Prevalência da regra definitiva mais favorável no cálculo do salário de benefício
A Lei n. 9.876/1999 adotou nova regra de cálculo dos benefícios previdenciários, ampliando gradualmente a base de cálculo dos benefícios, que passou a corresponder aos maiores salários de contribuição relativos a 80% de todo o período contributivo do segurado, substituindo a antiga regra que determinava o valor do benefício a partir da média aritmética simples dos 36 últimos salários de contribuição dos meses anteriores ao do afastamento do segurado da atividade ou da data da entrada do requerimento administrativo. A nova lei trouxe, também, uma regra de transição, em seu art. 3º, estabelecendo que no cálculo do salário de benefício dos segurados filiados à Previdência Social até o dia anterior à data de publicação da Lei n. 9.876/1999, o período básico de cálculo só abarcaria as contribuições vertidas a partir de julho de 1994 (estabilização econômica do Plano Real). A regra transitória deve ser vista em seu caráter protetivo, como é típico do Direito Previdenciário. Assim, o propósito do art. 3º da referida lei foi estabelecer regras de transição que garantissem que os segurados não fossem atingidos de forma abrupta por regras mais rígidas de cálculo dos benefícios. Nesse passo, não se harmoniza com o Direito Previdenciário admitir que tendo o segurado recolhido melhores contribuições antes de julho de 1994, tais pagamentos sejam simplesmente descartados no momento da concessão de seu benefício, sem analisar as consequências da medida na apuração do seu valor, sob pena de infringência ao princípio da contrapartida. É certo que o sistema de Previdência Social é regido pelo princípio contributivo, decorrendo de tal princípio a consequência de haver, necessariamente, uma relação entre custeio e benefício, não se afigurando razoável que o segurado realize contribuições e não possa se utilizar delas no cálculo de seu benefício. A concessão do benefício previdenciário deve ser regida pela regra da prevalência da condição mais vantajosa ou mais benéfica ao segurado, nos termos da orientação do STF e do STJ. Assim, é direito do segurado o recebimento de prestação previdenciária mais vantajosa dentre aquelas cujos requisitos cumpre, assegurando, consequentemente, a prevalência do critério de cálculo que lhe proporcione a maior renda mensal possível, a partir do histórico de suas contribuições. Desse modo, impõe-se reconhecer a possibilidade de aplicação da regra definitiva prevista no art. 29, I e II, da Lei n. 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando se revelar mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3º da Lei 9.876/1999, respeitados os prazos prescricionais e decadenciais. Afinal, por uma questão de racionalidade do sistema normativo, a regra de transição não pode ser mais gravosa do que a regra definitiva.
Reincidencia especifica no paragrafo 4 do artigo 28 da Lei de Drogas
Não obstante a existência de precedente em sentido diverso (AgRg no HC 497.852/RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 11/06/2019, DJe 25/06/2019) - em que a reincidência genérica era pela prática dos delitos de roubo e de porte de arma -, em revisão de entendimento, embora não conste da letra da lei, forçoso concluir que a reincidência de que trata o § 4º do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 é a específica. Com efeito, a melhor exegese, segundo a interpretação topográfica, essencial à hermenêutica, é de que os parágrafos não são unidades autônomas, estando vinculadas ao caput do artigo a que se referem. Vale dizer, aquele que reincidir na prática do delito de posse de drogas para consumo pessoal ficará sujeito a penas mais severas - pelo prazo máximo de 10 meses -, não se aplicando, portanto, à hipótese vertente, a regra segundo a qual ao intérprete não cabe distinguir quando a norma não o fez. Desse modo, condenação anterior por crime de roubo não impede a aplicação das penas do art. 28, II e III, da Lei n. 11.343/2006, com a limitação de 5 meses de que dispõe o § 3º do referido dispositivo legal.
