Este julgado integra o
Informativo STF nº 644
Em conclusão de julgamento, o Plenário, ante empate na votação, desproveu recurso extraordinário em que se discutia a aplicabilidade, ou não, da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 sobre condenações fixadas com base no art. 12, caput, da Lei 6.368/76, diploma normativo este vigente à época da prática do delito — v. Informativos 611 e 628. Além disso, assentou-se a manutenção da ordem de habeas corpus, concedida no STJ em favor do ora recorrido, que originara o recurso. Na espécie, o recorrente, Ministério Público Federal, alegava afronta ao art. 5º, XL, da CF (“a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”), ao argumento de que a combinação de regras mais benignas de 2 sistemas legislativos diversos formaria uma terceira lei. Aduziu-se que a expressão “lei” contida no princípio insculpido no mencionado inciso referir-se-ia à norma penal, considerada como dispositivo isolado inserido em determinado diploma de lei. No ponto, destacou-se que a discussão estaria na combinação de normas penais que se friccionassem no tempo. Afirmou-se, ademais, que a Constituição vedaria a mistura de normas penais que, ao dispor sobre o mesmo instituto legal, contrapusessem-se temporalmente. Nesse sentido, reputou-se que o fato de a Lei 11.343/2006 ter criado a figura do pequeno traficante, a merecer tratamento diferenciado — não contemplada na legislação anterior — não implicaria conflito de normas, tampouco mescla, visto que a minorante seria inédita, sem contraposição a qualquer regra pretérita. Por se tratar de pedido de writ na origem e em vista de todos os atuais Ministros do STF terem votado, resolveu-se aplicar ao caso concreto o presente resultado por ser mais favorável ao paciente com fundamento no art. 146, parágrafo único, do RISTF (“Parágrafo único. No julgamento de habeas corpus e de recursos de habeas corpus proclamar-se-á, na hipótese de empate, a decisão mais favorável ao paciente”). Nesse tocante, advertiu-se que, apesar de a repercussão geral ter sido reconhecida, em decorrência da peculiaridade da situação, a temática constitucional em apreço não fora consolidada. O Min. Cezar Peluso, Presidente, frisou o teor do voto proferido pela 2ª Turma no julgamento do HC 95435/RS (DJe de 7.11.2008), no sentido de entender que aplicar a causa de diminuição não significaria baralhar e confundir normas, uma vez que o juiz, ao assim proceder, não criaria lei nova, apenas se movimentaria dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente possível. Além disso, consignou que se deveria cumprir a finalidade e a ratio do princípio, para que fosse dada correta resposta ao tema, não havendo como se repudiar a aplicação da causa de diminuição também a situações anteriores. Realçou, ainda, que a vedação de convergência de dispositivos de leis diversas seria apenas produto de interpretação da doutrina e da jurisprudência, sem apoio direto em texto constitucional. O Min. Celso de Mello, a seu turno, enfatizou que o citado pronunciamento fora ratificado em momento subseqüente, no julgamento de outro habeas corpus. Acresceu que não se cuidaria, na espécie, da denominada “criação indireta da lei”. Ato contínuo, assinalou que, mesmo se fosse criação indireta, seria preciso observar que esse tema haveria de ser necessariamente examinado à luz do princípio constitucional da aplicabilidade da lei penal mais benéfica. De outro lado, o Min. Ricardo Lewandowski, relator, dava provimento ao recurso do parquet para determinar que o juízo da Vara de Execuções Penais aplicasse, em sua integralidade, a legislação mais benéfica ao recorrido, no que fora acompanhado pelos Ministros Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Marco Aurélio. Ressaltava a divisão da doutrina acerca do tema. Entendia não ser possível a conjugação de partes mais benéficas de diferentes normas para se criar uma terceira lei, sob pena de ofensa aos princípios da legalidade e da separação de poderes. Afirmava que a Constituição permitiria a retroatividade da lei penal para favorecer o réu, mas não mencionaria sua aplicação em partes. Registrava que a Lei 6.368/76 estabelecia para o delito de tráfico de drogas uma pena em abstrato de 3 a15 anos de reclusão e fora revogada pela Lei 11.343/2006, que cominara, para o mesmo crime, pena de 5 a 15 anos de reclusão. Evidenciava, dessa maneira, que a novel lei teria imposto reprimenda mais severa para aquele tipo penal e que o legislador se preocupara em diferenciar o traficante organizado do pequeno traficante. Acrescentava haver correlação entre o aumento da pena-base mínima prevista no caput do art. 33 da Lei 11.343/2006 e a inserção da causa de diminuição disposta em seu § 4º. Explicitava que, ao ser permitida a combinação das leis referidas para se extrair um terceiro gênero, os magistrados atuariam como legisladores positivos. Por fim, ponderava que se poderia chegar à situação em que o delito de tráfico fosse punido com pena semelhante às das infrações de menor potencial ofensivo. Concluía