Supremo Tribunal Federal • 7 julgados • 07 de mar. de 2006
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Com base no julgamento da ADI 2797/DF (acórdão pendente de publicação), no qual fora reconhecida a inconstitucionalidade dos parágrafos 1º e 2º do art. 84 do CPP, inseridos pela Lei 10.628/2002, a Turma deferiu habeas corpus para invalidar condenação penal imposta, pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, a ex-prefeito, por crime de responsabilidade (Decreto-lei 201/67, art 1º, I). Tendo em conta que, naquele julgamento, não fora procedida a modulação, no tempo, dos efeitos da declaração concentrada de inconstitucionalidade, prevalecendo, portanto, a eficácia normal, isto é, ex tunc, anulou-se o acórdão impugnado, por se entender que o paciente fora julgado por órgão incompetente, uma vez que não mais ostentava a condição de prefeito quando proferida a decisão. Em conseqüência, determinou-se a remessa dos autos ao juízo natural da causa, ou seja, a magistrado de primeira instância competente, nos termos da Lei de Organização Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, para processar e julgar o paciente.
A Turma concluiu julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que se pleiteava a extensão aos recorrentes, condenados pela justiça militar, dos efeitos de sentença absolutória proferida, pela justiça comum, em favor de um dos co-réus — v. Informativo 415. Afastou-se a pretendida aplicação do art. 580 do CPP ao fundamento de que, no caso concreto, tratava-se de decisões proferidas por órgãos judiciários distintos e que ambas as sentenças se lastrearam nos elementos probatórios disponíveis para motivar devidamente as conclusões. Entendeu-se que se requeria a reapreciação de provas, inviável tanto em HC quanto em seu recurso.
A Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto por empresa aérea contra acórdão da Turma Recursal dos Juizados Especiais Cível e Criminal de Natal/RN que entendera que, no conflito entre normas do Código de Defesa do Consumidor - CDC e da Convenção de Varsóvia sobre a prescrição, em ação de indenização do passageiro contra empresa aérea, prevalecem as disposições mais favoráveis do Código, que estabelecem o prazo prescricional de cinco anos. A recorrente sustentava ofensa aos artigos 5º, § 2º, e 178 da CF. Na linha do que firmado no julgamento do RE 214349/RJ (DJU de 11.6.99), afastou-se a apontada violação ao art. 5º, § 2º, da CF, por se entender que ele se refere a tratados internacionais relativos a direitos e garantias fundamentais, matéria não objeto da Convenção de Varsóvia, a qual trata da limitação da responsabilidade civil do transportador aéreo internacional. Considerou-se, entretanto, que, embora válida a norma do CDC quanto aos consumidores em geral, no caso de contrato de transporte internacional aéreo, em obediência ao disposto no art. 178 da CF (“A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade”), prevalece o que dispõe a Convenção de Varsóvia, que estabelece o prazo prescricional de dois anos.
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia trancamento de inquérito policial instaurado para investigação de suposto crime contra a ordem econômica. No caso concreto, fora instaurado inquérito policial, a partir documentos fiscais apreendidos pelo Fisco, no interior de uma empresa, sem prévia autorização judicial. O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná deferira habeas corpus para trancar o inquérito, por reconhecer ter havido ofensa ao sigilo fiscal, ressalvando, no entanto, que “nova investigação poderia ser iniciada, caso concedida a necessária autorização do Poder Judiciário para o acesso aos dados sigilosos”. Além disso, a impetrante conseguira também a devolução dos documentos apreendidos. Com base nessa mesma documentação, obtida posteriormente por meio de quebra de sigilo fiscal, fora instaurado novo inquérito policial, a pedido do Ministério Público, contra o qual impetrado este habeas corpus. Alegava a impetração que, por ser a documentação que ensejara o segundo inquérito a mesma obtida irregularmente no primeiro, aquele estaria contaminado pelo referido vício. Entendeu-se que a segunda apreensão estaria legitimada pela citada ressalva do acórdão do TJ local, pois precedida de autorização judicial. Salientou-se ser questionável, até mesmo, a alegada ilicitude da primeira apreensão, haja vista que, nos termos dos artigos 195 e 198, § 3º, I do CTN, não há vedação nem quanto ao ingresso do Fisco em empresa contribuinte no exercício de sua função de fiscalização, nem quanto à divulgação de informações relativas a representações fiscais para fins penais. Vencido o Min. Celso de Mello que deferia o writ por entender que o segundo inquérito fora instaurado a partir de dados contaminados na origem, presente, assim, a ilicitude por derivação.
A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenada pela prática, em concurso de agentes, de tráfico ilícito de entorpecentes (Lei 6.368/76, artigos 12 e 18, III) para fixar o regime inicialmente fechado de cumprimento da reprimenda imposta à paciente, com a ressalva de que a efetivação da pretendida progressão dependerá do preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos que a referida lei prevê, cujo exame cabe ao juízo da execução. Aplicou-se, ao caso, a orientação firmada pelo Plenário no julgamento do HC 82959/SP (acórdão pendente de publicação), no sentido da inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos crimes hediondos definidos no art. 1º da mesma Lei. Em questão de ordem suscitada pelo Min. Cezar Peluso, decidiu-se, ainda, que, em casos similares, quando se cuidar exclusivamente da declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da aludida Lei 8.072/90, a concessão da ordem poderá fazer-se por decisão individual do relator. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, por entender incabível a utilização analógica do art. 557 do CPC em habeas corpus.
