Este julgado integra o
Informativo STF nº 646
O Exame, inicialmente previsto no artigo 48, inciso III, da Lei nº 4.215/63 e hoje no artigo 8º, inciso IV, da Lei nº 8.906/94, mostra-se consentâneo com a Constituição Federal. Com ela é compatível a prerrogativa conferida à Ordem dos Advogados do Brasil para aplicação do exame de suficiência relativo ao acesso à advocacia. Obs: Redação da tese aprovada nos termos do item 2 da Ata da 12ª Sessão Administrativa do STF, realizada em 09/12/2015. O Plenário desproveu recurso extraordinário em que discutida a constitucionalidade dos artigos 8º, IV e § 1º; e 44, II, ambos da Lei 8.906/94, que versam sobre o exame da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB [“Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário: ... IV - aprovação em Exame de Ordem; ... § 1º O Exame da Ordem é regulamentado em provimento do Conselho Federal da OAB. ... Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: ... II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil”]. Na espécie, o recorrente alegava que o bacharel em Direito deveria ser considerado apto a exercer a advocacia até prova em contrário, bem como que a referida entidade teria condições de avaliar a capacidade do profissional, considerada a citada lei, que versa as sanções disciplinares para o advogado. Sustentava também violação ao princípio da igualdade, visto que a exigência de exame para o ingresso no órgão de classe ocorreria somente para esta profissão e que nem mesmo médicos seriam submetidos a seleção equivalente, embora lidassem com bem valioso. Alegava que a avaliação não poderia se sobrepor às das próprias universidades e que o bacharel, examinado e avaliado por instituição credenciada pelo Poder Público — o qual a OAB não integraria — teria direito ao livre exercício profissional. Aludia à necessidade de lei para a criação do exame, previsto apenas em regulamento, e que a entidade de classe, interessada em restringir a concorrência, não seria isenta, impessoal e imparcial ao avaliar os candidatos. Argumentava, ainda, que o exame teria sido derrogado, tacitamente, pela Lei 8.906/94 e que não seria compatível com a Lei 8.884/94. Inicialmente, lembrou-se que a exigência da prova de suficiência técnica para inscrição nos quadros da Ordem teria surgido com a Lei 4.215/63 e que, a partir da regência do atual diploma, o bacharel em Direito podia optar entre o estágio profissional ou a submissão à prova de conhecimentos jurídicos, situação que perdurou até 1996. Com o término de vigência do dispositivo que conferia essa escolha, o exame tornara-se obrigatório para todos os egressos do curso superior. Assim, a imprescindibilidade do teste seria relativamente nova no ordenamento jurídico pátrio, muito embora a prova de conhecimentos fosse mais antiga. Constatou-se o elevado número de formados em Direito e de cursos jurídicos no país, criados sem a observância do critério qualitativo, imprescindível à formação do bom profissional. Ressaltou-se que esse fato não seria determinante para o julgamento, porque extrajurídico, mas se evidenciou a necessidade de refletir a respeito. No tocante à proporcionalidade e compatibilidade entre o exame de conhecimentos jurídicos e a garantia do livre exercício profissional, inicialmente reputou-se que, a fim de assegurar a liberdade de ofício, impor-se-ia ao Estado o dever de colocar à disposição dos indivíduos, em condições eqüitativas de acesso, os meios para que aquela fosse alcançada. Destacou-se que esse dever entrelaçar-se-ia sistematicamente com a previsão do art. 205, caput, da CF (“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”). Frisou-se que a obrigação estatal seria a de não opor embaraços irrazoáveis ou desproporcionais ao exercício de determinada profissão, e que existiria o direito de se obterem as habilitações previstas em lei para a prática do ofício, observadas condições eqüitativas e qualificações técnicas previstas também na legislação. Sublinhou-se que essa garantia constitucional não se esgotaria na perspectiva do indivíduo, mas teria relevância social (CF, art. 1º, IV). Assim, nas hipóteses em que o exercício da profissão resultasse em risco predominantemente individual, como, por exemplo, mergulhadores e técnicos de rede elétrica, o sistema jurídico buscaria compensar danos à saúde com vantagens pecuniárias (adicional de insalubridade, de periculosidade) ou adiantar-lhes-ia a inativação. Essas vantagens, entretanto, não feririam o princípio da isonomia. Quando, por