que, na dúvida quanto à legislação mais benéfica em determinada situação, dever-se-ia examinar o caso concreto e verificar a lei que, aplicada em sua totalidade, fosse mais favorável. O Min. Luiz Fux apontava afronta ao princípio da isonomia (CF, art. 5º, caput), pois a lex tertia, aplicada pelo STJ, conceberia paradoxo decorrente da retroação da lei para conferir aos fatos passados situação jurídica mais favorável do que àqueles praticados durante a sua vigência. Dessumia que a aplicação da retroatividade da lei “em tiras” consistiria em velada deturpação da nova percepção que o legislador, responsável por expressar os anseios sociais, manifestara sobre a mesma conduta. Indicava, ademais, violação a outros fundamentos da Constituição: o princípio da legalidade e a democracia. Criar-se-ia, com a tese por ele refutada, regra não prevista na lei antiga nem na lei nova, que não experimentaria do batismo democrático atribuído à lei formal. Destacava que a questão reclamaria, portanto, o que se denominara como “sistema da apreciação in concreto” em conjunto com o princípio da alternatividade, para resolver pela aplicação da lei antiga ou da lei nova, uma ou outra, integralmente. O Min. Marco Aurélio, por sua vez, aduzia que, com a Lei 11.343/2006, houvera, também, a exacerbação das penas relativas à multa. Assegurava que, naquele contexto, cuidara-se, para situações peculiares, de uma causa de diminuição da reprimenda, ao inseri-la no artigo. No aspecto, salientava que o parágrafo seria interpretado segundo o artigo. A razão de ser do preceito seria mitigar a elevação do piso em termos de pena restritiva da liberdade de 3 para 5 anos. Por esse motivo, entendia haver mesclagem de sistemas, ao se manter a pena da Lei 6.368/76 adotando-se, contudo, a causa de diminuição que estaria jungida à cabeça do art. 33 da outra norma. Asseverava que, ao se proceder dessa maneira, colocar-se-ia em segundo plano o princípio unitário e criar-se-ia novo diploma para reger a matéria.
Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), art. 33, "caput" e § 4º; Lei 6.368/1976 (Lei de Tóxicos), art. 12, "caput"; CF/1988, art. 5º, "caput" e XL; RISTF, art. 146, parágrafo único
Número do Processo
596152
Tribunal
STF
Data de Julgamento
13/10/2011
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Nos termos do art. 1º do DL n. 1.025/1969, o encargo de 20% inserido nas cobranças promovidas pela União, pago pelo executado, é recolhido aos cofres públicos como renda da União, sendo que, com o advento da Lei n. 7.711/1988, conforme previsão do parágrafo único do art. 3º, "será recolhido ao Fundo a que se refere o art. 4º, em subconta especial, destinada a atender a despesa com o programa previsto neste artigo [...]", que é voltado para o incentivo da arrecadação, administrativa ou judicial, de receitas inscritas como Dívida Ativa da União e outras atividades relacionadas. Portanto, o encargo do DL n. 1.025/1969 é crédito não tributário destinado à recomposição das despesas necessárias à arrecadação, à modernização e ao custeio e diversas outras (despesas) pertinentes à atuação judicial da Fazenda Nacional. Não obstante, adequado o seu enquadramento no inciso III do art. 83 da atual Lei de Falências. Importante observar que no crédito tributário a que se refere a lei falimentar, estão incluídos somente a correção monetária e os juros de mora incidentes sobre o tributo devido pelo falido (art. 161 do CTN). Nessa linha e em tese, na falta de previsão legal, admitir que o encargo do DL n. 1.025/1969 seja classificado como crédito tributário poderia implicar violação do princípio do par conditio creditorum (igualdade de tratamento dos credores), segundo o qual todos os credores de uma mesma categoria devem ser tratados de forma igualitária (art. 126 da Lei n. 11.101/2005), pois um acréscimo de 20% da dívida cobrada da massa tem impacto na expectativa dos demais credores da mesma estatura (Estados, Distrito Federal, Municípios, autarquias). Entretanto, o § 4º do art. 4º da Lei n. 6.830/1980 dispõe: "Aplica-se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional." Com base nos referidos dispositivos se observa que, por opção do legislador, foi estendida expressamente ao crédito não tributário inscrito em dívida ativa a preferência dada ao crédito tributário, preferência já existente antes da LC n. 118/2005. Assim, se o encargo do mencionado Decreto-lei tem natureza não tributária (Lei n. 7.711/1988), compõe a dívida ativa da Fazenda Nacional (art. 2º, §§ 2º, 5º, II, da Lei n. 6.830/1980) e tem as mesmas preferências do crédito tributário, por força da autorização contida no art. 4º, § 4º, da Lei n. 6.830/1980, pode-se concluir pelo seu enquadramento, por equiparação, no inciso III do art. 83 da Lei n. 11.101/2005. Ademais, caso a questão surja sob a égide do DL n. 7.661/1945, antiga Lei de Falências, com o mesmo raciocínio deve-se-lhe assegurar a classificação pertinente aos créditos tributários, nos termos do art. 186 do CTN, antes da alteração implementada pela LC n. 118/2005.
