Supremo Tribunal Federal • 5 julgados • 17 de set. de 2021
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É inconstitucional a interpretação da legislação federal que possibilita o abate imediato de animais apreendidos em situação de maus-tratos (1). Essa exegese — proposta por órgãos administrativos e adotada por autoridades judiciais — ofende normas materiais da Constituição Federal (CF), em especial o art. 225, § 1º, VII (2), que impõe a proteção à fauna e proíbe qualquer espécie de maus-tratos aos animais. Embora sejam relevantes, os problemas estruturais e financeiros, mencionados nas decisões judiciais e nas manifestações administrativas, não autorizam o abate, e sim o uso de instrumentos descritos na legislação infraconstitucional, como a soltura em habitat natural ou em cativeiros, a doação a entidades especializadas ou a pessoas habilitadas e, inclusive, o leilão. A finalidade das normas protetivas não autoriza concluir que os animais devam ser resgatados de situações de maus-tratos para, logo em seguida, serem abatidos. As decisões judiciais e as interpretações administrativas que justificam o abate preferencial e imediato desses animais violam também o princípio da legalidade (CF, art. 37, caput) (3). Isso, porque inexiste autorização legal expressa que possibilite o abate no caso específico de apreensão em situação de maus-tratos, conforme se observa da literalidade do art. 25, §§ 1º e 2º, combinado com o art. 32 da Lei 9.605/1998 (Lei dos Crimes Ambientais) (4) (5), bem assim dos arts. 101, 102 e 103 do Decreto 6.514/2008 (6). Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente o pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental para declarar a ilegitimidade da interpretação dos arts. 25, §§ 1º e 2º da Lei 9.605/1998, bem como dos artigos 101, 102 e 103 do Decreto 6.514/2008 e demais normas infraconstitucionais, que autorizem o abate de animais apreendidos em situação de maus-tratos.
É constitucional dispositivo legal que veda a indicação de pessoa que exerça cargo em organização sindical ou que seja membro de conselho ou diretoria de associação patronal ou trabalhista para a alta direção das agências reguladoras (1). Isso porque o conselho diretor ou a diretoria colegiada das agências reguladoras, diante da necessidade de tomada de decisões imparciais, devem ser isentos de influências políticas, sociais e econômicas externas à própria finalidade dessas autarquias. Desse modo, devem preservar suas administrações da captura de gestão, compreendida como qualquer desvirtuação da finalidade conferida às agências, quando estas atuam em favor de interesses comerciais, especiais ou políticos, em detrimento do interesse da coletividade. A norma visa, portanto, garantir imparcialidade e higidez técnica dos órgãos deliberativos sem, contudo, violar o princípio da igualdade ou a garantia da liberdade de associação, visto que a restrição é episódica e pontual a quem exerça cargo no conselho diretor ou na diretoria colegiada das agências reguladoras. Com base nesse entendimento, o Plenário julgou improcedente o pedido formulado em ação direta para declarar a constitucionalidade dos incisos III e VII do art. 8º-A da Lei 9.986/2000.
(i) a eleição dos membros das mesas das assembleias legislativas estaduais deve observar o limite de uma única reeleição ou recondução, limite cuja observância independe de os mandatos consecutivos referirem-se à mesma legislatura; (ii) a vedação à reeleição ou recondução aplica-se somente para o mesmo cargo da mesa diretora, não impedindo que membro da mesa anterior se mantenha no órgão de direção, desde que em cargo distinto; e (iii) o limite de uma única reeleição ou recondução, acima veiculado, deve orientar a formação das mesas das assembleias legislativas que foram eleitas após a publicação do acórdão da ADI 6.524, mantendo-se inalterados os atos anteriores. É permitida apenas uma reeleição (ou recondução) sucessiva ao mesmo cargo da mesa diretora de assembleia legislativa estadual, independentemente de os mandatos consecutivos se referirem à mesma legislatura. Ainda que observada a relativa autonomia das Casas legislativas estaduais para reger o processo eletivo da mesa diretora, esse campo jurídico é estreitado por outros princípios constitucionais, sobretudo os princípios republicano, democrático e do pluralismo político. Estes exigem o implemento de mecanismos que impeçam resultados inconstitucionais às deliberações regionais, especialmente a perpetuidade do exercício do poder. O critério objetivo de uma única reeleição/recondução sucessiva — fornecido pela Emenda Constitucional 16/1997, que introduziu o instituto da reeleição — serve ao equacionamento da questão. Na espécie, o limite à reeleição refere-se ao mesmo cargo do órgão de direção, porquanto o óbice da recondução a qualquer cargo poderia implicar dificuldades relevantes ao regular funcionamento da assembleia legislativa, inclusive sob o ângulo do princípio democrático. Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, no matiz conferido pela aplicação analógica do art. 16 da Constituição Federal (CF) (1), premente convir que o novo entendimento jurisprudencial somente pode ser exigido de modo temperado, nos termos das teses fixadas. Com esses entendimentos, o Plenário, por maioria e em conclusão de julgamento conjunto, considerou procedente pedido formulado em ações diretas de inconstitucionalidade para conferir interpretação conforme a Constituição Federal ao art. 58, § 5º, I e II, e § 9º, da Constituição do Estado do Espírito Santo (CES/ES) (2), ao art. 8º do Regimento Interno da respectiva Assembleia Legislativa (RIAL/ES) (3), ao art. 15, § 3º, da Constituição do Estado de Tocantins (CES/TO) (4) e ao art. 51, § 5º, da Constituição do Estado de Sergipe (CES/SE) (5) e estabelecer que é permitida apenas uma reeleição ou recondução sucessiva ao mesmo cargo da mesa diretora, mantida a composição da mesa de assembleia legislativa eleita antes da publicação do acórdão da ADI 6.524 (6.4.2021), assentando as aludidas teses. Vencidos, parcialmente, os ministros Ricardo Lewandowski (relator), Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Edson Fachin. (1) CF/1988: “Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.” (2) CES/ES: “Art. 58 A Assembleia Legislativa reunir-se-á, anualmente, na capital do Estado, independentemente de convocação, de 02 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro. (...) § 5º A Assembleia Legislativa reunir-se-á, em sessão preparatória, no dia 1º de fevereiro, para: I - no primeiro ano da legislatura, dar posse aos seus membros, bem como eleger e dar posse à Mesa, cujos membros terão o mandato de dois anos, sendo permitida aos membros da Mesa a recondução para o mesmo cargo no biênio imediatamente subsequente; II - no terceiro ano da legislatura, dar posse à Mesa, cujos membros serão eleitos na forma do § 9º. (...) § 9º Em data e hora previamente designadas pelo Presidente da Assembleia Legislativa, antes do início do terceiro ano de cada legislatura, sob a direção da Mesa Diretora, realizar-se-á a eleição da Mesa, cujos membros terão mandato de dois anos e serão empossados na forma do inciso II do § 5º, sendo permitida aos membros da Mesa a recondução para o mesmo cargo no biênio imediatamente subsequente.” (3) RIAL/ES: “Art. 8º A Assembleia Legislativa reunir-se-á em sessões preparatórias, às quinze horas, para a eleição dos membros da Mesa nas datas fixadas no § 5º do artigo 58 da Constituição Estadual. § 1º As reuniões marcadas para as datas fixadas neste artigo serão transferidas para o primeiro dia útil subsequente, quando recaírem em sábados, domingos ou feriados. § 2º Assumirá a direção dos trabalhos o último Presidente, se reeleito Deputado, ou, na sua falta, o Deputado mais idoso.” (4) CES/TO: “Art. 15. A Assembleia Legislativa reunir-se-á anualmente, em Sessão Ordinária, na Capital do Estado, independente de convocação, de 1º de fevereiro a 8 de julho, e de 1º de agosto a 30 de dezembro. (...) § 3º No início de cada legislatura, a Assembleia Legislativa reunir-se-á, no dia 1º de fevereiro, para eleger a Mesa Diretora, com mandato de dois anos, permitida a reeleição.” (5) CES/SE: “Art. 51. A Assembleia Legislativa reunir-se-á, anualmente, em sua sede, na Capital do Estado, de 15 de fevereiro a 30 de junho e de 1º de agosto a 15 de dezembro. (...) § 5º O mandato dos membros da Mesa será de dois anos, sendo permitida a reeleição para qualquer dos cargos.”
É do juízo criminal singular a competência para julgar o crime de remoção ilegal de órgãos, praticado em pessoa viva e que resulta morte, previsto no art. 14, § 4º, da Lei 9.434/1997 (Lei de Transplantes) (1). O objeto jurídico tutelado pelo tipo penal em questão é a incolumidade pública, a ética e a moralidade, no contexto da doação e do transplante de órgãos e tecidos, e a preservação da integridade física das pessoas e respeito à memória dos mortos. A proteção da vida apresenta-se como objeto de tutela do tipo penal de forma mediata, não se podendo estabelecer que se cuida de crime doloso contra a vida a fixar a competência do Júri, tal como posto no art. 5º, XXXVIII, d, da Constituição Federal (CF) (2). Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário para fixar a competência do juízo criminal singular para processar e julgar a causa, afastando a competência do Tribunal do Júri, nos termos do voto do relator. Vencida a ministra Cármen Lúcia.
Para aplicação da majorante prevista no art. 334, § 3º, do Código Penal (CP) (1), é necessária a condição de clandestinidade. O aumento expressivo da pena, em face da aplicação da majorante, precisa ser justificado em razão de um maior desvalor da ação. No cenário atual, não há sentido lógico que justifique um aumento de pena tão expressivo pelo simples fato de ser o crime praticado em transporte regular. Essa posição tornaria a majorante quase a regra na aplicação do tipo penal na realidade prática, o que findaria por desvirtuar a estruturação normativa da norma incriminadora. Diante disso, a majorante somente pode ser aplicada quando houver uma maior reprovabilidade da conduta, caracterizada pela atuação do imputado no sentido de dificultar a fiscalização estatal, por meio da clandestinidade. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma, por empate na votação, deu provimento ao agravo regimental para determinar ao Juízo de origem que refaça a dosimetria da pena imposta à paciente, com a exclusão da causa de aumento prevista no art. 334, § 3º, do Código Penal. Os ministros Edson Fachin (relator) e Nunes Marques negaram provimento ao agravo.