Supremo Tribunal Federal • 8 julgados • 14 de set. de 2006
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Por ausência de direito líquido e certo, o Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado contra ato do Procurador-Geral da República que culminara na demissão de servidora pública, por ter procedido de forma desidiosa. A impetrante pleiteava, na espécie, a reintegração ao cargo que ocupava, sob alegação de nulidade na composição da comissão disciplinar, presidida por promotor de justiça, e de que estaria grávida quando demitida. Tendo em conta que os membros do parquet, como agentes públicos, são servidores públicos em sentido amplo, entendeu-se que a designação do referido promotor cumprira todos os requisitos exigidos pelo art. 149 da Lei 8.112/90, quais sejam, servidor estável; designado por autoridade competente; e com nível de escolaridade igual ou superior ao do indiciado. Rejeitou-se, de igual modo, o argumento de estabilidade provisória da gestante (ADCT, art. 10, II, b), por se considerar que a demissão ocorrera por justa causa. Asseverou-se que a dispensa da impetrante não fora arbitrária, pois precedida de processo administrativo disciplinar, no qual garantidos ampla defesa e contraditório. O Min. Marco Aurélio ressaltou, em seu voto, que o citado art. 10, II, b do ADCT não se aplica às servidoras públicas (ADCT, art. 10, II: “fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa... b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”).
O Tribunal, por maioria, deu parcial provimento a recurso extraordinário e declarou a inconstitucionalidade da cláusula quinta do Convênio ICMS 10/89, o qual autoriza o recolhimento desse imposto pelo sistema de substituição tributária progressiva, sobre produtos derivados de petróleo e demais combustíveis e lubrificantes. Sustentava-se, na espécie: a) ofensa ao princípio da irretroatividade tributária, haja vista que, em razão de a publicação do referido convênio ter se dado em 30.3.89, não poderia prevalecer a regra de sua cláusula quinta que determina a aplicação de suas disposições a partir de 1º.3.89; b) não-incidência de ICMS sobre operações de remessa de combustíveis a outros Estados, em face do disposto no art. 155, § 2º, X, b, da CF; c) ofensa ao art. 146, a e b, da CF, já que o sistema de substituição só poderia ter sido criado por lei complementar. Inicialmente, ressaltou-se a orientação fixada pela Corte no julgamento do RE 213396/SP (DJU de 1º.12.2000), no qual, analisando legislação anterior à EC 3/93, reconhecera a constitucionalidade do sistema de substituição tributária para frente. No que se refere à alegação relativa à imunidade de incidência do ICMS por força da norma do art. 155, § 2º, X, b, da CF, considerou-se ausente o requisito do prequestionamento. Quanto à aplicação da norma a partir de 1º.3.89, entendeu-se violado o princípio da irretroatividade, visto que, por se tratar do sistema de substituição tributária para frente, não se poderia retroagir de modo a imputar, de forma pretérita, a condição de responsável tributário a quem não detinha esse ônus no momento que, posteriormente, viria a ser definido pela lei como o do nascimento da obrigação tributária. Esclareceu-se, ainda, que o aludido convênio sequer instituiu a substituição tributária das empresas distribuidoras de combustíveis, pelo ICMS devido por revendedores varejistas, restringindo-se a autorizar o legislador estadual a fazê-lo, definindo, como o momento em que devida a antecipação do tributo, a saída da mercadoria do estabelecimento do distribuidor. Vencido o Min. Marco Aurélio que dava provimento integral ao recurso, por considerar, também, que a matéria não poderia ter sido tratada, antes da EC 3/93, por convênio.
