Supremo Tribunal Federal • 11 julgados • 06 de ago. de 2015
É constitucional a atribuição às guardas municipais do exercício de poder de polícia de trânsito, inclusive para imposição de sanções administrativas legalmente previstas. É constitucional a atribuição às guardas municipais do exercício de poder de polícia de trânsito, inclusive para imposição de sanções administrativas legalmente previstas. Com base nesse orientação, o Plenário, por maioria e em conclusão de julgamento, desproveu recurso extraordinário em que se discutia a possibilidade de lei local designar a guarda municipal para atuar na fiscalização, no controle e na orientação do trânsito e do tráfego, em face dos limites funcionais dispostos no art. 144, § 8º, da CF (“§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei”) — v. Informativo 785. A Corte destacou que o poder de polícia não se confundiria com a segurança pública. O exercício daquele não seria prerrogativa exclusiva das entidades policiais, a quem a Constituição outorgara, com exclusividade, no art. 144, apenas as funções de promoção da segurança pública. Ademais, a fiscalização do trânsito com aplicação das sanções administrativas legalmente previstas, embora pudesse se dar ostensivamente, constituiria mero exercício de poder de polícia. Não haveria, portanto, óbice ao seu exercício por entidades não policiais. O CTB, observando os parâmetros constitucionais, estabelecera a competência comum dos entes da Federação para o exercício da fiscalização de trânsito. Dentro de sua esfera de atuação, delimitada pelo CTB, os Municípios poderiam determinar que o poder de polícia que lhes compete fosse exercido pela guarda municipal. O art. 144, § 8º, da CF, não impediria que a guarda municipal exercesse funções adicionais à de proteção de bens, serviços e instalações do Município. Até mesmo instituições policiais poderiam cumular funções típicas de segurança pública com o exercício do poder de polícia. Vencidos os Ministros Marco Aurélio (relator), Teori Zavascki, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski (Presidente) e Cármen Lúcia, que davam parcial provimento ao recurso. Entendiam ser constitucional a lei local que conferisse à guarda municipal a atribuição de fiscalizar e controlar o trânsito, inclusive com a possibilidade de imposição de multas, porém, desde que observada a finalidade constitucional da instituição de proteger bens, serviços e equipamentos públicos (CF, art. 144, § 8º) e os limites da competência municipal em matéria de trânsito, estabelecidos pela legislação federal (CF, art. 22, XI).
O Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta e declarou a constitucionalidade do art. 77, XXIII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro (“XXIII - ressalvada a legislação federal aplicável, ao servidor público estadual é proibido substituir, sobre qualquer pretexto, trabalhadores de empresas privadas em greve”). O Colegiado asseverou, quanto à regularidade formal da norma, que o STF consolidara entendimento de que as regras básicas do processo legislativo presentes na CF/1988 incorporariam noções elementares do modelo de separação dos poderes, o que as torna de observância inafastável no âmbito local (CF, art. 25). As regras de iniciativa reservada, por demarcarem as competências privativas assinaladas a cada uma das instâncias políticas do País, estariam entre as disposições mais representativas da Federação, razão pela qual a jurisprudência da Corte assevera que à força normativa dessas regras corresponderia não apenas um encargo positivo a ser cumprido pelas assembleias legislativas, mas também uma eficácia negativa, que as impede de abordar temas de iniciativa de outras autoridades públicas. Em casos nos quais o STF rechaçara a existência de regras, em Constituição local, que deveriam constar de legislação ordinária, ficara consignado que esses conteúdos deveriam contar com a avaliação do Chefe do Executivo local, investido da conveniência e oportunidade de propor o debate a respeito de temas que estariam tipicamente submetidos à sua alçada política, como remuneração de cargos, regime jurídico de servidores, organização da administração local, entre outros. Permitir o tratamento dessa temática diretamente na Constituição estadual equivaleria, portanto, a esvaziar as competências do Chefe do Executivo. O Plenário afirmou que, contudo, isso não significaria que as assembleias constituintes estaduais seriam submetidas a uma completa interdição na disciplina das regras gerais de funcionamento da Administração local, devendo se ater à estrita reprodução do texto federal. Somente as normas de cunho substantivo deveriam ser