que visa ao seu desfecho final.
Lei municipal a versar a percepção, mensal e vitalícia, de “subsídio” por ex-vereador e a consequente pensão em caso de morte não é harmônica com a Constituição Federal de 1988. Lei municipal a versar a percepção, mensal e vitalícia, de “subsídio” por ex-vereador e a consequente pensão em caso de morte não é harmônica com a Constituição Federal de 1988. Essa é a tese do Tema 672 da Repercussão Geral fixada, por unanimidade, pelo Plenário ao negar provimento a recurso extraordinário, declarando a não recepção, pela Constituição Federal de 1988, da Lei 907/1984, do Município de Corumbá.
O Plenário, em conclusão de julgamento, resolveu questão de ordem para julgar prejudicado, por perda superveniente de objeto, pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade. A ação foi ajuizada contra decisão administrativa do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, tomada em 7.12.94, mas posteriormente revogada (Informativo 305). A decisão impugnada determinou o pagamento, a partir de abril de 1994, do reajuste de 10,94%, correspondente à diferença entre o resultado da conversão da URV em reais, com base no dia 20 de abril de 1994, e o obtido na operação de conversão com base no dia 30 do mesmo mês e ano, aos magistrados da Justiça do Trabalho, inclusive juízes classistas, bem como aos servidores ativos e inativos do Tribunal. O relator reajustou o voto.
O Plenário, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto de decisão denegatória de habeas corpus, impetrado contra ato do ministro Edson Fachin, relator da AC 4.388, que determinou a prisão preventiva do paciente (Informativo 951). O colegiado esclareceu ter sido aplicada a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido do não cabimento de habeas corpus com fundamento, por analogia, no Enunciado 606 da Súmula do STF (1). O ministro Dias Toffoli destacou existirem propostas de alteração do RISTF, no sentido de regulamentar o tema, uma vez que qualquer ato de ministro do STF é passível de revisão pelo colegiado, por meio de agravo. Entretanto, pode haver situações urgentes decorrentes de atos abusivos (o caso concreto não é uma delas), que podem implicar eventual impetração. Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que deram provimento ao agravo.
O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, conheceu de ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nela formulado, prejudicado o agravo regimental interposto da decisão que indeferiu o pleito de medida cautelar. A ação foi ajuizada em face do art. 3º da Lei Complementar (LC) 156/2010; do art. 1º, VI, do Decreto 39.921/2013; e do art. 2º, §§ 1º a 3º, da Portaria GAB-SDS 1.967/2010, todos do estado de Pernambuco (Informativo 932). O art. 3º da lei complementar redenominou o cargo de datiloscopista policial para perito papiloscopista, ainda no âmbito da polícia civil. Os demais dispositivos impugnados estabeleceram sínteses das atribuições e prerrogativas institucionais do cargo de perito papiloscopista e matérias relacionadas ao desempenho de suas atividades. Prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux (relator), que, de início, assentou a existência de competência concorrente para dispor sobre os peritos oficiais. Isso, porque o art. 24, XVI, da Constituição Federal (CF) dispõe competir à União, aos estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre organização, garantias, direitos e deveres dos policiais civis. Além disso, não verificou qualquer antinomia entre as normas locais e as normas federais de regência. Para o relator, a União exerceu sua competência legislativa ao aprovar a Lei 12.030/2009, que objetiva aprimorar a disciplina do tema e garantir que a perícia oficial esteja inserida num arranjo institucional adequado. Por ter caráter de norma nacional geral, aquela lei não esgotou as regras de organização da polícia civil. É o que se depreende de seu art. 5º, que expressamente ressalvou a necessidade de observância das disposições específicas da legislação de cada ente federado. A ressalva, que consta também do art. 3º, sequer seria necessária, porquanto decorre da autoadministração dos Estados-membros, consagrada no art. 25 da CF (1). Já a competência suplementar foi exercida pelo legislador estadual por meio da LC 156/2010 e das disposições infralegais questionadas. O ministro assinalou ainda que a Lei 12.020/2009 não foi exaustiva ao especificar peritos — criminais, médico-legistas e odontolegistas — e não vedou que se lhes equiparassem os cargos de datiloscopista ou papiloscopista. Informou que a expressão “perito criminal” alberga todos os peritos oficiais que possuem a incumbência estatal de elucidar crimes e que é possível aventar rol bem mais amplo de agentes que atuam como peritos oficiais, no qual se insere o auditor da Receita Federal, entre outros. A exclusão dos servidores públicos papiloscopistas desse rol resultaria no encaminhamento de suas conclusões a outro perito, muitas vezes sem a expertise necessária para referendar o trabalho. Salientou, no ponto, que não pode haver qualquer caráter de subordinação de um perito a outro. Afastou a alegação de usurpação de competência legislativa privativa da União em matéria processual. Não há falar em interferência das normas estaduais no direito processual penal, porque se trata de matéria relativa à organização administrativa da polícia civil que em nada altera a qualidade da prova pericial. Ademais, destacou que o Código de Processo Penal (CPP) não dispõe a respeito da profissão de papiloscopista, datiloscopista ou da perícia datiloscópica, tampouco limita ou relaciona quais servidores investidos de poder legal são considerados peritos oficiais. Além disso, se o próprio CPP admite a realização de perícia por duas pessoas idôneas, na falta de perito, com maior razão os peritos papiloscopistas e os datiloscopistas têm aptidão para exercer essas funções e integrar essa categoria. O ministro observou que, a partir da Lei 11.690/2008, o CPP passou a exigir nível superior