Supremo Tribunal Federal • 4 julgados • 03 de jun. de 2022
É inconstitucional norma que prevê a incidência do imposto de renda sobre valores percebidos pelo alimentado a título de alimentos ou pensão alimentícia. A materialidade do imposto de renda (IR) está necessariamente ligada à existência de acréscimo patrimonial (1). Nesse contexto, os alimentos ou pensão alimentícia oriundos do direito de família representam, para os alimentados, apenas entrada de valores, pois se revelam como montantes retirados dos acréscimos patrimoniais auferidos pelo alimentante. Assim, o recebimento de renda ou provento de qualquer natureza pelo alimentante - de onde ele retira a parcela a ser paga ao credor dos alimentos - já configura, por si só, fato gerador do IR. Por isso, submeter também os valores recebidos pelo alimentado representa nova incidência do mesmo tributo sobre a mesma realidade, configurando bis in idem camuflado e sem justificação legítima, em evidente violação ao texto constitucional. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, conheceu em parte da ação e, nessa parte, a julgou procedente para dar interpretação conforme a Constituição ao art. 3º, § 1º, da Lei 7.713/1988, aos arts. 4º e 46 do Anexo do Decreto 9.580/2018, e aos arts. 3º, caput e § 1º; e 4º do Decreto-lei 1.301/1973, com o intuito de afastar a incidência do imposto de renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias. (1) Precedente citado: RE 117887.
São inconstitucionais emendas parlamentares estaduais de caráter impositivo em lei orçamentária anteriores à vigência das ECs 86/2015 e 100/2019. Não cabe à Constituição estadual instituir a figura das programações orçamentárias impositivas fora das hipóteses previstas no regramento nacional. São inconstitucionais emendas parlamentares estaduais de caráter impositivo em lei orçamentária anteriores à vigência das ECs 86/2015 e 100/2019. O constituinte do Estado de Roraima, ao inovar e tratar da execução de emendas parlamentares impositivas (individuais ou coletivas), não agiu dentro da competência suplementar permitida na seara da legislação concorrente (1), uma vez que dispôs em sentido contrário às normas gerais federais que efetivamente já existiam à época sobre o tema e que não contemplavam o instituto (2). Além disso, inexiste no ordenamento jurídico brasileiro a figura da constitucionalidade superveniente (3), de modo que não há se falar na consequente convalidação das normas. Não cabe à Constituição estadual instituir a figura das programações orçamentárias impositivas fora das hipóteses previstas no regramento nacional (4). A compreensão doutrinária e jurisprudencial anota que as normas da CF/1988 sobre processo legislativo em geral e processo legislativo das leis orçamentárias em especial são de reprodução obrigatória pelas Constituições estaduais, por força do princípio da simetria (5). No caso, apesar de a CF/1988 ter passado a prever expressamente sobre o tema, fixou limites diferentes dos adotados pelo Estado roraimense. Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, conheceu parcialmente da ação e, nessa parte, a julgou procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 113, §§ 3º, 3º-A, 4º, 6º, 7º, 8º e 9º, da Constituição do Estado de Roraima, acrescidos pelas Emendas Constitucionais 41/2014 e 61/2019, e, por arrastamento, do art. 24, §§ 1º, 2º, 4º, 5º e 6º, da Lei 1.327/2019 (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e do art. 8º da Lei 1.371/2020 (Lei Orçamentária Anual para o exercício de 2020), ambas do Estado de Roraima, mantidos os efeitos da cautelar no período em que vigeu. (1) CF/1988: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; (...) § 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. § 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. § 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. § 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.” (2) Precedente citado: ADI 6129 MC. (3) Precedentes citados: ARE 683849 AgR; e RE 346084. (4) Precedentes citados: ADI 5274; e ADI 2680. (5) Precedente citado: ADI 422.
"É inconstitucional norma estadual de acordo com a qual compete a órgão colegiado do tribunal autorizar oprosseguimento de investigações contra magistrados, por criar prerrogativa não prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional e não extensível a outras autoridades com foro por prerrogativa de função.” É inconstitucional norma estadual que impõe a necessidade de prévia autorização do órgão colegiado do tribunal competente para prosseguir com investigações que objetivam apurar suposta prática de crime cometido por magistrado. Atualmente, a disciplina das matérias institucionais da magistratura nacional decorre da Lei complementar 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN), segundo a qual não há qualquer previsão dessa condicionante para a continuidade das investigações. Também não há se falar, na hipótese, em aplicação da ratio decidendi da ADI 7083. Nesse contexto, a norma estadual impugnada, ao dispor de modo distinto à lei federal, promove indevida inovação, afrontando o art. 93 da CF/1988. Ademais, ofende o princípio da isonomia, pois cria garantia mais extensa aos juízes estaduais mineiros do que a prevista aos demais membros da magistratura nacional e demais autoridades com foro por prerrogativa de função. Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão “na primeira sessão” do art. 90, § 1º, da Lei Complementar 59/2001 do Estado de Minas Gerais, e atribuir interpretação conforme a Constituição à expressão “órgão competente do Tribunal de Justiça”, prevista no mesmo dispositivo, a fim de estabelecer que caberá ao relator autorizar o prosseguimento das investigações.
“São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.” É constitucional norma oriunda de negociação coletiva que, apesar de limitar ou afastar direitos trabalhistas, assegura aos trabalhadores os direitos absolutamente indisponíveis. Os acordos e convenções coletivas devem ser interpretados com base no princípio da equivalência entre os negociantes, de modo que a autonomia coletiva — cujo reconhecimento não significa renúncia ao acesso à Justiça — não pode ser simplesmente substituída pela invocação do princípio protetivo ou da primazia da realidade, oriundos do direito individual trabalhista. Além disso, ajustes acordados com aval sindical são revestidos de boa-fé e a invalidade deles deve ser a exceção, não a regra. A anulação dos acordos, na parte em que supostamente interessa ao empregador, mantidos os ônus assumidos no que diz respeito ao trabalhador, ao mesmo tempo em que viola o art. 7º, XXVI, da CF/1988 (1), leva a um claro desestímulo à negociação coletiva, que deveria ser valorizada e respeitada, especialmente em momentos de crise (2). Conjugada a autonomia coletiva com o princípio da adequação setorial negociada, é possível a disponibilidade dos direitos trabalhistas em acordos e convenções coletivos, desde que resguardado um patamar mínimo civilizatório, o qual é composto, em linhas gerais, pelas normas constitucionais, pelas normas de tratados e convenções internacionais incorporados ao direito brasileiro e pelas normas que, mesmo infraconstitucionais, asseguram garantias mínimas de cidadania aos trabalhadores. No caso, quanto às horas in itinere — cuja questão se vincula diretamente ao salário e à jornada de trabalho —, trata-se de direito disponível, sujeito, portanto, à autonomia da vontade coletiva (3). Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 1.046 da repercussão geral, deu provimento ao recurso. (1) CF/1988: “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;” (2) Precedente citado: RE 590415 (Tema 152 RG). (3) Precedente citado: RE 895759 AgR-segundo.