Supremo Tribunal Federal • 5 julgados • 20 de abr. de 2022
Não podem ser realizadas junto a instituições financeiras estatais operações financeiras com a finalidade de obtenção de crédito para pagamento de pessoal ativo, inativo e pensionista, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Observa-se que a “regra de ouro” das finanças públicas versada no art. 167, III, da CF/1988 (1), segundo a qual o ente público não deve se endividar mais que o necessário para realizar suas despesas de capital, não impede a contratação de operações de crédito para o custeio de despesas correntes. O estado pode financiar suas despesas de capital mediante receitas de operações de crédito, desde que estas não excedam o montante das despesas de capital. Isso deverá ser observado pelo chefe do Poder Executivo quando fizer a operação financeira autorizada por lei. Ademais, o art. 167, X, da CF (2) não proíbe a concessão de empréstimos para pagamento de pessoal. O dispositivo veda, contudo, que os empréstimos realizados junto a instituições financeiras dos governos federal e estaduais sejam utilizados para aquele fim. Impede-se, portanto, a alocação das receitas obtidas com instituições financeiras estatais para o custeio de pessoal ativo e inativo. Por oportuno, nada impede a realização de empréstimos com instituições financeiras privadas para pagamento de despesas com pessoal, porquanto a proibição não as alcança. Por fim, sob o aspecto formal, em especial sobre eventual desrespeito ao devido processo legislativo, a norma estadual impugnada não possui qualquer vício a comprometer sua constitucionalidade. No caso, o Estado do Rio de Janeiro aprovou lei ordinária que autoriza o Poder Executivo a alienar ações representativas do capital social da Companhia Estadual de Águas e Esgotos – CEDAE, como meio de garantia para obtenção de empréstimo para o pagamento da folha dos servidores ativos, inativos e pensionistas. Com esses entendimentos, o Plenário, por maioria, confirmando a medida cautelar concedida, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade para dar interpretação conforme à CF/1988 ao art. 2º, § 2º, da Lei 7.529/2017 do Estado do Rio de Janeiro. Vencido o ministro André Mendonça. (1) CF/1988: “Art. 167. São vedados: (...) III – a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta;” (2) CF/1988: “Art. 167. São vedados: (...) X – a transferência voluntária de recursos e a concessão de empréstimos, inclusive por antecipação de receita, pelos Governos Federal e Estaduais e suas instituições financeiras, para pagamento de despesas com pessoal ativo, inativo e pensionista, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”
É constitucional a previsão regimental de rito de urgência para proposições que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, descabendo ao Poder Judiciário examinar concretamente as razões que justificam sua adoção. Inexiste violação ao devido processo legislativo, pois as normas dos Regimentos Internos reduzem as formalidades processuais para casos específicos, devidamente reconhecidos pela maioria legislativa, o que é permitido pela própria Constituição. O silêncio constitucional quanto à indicação das Comissões das Casas Legislativas e à definição do momento e oportunidade da intervenção deve ser interpretado como opção pela disciplina regimental, sob pena de inviabilizar os próprios trabalhos legislativos. Portanto, a adoção do rito é matéria interna corporis, sendo defeso ao STF adentrar em tal seara, o que implicaria indevido controle jurisdicional sobre a interpretação do sentido e do alcance de normas meramente regimentais, infringindo o princípio da separação dos Poderes. Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação direta. (1) CF/1988: “Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação. (...) § 2º Às comissões, em razão da matéria de sua competência, cabe: I - discutir e votar projeto de lei que dispensar, na forma do regimento, a competência do Plenário, salvo se houver recurso de um décimo dos membros da Casa; (...)” (2) Precedentes citados: MS 38.199 MC e RE 1.297.884.