Modulação temporal dos efeitos da Súmula 610/STJ em suicídio no seguro de vida
No caso, a recorrente alega que seu marido contratou junto à seguradora recorrida uma apólice de seguro de vida, contemplando-a como beneficiária. Nesse contrato, o capital segurado seria de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para morte natural e o dobro para a situação de morte acidental. Contudo, o marido da recorrente faleceu após o cometimento de suicídio, razão pela qual a seguradora negou o pagamento da indenização, sob a justificativa de que o sinistro ocorreu nos primeiros 2 anos de vigência do seguro de vida, conforme o art. 798 do CC/2002. Neste STJ, a jurisprudência anterior ao CC/2002 estava consolidada em dois enunciados: a Súmula 61/STJ e a Súmula n. 105/STF. Mesmo com o advento no novo código, o STJ mantém a aplicação dos mencionados entendimentos sumulares. A alteração da jurisprudência ocorreu em 2015, a partir do julgamento do REsp 1.335.005/GO, pela Segunda Seção, que realizou nova interpretação do disposto no art. 798 do CC/2002. A hipótese em julgamento tem seus fatos anteriores a esta mudança, inclusive a sentença foi proferida em 2014, quando ainda se encontrava presente a jurisprudência anterior do STJ. Posteriormente, em 2018, esta Corte superior consolidou esse novo entendimento jurisprudencial, ao fixá-lo em enunciado sumular assim redigido: o suicídio não é coberto nos dois primeiros anos de vigência do contrato de seguro de vida, ressalvado o direito do beneficiário à devolução do montante da reserva técnica formada. (Súmula n. 610, Segunda Seção, julgado em 25/04/2018, DJe 07/05/2018). Destaque-se que é de fundamental importância para o deslinde desta controvérsia a compreensão de que não se pleiteia a revisão do entendimento do STJ acerca do art. 798 do CC/2002, mas que seja aplicada, à hipótese em julgamento, a orientação jurisprudencial anterior ao julgamento do REsp 1.334.005/GO, pela Segunda Seção, no ano de 2015. Nesse sentido, a fim de se aferir a necessidade de modulação de efeitos, a doutrina destaca que não é qualquer confiança que merece tutela na superação de um entendimento jurisprudencial, mas sim somente a confiança "'justificada', ou seja, confiança qualificada por critérios que façam ver que o precedente racionalmente merecia a credibilidade à época em que os fatos se passaram". A modulação de efeitos deve, portanto, ser utilizada com parcimônia, de forma excepcional e em hipóteses específicas, em que o entendimento superado tiver sido efetivamente capaz de gerar uma expectativa legítima de atuação nos jurisdicionados e, ainda, o exigir o interesse social envolvido. Portanto, constata-se que, de fato, a recorrente ajuizou ação pleiteando a indenização securitária em 09/01/2012 e, ainda no ano de 2014, obteve sentença de 1º grau de jurisdição que julgou procedente seu pedido, com base no entendimento então vigente deste STJ, que ainda refletia vetusta posição do STF sobre matéria de lei federal. No entanto, atento à jurisprudência desta Corte Superior, o Tribunal de origem deu provimento à apelação interposta pela seguradora recorrida, afastando a aplicação da Súmula n. 105 do STF. Na hipótese, é inegável a ocorrência de traumática alteração de entendimento desta Corte Superior, o que não pode ocasionar prejuízos para a recorrente, cuja demanda já havia sido julgada procedente em 1º grau de jurisdição de acordo com a jurisprudência anterior do STJ. Assim, como meio de proteção da segurança jurídica e do interesse social contido na situação em discussão, impõe-se reconhecer, para a hipótese em julgamento, a aplicação do entendimento anterior do STJ, que está refletido na Súmula n. 105/STF.
Nulidade de cláusula de antecipação da indenização na representação comercial por rescisão imotivada
A Lei n. 4.886/1965, em seu art. 27, "j", estabelece que o representante deve ser indenizado caso o contrato de representação comercial seja rescindido sem justo motivo por iniciativa do representado. No entanto, o pagamento antecipado, em conjunto com a remuneração mensal devida ao representante comercial, desvirtua a finalidade da indenização. A obrigação de reparar o dano somente surge após a prática do ato que lhe dá causa (por imperativo lógico), de modo que, antes da existência de um prejuízo concreto passível de ser reparado - que, na espécie, é o rompimento imotivado da avença - não se pode falar em indenização. O princípio da boa-fé impede que as partes de uma relação contratual exercitem direitos, ainda que previstos na própria avença de maneira formalmente lícita, quando, em sua essência, esse exercício representar deslealdade ou gerar consequências danosas para a contraparte. Assim, a cláusula que extrapola o que o ordenamento jurídico estabelece como padrão mínimo para garantia do equilíbrio entre as partes da relação contratual deve ser declarada inválida.
Julgamento ampliado em embargos de declaração contra acórdão de agravo de instrumento condicionado à modificação
Segundo a lição da doutrina especializada, em se tratando de aclaratórios opostos a acórdão que julga agravo de instrumento, a convocação de outros julgadores para compor o colegiado somente ocorrerá se os embargos de declaração forem acolhidos para modificar o julgamento originário do magistrado de primeiro grau que houver proferido decisão parcial de mérito, conforme preconiza o artigo 942, § 3º, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015. No caso, após o provimento do agravo de instrumento, por maioria de votos, e da rejeição de questão de ordem relativa à ampliação do julgamento colegiado, foram opostos aclaratórios, pugnando pelo reconhecimento da nulidade do acórdão embargado e pela necessidade de refazimento daquele julgamento de forma ampliada. Levados os embargos de declaração a julgamento, estes foram inicialmente rejeitados, por maioria, sendo que o voto vencido preconizava o seu acolhimento com a anulação do julgamento do agravo de instrumento para que outro fosse realizado com a devida observância ao disposto no art. 942, § 3º, II, do CPC/2015. Nota-se, portanto, que, além de os aclaratórios terem sido rejeitados, o voto vencido proferido nos embargos não era apto a modificar o julgamento do agravo de instrumento em seu mérito. O sucesso da tese ali defendida ensejaria apenas a anulação do julgamento para que outro fosse realizado, sem nenhuma alteração no conteúdo meritório da decisão atacada. Nesse contexto, indevida a ampliação do julgamento operada pela Corte local.