O Tribunal, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que concedera liminar em reclamação para suspender os efeitos do acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe que julgara improcedente ação rescisória. Pretendia-se, nesta, a desconstituição de acórdão do TJSE que, com base na medida cautelar concedida pelo STF na ADI 1851/AL (DJU de 22.11.2002), suspendendo a eficácia do Convênio ICMS 13/97, garantira, à empresa agravante, o direito de ser compensada do tributo recolhido a maior em regime de substituição tributária. Alega o Estado de Sergipe, reclamante, ofensa à autoridade da decisão de mérito dessa ADI, na qual se reconhecera a constitucionalidade do aludido Convênio. Afastou-se, inicialmente, o argumento da agravante de que a decisão proferida na ADI não poderia retrotrair para alcançar decisão coberta pelo manto da coisa julgada, tendo em conta a jurisprudência da Corte quanto à eficácia ex tunc, como regra, da decisão proferida em controle concentrado, a legitimar a ação rescisória de sentença que, mesmo anterior, lhe seja contrária. Ressaltou-se, no ponto, decorrer a rescindibilidade do acórdão conflitante do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais e da conseqüente prevalência da orientação fixada pelo STF. Pelos mesmos fundamentos, rejeitou-se a alegação de que não se poderia aplicar o entendimento firmado na mencionada ADI porque, no momento em que prolatada a decisão favorável à contribuinte, tal entendimento ainda não possuía força cogente e normativa. Da mesma forma, não se acolheu a assertiva de que o acórdão da ação rescisória estaria a tratar da aplicação do direito constitucional no tempo e não da substituição tributária para frente, por se entender que o critério de aplicação da interpretação constitucional no tempo seria irrelevante para os efeitos da reclamação. Por fim, considerou-se que seria equivocado o argumento de que os votos proferidos na ADI 2777/SP e na ADI 2675/PE, acerca da inteligência do art. 150, § 7º, da CF, seriam favoráveis aos contribuintes, devendo, por isso, aguardar-se seu julgamento definitivo. Asseverou-se que, na ADI 1851/AL, a substituição tributária, baseada no Convênio ICMS 13/97, é facultativa e consiste em benefício fiscal aos optantes, enquanto que a substituição tributária analisada nas outras ações diretas mencionadas é obrigatória e caracterizada como técnica de arrecadação do ICMS. Por isso, não haveria possibilidade de haver interpretações colidentes, no caso de prevalecer o entendimento dos votos proferidos nas últimas, mas fixação ou revelação de regra geral, no sentido de que o art. 150, § 7º, da CF impõe a devolução da diferença a maior entre o valor devido e o efetivamente recolhido pela técnica de substituição, mesmo quando o fato gerador seja de valor inferior ao presumido (ADI 2777/SP e 2675/PE), e subsistência de regra específica, qual seja, a de ser constitucional a não devolução da diferença quando facultativa a substituição tributária e atrelada a figura de benefício fiscal (ADI 1851/AL). Vencido o Min. Marco Aurélio que dava provimento ao agravo regimental, por não vislumbrar, na espécie, a alegada ofensa à autoridade da decisão do STF, já que, quando do julgamento do acórdão rescindendo, não havia eficácia do dispositivo apontado na rescisória como infringido.
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade do art. 152, incisos I a VIII, da Constituição do Estado do Maranhão, que estabelece critério de fixação de número de vereadores em proporção com a população do município. Adotou-se a orientação firmada pela Corte no sentido de que compete ao município fixar o número de vereadores, que será proporcional à população, observados os limites estabelecidos na Constituição Federal (CF, art. 29, IV). Asseverou-se, ademais, não ter sido observado o critério aritmético para o cálculo dessa proporcionalidade eleito pelo Tribunal quando do julgamento do RE 197917/SP (DJU de 7.5.2004). Outros precedentes citados: ADI 1038 MC/TO (DJU de 6.5.94); ADI 692/GO (DJU de 1º.10.2004).
O Tribunal deferiu, em parte, pedido de extradição, formalizado pelo Governo de Portugal, de nacional português condenado pela prática dos crimes de falsidade informática e de burla informática, previstos, respectivamente, no art. 4º, nº 1, da Lei 109/91 e no art. 221, nºs 1 e 5, alínea a, do Código Penal português (CP português, art. 221: “1. Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, causar a outra pessoa prejuízo patrimonial, interferindo no resultado do tratamento de dados ou mediante estruturação incorrecta de programa informático, utilização incorrecta ou incompleta de dados, utilização de dados sem autorização ou intervenção por qualquer outro modo não autorizada no processamento...”). Entendeu-se que o crime de burla informática, apesar de ser delito de execução vinculada, equipara-se ao crime de burla tipificado, em termos genéricos, no art. 217 do CP português, e se amolda ao crime de estelionato, previsto no art. 171 do Código Penal brasileiro. Asseverou-se que esse tipo específico supõe que a fraude, enquanto requisito elementar do delito, ocorra mediante meio engenhoso capaz de enganar ou induzir a erro, e tem como elemento subjetivo o dolo, consistente na intenção de enriquecimento ilícito em prejuízo patrimonial alheio. Por outro lado, considerou-se que o crime de falsidade informática, em face da especialidade dos elementos normativos que o compõem, não encontra correspondente na legislação brasileira.