necessariamente adotadas pelo Constituinte local. Assim, desde que: a) as linhas básicas que regem a relação entre os poderes federados (no que se incluem as regras de reserva de iniciativa) fossem respeitadas; e b) o parlamento local não suprimisse do governador a possibilidade de exercício de uma opção política legítima dentre aquelas contidas na sua faixa de competências típicas, a Constituição estadual poderia dispor de modo singular a respeito do funcionamento da Administração, sobretudo quando essa disciplina peculiar traduzisse a concretização de princípios também contemplados no texto federal. No caso, ressalvada a legislação federal aplicável, o texto impugnado proíbe que servidor público estadual seja designado para substituir, sob qualquer pretexto, trabalhadores de empresas privadas em greve. Embora o preceito esteja relacionado ao funcionamento da Administração local, ele não se sobrepusera ao campo de discricionariedade política que a Constituição Federal reserva, com exclusividade, à iniciativa do governador. Tampouco a regra dera à Administração local configuração definitiva em desacordo com o texto federal. A norma em exame não teria deficiência formal. Seu conteúdo, basicamente expletivo, veda a substituição de trabalhadores grevistas por servidores públicos, a coibir a institucionalização do desvio de função como prática a frustrar o direito de greve dos trabalhadores da iniciativa privada. A Constituição local apenas textualizara um comportamento administrativo já condenável pela ordem constitucional federal. Este texto contém hipóteses de excepcionalidade, em que envolvidas necessidades inadiáveis da comunidade (CF, art. 9º, § 1º) que poderiam justificar o deslocamento de servidores para o exercício temporário de funções alheias aos correspondentes cargos. Presentes situações emergenciais, a Constituição Federal relativiza até mesmo a exigência de concurso público (CF, art. 37, IX). A norma adversada contempla uma ressalva de emergencialidade, tanto que remete à legislação federal a respeito de greve. O preceito não retira do governador uma alternativa viável de aproveitamento dos servidores a ele submetidos para o benefício da Administração. O que se proíbe é que a substituição dos grevistas viesse a ser implementada para servir a pretextos outros que não o da própria emergencialidade. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski (Presidente), que julgavam procedente o pedido. Entendiam que o constituinte local antecipara-se ao disciplinar a matéria, de iniciativa do governador. O Ministro Marco Aurélio acrescia que a lei também padeceria de vício material, pois estaria indevidamente acrescida no texto constitucional local.
O Plenário julgou improcedente pedido formulado em ação direta e declarou a constitucionalidade do art. 2º, §§ 1º, 2º, 3º, 4º e 5º, da Lei 7.971, do Estado do Espírito Santo, que extingue o cargo de escrivão judiciário e cria, em seu lugar, função de confiança para o exercício de atividades de direção, chefia e assessoramento, por servidor público ocupante de cargo efetivo. O Tribunal asseverou que os tribunais de justiça estaduais possuiriam competência para propor ao Poder Legislativo respectivo a criação e a extinção de cargos, nos termos do art. 96, II, b, da CF. Consignou que a extinção do cargo de escrivão judiciário não configuraria incursão indevida na esfera de competência da União para legislar sobre Direito Processual (CF, art. 22, I), mormente por se tratar de vínculo administrativo-funcional, inserido na autoadministração dos Estados-Membros (CF, art. 18). Ademais, a vacância do cargo público não se confundiria com a sua extinção; enquanto a primeira significaria a saída do servidor do cargo público ocupado, a última seria a eliminação de um núcleo de atribuições e responsabilidades na estrutura organizacional da Administração Pública. Além disso, a exigência de critérios e garantias especiais para a perda do cargo pelo servidor público estável, que desenvolvesse atividades exclusivas de Estado (CF, art. 247), somente se aplicaria à vacância de cargo público e apenas nas estritas hipóteses do art. 41, § 1º, III, e do art. 169, § 7º, da CF, não constituindo, portanto, qualquer óbice à extinção de cargo público por lei. No caso, a lei estadual atacada extinguira o cargo de escrivão judiciário em sede estadual e criara, em seu lugar, função de confiança para o exercício de atividades de direção, chefia e assessoramento, por servidor público ocupante de cargo efetivo, em total consonância com o ordenamento constitucional, o que não configuraria transposição ou qualquer outra forma de provimento vedada pelo Enunciado 685 da Súmula do STF.
O Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da LC 376/2007 do Estado de Santa Catarina. Na espécie, em projeto de iniciativa do governador do referido Estado-Membro (CF, art. 61, § 1º, II, a), a assembleia legislativa aprovara emenda aditiva sem pertinência com a proposição inicial do chefe do Poder Executivo. Assim, a referida emenda aditiva — formalizada no curso da tramitação de projeto de lei complementar que visava a criação de funções comissionadas no âmbito da Secretaria de Estado de Educação, Ciência e Tecnologia — impusera ao governador o reenquadramento de servidores do Instituto de Previdência estadual. A Corte afirmou que a ausência de pertinência temática de emenda da Casa Legislativa a projeto de lei de iniciativa exclusiva do Executivo levaria a concluir-se pela sua inconstitucionalidade formal. Ademais, aplicar-se-ia ao caso o teor do Enunciado 685 da Súmula do STF, no sentido de ser inconstitucional toda modalidade de provimento que propiciasse ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público, em cargo que não integrasse a carreira na qual anteriormente investido.
Em conclusão de julgamento, o Plenário proveu recurso extraordinário em que discutida a constitucionalidade dos artigos 29 e 30 da Lei 7.799/1989 (“Art. 29. A correção monetária de que trata esta Lei será efetuada a partir do balanço levantado em 31 de dezembro de 1988. Art. 30. Para efeito da conversão em número de BTN, os saldos das contas sujeitas à correção monetária, existentes em 31 de janeiro de 1989, serão atualizados monetariamente tomando-se por base o valor da OTN de NCz$ 6,92. § 1° Os saldos das contas sujeitas à correção monetária, atualizados na forma deste artigo, serão convertidos em número de BTN mediante a sua divisão pelo valor do BTN de NCz$ 1,00. § 2° Os valores acrescidos às contas sujeitas à correção monetária, a partir de 1° de fevereiro até 30 de junho de 1989, serão convertidos em número de BTN mediante a sua divisão pelo valor do BTN vigente no mês do acréscimo.”) — v. Informativos 427 e 782. O Colegiado declarou a inconstitucionalidade do § 2º do art. 30 da Lei 7.799/1989, por entender caracterizada a ofensa aos princípios da anterioridade e da irretroatividade (CF, art. 150, III, a e b). Asseverou que se deixara de observar o direito introduzido pela Lei 7.730/1989 — que afastara a inflação e revogara o art. 185 da Lei 6.404/1976 e as normas de correção monetária de balanço previstas no Decreto-Lei 2.341/1987 —, porquanto a retroatividade implementada incidira sobre fatos surgidos em período em que inexistente a correção, implicando situação gravosa, ante o surgimento de renda a ser tributada.
CF, art. 102, I, f. EC 1/69, art. 4º, I. CC, art. 447. Decreto-lei 1.164/1971. Decreto-lei 2.375/1987.
A Segunda Turma, por maioria, concedeu, em parte, a ordem em “habeas corpus”, para restabelecer pena fixada em sentença condenatória de primeira instância, mantida, no entanto, a tipificação imposta pelo STM em julgamento de recurso de apelação. No caso, o paciente fora condenado, em primeiro grau, à pena de 1 ano e 6 meses de reclusão, pela suposta prática do crime de falsidade ideológica (CPM, art. 312), por ter supostamente emitido declarações falsas de rendimentos em favor de outros corréus para a obtenção de empréstimos consignados perante a Caixa Econômica Federal. O STM, contudo, dera parcial provimento à apelação interposta pelo Ministério Público para modificar a capitulação para a do delito de uso de documento falso (CPM, art. 315, c/c o art. 311), fixando nova reprimenda em 2 anos de reclusão. A impetração sustentava: a) a incompetência absoluta da Justiça Militar da União, pois a suposta ação delituosa não teria ferido nenhum bem jurídico diretamente relacionado às funções típicas das Forças Armadas, previstas no art. 142 da CF; e b) a inexistência de correlação entre o que fora postulado pelo Ministério Público nas razões da referida apelação e o que fora decidido pela Corte castrense, uma vez que o apelo ministerial teria buscado apenas a modificação da capitulação do delito, sem pedido expresso de aumento da pena imposta ao paciente. Em relação à alegada incompetência da Justiça Militar, a Turma asseverou ser inviável ao STF, em sede de “habeas corpus”, decidir que o crime praticado seria o de estelionato e que, portanto, a vítima seria a Caixa Econômica Federal. Aliás, em momento algum a denúncia teria aludido a prejuízo alheio, elementar normativa do delito previsto no art. 171 do CP. Assim, se a condenação se dera pela prática de uso de documento militar adulterado, previsto no art. 315 do CPM, as condutas voltar-se-iam contra a ordem da administração militar, circunstância configuradora de crime militar impróprio, nos termos do art. 9º, III, a, do