também para o perito oficial, resguardando o exercício daqueles peritos que ingressaram antes da vigência dessa lei (art. 159). Quanto a esse aspecto, sequer há conflito com o CPP, pois a LC 137/2008 do estado de Pernambuco já exigia diploma de curso superior para os datiloscopistas policiais. Verificou inexistir burla à necessidade de concurso público, visto que os papiloscopistas são peritos oficiais que ingressaram nos quadros do cargo por meio de concurso público, ainda que, anteriormente, possuíssem outra nomenclatura. Não houve, portanto, provimento derivado de cargo público. O relator afastou a arguição de transposição gradativa dos cargos em face do requisito mínimo de investidura exigível para os peritos oficiais, que é ensino superior com formação específica. Consignou que a exigência de diploma de curso superior já existia na redação original do art. 11 c/c art. 7º, VIII, da LC pernambucana 137/2008. Como esses preceitos não foram objeto de impugnação, eventual declaração de nulidade dos dispositivos ora atacados restaria inócua para o fim de afastar o alegado provimento derivado de cargo público. Por coincidirem os requisitos de investidura, o aproveitamento dos ocupantes de cargos extintos em cargos recém-criados se condiciona apenas à similitude de suas atribuições. No caso, não restaram comprovadas as supostas alterações substanciais nas atribuições. De um lado, o art. 3º reserva aos papiloscopistas as mesmas atividades antes exercidas pelos datiloscopistas, limitando-se a alterar a denominação do cargo. De outro, o Decreto 39.921/2013 limita-se a descrever as atribuições conferidas a esses profissionais por disposições legais prévias. Em conclusão, o ministro Luiz Fux registrou que, independentemente da nomenclatura, os profissionais exercem atividade específica condizente com o cargo de perito oficial, dado que se dedicam a colher e analisar impressões deixadas pelas papilas dérmicas de quem haja tido contato com objetos importantes para a apuração de fatos de relevo criminal. O ministro Dias Toffoli acompanhou o relator por fundamento diverso e o ministro Alexandre de Moraes, com a ressalva de entender ser inviável, à luz do regramento previsto na Lei 12.030/2009, o enquadramento dos peritos papiloscopistas como peritos criminais. Vencida, parcialmente, a ministra Rosa Weber, que conheceu da ação apenas quanto à lei complementar pernambucana, e não no que atine aos atos secundários: decreto e portaria. Vencido o ministro Edson Fachin, que julgou parcialmente procedente o pedido e acolheu a pretensão de inconstitucionalidade material.
O Plenário, por unanimidade, converteu o julgamento da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito e, em seguida, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 40 da Lei 13.155/2015 na parte em que altera o art. 10, §§ 1º, 3º e 5º, da Lei 10.671/2003 (1). Manteve a vigência e a eficácia de todos os demais dispositivos impugnados em face de sua compatibilidade com o texto constitucional (Informativo 937). O art. 40 da lei impugnada estabelece o atendimento a requisitos de natureza fiscal (apresentação de Certidão Negativa de Débitos) como critério técnico para a habilitação de entidade de prática desportiva, até mesmo com a possibilidade de rebaixamento de divisão às agremiações que não cumprirem tais requisitos não desportivos (fiscais e trabalhistas) – os quais não apresentam nenhuma relação com o desempenho esportivo da entidade. Para o colegiado, o referido dispositivo legal falece de proporcionalidade e razoabilidade. Isso porque essas previsões constituem formas de cobrança de tributos por intermédio de limitações arbitrárias, com a utilização de meios gravosos e indiretos de coerção estatal destinados a compelir o contribuinte inadimplente a pagar o tributo. Isso configura sanção política, o que afronta diversos entendimentos sumulados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) (2). Ademais, o Tribunal considerou que a imposição de decesso a categoria inferior da competição esportiva acarreta a verdadeira morte civil do clube, diante dos imediatos e drásticos efeitos sobre as receitas a serem por ele obtidas, como direitos de imagem, direito de arena e patrocínios. Há, em razão disso, uma grave desproporcionalidade na consequência prevista na lei para o comportamento do clube. Se eventual inadimplência do clube – que deve ser cobrada pelas vias normais – resultasse na sua automática exclusão do campeonato do ano seguinte, isso inviabilizaria a percepção de seus rendimentos e, consequentemente, o pagamento de suas dívidas. Também prejudicaria a União, que não receberia mais os valores relativos a refinanciamentos ou a atuais tributos; os atletas e funcionários da entidade esportiva, que não seriam mais pagos; e a própria ideia de fomentar o desporto. Quanto aos demais artigos impugnados, o Plenário concluiu que a lei previu tratamento favorável ao parcelamento e ao pagamento de débitos fiscais das entidades perante a União, e de obrigações relativas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Dessa forma, a exigência de contrapartidas por parte das entidades aderentes se afigura plenamente constitucional. A lei pretendeu, com isso, promover a melhoria do padrão de gestão do futebol profissional, mas sem interferência na autonomia das entidades assegurada pelo art. 217 da Constituição Federal (CF) (3). Ressaltou, por fim, que a adesão a esse regime de cooperação se deu de forma voluntária pelos clubes. Por ser uma adesão facultativa ao regime fiscal benéfico, não se poderia, portanto, admitir que aqueles que aderiram obtivessem o refinanciamento de suas dívidas sem se submeter às regras de contrapartida disciplinadoras de rigor financeiro e de gestão. Essas regras não constituem nenhuma intervenção externa, haja vista que são os dirigentes eleitos da própria entidade que continuam a administrar. Além do caráter voluntário da adesão, as exigências estabelecidas no Profut atenderam ao princípio da razoabilidade, porquanto respeitadas as necessárias proporcionalidade, justiça e adequação entre os dispositivos impugnados e as normas constitucionais protetivas da autonomia desportiva. O legislador visou à probidade e à transparência da gestão do desporto e, sobretudo, à recuperação e à manutenção dessas entidades desportivas, que, se tivessem prosseguido como estavam, não teriam conseguido manter suas atividades. Registrou que dos vinte clubes profissionais de elite do futebol brasileiro que aderiram ao programa dezenove possuem dívidas gigantescas. (1) Lei 13.155/2015: “Art. 40. A Lei n. 10.671, de 15 de maio de 2003, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 10. (...) