Supremo Tribunal Federal • 7 julgados • 01 de jul. de 2004
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O Tribunal julgou inquérito em que se pretendia o recebimento de denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra deputado federal e outras três pessoas pela suposta prática do crime de receptação (CP, art. 180: “Adquirir, receber ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro de boa fé a adquira, receba ou oculte:...”). O parlamentar fora denunciado também pela suposta prática do delito de coação no curso do processo (CP, art. 344: “Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou admi-nistrativo, ou em juízo arbitral:...”), por ter orientado testemunha a prestar declarações inverídicas. Um dos outros três acusados, primo do parlamentar, fora denunciado pela suposta prática de falso testemunho (CP, art. 342: “Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade, como testemunha, perito tradutor ou intérprete em processo judicial, policial ou admi-nistrativo, ou em juízo arbitral:...”). O inquérito policial, instaurado pela Polícia Civil de Colinas/MA, apurara incêndio de uma carreta roubada no Município de Monte Alegre de Minas/MG que, anteriormente, estivera na posse do referido parla-mentar, sendo utilizada em sua fazenda. Em relação ao deputado, rejeitou-se a denúncia quanto ao crime de coação no curso do processo, em razão da inexistência de indícios do emprego de ameaça física ou moral, exigidos pelo tipo penal e, por maioria, recebeu-se a denúncia relativamente aos crimes de receptação, por se entender estar demonstrado que o acusado tinha ciência da origem ilícita do veículo, e de falso testemunho, pelo fato capitulado como coação no curso do processo. Vencidos, em parte, os Ministros Carlos Britto, relator, e Marco Aurélio, que rejeitavam a denúncia quanto ao crime de falso testemunho por considerarem que a retratação da testemunha implicaria no desaparecimento do objeto jurídico tutelado, o que alcançaria o co-autor. Quanto ao primo do parlamentar, acusado de receptação e falso testemunho, recebeu-se a denúncia em relação apenas ao primeiro crime, também em face dos indícios do conhecimento pelo acusado da origem ilícita do veícu-lo, e rejeitou-se a denúncia quanto ao segundo, porquanto não teria havido a descrição concreta do testemunho prestado, não sendo possível saber em que depoimento o acusado teria faltado com a verdade, não estando presentes, outrossim, elementos que pudessem caracterizar o relevo do depoimento e suas implicações diante do processo em que prestado. Em relação aos demais acusados, o Tribunal rejeitou a denúncia em sua totalidade por inexistência de indícios mínimos de autoria.
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário no qual se discutia a competência tributária quanto ao sujeito ativo do ICMS, na hipótese de importação de mercadoria, por estabelecimento localizado em determinado Estado, que ingressa no território nacional em outro Estado em que localizado o estabelecimento para o qual houve revenda do produto. Tratava-se, na espécie, de recurso interposto pelo Estado do Rio de Janeiro contra acórdão do tribunal de justiça local que entendera ser o Estado de Pernambuco o beneficiário do referido imposto, haja vista ser o local em que situado o estabeleci-mento destinatário da mercadoria importada, independentemente do desembaraço aduaneiro ter se dado no Estado recorrente. O recorrente alegava ofensa ao art. 155, §2º, IX, a, da CF, tendo em vista ser a localidade efetiva do estabelecimento destinatário da mercadoria — v. Informativo 353. A Turma negou provimento ao recurso extraordinário por entender que o sujeito ativo da relação tributária é o Estado de Pernambuco, uma vez que, em se tratando de operação iniciada no exterior, o ICMS é devido ao Estado em que está localizado o destinatário jurídico do bem, isto é, o importador. Assim, o ICMS incidente na importação de mercadoria não tem como sujeito ativo da relação jurídico-tributária o Estado onde ocorreu o desembaraço aduaneiro, mas o Estado onde situado o sujeito passivo do tributo, qual seja, aquele que promoveu juridicamente o ingresso do produto.