A composição da jornada de trabalho dos professores encontra-se disciplinada na Lei n. 11.738/2008, que instituiu o piso salarial para os profissionais do magistério da educação básica. Dispõe o § 4º do art. 2º da referida lei que apenas 2/3 (dois terços) da jornada de trabalho do professor pode ser destinada à atividade que envolva interação com os educandos. O diploma normativo em questão foi discutido em controle concentrado na ADI n. 4.167 perante o Supremo Tribunal Federal, o qual afirmou a constitucionalidade da norma quanto à reserva de 1/3 da carga horária dos professores para dedicação às atividades extraclasse. Fundamenta o julgado que o limite de 2/3 (dois terços) da jornada do professor com atividades de interação com educando justifica-se exatamente pela importância das atividades extra-aula para esses profissionais. O ofício do professor abrange, além das tarefas desempenhadas em classe, a preparação das aulas, as reuniões pedagógicas e as com os pais, entre outras práticas inerentes ao exercício do magistério. Assim, sendo essa a razão de ser da mencionada limitação, não se mostra razoável o cômputo dos 10 (dez) ou 15 (quinze) minutos que faltam para que a "hora-aula" complete efetivamente uma hora como atividade extraclasse. Tal ínterim não se mostra, de forma alguma, suficiente para que o professor realize nenhuma das atividades para as quais foi o limite idealizado. Desse modo, entende-se que os minutos que faltam para o cumprimento de uma "hora-relógio" não podem ser computados como tempo de atividade extraclasse.
Nos termos do art. 175, caput , da Lei n. 9.279/1996, o INPI deve intervir nas ações anulatórias de registro. A participação do INPI, entretanto, não lhe impõe a defesa do ato concessivo do registro por ele praticado. Ao contrário, o interesse jurídico do INPI se distingue do interesse individual de ambas as partes, tendo por objetivo último a proteção da concorrência e do consumidor, direitos essencialmente transindividuais, o que atrai certo temperamento das regras processuais tradicionais da defesa de direitos individuais. Por essa razão, a legitimidade ad causam do INPI, bem como todas as demais situações processuais, dependerá de exame casuístico e particularizado, não se resolvendo por meio da simples aplicação de conceitos consolidados. Nesse sentido, a doutrina moderna vem ressaltando que a apreciação da legitimidade, embora não se tenha libertado da avaliação inicial in status assertionis , deve também levar em consideração as "zonas de interesse" dos sujeitos litigantes, que ora se contrapõem, ora se coincidem e ora se complementam pela atuação baseada sobretudo num interesse social ou público. Desse modo, para além de uma legitimidade ad causam , verificável ab initio , há que se reconhecer uma legitimidade móvel refletida na prática dos atos processuais adequados e necessários à defesa de sua "zona de interesse". A Terceira Turma do STJ já se posicionou no sentido de que o INPI desempenha função própria, mediante intervenção sui generis , nos processos de anulação de registro de marca. Em face disso, nem sempre se comportará como litisconsorte passivo, devendo a sua legitimidade e os consectários da sua atuação processual tomarem em consideração a função efetivamente exercida no caso concreto. Daí se extrai que, sobrevindo ação anulatória de registro, mesmo que o ente estatal não fosse parte na demanda originária, seria impositiva sua participação, podendo, após sua integração no polo passivo da demanda, reposicionar-se em qualquer um dos polos da reconvenção. Essa imposição de intervenção, além de não inviabilizar, por si só, a utilização do instituto da reconvenção, legitima o INPI a impugnar a sentença que a extingue, com ou sem resolução de mérito, e qualquer que tenha sido o resultado do julgamento, devendo o interesse recursal ser avaliado sob a perspectiva da atuação concreta do INPI ao longo da tramitação da reconvenção.