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em razão de: I – colocação obtida em competição anterior; e II – cumprimento dos seguintes requisitos: a) regularidade fiscal, atestada por meio de apresentação de Certidão Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União – CND; b) apresentação de certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS; e c) comprovação de pagamento dos vencimentos acertados em contratos de trabalho e dos contratos de imagem dos atletas. (...) § 3º Em campeonatos ou torneios regulares com mais de uma divisão, serão observados o princípio do acesso e do descenso e as seguintes determinações, sem prejuízo da perda de pontos, na forma do regulamento: I – a entidade de prática desportiva que não cumprir todos os requisitos estabelecidos no inciso II do § 1º deste artigo participará da divisão imediatamente inferior à que se encontra classificada; II – a vaga desocupada pela entidade de prática desportiva rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo será ocupada por entidade de prática desportiva participante da divisão que receberá a entidade rebaixada nos termos do inciso I deste parágrafo, obedecida a ordem de classificação do campeonato do ano anterior e desde que cumpridos os requisitos exigidos no inciso II do § 1º deste artigo. (...) § 5º A comprovação da regularidade fiscal de que trata a alínea a do inciso II do § 1º deste artigo poderá ser feita mediante a apresentação de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União – CPEND.” (2) Enunciado 70 da Súmula do STF: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo. ”; Enunciado 323 da Súmula do STF: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. ”; Súmula 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.” (3) CF: “Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: I – a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II – a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento; III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não profissional; IV – a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional.”
O Plenário, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto de decisão monocrática que entendeu ser procedente pedido formulado em ação cível originária, para reconhecer o direito de Estado-membro a recalcular o valor mínimo nacional por aluno nos anos de 1998 a 2003, para fins de complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) (Informativo 947). Ao rejeitar o argumento de ofensa ao princípio da colegialidade, sublinhou que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a infraconstitucionalidade da matéria em debate ao apreciar o RE 636.978 RG (Tema 422), sob a sistemática da repercussão geral. Esse entendimento cumulado com a análise do assunto realizada sob o regime de recursos repetitivos (REsp 1.101.015), decorrente da competência jurisdicional de uniformização da legislação federal do Superior Tribunal de Justiça (STJ), são elementos, por si sós, capazes de ensejar a atuação monocrática sujeita à revisão do colegiado mediante agravo interno e embargos de declaração. Ademais, o STF, ao examinar em conjunto as ACOs 648, 660, 669 e 700, estabeleceu diretriz jurisprudencial convergente com a da decisão impugnada. Na ocasião, foram firmadas as seguintes orientações: a) o valor da complementação da União ao Fundef deve ser calculado com base no valor mínimo nacional por aluno extraído da média nacional; e b) a complementação ao Fundef realizada a partir do valor mínimo anual por aluno fixada em desacordo com a média nacional impõe à União o dever de suplementação de recursos, mantida a vinculação constitucional a ações de desenvolvimento e manutenção do ensino. Naquela oportunidade, a Corte ainda delegou aos ministros relatores a faculdade de decidirem monocraticamente as demais ações cíveis originárias que tratem da mesma matéria. O Plenário também aduziu que a jurisprudência do STF propiciou assinalar a ilegalidade do Decreto 2.264/1997, na medida em que extravasou da delegação legal oriunda do § 1º do art. 6º da Lei 9.424/1996 (1) e das margens de discricionariedade conferidas à Presidência da República, para fixar, em termos nacionais, o valor mínimo por aluno. Superado o entendimento de que a controvérsia é infraconstitucional, indicou a possibilidade de aplicar-se o federalismo de cooperação do inciso III do art. 3º da Constituição Federal (CF) (2) e que veio vertido no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), nomeadamente no § 4º (3), incluído pela Emenda Constitucional (EC) 14/1996, ao cuidar da fixação de valor mínimo. Dessa forma, nenhum aluno do ensino fundamental valerá mais ou menos dependendo de onde estiver no país. Noutro passo, explicitou que o Tema 416 da repercussão geral (RE 635.347) versa sobre a forma de pagamento de débito originado de erro no cálculo das verbas a serem repassadas pela União a título de complementação ao Fundef. Esclareceu que, entretanto, o relator daquele feito não determinou a suspensão nacional dos processos correlatos ao assunto, como autoriza o art. 1.035, § 5º, do Código de Processo Civil (CPC). Vencidos os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, que deram provimento ao agravo e julgaram improcedente o pedido formulado na ação cível originária; e o ministro Marco Aurélio, que deu provimento ao agravo para determinar o prosseguimento da ação.
