Este julgado integra o
Informativo STF nº 642
Por vislumbrar prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, o Plenário, em votação majoritária, recebeu, em parte, denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra deputado federal e outras 8 pessoas acusadas da suposta prática dos delitos de lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98, art. 1º, V e § 1º, II e § 4º) e de formação de quadrilha ou bando (CP, art. 288), rejeitando-a, no que concerne a este último delito, somente quanto ao parlamentar e sua mulher. No caso, a peça acusatória narrara o envolvimento de 11 pessoas — o parlamentar, sua esposa, seus 4 filhos, nora e genro, casal de doleiros e consultor financeiro naturalizado suíço — em pretensa ocultação e dissimulação da origem, da natureza e da propriedade de valores provenientes de delitos de corrupção passiva, alegadamente cometidos pelo parlamentar e seu filho, em virtude da condição de agente político do primeiro, prefeito à época dos fatos. Descrevera a inicial que, para a ocultação desses recursos financeiros, os denunciados se utilizariam de diversas contas bancárias — mantidas em instituições financeiras localizadas na Europa e nos Estados Unidos —, cujos titulares seriam empresas e fundos de investimentos offshore, de propriedade da família do parlamentar, o que caracterizaria organização criminosa voltada para a lavagem de capitais. Constaria, ainda, a referência ao retorno desse numerário ao Brasil por meio da compra de títulos denominados ADR’s (American Depositary Receipts) de determinada empresa, pertencente à família do deputado federal, com o intuito de dissimular a origem dos valores. A denúncia fora inicialmente ofertada perante a justiça federal, sendo remetida ao Supremo ante a diplomação do acusado. Diante disso, a Procuradoria-Geral da República, ao ratificar a exordial, aditara-a para modificar período relativo ao 5º conjunto de fatos nela descritos, bem como requerera o desmembramento do feito, de modo que a tramitação nesta Corte ocorresse apenas em relação ao detentor de prerrogativa de foro. Na ocasião, o Colegiado mantivera decisão do Min. Ricardo Lewandowski, relator, que, por não entrever a participação direta do parlamentar nos conjuntos fáticos de números 5 a 8, encaminhara à origem os tópicos desmembrados — aqui incluído o casal de doleiros. De início, rejeitou-se a preliminar de inépcia de denúncia genérica ao fundamento de que, em se tratando de atuação coletiva de agentes, cujos crimes teriam sido praticados por meio da colaboração de várias pessoas físicas e jurídicas, não seria razoável exigir-se, nesta fase processual, que o Ministério Público descrevesse de forma minuciosa os atos atribuídos a cada um dos denunciados, sob pena de adentrar-se em inextrincável cipoal fático. Além disso, as condutas dos agentes estariam de tal modo interligadas, a permitir sua análise sob um mesmo modus operandi. De igual modo, superou-se a alegação de que a exordial referir-se-ia a documentos que não constariam dos autos. Assinalou-se que o parquet posteriormente juntara novos documentos e mídia eletrônica, oportunidade em que os acusados puderam se manifestar. Repeliu-se, também, a assertiva de que o delito de lavagem constituiria mero exaurimento do crime antecedente de corrupção passiva. Aduziu-se que a Lei 9.613/98 não excluiria a possibilidade de que o ilícito penal antecedente e a lavagem de capitais subseqüente tivessem a mesma autoria, sendo aquele independente em relação a esta. Rechaçou-se a pretensa litispendência ou o risco de dupla penalização no que se refere a outra ação penal em curso no STF contra o parlamentar e seu filho, pois os delitos seriam diversos. Ante a natureza permanente da lavagem de capitais, afastou-se o argumento de ofensa ao princípio vedatório de retroação da lei penal em prejuízo do réu. Sustentava a defesa que a peça ministerial imputaria aos denunciados fatos ocorridos antes da entrada em vigor da Lei 9.613/98. Consignou-se que, embora as transferências ilícitas de recursos para o exterior tivessem ocorrido antes de 4 de março de 1998, enquanto os valores correspondentes não viessem a ser legalmente repatriados ou remanescessem ocultos no exterior, o crime de lavagem de capitais continuaria sendo perpetrado. Os Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes fizeram a reserva de não se comprometerem com a tese, vindo a apreciá-la na ação penal. Nesse contexto, explicitou-se que o marco inicial da prescrição seria computado a partir do momento em que descoberto o delito, ou seja, quando o que estivesse oculto viesse a lume. No ponto, o Presidente somou-se ao Ministro Dias Toffoli para ressalvar seu entendimento quanto ao tema da prescrição. Em passo seguinte, considerou-se que os documentos oriundos da quebra de sigilo bancário dos acusados, enviados por governos estrangeiros às autoridades brasileiras, seriam hábeis para embasar a denúncia. Ademais, o Plenário, ao julgar outra ação penal ajuizada contra o