Em conclusão de julgamento, a Turma, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, aplicando o princípio da responsabilidade objetiva do Estado, julgara procedente pedido formulado em ação indenizatória movida por vítimas de ameaça e de estupro praticados por foragido do sistema penitenciário estadual, sob o fundamento de falha do Estado na fiscalização do cumprimento da pena pelo autor do fato, que, apesar de ter fugido sete vezes, não fora sujeito à regressão de regime — v. Informativos 391 e 399. Afastou-se, na espécie, semelhanças do caso concreto com precedentes do Supremo em que rejeitada a responsabilidade do Estado em razão de ato omissivo. Considerou-se caracterizada a falha do serviço, a ensejar a responsabilidade civil do Estado recorrente, bem como entendeu-se presente o nexo causal entre a fuga do apenado e o dano sofrido pelas recorrentes, haja vista que, se a Lei de Execução Penal houvesse sido aplicada com um mínimo de rigor, o condenado dificilmente teria continuado a cumprir pena nas mesmas condições que originariamente lhe foram impostas e, por conseguinte, não teria a oportunidade de evadir-se pela oitava vez e cometer o delito em horário no qual deveria estar recolhido ao presídio. Vencido o Min. Carlos Velloso que dava provimento ao recurso. Precedentes citados: RE 130764/PR (DJU de 7.8.92); RE 172025/RJ (DJU de 19.12.96); RE 136247/RJ (DJU de 18.8.2000).
Em face da singularidade do caso, a Turma, por maioria, deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto contra acórdão do STJ que, em julgamento de segundos embargos de declaração opostos em recurso especial, aplicara à recorrente multa de 1% sobre o valor da causa originária. Na espécie, a referida multa fora cominada (CPC, art. 538, parágrafo único), porquanto o Tribunal a quo entendera que a persistência da empresa aproximava-se da litigância de má-fé. Contra essa decisão, a empresa interpusera recurso extraordinário e impetrara mandado de segurança, este com o objetivo de afastar a sanção financeira incidente sobre ação de dissolução de sociedade, a qual envolve milhões de dólares. O relator negara seguimento ao writ por entender imprópria a via utilizada, aplicando o Enunciado da Súmula 121 do TFR (“Não cabe mandado de segurança contra ato ou decisão de natureza jurisdicional, emanado de Relator ou Presidente de Turma”). Esse posicionamento fora mantido no julgamento sucessivo de agravo regimental e de embargos de declaração. Sustentava-se, na hipótese, o cabimento do mandado de segurança como instrumento processual apto à discussão do tema, sob o fundamento de que o acórdão impugnado, no trecho em que impusera a multa, revestia-se de natureza administrativa, já que decorrente do exercício do poder de polícia do juiz. Afastou-se a alegada natureza administrativa do acórdão recorrido. No tocante ao poder de polícia, ressaltou-se que, no âmbito do Poder Judiciário, essa prerrogativa é mais utilizada na direção e disciplina do processo e que, na espécie, a sanção alcançara o patrimônio do recorrente, que o seu beneficiário não seria o erário, e sim o recorrido e que essa multa não constituiria, necessariamente, obstáculo aos movimentos ou a outros recursos da parte sucumbente. Concluiu-se que a imposição da multa decorrera do poder jurisdicional do magistrado, mostrando-se, a princípio, inatacável por meio de ação mandamental, a teor da Lei 1.533/51 e do Enunciado da Súmula 267 do STF (“Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição”). Apesar dessas previsões, afirmou-se que a oposição de novos embargos de declaração ensejaria a elevação da multa para 10% do valor da causa, ficando a interposição de outro recurso condicionada ao depósito do valor respectivo. Ademais, o recorrente fora surpreendido com a aplicação da multa num momento em que o STJ exauria a sua jurisdição, não estando presentes os pressupostos necessários à interposição de recurso extraordinário, nesse ponto. Dessarte, restava-lhe, apenas, o mandado de segurança para evitar que a condenação se consumasse com um único julgamento. Assim, considerando estar-se diante de ato que não poderia ser impugnado de outro modo, entendeu-se que a impetrante estaria amparada pela garantia da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV). Vencido o Min. Marco Aurélio que negava provimento ao recurso ao fundamento de que a decisão do STJ impondo a multa, porque não mais impugnável mediante qualquer recurso, transitara em julgado e, desse modo, o mandado de segurança ganharia contornos de ação rescisória. RMS provido para determinar o retorno dos autos ao STJ para que este processe e julgue o mandado de segurança conforme entender de direito, nos termos da alínea b do inciso I do art. 105 da CF.