O Plenário, em conclusão e por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração para, sanar os vícios identificados e, dessa forma, assentar a constitucionalidade do art. 55, II, da Lei 8.212/1991, na redação original e nas redações que lhe foram dadas pelo art. 5º da Lei 9.429/1996 e pelo art. 3º da Medida Provisória 2.187-13/2001. Além disso, a fim de evitar ambiguidades, o Tribunal conferiu à tese relativa ao Tema 32 da repercussão geral a seguinte formulação: “A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF (1), especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas” (Informativos 749, 844, 855, 914 e 938). No caso, a embargante apontou obscuridade no acordão embargado e excessiva abrangência da tese de repercussão geral no sentido de considerar que os requisitos para o gozo de imunidade tributária devem estar previstos em lei complementar. Para ela, a tese de repercussão geral deveria se restringir ao referido artigo declarado inconstitucional. Alegou, ainda, que o acordão e a tese fixada estavam em conflito com o que foi decidido nas ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621, convertidas em arguições de descumprimento de preceito fundamental, julgadas simultaneamente e em conjunto. O colegiado ressaltou que, no julgamento em conjunto das quatro ações, de um lado, e do recurso extraordinário, de outro, foram assentadas, a partir das mesmas manifestações, teses jurídicas contraditórias. Explicou que, nos acórdãos das ações objetivas, ficou consignado que aspectos meramente procedimentais referentes à certificação, à fiscalização e ao controle administrativo são passíveis de definição em lei ordinária, mas que é necessária a lei complementar para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social previstas no art. 195, § 7º, da Constituição Federal (CF), principalmente no que diz respeito à instituição de contrapartidas a que elas devem atender. Ocorre que, a partir das mesmas manifestações dos integrantes do colegiado, na mesma sessão de julgamento, restou estampada, no acórdão do recurso extraordinário, a tese sugestiva de que toda e qualquer normatização relativa às entidades beneficentes de assistência social, até mesmo sobre aspectos meramente procedimentais, há de ser veiculada mediante lei complementar. Dessa forma, ainda que sejam convergentes os resultados processuais imediatos – o provimento do recurso extraordinário e a declaração de inconstitucionalidade dos preceitos impugnados nas ações objetivas –, há efetivamente duas teses jurídicas de fundo concorrendo entre si. Não obstante ambas as teses conduzirem ao mesmo resultado processual nos casos sob exame, é de fundamental importância a definição do entendimento do colegiado sobre a seguinte questão: se há ou não espaço de conformação para a lei ordinária no tocante a aspectos procedimentais. Da leitura dos votos proferidos no julgamento embargado, é possível concluir que a maioria do colegiado reconhece a necessidade de lei complementar para a caracterização das imunidades propriamente ditas, admitindo, contudo, que questões procedimentais sejam regradas mediante legislação ordinária. Na condição de limitações constitucionais ao poder de tributar, as imunidades tributárias consagradas na CF asseguram direitos que se incorporam ao patrimônio jurídico-constitucional dos contribuintes. Assim, o emprego da expressão “são isentas”, no art. 195, § 7º, da CF, não tem o condão de descaracterizar a natureza imunizante da desoneração tributária nele consagrada. Não há dúvida, portanto, sobre a convicção de que a delimitação do campo semântico abarcado pelo conceito constitucional de “entidades beneficentes de assistência social”, por inerente ao campo das imunidades tributárias, sujeita-se à regra de reserva de lei complementar, consoante disposto no art. 146, II, da CF (2). O Tribunal sublinhou, também, ser preciso definir a norma incidente à espécie, à luz do enquadramento constitucional: se o art. 14 do Código Tributário Nacional (CTN) ou o art. 55 da Lei 8.212/1991. Pontuou que, tal como redigida, a tese original de repercussão geral aprovada nos autos do RE 566.622 sugeria a inexistência de qualquer espaço normativo que pudesse ser integrado por legislação ordinária, o que não se extraiu do cômputo dos votos proferidos. Por essa razão, foi apresentada nova formulação que melhor espelha o quanto decidido pelo Plenário e vai ao encontro de recente decisão da Corte (ADI 1.802), em que se reafirmou a jurisprudência no sentido de reconhecer legítima a atuação do legislador ordinário no trato de questões procedimentais desde que não interfira na própria caracterização da imunidade. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que rejeitou os embargos de declaração. Entendeu que não há qualquer vício inerente ao acordão impugnado. Afastou a apontada abrangência da tese fixada, a qual, segundo o relator, decorreu da linha argumentativa geral do voto condutor do acórdão quanto à impossibilidade de lei ordinária prever requisitos para o gozo da imunidade tributária. Ressaltou que inexiste qualquer descompasso e que é imprópria a alegação de ser a tese mais extensiva do que o entendimento adotado sob o ângulo da repercussão geral. Ademais, o colegiado reconheceu a suficiência do Código Tributário Nacional (CTN) para estabelecer os critérios para a concessão de imunidade tributária às entidades beneficentes de assistência social. Quanto à suposta contradição entre o que decidido no recurso extraordinário e a orientação firmada nas ações diretas apreciadas em conjunto, concluiu que descabe suscitar, mediante embargos, vícios externos ao ato impugnado. A mácula passível de saneamento deve ser interna, não alcançando inconformismos alusivos ao resultado do julgamento.