parlamentar, autorizara utilização das provas em outros processos. Mencionou-se que toda a documentação que instruíra os autos fora colhida de modo lícito, com observância das garantias constitucionais dos denunciados. Frisou-se não ser indispensável haver perfeita correspondência entre os valores tidos pela acusação como oriundos do crime de corrupção passiva e os movimentados, posteriormente, nas contas correntes mantidas no exterior pela família do deputado federal. Refutou-se, ainda, a alusão de dependência das regras descritas no § 1º em relação ao caput e aos incisos do art. 1º da Lei 9.613/98. Entendeu-se que essas seriam autônomas e subsidiárias, de modo a não haver impedimento para que os acusados, em mesma ação penal, respondessem separada e subsidiariamente por ações enquadradas em cada um dos preceitos, desde que existente prova da materialidade e indícios suficientes de autoria. Ressaltou-se que para a caracterização do delito de lavagem de capitais bastaria o cometimento de atos que objetivassem a ocultação patrimonial, sendo irrelevante o local em que operada a camuflagem, dado que em jogo crime de natureza transnacional. No que se refere ao consultor financeiro, enfatizou-se que, não obstante a carta rogatória expedida para a Suíça — com o objetivo de intimá-lo para fins de apresentação de defesa preliminar — não tivesse sido formalmente cumprida, sua finalidade fora atingida, haja vista que ele constituíra advogado para representá-lo neste inquérito, o qual tivera amplo acesso aos autos e demonstrara conhecimento inequívoco sobre os elementos componentes dos autos. Por fim, resolveu-se questão de ordem suscitada da tribuna no sentido de que o 5º conjunto fático retornasse ao STF, uma vez que o mencionado aditamento, além de alterar o intervalo em que supostamente perpetradas as condutas, teria incluído nova imputação ao parlamentar. A defesa, durante o julgamento, informou que tramitariam perante a 1ª instância duas ações penais, porquanto o juízo, ao receber o traslado, procedera à separação entre os agentes brasileiros e o residente suíço. Argüiu que o juízo acatara a inicial quanto aos nacionais e não se manifestara no que se refere ao estrangeiro. Por maioria, reputou-se que o Supremo deveria apreciar esse grupo de fatos apenas no tocante ao titular da prerrogativa de foro. O relator asseverou que não haveria prejuízo ao parlamentar, já que amplamente se manifestara em defesa preliminar — apresentada antes do desmembramento — e quando da juntada de documentos adicionais. Explicou que, naquela oportunidade, concluíra, com base em elementos precários de cognição, pela inexistência de relação direta com o parlamentar. Agora, após examinar o conjunto indiciário, considerou que o fatos estariam tão imbricados que o aditamento deveria ser acolhido. Ademais, afirmou que essas acusações estariam incluídas no 3º conjunto fático. O Min. Cezar Peluso, Presidente, acrescentou que a anterior decisão da Corte, relativa ao desmembramento, não teria configurado verdadeiro arquivamento. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que não conheciam da questão de ordem. Este aduzia não ser possível rever o arquivamento que favorecera o deputado sem que surgissem dados fáticos novos. Além disso, tendo em conta o princípio da segurança jurídica, apontava que a decisão do Pleno não estaria submetida à condição resolutiva. O primeiro, por sua vez, observava que o Tribunal teria outrora acatado a separação do feito. No mérito, a partir de farta documentação probatória, a exemplo de pareceres técnicos, verificou-se a existência de indícios substanciais de que o delito de corrupção passiva, pressuposto para o recebimento da denúncia por lavagem de dinheiro, teria ocorrido por intermédio de um sistema de desvios de verbas pagas pela prefeitura a construtoras. Aludiu-se a conjunto de empresas que, durante anos, teriam vendido serviços fictos àquela, mediante remuneração de 10%. Afirmou-se, também por depoimentos testemunhais, que parte das propinas seriam remetidas ao exterior, com o auxílio de doleiros, para contas da família do parlamentar, com movimentação de aproximadamente US$ 1 bilhão. Assinalou-se que a mera ocultação de capitais já poderia configurar, por si só, o crime de lavagem. Entretanto, enalteceu-se o trabalho pericial realizado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, em que retratado o caminho percorrido pelo dinheiro retirado do país. Destacou-se que a elementar subjetiva “servidor público” comunicar-se-ia ao filho do parlamentar, não havendo impedimento para que fosse processado por corrupção passiva em co-autoria. Registrou-se que não haveria como deixar de considerar que cada transferência internacional representaria, em tese, ajuda à pulverização do capital ilícito, a caracterizar elo que daria continuidade ao processo de ocultação patrimonial. Aduziu-se que esse raciocínio alcançaria os demais acusados que, de alguma forma, manipularam ou foram beneficiados com os recursos. Realçaram-se