A liberdade de expressão existe para a manifestação de opiniões contrárias, jocosas, satíricas e até mesmo errôneas, mas não para opiniões criminosas, discurso de ódio ou atentados contra o Estado Democrático de Direito e a democracia. Não configurada abolitio criminis com relação aos delitos previstos na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983). A liberdade de expressão existe para a manifestação de opiniões contrárias, jocosas, satíricas e até mesmo errôneas, mas não para opiniões criminosas, discurso de ódio ou atentados contra o Estado Democrático de Direito e a democracia. A Constituição garante a liberdade de expressão, com responsabilidade. A liberdade de expressão não pode ser usada para a prática de atividades ilícitas ou para a prática de discursos de ódio, contra a democracia ou contra as instituições. Nesse sentido, são inadmissíveis manifestações proferidas em redes sociais que objetivem a abolição do Estado de Direito e o impedimento, com graves ameaças, do livre exercício de seus poderes constituídos e de suas instituições. Ademais, conforme jurisprudência do STF, a garantia constitucional da imunidade parlamentar (1) incide apenas sobre manifestações proferidas no desempenho da função legislativa ou em razão desta, não sendo possível utilizá-la como escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas. Não configurada abolitio criminis com relação aos delitos previstos na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983). Quando determinada conduta típica (e suas elementares) permanece descrita na nova lei penal, com a manutenção do caráter proibido da conduta, há a configuração do fenômeno processual penal da continuidade normativo-típica. Na hipótese, o legislador não pretendeu abolir as condutas atentatórias à democracia, ao Estado de Direito e ao livre exercício dos poderes. Na realidade, aprimorou, sob o manto democrático, a defesa do Estado, de suas instituições e de seus poderes. Observa-se, assim, a ocorrência de continuidade normativo-típica entre as condutas previstas nos arts. 18 e 23, IV, da Lei 7.170/1983 e a conduta prevista no art. 359-L do CP (com redação dada pela Lei 14.197/2021), bem como entre a conduta prevista no art. 23, II, da Lei 7.170/1983 e o conduta típica prevista no art. 286, parágrafo único, do CP, com redação dada pela Lei 14.197/2021. Com base nesses e em outros fundamentos, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente ação penal. (1) CF: “Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.”
Sociedade de economia mista estadual prestadora exclusiva do serviço público de abastecimento de água potável e coleta e tratamento de esgotos sanitários faz jus à imunidade tributária recíproca sobre impostos federais incidentes sobre patrimônio, renda e serviços. Prevalece na Corte o entendimento de que, para a extensão da imunidade tributária recíproca da Fazenda Pública a sociedades de economia mista e empresas públicas, é necessário preencher 3 (três) requisitos: (i) a prestação de um serviço público; (ii) a ausência do intuito de lucro e (iii) a atuação em regime de exclusividade, ou seja, sem concorrência (1) (2). No caso, os documentos acostados comprovam que, em relação à Companhia de Saneamento de Sergipe – DESO, os requisitos foram atendidos. Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente o pedido para reconhecer a imunidade recíproca à DESO, enquanto mantidos os requisitos. (1) CF/1988: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;” (2) Precedentes citados: RE 599.628; RE 627.242 AgR; e RE 600.867.
A Medida Provisória 144/2003, convertida na Lei 10.848/2004, que dispõe sobre a comercialização de energia elétrica, não viola o art. 246 da Constituição Federal (1) (2). Em primeiro lugar, porque a Emenda Constitucional (EC) 6/1995 não promoveu alteração substancial na disciplina constitucional do setor elétrico, mas, em razão da revogação do art. 171 da CF, restringiu-se a substituir a expressão “empresa brasileira de capital nacional” pela expressão “empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no país”, incluída no § 1º do art. 176 da CF pela EC 6/1995. Com efeito, o setor elétrico já estava, antes dessa alteração, aberto ao capital privado. Houve apenas ampliação colateral em relação às empresas que poderiam ser destinatárias de autorização ou concessão para explorar o serviço. Além disso, a MP não se destinou a dar eficácia às modificações introduzidas pela EC 6/1995, mas a regulamentar o art. 175 da CF, que dispõe sobre o regime de prestação de serviços públicos no setor elétrico. Com base nesses fundamentos, o Plenário, por unanimidade conheceu em parte das ações diretas de constitucionalidade analisadas em conjunto, e, nas partes conhecidas, julgou improcedentes os pedidos. (1) CF: “Art. 246. É vedada a adoção de medida provisória na regulamentação de artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 até a promulgação desta emenda, inclusive.” (2) Precedentes: ADI 2005 MC, ADI 2473 MC, ADI 1518 MC, ADI 1597 MC e ADI 1975 MC.