O Plenário, por maioria, resolveu questão de ordem suscitada pelo ministro Dias Toffoli (Presidente) e fixou o quórum de maioria absoluta dos membros da Corte para modular os efeitos de decisão em julgamento de recursos extraordinários repetitivos, com repercussão geral, nos quais não tenha havido declaração de inconstitucionalidade de ato normativo. Vencido, o ministro Marco Aurélio, que divergiu da formulação e do mérito da questão. Entendeu não ser possível a mesclagem de julgamento da sessão virtual com a presencial. Além disso, não admitiu a reabertura de julgamento concluído. Em seguida, o ministro Dias Toffoli proclamou o resultado do julgamento dos embargos de declaração, ocorrido na sessão virtual de 11.10.2019 a 17.10.2019: “O Tribunal, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para reconhecer indevida a cessação imediata do pagamento dos quintos quando fundado em decisão judicial transitada em julgado, vencida a Ministra Rosa Weber, que rejeitava os embargos. No ponto relativo ao recebimento dos quintos em virtude de decisões administrativas, o Tribunal, em razão de voto médio, rejeitou os embargos e, reconhecendo a ilegitimidade do pagamento dos quintos, modulou os efeitos da decisão de modo que aqueles que continuam recebendo até a presente data em razão de decisão administrativa tenham o pagamento mantido até sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores. Os Ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello proviam os embargos de declaração e modulavam os efeitos da decisão em maior extensão. Ficaram vencidos, nesse ponto, os Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber. Por fim, o Tribunal, por maioria, também modulou os efeitos da decisão de mérito do recurso, de modo a garantir que aqueles que continuam recebendo os quintos até a presente data por força de decisão judicial sem trânsito em julgado tenham o pagamento mantido até sua absorção integral por quaisquer reajustes futuros concedidos aos servidores, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber. Tudo nos termos do voto do Relator. Afirmaram suspeição os Ministros Luiz Fux e Roberto Barroso”.
O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 (1). Com essa orientação, o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus e revogou a liminar anteriormente concedida (Informativo 963). Na situação dos autos, sócios e administradores de uma empresa declararam operações de venda ao Fisco, mas deixaram de recolher o ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação) relativamente a diversos períodos. Por três vezes, a empresa aderiu a programas de parcelamentos da Fazenda estadual, mas não adimpliu as parcelas. Os ora recorrentes foram denunciados pela prática do delito previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Na primeira instância, o juízo os absolveu sumariamente por considerar a conduta atípica. Em sede de apelação, o tribunal de justiça local afastou a tese da atipicidade e determinou o regular prosseguimento do processo. Ato contínuo, a defesa impetrou habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) (HC 399.109). Naquela Corte, a Terceira Seção, por maioria, asseverou ser inviável a absolvição sumária, notadamente quando a denúncia descreve fato que contém a necessária adequação típica e não há excludentes de ilicitude. Salientou que eventual dúvida quanto ao dolo de se apropriar deverá ser esclarecida com a instrução criminal. Daí a interposição do presente recurso ordinário, no qual se requeria a declaração da ilegalidade do acórdão do tribunal de justiça, com o objetivo de restabelecer a sentença que os absolvia sumariamente. Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso (relator), que estabeleceu três premissas, reputadas importantes no equacionamento da matéria: (i) o Direito Penal deve ser sério, igualitário e moderado; (ii) o pagamento de tributos é dever fundamental de todo cidadão, na medida em que ocorra o fato gerador e ele exiba capacidade contributiva; e (iii) o mero inadimplemento tributário não deve ser tido como fato típico criminal, para que seja reconhecida a tipicidade de determinada conduta impende haver um nível de reprovabilidade especial que justifique o tratamento mais gravoso. Explicitou que o sujeito ativo do crime é o sujeito passivo da obrigação, que, na hipótese do ICMS próprio, é o comerciante. O objeto do delito é o valor do tributo. No caso, a quantia transferida pelo consumidor ao comerciante. A utilização dos termos “descontado” e “cobrado” é o ponto central do dispositivo em apreço. Tributo descontado, não há dúvidas, refere-se aos tributos diretos. Já a expressão “cobrado” abarca o contribuinte nos tributos indiretos. Portanto, “cobrado” significa o tributo que é acrescido ao preço da mercadoria, pago pelo consumidor — contribuinte de fato — ao comerciante, que deve recolhê-lo ao Fisco. O consumidor paga mais caro para que o comerciante recolha o tributo à Fazenda estadual. O ministro salientou que o valor do ICMS cobrado em cada operação não integra o patrimônio do comerciante, que é depositário desse ingresso de caixa. Entendimento coerente com o decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 574.706 (Tema 69 da repercussão geral), oportunidade na qual assentado que o ICMS não integra o patrimônio do sujeito passivo e, consequentemente, não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins. Dessa maneira, a conduta não equivale a mero inadimplemento tributário, e sim à apropriação indébita tributária. A censurabilidade está em tomar para si valor que não lhe pertence. Para caracterizar o tipo penal, a conduta é composta da cobrança do consumidor e do não recolhimento ao Fisco. Segundo o relator, além da interpretação textual do preceito, a interpretação histórica também conduz à tipicidade da conduta. Na redação apresentada em substitutivo ao projeto de lei original, tratava-se, em incisos separados, a hipótese de retenção e não recolhimento e a hipótese de cobrança no preço e não recolhimento. No texto final aprovado, o dispositivo foi compactado sem a modificação do sentido da norma. Fundiu os dois incisos em um só e dispôs os termos “descontado”, para o tributo retido na fonte, e “cobrado”, para o incluído no preço. De igual modo, a análise do direito comparado reforça essa compreensão. Em outras partes do mundo, os delitos tributários inclusive são punidos de forma mais severa. O relator lembrou que a Primeira Turma do STF concedeu pedido de extradição fundado em tipo penal análogo (Ext 1.139) e que o STF já reconheceu a constitucionalidade do tipo penal em debate (ARE 999.425, Tema 937 da repercussão geral). Ao versar sobre a interpretação teleológica, o ministro Roberto Barroso observou que são financiados, com a arrecadação de tributos, direitos fundamentais, serviços públicos, consecução de objetivos da República. No País, o ICMS é o