que as indicações, referências, comparações e conclusões do laudo elaborado pelo Ministério Público estadual seriam confirmadas por outro trabalho pericial efetivado por técnicos do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, da Secretaria Nacional de Justiça, órgão vinculado ao Ministério da Justiça. Anotou-se que, em 11.5.2006, por intermédio de comunicação oficial desse ente, a acusação tomara ciência dos documentos oriundos de autoridade norte-americana. Razão pela qual, em face da permanência do delito, não se cogitaria de prescrição. Para evitar a ocorrência de bis in idem, julgou-se o pleito ministerial improcedente quanto à imputação, em concurso material, de ocultação de recursos oriundos de crime praticado por organização criminosa (Lei 9.613/98, art. 1º, VII e § 4º). Correr-se-ia o risco de punir os acusados, duas vezes, por corrupção passiva, desta vez cometida por meio de organização criminosa. Por outro lado, recebeu-se a denúncia quanto à formação de quadrilha ou bando (CP, art. 288). Entretanto, no que concerne ao parlamentar e à sua mulher, reconheceu-se a prescrição da pretensão punitiva, haja vista que ambos teriam mais de 70 anos de idade (CP, art. 115). Para o acolhimento da pretensão acusatória, levou-se em conta não só o fato de os denunciados integrarem a mesma família, mas também, consoante demonstrado para fins de cognição sumária e inaugural, a circunstância de serem sócios de várias pessoas jurídicas offshore, suspeitas de envolvimento na lavagem de capitais; transferirem recursos entre essas sociedades; e empregarem mecanismos societários complexos a dificultar a identificação de seus dirigentes. Ademais, conforme comprovado, essa associação objetivaria a prática de crimes. Advertiu-se inexistir empecilho para a exacerbação da pena, com base no § 4º do art. 1º da Lei 9.613/98, na hipótese de demonstração de que os crimes de lavagem de capital teriam sido perpetrados de modo habitual e reiterado. Vencido o Min. Marco Aurélio, que rejeitava a denúncia. Salientava que as práticas delituosas teriam ocorrido em 1998 e, em conseqüência, pronunciava a prescrição da pretensão punitiva quanto ao parlamentar. Esclarecia que o crime de lavagem se operaria com os atos e os fatos realizados, possuindo natureza instantânea. Determinava, por conseguinte, a baixa dos autos à justiça de primeiro grau relativamente aos demais envolvidos.
Lei 9.613/98, art. 1º, V e § 1º, II e § 4º; CP, art. 115, art. 288.
Número do Processo
2471
Tribunal
STF
Data de Julgamento
29/09/2011
Explore conteúdo relacionado para aprofundar seus estudos
Inicialmente, cumpre destacar que a Lei n. 13.491/2017 não tratou apenas de ampliar a competência da Justiça Militar, também ampliou o conceito de crime militar, circunstância que, isoladamente, autoriza a conclusão no sentido da existência de um caráter de direito material na norma. Esse aspecto, embora evidente, não afasta a sua aplicabilidade imediata aos fatos perpetrados antes de seu advento, já que a simples modificação da classificação de um crime como comum para um delito de natureza militar não traduz, por si só, uma situação mais gravosa ao réu, de modo a atrair a incidência do princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa (arts. 5º, XL, da Constituição Federal e 2º, I, do Código Penal). Por outro lado, a modificação da competência, em alguns casos, pode ensejar consequências que repercutem diretamente no jus libertatis , inclusive de forma mais gravosa ao réu. É inegável que a norma possuiu conteúdo híbrido (lei processual material) e que, em alguns casos, a sua aplicação retroativa pode ensejar efeitos mais gravosos ao réu. Tal conclusão, no entanto, não impossibilita a incidência imediata, sendo absolutamente possível e desejável conciliar sua aplicação com o princípio da irretroatividade de lei penal mais gravosa. A jurisprudência desta Corte não admite a cisão da norma de conteúdo híbrido (AgRg no REsp n. 1.585.104/PE, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 23/4/2018). Ocorre que a aplicação imediata, com observância da norma penal mais benéfica ao tempo do crime, não implicaria uma cisão da norma, pois, o caráter material, cujo retroatividade seria passível de gerar prejuízo ao réu, não está na norma em si, mas nas consequências que dela advém. Logo, é absolutamente possível e adequado a incidência imediata da norma aos fatos perpetrados antes do seu advento, em observância ao princípio tempus regit actum (tal como decidido no julgamento do CC n. 160.902/RJ), desde que observada, oportunamente, a legislação penal (seja ela militar ou comum) mais benéfica ao tempo do crime. Ademais, importante ressaltar que tal ressalva é inafastável da declaração de competência. Primeiro, porque a solução do julgado dela depende. Segundo, porque a simples declaração de competência em favor da Justiça Militar, sem a ressalva acima estabelecida, poderia dar azo a ilegalidade futura, decorrente de eventual inobservância da norma penal mais benéfica.