A Turma, em julgamento conjunto, indeferiu, por maioria, três habeas corpus em que policiais militares pleiteavam a revogação da custódia cautelar contra eles decretada, ao argumento de ausência de fundamentação, bem como de suspeição do juiz que os pronunciara por homicídio de magistrado. Entendeu-se, na espécie, que as declarações dadas à imprensa pelo juiz a respeito da morte de um colega de ofício não implicaram a sua suspeição. Considerou-se, também, que a custódia, cuja sentença de pronúncia confirmara o decreto prisional, estaria fundada na manutenção da ordem pública. Asseverou-se que, no caso, a excepcionalidade da situação vivenciada no Estado do Espírito Santo, onde há forte atuação do crime organizado, respaldaria a permanência dos motivos ensejadores da prisão. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, relator, que, ressaltando a generalidade e a abstração do decreto, deferia parcialmente o writ por inobservância dos requisitos previstos no art. 312 do CPP. Em seguida, a Turma também indeferiu, por votação majoritária, a concessão da ordem, de ofício, por não vislumbrar excesso de prazo nas prisões preventivas, que duram quase três anos, haja vista a complexidade do caso e o envolvimento de vários réus.
Aplica-se à Fazenda Pública a exigência de comprovação do depósito da multa de que trata o parágrafo 2º do art. 557 do CPC (“§ 2o Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor.”). Com base nesse entendimento, a Turma não conheceu de embargos de declaração em agravo regimental em recurso extraordinário opostos pelo Município do Rio de Janeiro por ausência de comprovação do mencionado requisito, indispensável à admissibilidade de novos recursos.
A Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de um dos líderes de organização criminosa, denunciado, com terceiros, pela suposta prática dos crimes de furto qualificado, formação de quadrilha e violação de sigilo bancário em decorrência da subtração de valores, por intermédio da internet, de contas de correntistas da Caixa Econômica Federal - CEF e de outras instituições financeiras. No caso, a prisão preventiva do paciente fora decretada com base na conveniência da instrução criminal e na garantia da ordem pública, sendo mantida tanto pelo TRF da 1ª Região quanto pelo STJ. Alegava-se, na espécie, ausência de fundamentação da custódia e excesso de prazo para a formação da culpa e conclusão do processo. Rejeitou-se o argumento de falta de fundamentação, ao entendimento de que, no ponto, o decreto atendera as condições previstas nos artigos 41 e 43 do CPP e indicara, de modo expresso, a garantia da ordem pública como motivo da prisão preventiva (CPP, art. 312). Acerca desse requisito, asseverou-se que este envolve, em linhas gerais, as seguintes circunstâncias principais: a) necessidade de resguardar a integridade física do paciente; b) objetivo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde que lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e c) propósito de assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial o Poder Judiciário, no sentido da adoção tempestiva de medidas adequadas, eficazes e fundamentadas quanto à visibilidade e transparência da implementação de políticas públicas de persecução criminal. Nesse sentido, aduziu-se que o juízo federal de 1º grau apresentara elementos concretos suficientes para efetivar a garantia da ordem pública: a função de direção desempenhada pelo paciente na organização; a ramificação das atividades criminosas em diversas unidades da federação; e a alta probabilidade de reiteração delituosa, haja vista a potencialidade da utilização ampla do meio tecnológico sistematicamente empregado pela quadrilha. Por fim, considerou-se não configurado o excesso de prazo, tendo em conta a complexidade da causa, o envolvimento de vários réus, bem como a contribuição da defesa para a demora processual.