CPM. Quanto à alegação de ilegitimidade do aumento, em sede recursal, da pena anteriormente imposta, a Turma assentou que, no caso, seria indevida a majoração em sede de apelação, pois dessa parte não teria recorrido a acusação. O recurso de apelação do Ministério Público teria expressamente consignado que “o apelo ministerial cinge-se unicamente na correção do tipo penal a que o mesmo está incurso, pois sua condenação deve se dar pela prática de uso de documento falso, consoante tipificação do art. 315 do Código Penal Militar, nos exatos termos da fundamentação da sentença recorrida, inclusive quanto ao apenamento ditado pelo Colegiado de 1ª Instância”. O STM, ao dar parcial provimento ao recurso para modificar a adequação típica, como postulado no recurso, desacolhera o pleito relativo à manutenção da reprimenda, aplicando a pena cominada ao crime do art. 315 do CPM. Não se poderia, entretanto, admitir o agravamento da reprimenda, de ofício, pelo STM, ainda que o recurso tivesse sido da acusação. Seria certo que o efeito devolutivo inerente ao recurso de apelação permitiria que o tribunal o apreciasse em exaustivo nível de profundidade. O mesmo não ocorreria, porém, no tocante à sua extensão — limite horizontal —, que deveria se adstringir — sobretudo em se tratando de recurso da acusação — à matéria questionada e ao pedido formulado na petição recursal, ressalvada sempre a possibilidade de concessão de ordem de “habeas corpus” de ofício. Em conclusão, chancelar o ato da Corte revisora que agravara a situação processual do réu sem que a própria acusação a tivesse almejado certamente implicaria violação a princípios básicos do processo penal constitucional. Vencido o Ministro Dias Toffoli, que denegava a ordem por entender que não caberia ao Ministério Público se manifestar sobre qual a pena a ser aplicada no caso em comento, mas, sim, ao Poder Judiciário.
Não atenta contra a coisa julgada o entendimento de que, em face de efetiva alteração do estado de direito superveniente, a sentença anterior, a partir de então, deixa de ter eficácia. Assim, modificadas as premissas originalmente adotadas pela sentença, a cessação de seus efeitos, via de regra, é imediata e automática, sem depender de novo pronunciamento judicial. Não atenta contra a coisa julgada o entendimento de que, em face de efetiva alteração do estado de direito superveniente, a sentença anterior, a partir de então, deixa de ter eficácia. Assim, modificadas as premissas originalmente adotadas pela sentença, a cessação de seus efeitos, via de regra, é imediata e automática, sem depender de novo pronunciamento judicial. Com base nessa orientação, a Segunda Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, deu provimento a agravo regimental para denegar a segurança. Na espécie, o TCU determinara a supressão do percentual de 28,86% dos proventos da impetrante, servidora de universidade federal. Aduzira-se, na impetração, que aquela Corte de Contas, ao assim decidir, teria desrespeitado decisão judicial transitada em julgado, proferida nos autos de ação ordinária, no sentido de estender aos professores daquela universidade o mesmo índice de reajuste salarial (28,86%) anteriormente concedido aos militares pela Lei 8.622/1993 — v. Informativo 749. A Turma apontou que o ato atacado apenas emitira juízo sobre a eficácia temporal da decisão, tendo em vista que, com o advento da Medida Provisória 1.704/1998 e de leis posteriores reestruturadoras da carreira do magistério superior, houvera significativa mudança no estado de direito, não mais subsistindo o quadro fático-normativo que dera suporte à diferença de vencimentos reconhecida em ação judicial transitada em julgado. Asseverou que a coisa julgada atuaria “rebus sic stantibus” e, no caso, restringira-se a garantir o referido reajuste aos vencimentos dos professores, sem mencionar sua necessária incidência também para efeito de proventos de aposentadoria. A coisa julgada deveria ser invocada, a princípio, para efeitos de pagamento de vencimentos, sem significar que, para o cálculo dos proventos, essa proteção jurídica se estendesse desde logo. Nesse sentido, o cômputo seria feito caso a caso, sob pena de reconhecer-se a perpetuação de um direito declarado a ponto de alcançar um instituto jurídico diverso: o instituto dos proventos. Vencido o Ministro Celso de Mello (relator), que negava provimento ao recurso de agravo. Observava que, após proferir seu voto no presente recurso, fizera consignar, em decisões supervenientes, as mesmas razões da tese ora vencedora, porém, mantinha seu voto original nos presentes autos. Precedentes citados: RE 596.663/RJ (DJe de 26.11.2014); MS 26.980 AgR/DF (DJe de 8.5.2014); MS 32.416/DF (DJe de 19.12.2013); MS 30.725/DF (DJe de 22.12.2011).