A oposição é instituto de intervenção de terceiros que tem natureza jurídica de ação judicial de conhecimento, de modo que o opoente deve preencher as condições da ação para o seu processamento, entre elas, o interesse processual, que se encontra presente quando o autor tem necessidade de propor a demanda para alcançar a tutela pretendida. Contudo, in casu , a tutela buscada por meio da oposição pode ser alcançada pela simples contestação à ação de usucapião, de modo que a intervenção pretendida é totalmente desnecessária. Dessa forma, inexiste a condição de terceiro da opoente em relação ao direito material discutido na ação de usucapião. Isso porque a existência de convocação por meio de edital, a fim de chamar aos autos toda universalidade de sujeitos indeterminados para que integrem o polo passivo da demanda se assim desejarem, elimina a figura do terceiro nesse procedimento tão peculiar.
Inicialmente cumpre salientar que a partir do julgamento da ADPF n. 130/DF, pelo Supremo Tribunal Federal, a Lei n. 5.250/1967 (Lei de Imprensa) foi considerada, em sua integralidade, não recepcionada pela Constituição da República de 1988. Contudo, os direitos ao esclarecimento da verdade, à retificação da informação inverídica ou à retratação não foram banidos do ordenamento jurídico brasileiro, pois eles ainda encontram amparo na legislação civil vigente. O art. 927 do Código Civil impõe àquele que, cometendo ato ilícito, causar dano a outrem, a obrigação de repará-lo, ao passo que o art. 944 do mesmo diploma legal determina que a indenização seja medida pela extensão do dano. Isso significa que a principal função da indenização é promover a reparação da vítima, anulando, ao máximo, os efeitos do dano. Nessa linha, o Poder Judiciário deve reformular sua visão e dar um passo à frente, abrandando a natureza essencialmente patrimonialista da responsabilidade civil e buscando a reparação do dano, em toda a sua extensão. Assim, imperativo o reconhecimento da subsistência do direito de retratação fundamentado na legislação civil (arts. 927 e 944 do CC), mesmo após o julgamento da ADPF n. 130/DF, preservando-se a finalidade e a efetividade da responsabilidade civil, notadamente nos casos em que o magistrado, sopesando a necessidade de impor a condenação de publicação da decisão condenatória, vislumbre que a medida é proporcional e razoável no caso concreto. Portanto, na hipótese, a publicação da petição inicial e do acórdão condenatório nas próximas edições do livro não impõe, de um lado, uma obrigação excessiva, onerosa, desarrazoada ou desproporcional aos réus, pois tal publicação deverá se dar nas edições que vierem a ser editadas. Não se trata, ainda, de censura ou controle prévio dos meios de comunicação social e da liberdade de expressão, pois não se está impondo nenhuma proibição de comercialização da obra literária, nem mesmo se determinando que as edições até então produzidas sejam recolhidas ou destruídas, o que seria de todo contrário ao ordenamento jurídico, mas satisfaz aos anseios da vítima, que terá a certeza de que os leitores da obra literária terão consciência de que os trechos que a ele se referem foram considerados ofensivos à sua honra.