A Turma deu parcial provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do TJ/RS que convertera imediatamente pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade, em decorrência da notícia de prisão em flagrante do recorrente pela prática de outro delito cometido durante o cumprimento daquela. Entendeu-se que somente após a superveniência de nova condenação seria possível decidir sobre a conversão, a teor do disposto no §5º do art. 44 do CP (“Sobrevindo con-denação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.”). Em razão da incompatibilidade da continuidade da execução da pena de prestação de serviço, concluiu-se pela suspensão da mesma e a aplicação, relativamente à prescrição, do disposto no parágrafo único do art. 116 do CP (“Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo.”).
A Turma indeferiu pedido de habeas corpus impetrado em favor de militar acusado da prática de crime de deserção (CPM, art. 187: “Ausentar-se o militar, sem licença, da unidade em que serve, ou do lugar em que deve permanecer, por mais de oito dias...”), no qual se pretendia afastar acórdão do STM - Superior Tribunal Militar que, sob o fundamento de falta de amparo legal, denegara outro writ em que se pleiteava o direito do paciente desertor de não se ver preso e poder responder processo contra ele instaurado em liberdade sob a alegação de falta de justa causa ou abuso de poder em razão de se encontrar com Síndrome de Deficiência Imunológica (SIDA). Rejeitou-se a preliminar de inviabilidade do writ, suscitada pela autoridade impetrada, em face de não haver sido instada a pronunciar-se sobre a matéria constitucional apontada neste processo, tendo em vista a desnecessidade de prequestionamento na espécie. Repeliu-se a alegação da Defensoria Pública no sentido de que o CPM, no que diz respeito à vedação de liberdade provisória, não teria sido recepcionado pela CF (art. 5º, LXVI: “ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;”). Entendeu-se que o art. 5º, LXI, da CF, ao disciplinar a prisão e jungi-la ao flagrante delito ou à ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, ressalvou os casos de transgressão militar ou crime propriamente militar definidos em lei. Concluiu-se, dessa forma, ressaltando o caráter de permanência do delito de deserção, correta a aplicação da legislação especial, salientando-se que o art. 457, do CPPM, estabelece que o desertor sem estabilidade que se apresentar ou for capturado deve ser submetido à inspeção de saúde e, considerado apto para o serviço militar, será reincluído.
A Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do TRF da 5ª Região para declarar a constitucionalidade do art. 3º, do Decreto-Lei 2.396/87, e suas modificações pelo Decreto-Lei 2.419/88, que dispuseram sobre a cobrança trimestral do imposto de renda de contribuintes que tenham recebido de mais de uma fonte pagadora. O aresto recorrido, com base nos princípios da legalidade, da anterioridade e da indelegabilidade, inscritos na CF/69, entendera que a regra do mencionado artigo delegara indevidamente ao Ministro da Fazenda competência para fixar alíquota e base de cálculo do imposto de renda, bem como indevida a cobrança trimestral do tributo. Consideraram-se inexistentes a referida delegação e a alegada ofensa ao princípio da reserva legal, uma vez que o item 5º do art. 3º do Decreto-Lei 2.396/87 preconiza expressamente que o cálculo do imposto será feito com base na tabela constante do art. 6º do mencionado diploma legal, estando, por este, devidamente delineados os elementos constitutivos da exação. Esclareceu-se que a locução “baixadas pelo Ministro da Fazenda” refere-se apenas à palavra “instruções”, cuja edição não era vedada pela Carta pretérita. Asseverou-se que a Instrução Normativa tida pelo acórdão recorrido como a disciplinar indevidamente o imposto de renda (IN 62/88) nada instituiu em desfavor do contribuinte, revelando-se exclusivamente expletiva dos tipos de rendimentos que não estariam enquadrados na exigência do recolhimento trimestral, reproduzindo fielmente as faixas de alíquotas já estabelecidas pelo Decreto-Lei 2.396/87. Entendeu-se improcedente a assertiva de que a sistemática de recolhimento do imposto de renda — na fonte, mês a mês ou de forma trimestral — consubstanciaria irregular