tributo mais sonegado e a principal fonte de receita própria dos Estados-membros da Federação. Logo, é inequívoco o impacto da falta de recolhimento intencional e reiterado do ICMS sobre o Erário. Considerar crime a apropriação indébita tributária produz impacto relevante sobre a arrecadação. Também a livre iniciativa é afetada por essa conduta. Empresas que sistematicamente deixam de recolher o ICMS colocam-se em situação de vantagem competitiva em relação as que se comportam corretamente. No mercado de combustíveis, por exemplo, são capazes de alijar os concorrentes que cumprem suas obrigações. O relator esclareceu que a oscilação da jurisprudência do STJ, ao afirmar a atipicidade da conduta adversada, fez com que diversos contribuintes passassem a declarar os valores devidos, sem recolhê-los. Houve uma “migração” do crime de sonegação para o de apropriação indébita e não é isso que o direito deseja estimular. No tocante às consequências do reconhecimento da tipicidade sobre os níveis de encarceramento no País, aduziu que é virtualmente impossível alguém ser efetivamente preso pelo delito de apropriação indébita tributária. A pena cominada é baixa, portanto, são cabíveis transação penal, suspensão condicional do processo e, em caso de condenação, substituição da pena privativa de liberdade por medidas restritivas de direito. Além disso, é possível a extinção da punibilidade se o sonegador ou quem tenha se apropriado indevidamente do tributo quitar o que devido. Assentada a possibilidade do delito em tese, o ministro assinalou que o crime de apropriação indébita tributária não comporta a modalidade culposa. É imprescindível a demonstração do dolo e não será todo devedor de ICMS que cometerá o delito. O inadimplente eventual distingue-se do devedor contumaz. O devedor contumaz faz da inadimplência tributária seu modus operandi. Por fim, consignou que o dolo da apropriação deve ser apurado na instrução criminal, pelo juiz natural da causa, a partir de circunstâncias objetivas e factuais, tais como a inadimplência reiterada, a venda de produtos abaixo do preço de custo, a criação de obstáculos à fiscalização, a utilização de “laranjas”, a falta de tentativa de regularização de situação fiscal, o encerramento irregular de atividades com aberturas de outras empresas. A ministra Rosa Weber acrescentou que a conduta eleita pelo legislador penal não exige, para sua perfectibilização, o emprego de fraude ou simulação pelo contribuinte, nem qualquer omissão. Vencidos os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que deram provimento ao recurso, por considerarem a conduta atípica. Compreenderam estar-se diante de imputação criminal pelo mero inadimplemento de dívida fiscal. O ministro Gilmar Mendes salientou que uma interpretação constitucional do dispositivo deve levar em conta o animus de fraude do agente, sob pena de fomentar-se uma política criminal arrecadatória. Ademais, inexiste apropriação de tributo devido por terceiro, pois o tributo é devido pela própria empresa.
A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça; revogou a medida cautelar anteriormente deferida e concedeu a ordem, de ofício, para que o tribunal de origem verifique os requisitos do art. 319 do Código de Processo Penal (CPP) (1). Na situação dos autos, o tribunal a quo ordenou a execução provisória da pena imposta ao ora paciente. A Turma determinou que seja analisado se é caso de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão (CPP, art. 319), haja vista o paciente ter sido condenado em regime semiaberto. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para que o paciente aguardasse, em liberdade, o trânsito em julgado do título condenatório.
A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça e revogou a medida cautelar anteriormente deferida. Na situação dos autos, o tribunal a quo determinou o início imediato do cumprimento da pena imposta ao ora paciente, pois, à época, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendia ser possível a execução provisória. Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que ponderou não ser hipótese de concessão da ordem de ofício. Isso, porque o paciente foi julgado pelo tribunal do júri e, no exame do recurso, mantida a condenação por homicídio qualificado. O ministro observou que a questão específica do júri será apreciada pelo STF em repercussão geral. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para afastar a execução provisória do título condenatório.
A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento a reclamação em que se requereu a decretação de nulidade de julgamento do tribunal do júri por inobservância da Súmula Vinculante 11 do Supremo Tribunal Federal (STF) (1) (Informativo 954). No caso, durante julgamento em plenário, a juíza de direito presidente do tribunal do júri indeferiu o pleito da defesa de retirada das algemas do reclamante. Determinou que, excepcionalmente, fosse o acusado mantido algemado, na forma do que autoriza o referido verbete sumular, tendo em conta ofício exibido pela escolta do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), o qual justificaria o uso de algemas. O juízo de origem considerou, ainda, que os policiais federais responsáveis pela escolta, quando consultados, afirmaram não poder opinar favoravelmente à retirada das algemas sem ferir o procedimento recomendado pelo órgão a que pertencem, em relação ao réu custodiado em presídio federal de segurança máxima. O tribunal de justiça local, em sede de apelação, afastou a apontada nulidade. Citou o envolvimento do réu com milícias, bem como seus maus antecedentes e acautelamento em presídio de segurança máxima. O colegiado entendeu que a juíza de primeiro grau justificou devidamente a manutenção do uso das algemas e que todas as circunstâncias fáticas exigiriam que o acusado estivesse algemado. Destacou que o réu integra milícia, possui extensa folha de antecedentes criminais e foi transferido para presídio de segurança máxima, em virtude da sua alta periculosidade, além da possibilidade de sua fuga ou de seu resgate. O ministro Roberto Barroso ressaltou, sobretudo, o que consignado pelo tribunal de justiça ao decidir a matéria. Para ele, não se pode desconsiderar o que está nos autos do processo e na decisão do juízo a quo. Salientou que a questão da periculosidade, ou não, do réu, é assunto de polícia e não de juiz. Se a polícia informa que o réu é perigoso, o juiz, que, normalmente, entra em contato com o réu pela primeira vez, tem de confiar na presunção de legitimidade da informação passada pela autoridade policial. Fora dos casos de abuso patente, é preciso dar credibilidade àquele que tem o encargo de zelar pela segurança pública, inclusive no âmbito do tribunal. Vencido o ministro Marco Aurélio, que proveu o agravo. (1) Súmula Vinculante 11 do STF: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.”