outro lado, o risco suportado pela atividade profissional fosse coletivo, hipótese em que incluída a advocacia, caberia ao Estado limitar o acesso à profissão e o respectivo exercício (CF, art. 5º, XIII). Nesse sentido, o exame de suficiência discutido seria compatível com o juízo de proporcionalidade e não alcançaria o núcleo essencial da liberdade de ofício. No concernente à adequação do exame à finalidade prevista na Constituição — assegurar que as atividades de risco sejam desempenhadas por pessoas com conhecimento técnico suficiente, de modo a evitar danos à coletividade — aduziu-se que a aprovação do candidato seria elemento a qualificá-lo para o exercício profissional. Dessa forma, o argumento no sentido de que o exame não se prestaria para esse fim seria improcedente, pois o mesmo raciocínio seria aplicável às provas instituídas pelas próprias universidades, essenciais para a obtenção do bacharelado. Consignou-se que o exame da OAB atestaria conhecimentos jurídicos, o que seria congruente com o fim pretendido e com a realidade brasileira. Sob esse aspecto, a fiscalização posterior dos atos dos profissionais da advocacia, como meio de se controlar a qualidade do exercício de seu mister, seria inequivocamente menos efetiva do que o escrutínio prévio. Ademais, o poder de polícia poderia ser exercitado em momento concomitante, prévio ou posterior ao ato ou à conduta, com o objetivo de impedir lesões ao patrimônio econômico e moral dos indivíduos. Rememorou-se haver decisões anteriores da Corte a respeito da restrição ao exercício profissional e constatou-se que o vetor preponderante do posicionamento do STF fora o risco trazido à coletividade. Quanto mais arriscada a atividade, maior o espaço de conformação deferido ao Poder Público. Portanto, se inexistente o risco, inadmissível qualquer restrição. No tocante à advocacia, asseverou-se que quem a exerce sem a capacidade técnica necessária afetaria outrem, tanto o cliente, indivíduo, como a coletividade, pois lhe denegaria Justiça, pressuposto da paz social. Sob esse prisma, destacou-se o papel central e fundamental do advogado na manutenção do Estado Democrático de Direito e na aplicação e defesa da ordem jurídica, razão pela qual o constituinte o proclamara indispensável à administração da Justiça (CF, art. 133). Frisou-se o interesse social no sentido de existirem mecanismos de controle, objetivos e impessoais, concernentes à prática da advocacia, visto que o Direito envolveria questões materiais e existenciais, como o patrimônio, a liberdade ou a honra. Acrescentou-se que a garantia do acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV), imporia que fosse posto à disposição da coletividade corpo de advogados capazes de exercer livre e plenamente a profissão. Lembrou-se que os advogados comporiam todos os tribunais do país (CF, artigos 94; 111-A, I; 119; 103, II), exceto no STF. Integrariam, também, o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público (CF, artigos 103-B, XIII; 130-A, V), o que reforçaria sua relevância social. No tocante à suposta violação ao princípio da isonomia, decorrente da inexistência de exame imposto a médicos, por exemplo, antes de ingressarem na carreira, reputou-se descabida a pretensão de aplicar idêntico regime jurídico a atividades distintas, marcadas por conhecimentos e técnicas próprios. Além disso, o equívoco não estaria nas rígidas exigências para o exercício da advocacia. Ao contrário, caberia ao legislador determinar a obrigatoriedade de exame para o exercício da Medicina, o que estaria em consonância com a Constituição. Em relação à assertiva do recorrente no sentido de que os baixos índices de aprovação no atual exame seriam reflexo da reserva de mercado empreendida pelos atuais membros da OAB, aduziu-se que a redução do percentual de aprovados seria resultado do acúmulo de bacharéis que, sem êxito, repetiriam o exame sucessivamente. Consignou-se que, de acordo com os parâmetros impostos pelo exame, mostrar-se-iam grandes as chances de aprovação. Assinalou-se que o teste seria impessoal e objetivo, e sua aplicação observaria os princípios constitucionais relativos aos concursos públicos, conquanto não fosse espécie desse gênero. Destacou-se, ainda, que as questões estariam circunscritas aos conhecimentos adquiridos ao longo do curso superior. O quadro, portanto, afastaria qualquer subjetivismo ou inidoneidade por parte dos organizadores e aplicadores do exame. Embora fosse saudável haver membros de outras