instituição de empréstimo compulsório, porquanto, ao fim de cada ano, o contribuinte realizava o ajuste pertinente, apurando a existência de imposto a restituir ou pagar, e avaliando se o valor recolhido antecipadamente fora inferior ou superior àquele efetivamente devido. Ressaltou-se a constitucionalidade da exigência do recolhimento fracionado (sistema de bases correntes), conforme se concretizem as hipóteses de incidência do imposto durante o ano, desde que mantida a oportunidade de verificação final da imposição tributária (ajuste anual). Afastou-se a apontada violação ao princípio da anterioridade, haja vista que o Decreto-Lei 2.396/87 foi publicado no DOU em 22.12.87 para ser aplicado no ano de 1988, ou seja, somente no exercício seguinte ao da sua veiculação pela im-prensa oficial, em total conformidade com a norma do art. 153, §29, da CF/69. Salientou-se que o art. 2º do Decreto-Lei 2.419/88 efetuou a correção monetária dos valores das faixas de rendimentos constantes da tabela do art. 6º do Decreto-Lei 2.396/87, o que não representou majoração da alíquota ou da base de cálculo do tributo, mas beneficio ao contribuinte em razão de adotar valores maiores para cada faixa de rendimento e, conseqüentemente, ampliação do rol dos isentos e redução do valor a ser pago. Concluiu-se que a modificação realizada pelos arts. 4º e 5º do Decreto-Lei 2.419/88 nos itens 4º e 5º do art. 3º do Decreto-Lei 2.396/87 apenas revelou melhora na técnica da redação primitiva, bem como o elastério da faixa de contribuintes que, apesar de possuírem duas fontes de rendimentos, estavam dispensados do recolhimento trimestral.
A Turma concluiu julgamento de habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, impetrado contra acórdão do STJ que denegara igual medida, sob fundamento de inviabilidade de reexame minucioso da prova na sede eleita. Tratava-se, na espécie, de condenado por corrupção ativa, em ação penal originária ajuizada perante o TJ/RJ, que pretendia a anulação da decisão condenatória, sob as alegações de ausência de vinculação entre ele e os fatos que ensejaram a sua condenação e de impossibilidade de condenação do corruptor diante da absolvição do corrompido — v. Informativos 349, 352 e 353. Conheceu-se do pedido, por se entender que o STJ teria analisado o mérito da impetração e, por maioria, denegou-se a ordem por estas razões: 1) a existência de prova suficiente para a condenação do paciente pela prática da participação em crime de corrupção ativa; 2) o fato de ter o paciente gerido um fundo destinado à distribuição de propina que era efetivada por intermedi-ários; 3) a existência de condenação de diversas pessoas por corrupção passiva, tanto nos autos principais quanto nos autos em que o paciente figurou como réu, em razão de terem recebido propina proveniente do fundo gerido pelo paciente, o que afastaria a tese de ofensa ao princípio da bilateralidade. Vencido, em parte, o Ministro Cezar Peluso, que concedia o habeas corpus, de ofício, para devolver o julgamento da impetração ao Superior Tribunal de Justiça para exame do mérito de dois fundamentos do habeas corpus impetrado perante aquela Corte.
A Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pretendia que a prescrição da pretensão executória fosse calculada com base no saldo da pena a cumprir, descontados os dias em que o réu estivera preso cautelarmente. No caso, o recorrente fora preso em flagrante delito e condenado à pena privativa de liberdade, sendo esta substituída por restritiva de direitos e, posteriormente, convertida em pena privativa de liberdade em virtude do não cumprimento da pena imposta. Considerou-se que a pretensão do recorrente implicaria em alteração da norma prevista no art. 110, caput, do CP (“A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente”). Concluiu-se que a norma prevista no art. 113 do CP (“No caso de evadir-se o condenado ou de revogar-se o livramento condicional, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena”) possui aplicação restrita às hipóteses nela previstas e que, na espécie, o recorrente desaparecera antes do cumprimento da pena. Ressaltou-se, ainda, que a detração penal somente é feita quando do cumprimento da pena e esta, no caso, sequer fora iniciada. Precedente citado: HC 69865/PR (DJU de 27.11.93).