A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça; revogou a medida cautelar anteriormente deferida e concedeu a ordem, de ofício, para que o tribunal de origem verifique os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal (CPP) (1). Na situação dos autos, o tribunal a quo determinou o início imediato do cumprimento das penas impostas ao ora paciente, pois, à época, o Supremo Tribunal Federal entendia ser possível a execução provisória. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para afastar a execução provisória dos títulos condenatórios.
A Primeira Turma, por maioria, negou provimento a agravo regimental em reclamação em que discutida suposta afronta à Súmula Vinculante 14 do Supremo Tribunal Federal (STF) (1), em virtude de a defesa do interessado não haver obtido acesso amplo e irrestrito aos elementos de prova já documentados em inquérito policial, instaurado para apurar a prática de crime de lavagem de dinheiro por diversos agentes. No caso, a decisão agravada se baseou nas seguintes premissas: a) a investigação ocorre em segredo de justiça; e b) o Relatório de Inteligência Financeira do Coaf (ao qual se pretende acesso integral) menciona outros investigados, além do interessado. Desse modo, foi deferido o pedido do reclamante quanto à extração de cópias do inquérito, com exceção de eventuais peças protegidas pelo segredo de justiça, especialmente o relatório do Coaf, no que diz respeito a dados de terceiros. A Turma ressaltou que o direito à privacidade e à intimidade é assegurado constitucionalmente, e que é excessivo o acesso de um dos investigados a informações, de caráter privado de diversas pessoas, que não dizem respeito ao direito de defesa dele, sob pretexto de obediência à Súmula Vinculante 14. Vencido o ministro Marco Aurélio, que proveu o agravo. Entendeu que o relatório do Coaf é um documento único, e o reclamante está envolvido no episódio contido nesse documento. A Súmula Vinculante 14 não faz distinção quanto aos documentos passíveis de acesso pela parte interessada, exigindo apenas que estejam encartados nos autos. (1) Sumula Vinculante 14 do STF: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.”
A Primeira Turma, por maioria, não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça e revogou a medida cautelar anteriormente deferida. Na situação dos autos, o tribunal a quo determinou a execução provisória da pena de 22 anos de reclusão, cominada ao ora paciente. O colegiado observou que o juiz de piso decretou a prisão preventiva do acusado e, depois, vedou-lhe o direito de recorrer em liberdade. Além disso, o tribunal de origem, apesar de ordenar a execução provisória, repetiu a necessidade de garantia da ordem pública. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que admitiu a impetração e deferiu a ordem para afastar a execução provisória do título condenatório.
A Primeira Turma indeferiu habeas corpus em que se buscava, dentre outras providências, o reconhecimento da nulidade de todos os atos judiciais decorrentes de investigações conduzidas pela Polícia Federal relativas a supostas infrações atribuídas ao paciente. A defesa afirmava não configurada hipótese de atribuição da autoridade da Polícia Federal que conduziu os inquéritos. Para tanto, reportou-se à Lei 10.446/2002, que versa sobre a atuação desse órgão na repressão de crimes com repercussão interestadual ou internacional. Diziam configurado abuso na atuação da referida autoridade e aludiam ao posterior afastamento do delegado federal responsável pelas investigações. O colegiado observou que o procedimento foi inicialmente instaurado pela Polícia Federal e decorreu de requisição do Parquet correspondente, sendo destinado a investigar suposta prática de crimes, em tese, afetos à competência da Justiça Federal. O declínio da competência para a Justiça estadual, ante indícios da prática de delitos a ela sujeitos, a resultar na definição do juízo criminal de determinada comarca, revela ter-se observado o figurino legal. O inquérito policial constitui procedimento administrativo, de caráter meramente informativo e não obrigatório à regular instauração do processo-crime. Visa subsidiar eventual denúncia a ser apresentada, razão pela qual irregularidades ocorridas não implicam, de regra, nulidade de processo-crime. Uma vez supervisionados pelo juízo competente e por membro do Ministério Público revestido de atribuição, pouco importa que os procedimentos investigatórios atinentes à operação desencadeada tenham sido presididos por autoridade de Polícia Federal. O art. 5º, LIII, da Constituição da República, ao dispor que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, contempla o princípio do juiz natural, não se estende às autoridades policiais, porquanto não investidas de competência para julgar. Surge inadequado pretender-se a anulação de provas ou de processos em tramitação com base na ausência de atribuição da Polícia Federal para conduzir os inquéritos. A desconformidade da atuação da Polícia Federal com as disposições da Lei 10.446/2002 e eventuais abusos cometidos por autoridade policial podem implicar responsabilidade no âmbito administrativo ou criminal dos agentes. No caso, por não apresentarem qualquer repercussão no tocante à validade jurídica das provas obtidas, não se mostram passíveis de caracterizar nulidade.