instituições públicas na comissão examinadora, a ausência destes não tornaria a exigência do teste inconstitucional. Ressaltou-se, ainda, a possibilidade de controle judicial para avaliar as eventuais ilegalidades cometidas pelas bancas, bem como a adequação entre o edital e a prova. Afirmou-se que os papéis das universidades e das organizações seriam distintos, uma vez que, às primeiras, caberia ministrar o conteúdo educacional necessário à profissionalização do indivíduo e atribuir o grau respectivo, correspondente ao curso terminado. Descaberia pensar que a formação universitária constituiria presunção absoluta de capacidade para o exercício profissional, visto que a atividade censória das autarquias profissionais demonstraria que, não raro, a obtenção de grau acadêmico seria insuficiente para a realização correta de determinado trabalho. Ademais, o bacharel em direito poderia exercer diversas atividades além da advocacia, como a magistratura, por exemplo. Considerou-se caber às autarquias implementar o poder de polícia das profissões respectivas. Anotou-se que, especificamente, caberia à OAB promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados no país e, embora não submetida a vinculação quanto à Administração direta, exerceria função pública, valendo-se, para tanto, de poderes próprios do Estado, como os de tributar e de punir. Não seria, portanto, instituição privada e deslegitimada para assumir esse encargo. No ponto, o Min. Ricardo Lewandowski salientou que quando o legislador conferira a esse órgão — estatal ou de colaboração com o Estado — determinadas atribuições, implicitamente também lhe outorgara os meios para realizá-las, como as provas de seleção. O Colegiado anotou, ainda, haver instituições de ensino a configurar pessoas jurídicas de direito público e de direito privado e, ao se aplicar entendimento contrário ao exposto, de modo a excluir os estudantes daquelas da necessidade do exame da OAB, implementar-se-ia regime incompatível com a isonomia. No que se refere à suposta ofensa ao princípio da legalidade, porquanto a regulamentação do exame, a teor do disposto no art. 8º, § 1º, da Lei 8.906/94, deveria ocorrer por meio de provimento — competência do Presidente da República —, reputou-se que a interpretação do dispositivo deveria ser realizada considerando-se a sistematicidade do ordenamento. Nesse sentido, as matérias constantes do exame não poderiam discrepar das enquadradas nas diretrizes curriculares do curso de graduação em Direito, assim definido pelo Ministério da Educação. O teste poderia exigir, também, regras pertinentes ao exercício da advocacia, como o Código de Ética e os ditames do Estatuto da OAB. Asseverou-se, portanto, não haver, no aludido dispositivo, genuína delegação de poderes legislativos à autarquia corporativa. Assim, o provimento da entidade não seria capaz de criar obrigação nova, mas daria concretude àquela prevista em caráter abstrato. Nesse sentido, considerar-se que o princípio da legalidade implicaria impor ao legislador o exaurimento de toda a matéria alusiva ao exercício do poder de polícia significaria alargá-lo. Discorreu-se que o princípio da legalidade estrita deveria ser tomado em termos, considerada a velocidade atual das transformações ocorridas em diversas áreas. No caso em exame, a previsão do art. 8º, § 1º, da Lei 8.906/94 reclamaria a edição de regulamento executivo, destinado a tornar efetivo o mandamento legal. A Constituição não teria, ademais, imposto reserva absoluta de lei para restrição à liberdade de ofício. Quanto à alegada violação ao art. 84, IV, da CF, consignou-se não haver impedimento para que a lei conferisse a entidades da Administração, públicas ou privadas, a prerrogativa de concretizar, por meio de atos gerais e abstratos, alguns aspectos práticos que lhe concernissem. Explicitou-se a nova feição da Administração Pública moderna, na qual a estrutura absolutamente hierárquica e piramidal não corresponderia perfeitamente à organização do Estado. Como exemplo, citaram-se as agências reguladoras, autarquias dotadas de autonomia reforçada, que exerceriam atividade administrativa, mas não se submeteriam aos mecanismos clássicos de hierarquia ou tutela. Editariam regulamentos e tomariam decisões, sem possibilidade de revisão pelo Chefe do Executivo. Sob esse prisma, a OAB não poderia ficar subordinada à regulamentação presidencial ou a qualquer órgão público, pois deveria prevalecer a vontade dos representantes da própria categoria, somente.