A razão de ser do § 3º do art. 941 do CPC/2015 está ligada, sobretudo, à exigência de fundamentação, inerente a todas as decisões judiciais, nos termos do art. 93, IX, da Constituição Federal e, em consequência, à observância do direito fundamental ao devido processo legal, na medida em que, na perspectiva endoprocessual, a norma garante às partes o conhecimento integral do debate prévio ao julgamento, permitindo o exercício pleno da ampla defesa, e, na perspectiva extraprocessual, confere à sociedade o poder de controlar a atividade jurisdicional, assegurando a independência e a imparcialidade do órgão julgador. Noutra toada, a publicação do(s) voto(s) vencido(s) municia a comunidade jurídica de fundamentos outros que, embora não constituam a razão de decidir ( ratio decidendi ) do colegiado, têm o condão de instigar e ampliar a discussão acerca das questões julgadas pelas Cortes brasileiras e pode, inclusive, sinalizar uma forte tendência do tribunal à mudança de posicionamento. Assim sendo, afirma a doutrina que "o acórdão, para o CPC/2015, compõe-se da totalidade dos votos, vencedores e vencidos". Nesse sentido, a inobservância da regra do § 3º do art. 941 do CPC/2015 constitui vício de atividade ou erro de procedimento ( error in procedendo ), porquanto não diz respeito ao teor do julgamento em si, mas à condução do procedimento de lavratura e publicação do acórdão, já que este representa a materialização do respectivo julgamento. Assim, há nulidade do acórdão, por não conter a totalidade dos votos declarados, mas não do julgamento, pois o resultado proclamado reflete, com exatidão, a conjunção dos votos proferidos pelos membros do colegiado. Cabe ao tribunal de origem providenciar a juntada do(s) voto(s) vencido(s) declarado(s), observando, para tanto, as normas de seu regimento interno, e, em seguida, promover a sua republicação, nos termos do § 3º do art. 941 do CPC/2015, abrindo-se, em consequência, novo prazo para eventual interposição de recurso pelas partes.
Inicialmente, cumpre destacar que a correção monetária da prestação inadimplida a tempo e modo não se confunde com a atualização monetária do valor histórico da prestação de trato sucessivo, nem em sua essência nem em sua finalidade, e, por isso, devem ser apreciadas a partir de óticas jurídicas distintas. Nos termos do art. 1.710 do CC/2002, as obrigações alimentares estão sujeitas à atualização monetária por "índice oficial regularmente estabelecido". A partir da interpretação dessa regra, o Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de se manifestar quanto à exigência de previsão do índice a ser aplicado na sentença que fixa obrigação alimentícia. Contudo, esses julgamentos não se pronunciaram quanto às hipóteses em que a obrigação é fixada em acordo, situação ora enfrentada. Assim, o cerne da presente controvérsia repousa na necessidade de definir se é possível a ampliação dessa interpretação para alcançar os alimentos fixados por acordo, mormente quando esses alimentos são fixados em prol de ex-cônjuge. Nesse mister, importa ter em mente que, no que tange à incidência de correção monetária sobre obrigações contratuais, a Lei n. 10.192/2001 foi expressa em romper com a atualização automática de obrigações oriundas de contratos de prestação continuada, restringindo até mesmo a possibilidade de expressa contratação, que somente se admite em contratos com duração superior a 1 (um) ano. Nota-se, portanto, que o ambiente regulatório dos contratos é notoriamente distinto daquele estabelecido para as obrigações judicialmente fixadas. Também não se pode perder de vista que a Lei n. 6.899/1981 ainda se encontra em vigência, determinando a correção monetária sobre todos os débitos decorrentes de decisão judicial, conforme prevê expressamente seu art. 1º. Portanto, reconhecendo-se a natureza consensual do acordo que estabelece a obrigação alimentar entre ex-cônjuges, a incidência de correção monetária para atualização da obrigação ao longo do tempo deve estar expressamente prevista no contrato. Isso porque a imposição de aplicação de índice regularmente estabelecido abarca todas as obrigações alimentícias, não se fazendo distinção segundo se trate de obrigação fixada em sentença ou em contrato. Contudo, na hipótese de omissão quanto a essa exigência de prévia e expressa deliberação, a solução não poderá ser idêntica para os casos de obrigações contratuais e judiciais, uma vez que a regra específica para cada uma delas, extraída da legislação nacional, é diametralmente oposta. Assim é que, uma vez silente o contrato quanto à incidência de correção monetária para a apuração do quantum devido, o valor da obrigação se mantém pelo valor histórico. Por outro lado, silente a decisão judicial quanto ao índice aplicável, deverá a prestação ser corrigida, mantendo-se atualizado o valor historicamente fixado. Por fim, é ainda relevante esclarecer que o caso ora em questão não se confunde com o debate acerca da necessidade de pedido expresso de correção monetária dos valores sub judice . Nessas hipóteses, a jurisprudência desta Corte Superior é pacífica em admitir a correção monetária como pedido implícito, mesmo porque decorre de expressa determinação legal a imposição de atualização dos débitos decorrentes de sentenças.