A realização de acordo de transação penal não enseja a perda de objeto de habeas corpus anteriormente impetrado. A realização de acordo de transação penal não enseja a perda de objeto de habeas corpus anteriormente impetrado. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma concedeu a ordem de habeas corpus para determinar que o tribunal de justiça analise o mérito da impetração lá formulada. No caso, de acordo com a inicial acusatória, o paciente foi denunciado pela prática de lesão corporal culposa, com pedido de reparação de danos, por ter agido de forma negligente e descumprido as regras técnicas de sua profissão. Após o recebimento da denúncia, o Ministério Público ofereceu transação penal, medida aceita pelo paciente. A defesa, no entanto, já havia impetrado habeas corpus no tribunal, apontando a inépcia da denúncia e a ausência de justa causa para a ação penal. Todavia, em razão da celebração do referido acordo, o habeas corpus foi julgado prejudicado. No presente writ, a defesa alega que o habeas corpus impetrado na origem deveria ter sido conhecido, pois remanesce o interesse na apreciação das teses de inépcia da denúncia e de ausência de justa causa, mesmo tendo sido celebrado o acordo de transação penal. A Turma afirmou que, em razão dos riscos e problemas inerentes ao sistema negocial, o controle realizado pelo julgador deve também abranger certa verificação sobre a legitimidade da persecução penal, visto que o Estado não pode autorizar a imposição de uma pena em situações ilegítimas, como, por exemplo, em quadros de manifesta atipicidade da conduta ou extinção da punibilidade do imputado. Assim, não se pode permitir que o aceite à transação penal inviabilize o questionamento judicial à persecução penal. Ou seja, não se pode aceitar que um habeas corpus, que, entre outros requerimentos, aponta a atipicidade da conduta, seja declarado prejudicado em razão do aceite à barganha penal. Ainda que os acordos penais pressuponham, corretamente, a voluntariedade do réu, ou seja, a sua vontade não coagida no sentido de aceitar a imposição da pena proposta, há relevantes críticas ao sistema de justiça negocial, em razão de possíveis abusos que viciam a voluntariedade do réu e podem ocasionar, inclusive, o aceite ao acordo por pessoas inocentes. Assinalou que se potencializa o risco de um cenário de pressões e coerções, que pode ocasionar a fragilização da voluntariedade, o que, muitas vezes, não é devidamente analisado pelo Judiciário, se ausente um mecanismo de devido controle do acordo. Embora o sistema penal negocial possa acarretar aprimoramentos positivos em certas hipóteses, a barganha no processo penal inevitavelmente gera riscos consideráveis aos direitos fundamentais do imputado e deve ser estruturada de modo limitado, para evitar a imposição de penas pelo Estado de forma ilegítima. Nesse sentido, o controle judicial sobre o acordo é medida fundamental para a proteção efetiva de direitos fundamentais, de modo a se autorizar o exercício do poder punitivo estatal somente em casos legítimos para tanto. Deve-se, então, assentar a abrangência e os critérios para tal juízo de homologação da barganha penal. Ainda que o réu se conforme com a acusação e aceite a imposição da pena com o benefício proposto, não se pode aceitar que o poder punitivo estatal seja exercido sem o devido controle judicial. Por isso, em todos os casos, tanto em colaboração premiada como em transação penal ou suspensão condicional do processo há a submissão para homologação judicial. O controle judicial não pode ser meramente formal e mecânico, ao passo que a imposição de uma pena pelo Estado, ainda que consentida pelo imputado, deve ocorrer de modo legítimo e em conformidade com os direitos fundamentais previstos constitucional e convencionalmente. Por óbvio, tal análise se dará de modo compatível com o momento em que ocorre e os limites cognitivos da fase preliminar da persecução penal. Ou seja, não se espera que o julgador busque fundamentar sua decisão em provas além de qualquer dúvida razoável, o que seria necessário para uma sentença condenatória ao final do processo regular. Contudo, na homologação do acordo penal, como a transação penal, o julgador precisa realizar controle sobre a legitimidade da persecução penal, de modo que casos de manifesta atipicidade da conduta narrada, extinção da punibilidade do imputado ou evidente inviabilidade da denúncia por ausência de justa causa acarretem a não homologação da proposta. Pela própria lógica da legislação atual, a transação penal somente pode ser oferecida se não for caso de arquivamento, ou seja, se houver potencial oferecimento de denúncia apta a ensejar o início do processo penal. Não se pode admitir que a transação penal possa impor obrigações a imputado que nem poderia ser submetido à persecução penal por ausência de justa causa ou atipicidade da conduta, por exemplo. A celebração do acordo, por si só, não afasta o interesse do imputado no habeas corpus. Primeiramente, o descumprimento das cláusulas da transação penal permite o prosseguimento do processo. Além disso, a transação penal somente pode ser oferecida uma vez a cada cinco anos, de maneira a demonstrar interesse do paciente em sua desconstituição, por meio de eventual concessão da ordem para o trancamento do processo. Por fim, inexiste qualquer disposição legal que imponha a desistência a recursos ou ações em andamento, tampouco determine a renúncia ao direito de acesso à Justiça. A Turma registrou que, conquanto a Lei 9.099/1995 determine seja a transação ofertada antes da denúncia, o que, em tese, significaria ausência de ação, neste caso concreto, a denúncia havia sido oferecida e recebida pelo Juízo de origem, de modo a ensejar pretensão legítima a buscar o trancamento do processo, ainda que se tenha anulado o ato precursor do processo. Concluiu que, ainda que o cenário fosse diverso, o habeas corpus é meio legítimo para impugnar a imposição de pena pelo Estado, em casos de manifesta ilegalidade. O ato de homologação do acordo é momento em que o juiz de primeiro grau deve realizar o controle sobre a sua legalidade e a legitimidade da potencial persecução penal. Portanto, tal ato igualmente pode ser objeto de habeas corpus para o controle por tribunal superior. O ministro Edson Fachin concedeu a ordem por outro fundamento. Pontuou que o habeas corpus anteriormente impetrado não pode ser implicitamente afetado por uma transação penal sem cláusula geral de renúncia.