Lei 8.906/94, arts. 8º, IV e § 1º; e 44, II; CF, arts. 1º, IV; 5º, XIII, XXXV; 84, IV; 94; 103-B, XIII; 111-A, I; 119; 130-A, V; 133; 205
Número do Processo
603583
Tribunal
STF
Data de Julgamento
26/10/2011
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A Lei n. 9.656/1998 distinguiu três espécies de regime ou tipo de contratação de plano ou seguro de assistência à saúde: individual ou familiar, coletivo empresarial e coletivo por adesão (art. 16, inc. VII, alíneas "a", "b" e "c", com a redação da Medida Provisória n. 2.177/41/2001). A distinção entre os planos individuais ou familiares e as contratações de natureza coletiva concebida pela Lei n. 9.566/1998 e RN - ANS 195/2009 teve por objetivo conferir maior proteção aos titulares de planos individuais, diante da posição de maior vulnerabilidade do consumidor singularmente considerado e, também, inserir mecanismo destinado a permitir que, nos contratos coletivos, a pessoa jurídica contratante exerça o seu poder de barganha na fase de formação do contrato, presumindo-se que o maior número de pessoas por ela representadas desperte maior interesse da operadora do plano de saúde. Ao interpretar as referidas normas , a jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de que o artigo 13, parágrafo único, II, da Lei n. 9.656/1998, que veda a resilição unilateral dos contratos de plano de saúde, não se aplica às modalidades coletivas, desde que exista previsão contratual, tenha decorrido doze meses da vigência do contrato e a operadora notifique o usuário com no mínimo de 60 dias de antecedência. No caso em exame, todavia, a despeito de se tratar de plano de saúde coletivo empresarial, a estipulante é empresa de pequeno porte, encontrando-se filiadas ao contrato de plano de saúde apenas cinco pessoas. Nessa espécie de contrato, o reduzido número de filiados imporia que a eventual necessidade de tratamento dispendioso por parte de um ou de poucos deles seja dividida apenas entre eles, ensejando a incidência de elevados reajustes no valor das mensalidades e, em consequência, a excessiva onerosidade para o usuário suportar a manutenção do plano de saúde, inclusive em decorrência da reduzida a margem de negociação da empresa estipulante. Essas circunstâncias tornam as bases atuariais dos contratos de planos de saúde coletivos semelhantes às das modalidades individual ou familiar, sendo essa a razão pela qual a Diretoria Colegiada da ANS, atenta a essas particularidades, editou a Resolução 309, de 24.10.2012, estabelecendo regras de agrupamento de contratos com menos de trinta usuários, quantidade que instituiu como o vetor para apuração do reajuste das mensalidades de cada um dos planos agrupados. Assim, para os contratos de planos de saúde coletivos, com menos de 30 usuários, não se admite a simples rescisão unilateral pela operadora de plano de saúde por simples notificação destituída de qualquer fundamentação.