Cinge-se a controvérsia a definir se o advogado substabelecente (mantidos os seus poderes) responsabiliza-se solidariamente pelos prejuízos causados a cliente por ato ilícito praticado unicamente pela causídica substabelecida, que deixou de lhe repassar os valores recebidos em razão de acordo, por ela subscrito, realizado entre as partes, o qual pôs fim à demanda. Dos termos do § 2º do art. 667 do Código Civil, ressai que, em regra, na hipótese de haver autorização para substabelecer, o mandatário não responde pelos atos praticados pelo substabelecido que venham causar danos ao mandante, salvo se for comprovada a sua culpa in eligendo , que se dá no caso de o mandatário proceder a uma má escolha do substabelecido, recaindo sobre pessoa que não possui capacidade legal (geral ou específica), condição técnica ou idoneidade para desempenhar os poderes a ela transferidos. A culpa in eligendo resta configurada, ainda, se o substabelecente negligenciar orientações ou conferir instruções deficientes ao substabelecido, subtraindo-lhe as condições necessárias para o bom desempenho do mandato. De suma relevância anotar que, para o reconhecimento da culpa in eligendo do substabelecente, é indispensável que este, no momento da escolha, tenha inequívoca ciência a respeito da ausência de capacidade legal, de condição técnica ou de idoneidade do substabelecido para o exercício do mandato. Ademais, não se olvida que o substabelecimento, em especial o com reserva de poderes, evidencia, naturalmente, a existência, entre as partes envolvidas (substabelecente e substabelecido), de uma relação calcada, minimamente, na confiança. Todavia, essa relação prévia, por si, não é suficiente para vincular o substabelecente, a ponto de responsabilizá-lo por atos praticados pelo substabelecido que venham a desbordar dos poderes transferidos, a revelar sua inaptidão para o exercício do mandato. Entendimento contrário redundaria, por óbvio, em todos os casos, na responsabilidade solidária entre mandatário e substabelecido pelos atos perpetrados por esse último, imputação objetiva que não encontra nenhum amparo legal.
O propósito recursal é definir se o conceito de "decisões interlocutórias que versarem sobre exclusão de litisconsorte", previsto no art. 1.015, VII, do CPC/2015, abrange somente a decisão que determina a exclusão do litisconsorte ou se abrange também a decisão que indefere o pedido de exclusão. Inicialmente, destaque-se que o CPC/2015 disciplinou, de modo específico, sobre os vícios de que padecerão as sentenças proferidas sem a integração de um litisconsorte: (i) na hipótese de litisconsórcio necessário e unitário, a sentença é nula (art. 115, I); (ii) na hipótese de litisconsórcio necessário e simples, a sentença será ineficaz em relação aos que não foram citados (art. 115, II); (iii) e, em ambas as situações, o não atendimento da ordem judicial que determina a integração do polo passivo para a inclusão dos litisconsortes necessários faltantes acarretará a extinção do processo (art. 115, parágrafo único). Justamente porque a errônea exclusão de um litisconsorte é capaz de invalidar a sentença de mérito, inclusive porque à parte excluída deveria ser facultada a ampla participação na atividade instrutória, é que se admite que a decisão interlocutória com esse conteúdo seja, desde logo, reexaminada pelo tribunal, antes da sentença. Essa é a razão de existir do art. 1.015, VII, do CPC/2015. Todavia, não se verifica a mesma consequência jurídica quando se examina a decisão interlocutória que rejeita excluir o litisconsorte. A manutenção, no processo, de uma parte alegadamente ilegítima não fulmina a sentença de mérito nele proferida, podendo o tribunal, por ocasião do julgamento do recurso de apelação, reconhecer a ilegitimidade da parte e, então, exclui-la do processo. Por mais que o texto legal seja amplo e genérico - realmente, o conceito de "versar sobre" previsto no art. 1.015, caput , do CPC/2015, é bastante elástico e comporta debate sobre a sua real abrangência - a boa hermenêutica não autoriza que se coloque, na mesma hipótese, questões assentadas em premissas teóricas distintas ou que sejam ontologicamente diferentes. Nesse aspecto, sublinhe-se que ambas as decisões interlocutórias poderão ser reexaminadas pelo tribunal, diferenciando-se o momento em que a parte poderá exercer o direito de recorrer (na exclusão, imediatamente por agravo; na manutenção, posteriormente por apelação), o que é lícito, legítimo e justificável. O regime recursal diferenciado criado pelo legislador na hipótese se assentou em razão de um aspecto objetivo da controvérsia (maior gravidade do ato que exclui o litisconsorte em relação ao ato que o mantém). Ademais, quando quis, o CPC/2015 expressamente estabeleceu o cabimento recursal para a hipótese de acolhimento e de rejeição do requerimento da parte, como se verifica, por exemplo, no art. 1.015, IX, que expressamente prevê a recorribilidade imediata da decisão interlocutória que versar sobre a admissão e também sobre a inadmissão de intervenção de terceiros.