Este julgado integra o
Informativo STF nº 944
Comentário Damásio
Conteúdo Completo
A Segunda Turma, por maioria, deu provimento parcial a reclamação para declarar a nulidade de entrevista realizada por autoridade policial no interior da residência do reclamante, durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão, em flagrante contrariedade à autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 395 e 444. O reclamante sustentava ter sido interrogado por delegado de polícia sem ser informado de seu direito ao silêncio, além de ter-lhe sido exigida a senha de acesso ao seu smartphone, em flagrante violação ao princípio da não autoincriminação. No tocante à entrevista, prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator). Em seu pronunciamento, observou que, nas ADPFs 395 e 444, a Corte decidiu pela impossibilidade de se conduzir coercitivamente os suspeitos de prática de crimes com o intuito de serem interrogados. Entre o rol de direitos potencialmente atingidos pela conduta, destacou a violação do direito à não autoincriminação e ao silêncio. Aduziu que a contrariedade aos referidos direitos ocorreu com a realização de interrogatório travestido de entrevista, na medida em que utilizada técnica de interrogatório forçado, proibida a partir do julgamento das ADPFs 395 e 444. Observou que o reclamante foi interrogado em ambiente intimidatório que diminuiria o direito à não incriminação. Além disso, na entrevista formalmente documentada, não se oportunizou ao sujeito da diligência o direito à prévia consulta a advogado, tampouco certificou-se, no respectivo termo, o direito ao silêncio e à não produção de provas contra si mesmo, nos termos da legislação e dos aludidos precedentes. Por sua vez, o ministro Edson Fachin ressaltou não se tratar, na hipótese, de aderência estrita de um conjunto de elementos fáticos que se submeteriam à vedação da condução coercitiva. Contudo, assinalou a existência de desrespeito ao direito de não incriminação e ao direito ao silêncio, conforme os fatos apresentados. Isso ocorreu mediante metodologia atípica e descolada de qualquer fundamentação que permita esse tipo de procedimento. Quanto à conduta adotada pela autoridade policial em relação ao celular do reclamante, o colegiado, por maioria, não vislumbrou suporte à sua alegação no sentido de que teria sido coagido ou obrigado a fornecer a senha. Explicitou inexistir expressamente, na decisão judicial, a expressão “autorizo a apreensão do aparelho celular”. Entretanto, o ato decisório conteve o deferimento ao acesso, à exploração e cópia do conteúdo de mídias, dispositivos e dados armazenados em nuvem, bem assim a determinação de que deveria constar, expressamente no mandado, a autorização de acesso a dados telefônicos e telemáticos armazenados nos dispositivos eletrônicos apreendidos. O ministro Ricardo Lewandowski acrescentou não ser possível exigir do juiz que minudencie todos os objetos de interesse do processo que serão encontrados no local da busca e apreensão. No ponto, ficou vencido o ministro relator, que reconheceu, de ofício [Código de Processo Penal (CPP), art. 654, § 2º (1)], a inconstitucionalidade e a ilegalidade da apreensão e do acesso aos dados, às mensagens e informações contidas no aparelho celular, haja vista a ausência de prévia e fundamentada decisão judicial que justificasse a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da medida. (1) CPP: “Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público. (...) § 2º Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.”
Legislação Aplicável
CPP, art. 654, § 2º.
Informações Gerais
Número do Processo
33711
Tribunal
STF
Data de Julgamento
11/06/2019