Nos termos do art. 105, II, b , da Constituição Federal, o STJ é o órgão competente para o julgamento de recursos ordinários interpostos contra acórdãos denegatórios proferidos em mandado de segurança de competência originária dos tribunais federais e estaduais. Todavia, o procedimento desses recursos no STJ não era detalhado pela Lei n. 12.016/2009, que regula o mandado de segurança, tampouco pelo CPC/1973. Diante da omissão legislativa e observando a natureza jurídica do referido recurso, que se identificava com a do recurso de apelação, porque ambos são consectários diretos do duplo grau de jurisdição, esta Corte Superior firmou o entendimento de que ao recurso ordinário era aplicável, analogicamente, o procedimento previsto no CPC/1973 para julgamento de apelações cíveis. Nessa trilha, caberia ao órgão a quo , no recebimento dos recursos ordinários, o exame prévio da sua admissibilidade à simetria do previsto no art. 518 do CPC/1973. Somente após a decisão pelo recebimento do recurso é que os autos eram então remetidos ao STJ para julgamento de mérito. Contudo, o atual sistema processual, além de alterar o procedimento para processamento e julgamento das apelações, dispõe também de forma específica acerca do processamento dos recursos ordinários nos arts. 1.027 e 1.028 do CPC/2015. Segundo o novo regramento legal, o duplo grau de jurisdição não se sujeita ao exame prévio de admissibilidade pelo órgão de origem. Isso porque o legislador, além de eliminar a possibilidade de o juiz negar seguimento à apelação, foi expresso em determinar a imediata remessa dos autos do recurso ordinário ao juízo ad quem . É o que se depreende do art. 1.208, §§ 2º e 3º do CPC/2015. Diante da disposição expressa e atual, não remanesce nenhuma dúvida acerca da competência exclusiva desta Corte Superior para analisar o preenchimento dos requisitos essenciais à admissibilidade do recurso ordinário, bem como para apreciação de seu mérito. Portanto, caracterizada a usurpação de competência deste Superior Tribunal de Justiça no que toca ao exercício do juízo de admissibilidade em recurso ordinário em mandado de segurança, o qual fora realizado pelo Tribunal a quo , sendo viável o manejo de reclamação.
A Segunda Turma do STJ decidiu pela legitimidade passiva das entidades destinatárias das contribuições sociais recolhidas, antigamente, pelo INSS e, atualmente, após a Lei n. 11.457/2007, pela Secretaria da Receita Federal. No precedente apontado como paradigma para a Primeira Turma do STJ, "as entidades do chamado Sistema "S" não possuem legitimidade para compor o polo passivo ao lado da Fazenda Nacional". Há de se ressaltar que "os serviços sociais autônomos integrantes do denominado Sistema "S", vinculados a entidades patronais de grau superior e patrocinados basicamente por recursos recolhidos do próprio setor produtivo beneficiado, ostentam natureza de pessoa jurídica de direito privado e não integram a Administração Pública, embora colaborem com ela na execução de atividades de relevante significado social. São meros destinatários de parte das contribuições sociais instituídas pela União, parcela nominada, via de regra, de "adicional à alíquota" (art. 8º da Lei n. 8.029/1990), cuja natureza jurídica, contudo, é de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE, que, por opção política, tem um percentual a eles (serviços sociais) destinado como espécie de receita para execução das políticas correlatas a cada um. O repasse da arrecadação da CIDE caracteriza uma transferência de receita corrente para pessoas jurídicas de direito privado (arts. 9º e 11 da Lei n. 4.320/1964). É, assim, espécie de subvenção econômica (arts. 12, §§ 2º e 3º, e 108, II, da Lei n. 4.320/1964). Após o repasse, os valores não mais têm a qualidade de crédito tributário; são, a partir de então, meras receitas dos serviços sociais autônomos, como assim qualifica a legislação (arts. 15 e 17 Lei n. 11.080/2004 e art. 13 da Lei n. 10.668/2003). Estabelecida essa premissa, é necessário dizer que o direito à receita decorrente da subvenção não autoriza a conclusão pela existência de litisconsórcio unitário, pois os serviços autônomos, embora sofram influência (financeira) da decisão judicial a respeito da relação tributária, como pessoas jurídicas de direito privado, não têm interesse jurídico quanto à relação jurídico-tributária da qual se origina a base de cálculo dos valores repassados. O interesse, sob esse ângulo, é reflexo e meramente econômico, até porque, se os serviços prestados são relevantes à União, esta se utilizará de outra fonte para manter a subvenção para caso a relação jurídico-tributária entre contribuinte e ente federado seja declarada inexistente. De outro lado, basta notar que eventual ausência do serviço social autônomo no polo passivo da ação não gera nenhum prejuízo à defesa do tributo que dá ensejo à subvenção.