A Primeira Turma concedeu mandado de segurança para assegurar que serventias extrajudiciais cujas vacâncias estiverem sendo questionadas judicialmente tenham sua inclusão em edital de concurso, mas que não sejam providas até o trânsito em julgado das respectivas decisões. Na espécie, o CNJ determinara que as delegações em relação às quais existissem pendências judiciais, mas que tivessem sido reconhecidas previamente como vagas, seriam incluídas na lista geral de vacâncias. Entretanto, seria imperioso que houvesse advertência pública acerca da condição “sub judice” da delegação ofertada no concurso, de modo que o candidato faria a escolha por sua conta e risco, sem direito a qualquer reclamação posterior caso o resultado da ação judicial correspondente frustrasse sua escolha e seu exercício. A Turma consignou que o princípio da razoabilidade recomendaria que não se desse provimento a serventia cuja vacância estivesse sendo contestada judicialmente, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão. Por conseguinte, a entrega da serventia ao aprovado no certame dependeria do encerramento da lide com o trânsito em julgado das decisões de todos os processos alusivos à referida serventia.
A Primeira Turma deu provimento a recurso ordinário em “habeas corpus” para trancar ação penal por falta de justa causa. No caso, a paciente fora denunciada, em setembro de 2013, por não ter entregado ao seu constituinte valor resultante de reclamação trabalhista. Na denúncia, consignara-se que o prejudicado provocara a instauração de procedimento disciplinar perante a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. Ocorre que, no juizado especial cível, houvera acordo e a recorrente, então ré, assumira a obrigação de realizar o pagamento. O magistrado determinara que se oficiasse à delegacia de polícia, onde apresentada a notícia do crime de apropriação indébita, sobre o referido ajuste. A Turma salientou que o acordo firmado no juízo cível que colocara fim à pendência ocorrera em novembro de 2012 e que a denúncia fora formalizada quase um ano após. Assim, não houvera a indispensável comunicação, sendo o Judiciário acionado pelo Ministério Público. A excepcionalidade da situação seria suficiente para se trancar a ação penal. Consignou, ainda, que a relação jurídica cível repercutira, inclusive, sobre cobrança junto ao juizado especial. Ademais, o acerto de contas teria se dado em data anterior à propositura da ação penal.
