Este julgado integra o
Informativo STF nº 657
A emissão de parecer, relativamente a medidas provisórias, por comissão mista de deputados e senadores antes do exame, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das casas do Congresso Nacional (CF, art. 62, § 9º) configura fase de observância obrigatória no processo constitucional de conversão dessa espécie normativa em lei ordinária. Com base nesse entendimento e tendo em conta razões de segurança jurídica para a manutenção dos diplomas legais já editados com esse vício de tramitação, o Tribunal acolheu questão de ordem, suscitada pelo Advogado-Geral da União, para alterar o dispositivo do acórdão da presente ação direta apreciada em assentada anterior. Ato contínuo, em votação majoritária, julgou improcedente o pleito formulado, mas declarou, incidentalmente, com eficácia ex nunc, a inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, §§ 1º e 2º, da Resolução 1/2002, do Congresso Nacional [“Art. 5º A Comissão terá o prazo improrrogável de 14 (quatorze) dias, contado da publicação da Medida Provisória no Diário Oficial da União para emitir parecer único, manifestando-se sobre a matéria, em itens separados, quanto aos aspectos constitucional, inclusive sobre os pressupostos de relevância e urgência, de mérito, de adequação financeira e orçamentária e sobre o cumprimento da exigência prevista no § 1º do art. 2º. ... Art. 6º A Câmara dos Deputados fará publicar em avulsos e no Diário da Câmara dos Deputados o parecer da Comissão Mista e, a seguir, dispensado o interstício de publicação, a Medida Provisória será examinada por aquela Casa, que, para concluir os seus trabalhos, terá até o 28º (vigésimo oitavo) dia de vigência da Medida Provisória, contado da sua publicação no Diário Oficial da União. § 1º Esgotado o prazo previsto no caput do art. 5º, o processo será encaminhado à Câmara dos Deputados, que passará a examinar a Medida Provisória. § 2º Na hipótese do § 1º, a Comissão Mista, se for o caso, proferirá, pelo Relator ou Relator Revisor designados, o parecer no plenário da Câmara dos Deputados, podendo estes, se necessário, solicitar para isso o prazo até a sessão ordinária seguinte”]. Tratava-se, no caso, de ação direta ajuizada, pela Associação Nacional dos Servidores do Ibama - Asibama nacional, contra a Lei federal 11.516/2007 — originada da Medida Provisória 366/2007 —, que dispõe sobre a criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio; altera diversos diplomas legais; revoga dispositivos; e dá outras providências. Em preliminar, assentou-se a legitimidade ativa ad causam da requerente e destacou-se, no ponto, a importância da participação da sociedade civil organizada em âmbito de controle abstrato de constitucionalidade, a caracterizar pluralização do debate. Em seguida, reafirmou-se a sindicabilidade jurisdicional, em hipóteses excepcionais, dos pressupostos constitucionais de relevância e urgência necessários à edição de medidas provisórias. Asseverou-se que essa fiscalização deveria ser feita com parcimônia, haja vista a presença, consoante sublinhado pelo Min. Gilmar Mendes, de um elemento de política, a demandar verificação pelo próprio Poder Executivo. O Min. Ayres Britto salientou que um fato do mundo do ser, que legitimaria a edição da medida provisória, consubstanciaria urgência e relevância tais que o autor da norma, ao avaliar esse fato, não poderia aguardar o curso de um projeto de lei, mesmo classificado como urgente. Aduziu que, na situação em comento, esses requisitos estariam configurados, visto que, em matéria de meio ambiente, tenderia a concluir que tudo seria urgente e relevante pela qualificação dada pela Constituição. A Min. Rosa Weber, por sua vez, não vislumbrou abuso na atuação do Presidente da República. A Min. Cármen Lúcia advertiu sobre a impossibilidade de substituição, na via judicial, do que designado como urgente pelo Chefe do Executivo. Também considerou que a busca da maior eficiência e eficácia na execução de ações de política nacional de unidades de conservação, proposição, implantação, gestão, proteção, fiscalização e monitoramento dessas enquadrar-se-ia na exigência constitucional. O Min. Ricardo Lewandowski assinalou que o STF deveria averiguar, cum grano salis, os requisitos legitimadores para a edição de medidas provisórias, porquanto diriam respeito à vontade política de caráter discricionário