Registre-se, inicialmente, que as obrigações dos condôminos perante o condomínio são ordinariamente qualificadas como ambulatórias ( propter rem ), de modo que, decorrendo as respectivas prestações da mera titularidade do direito real sobre o imóvel, incidirão sobre a coisa e irão acompanhá-la em todas as suas mutações subjetivas. Essa, aliás, é a compreensão que se extrai da leitura do art. 1.345 do CC/2002: "o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios". Assim, a obrigação de pagar os débitos em relação ao condomínio se transmite automaticamente, isso é, ainda que não seja essa a intenção do alienante e mesmo que o adquirente não queira assumi-la. O sentido dessa norma é, por certo, fazer prevalecer o interesse da coletividade, permitindo que o condomínio receba, a despeito da transferência de titularidade do direito real sobre o imóvel, as despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum, impondo ao adquirente, para tanto, a responsabilidade, inclusive, pelas cotas condominiais vencidas em período anterior à aquisição. Daí se conclui que a obrigação de pagar as verbas de sucumbência, ainda que sejam elas decorrentes de sentença proferida em ação de cobrança de cotas condominiais, não pode ser qualificada como ambulatória ( propter rem ) e, portanto, não pode ser exigida do novo proprietário do imóvel sobre o qual recai o débito condominial. Em primeiro lugar, porque tal obrigação não está expressamente elencada no rol do art. 1.345 do CC/2002, até mesmo por não se prestar ao custeio de despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum. Em segundo lugar, porque, no que tange aos honorários de sucumbência, esta Corte, à luz do que dispõe o art. 23 do Estatuto da OAB, consolidou o entendimento de que constituem direito autônomo do advogado, de natureza remuneratória. Trata-se, portanto, de dívida da parte vencida frente ao advogado da parte vencedora, totalmente desvinculada da relação jurídica estabelecida entre as partes da demanda.
Dos termos dos arts. 18, IV, e 19, I, da Lei n. 9.514/1997, ressai que a cessão fiduciária sobre títulos de créditos opera a transferência da titularidade dos créditos cedidos. Ou seja, o objeto da cessão fiduciária são os direitos creditórios que hão de estar devidamente especificados no instrumento contratual, e não o título, o qual apenas os representa. A exigência de especificação do título representativo do crédito, como requisito formal à conformação do negócio fiduciário, além de não possuir previsão legal - o que, por si, obsta a adoção de uma interpretação judicial ampliativa - cede a uma questão de ordem prática incontornável. Por ocasião da realização da cessão fiduciária, afigura-se absolutamente possível que o título representativo do crédito cedido não tenha sido nem sequer emitido, a inviabilizar, desde logo, sua determinação no contrato. Registre-se, inclusive, que a Lei n. 10.931/2004, que disciplina a cédula de crédito bancário, é expressa em admitir que a cessão fiduciária em garantia da cédula de crédito bancário recaia sobre um crédito futuro (a performar), o que, per si , inviabiliza a especificação do correlato título (já que ainda não emitido).