A incidência do princípio da insignificância deve ser feita caso a caso. A incidência do princípio da insignificância deve ser feita caso a caso. Essa a orientação do Plenário ao concluir julgamento conjunto de três “habeas corpus” impetrados contra julgados que mantiveram a condenação dos pacientes por crime de furto e afastaram a aplicação do mencionado princípio — v. Informativo 771. No HC 123.108/MG, o paciente fora condenado à pena de um ano de reclusão e dez dias-multa pelo crime de furto simples de chinelo avaliado em R$ 16,00. Embora o bem tenha sido restituído à vítima, o tribunal local não substituíra a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão da reincidência. Nesse caso, o Colegiado, por decisão majoritária, denegou a ordem, mas concedeu “habeas corpus” de ofício para fixar o regime aberto para cumprimento de pena. No HC 123.533/SP, a paciente fora condenada pela prática de furto qualificado de dois sabonetes líquidos íntimos avaliados em R$ 40,00. O tribunal de origem não aplicara o princípio da insignificância em razão do concurso de agentes e a condenara a um ano e dois meses de reclusão, em regime semiaberto e cinco dias-multa. Na espécie, o Pleno, por maioria, denegou a ordem, mas concedeu “habeas corpus” de ofício para fixar o regime aberto para cumprimento de pena. Por fim, no HC 123.734/MG, o paciente fora sentenciado pelo furto de 15 bombons caseiros, avaliados em R$ 30,00. Condenado à pena de detenção em regime inicial aberto, a pena fora substituída por prestação de serviços à comunidade e, não obstante reconhecida a primariedade do réu e a ausência de prejuízo à vítima, o juízo de piso afastara a incidência do princípio da insignificância porque o furto fora praticado mediante escalada e com rompimento de obstáculo. No caso, o Colegiado, por decisão majoritária, denegou a ordem. O Plenário aduziu ser necessário ter presentes as consequências jurídicas e sociais que decorrem do juízo de atipicidade resultante da aplicação do princípio da insignificância. Negar a tipicidade significaria afirmar que, do ponto de vista penal, as condutas seriam lícitas. Além disso, a alternativa de reparação civil da vítima seria possibilidade meramente formal e inviável no mundo prático. Sendo assim, a conduta não seria apenas penalmente lícita, mas imune a qualquer espécie de repressão. Isso estaria em descompasso com o conceito social de justiça, visto que as condutas em questão, embora pudessem ser penalmente irrelevantes, não seriam aceitáveis socialmente. Ante a inação estatal, poder-se-ia chegar à lamentável consequência da justiça privada. Assim, a pretexto de favorecer o agente, a imunização de sua conduta pelo Estado o deixaria exposto a uma situação com repercussões imprevisíveis e mais graves. Desse modo, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade, mormente em se tratando de crimes contra o patrimônio, envolveria juízo muito mais abrangente do que a simples expressão do resultado da conduta. Importaria investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, traduzido pela ausência de periculosidade social, pela mínima ofensividade e pela ausência de reprovabilidade, de modo a impedir que, a pretexto da insignificância do resultado meramente material, acabasse desvirtuado o objetivo do legislador quando formulada a tipificação legal. Aliás, as hipóteses de irrelevância penal não teriam passado despercebidas pela lei, que conteria dispositivos a contemplar a mitigação da pena ou da persecução penal. Para se conduzir à atipicidade da conduta, portanto, seria necessário ir além da irrelevância penal prevista em lei. Seria indispensável averiguar o significado social da ação, a adequação da conduta, a fim de que a finalidade da lei fosse alcançada. No que se refere aos casos em que fora imposto o regime inicial semiaberto para cumprimento de pena, o Colegiado afirmou que seria desproporcional para a reprovação e prevenção quanto à conduta imputada. De acordo com a jurisprudência da Corte, seria necessário valorar os vetores subjetivos a respeito da causa penal (CP, art. 59), no sentido de individualizar a pena. A pena privativa de liberdade deveria se restringir às hipóteses de reconhecida necessidade, tendo em vista seu custo elevado, as consequências deletérias para infratores primários, ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena significação. Haveria situações que, embora enquadráveis no enunciado normativo, não mereceriam as consequências concebidas pelo legislador. Caberia ao intérprete calibrar eventuais excessos e produzir a solução mais harmônica com o sistema jurídico. Dever-se-ia ter presente a regra geral de proporcionalidade, compatível com a natureza e a repercussão do delito. Seria indispensável, porém, que a avaliação se desse caso a caso, pois a uniformização de tratamento não seria desejável, tendo em vista as díspares realidades sociais, econômicas e culturais existentes no País. O Ministro Roberto Barroso (relator) reajustou seu voto. Vencidos, no HC 123.108/MG, a Ministra Rosa Weber e os Ministros Celso de Mello, que concediam a ordem; Edson Fachin, que não conhecia do “habeas corpus”; e Marco Aurélio, que denegava a ordem. Quanto ao HC 123.533/SP, ficaram vencidos os Ministros Celso de Mello e Rosa Weber, que não conheciam do “habeas corpus”, mas concediam a ordem de ofício; Edson Fachin, que não conhecia do “habeas corpus”; e Marco Aurélio, que denegava a ordem. No que se refere ao HC 123.734/MG, ficaram vencidos os Ministros Edson Fachin e Rosa Weber, que não conheciam do “habeas corpus”; e o Ministro Celso de Mello, que concedia a ordem.