dos atos de governo. Na mesma linha, registrou que, no tocante ao meio ambiente, o tema seria sempre urgente. O Min. Marco Aurélio, consignou, outrossim, que os conceitos em tela possuiriam textura aberta e que, ante a degradação do meio ambiente, a disciplina de qualquer instrumento, visando a minimizá-la, freá-la, mostrar-se-ia relevante e urgente. O Min. Celso de Mello, de igual modo, ao enfatizar a exposição de motivos da norma, afirmou o atendimento dos pressupostos. De outro lado, os Ministros Luiz Fux, relator, e Cezar Peluso, Presidente, reputavam não atendido o requisito da urgência, pois as atribuições conferidas à autarquia recém-criada não teriam sido por ela imediatamente realizadas, mas sim pelo Ibama. No que se refere à alegação de ofensa ao art. 62, § 9º, da CF, realçou-se que a comissão mista exigida pelo preceito fora constituída, entretanto, não houvera quórum para a votação, motivo pelo qual seu relator, nos termos da mencionada Resolução 1/2002, emitira parecer sobre a medida provisória diretamente ao plenário. Ressurtiu-se que o descumprimento desse dispositivo constitucional seria prática comum, a configurar, nos dizeres do Min. Gilmar Mendes, direito costumeiro inconstitucional. A Min. Rosa Weber ponderou que todo o regramento relativo às medidas provisórias, pela sua excepcionalidade, mereceria interpretação restritiva. Nesse mesmo diapasão, votaram os Ministros Ayres Britto e Cármen Lúcia, a qual aludiu que a espécie normativa em foco seria utilizada como expediente para a inclusão de matérias a ela estranhas. Acrescentou que, para a criação de autarquias, necessário lei específica, contudo, a transgressão ao art. 62, § 9º, da CF seria bastante para a declaração de inconstitucionalidade formal. O Min. Marco Aurélio dessumiu que o devido processo legislativo seria essencial à valia do ato, cujo defeito na tramitação contaminaria a lei de conversão. Nesse contexto, o Min. Celso de Mello reputou inexistir possibilidade de substituição da vontade colegiada pela manifestação unipessoal de relator, normalmente vinculado à maioria dominante no parlamento, para que não houvesse o parecer da comissão mista. Mencionou que eventual obstrução por parte da minoria faria parte do processo democrático na formulação de leis e que a Constituição resolveria o impasse. Além disso, a competência do Presidente da República para editar medidas provisórias não seria afetada, dado que, diante da transitividade da norma, ela deixaria a esfera do Chefe do Executivo e passaria a se submeter ao controle parlamentar. Alfim, o artigo constitucional cuidaria de fase insuprimível do processo de conversão. O Min. Ricardo Lewandowski, a seu turno, explicitou que as medidas provisórias seriam instrumentos que o Poder Executivo teria, no mundo globalizado, para responder, com rapidez, aos desafios que surgiriam cotidianamente, em especial, em tempos de crise econômica. Ademais, observou que a resolução pretenderia evitar manobras que impedissem o exame das medidas provisórias em tempo hábil com o intuito de não perderem a eficácia, assim como envolveria matéria interna corporis. Arrematou inexistir óbice à fixação de prazo para o pronunciamento da comissão mista e acresceu que a interpretação restritiva conferida subtrairia do Presidente da República mecanismo para interferir na realidade social e econômica. No que atine à não emissão de parecer pela comissão mista, ressaiu-se que seria temerário admitir que as leis derivadas de conversão de medida provisória em desrespeito ao disposto no art. 62, § 9º, da CF fossem expurgadas, com efeitos retroativos, do ordenamento jurídico. Em consequência, declarou-se a inconstitucionalidade da Lei 11.516/2007, sem pronúncia de nulidade, pelo prazo de 24 meses, a fim de garantir a continuidade da autarquia. Quanto à inconstitucionalidade material, o Min. Luiz Fux rechaçou a assertiva de que a criação do ICMBio enfraqueceria a proteção ao meio ambiente. Concluiu que não caberia a esta Corte discutir a implementação de políticas públicas, seja por não dispor de conhecimento necessário para o sucesso de um modelo de gestão ambiental, seja por não ser a sede idealizada pela Constituição para o debate em torno do assunto. Em suma, ao levar em consideração os fundamentos expostos, o Colegiado, por maioria, na assentada de 7.3.2012, julgou parcialmente procedente o pedido requerido na ação direta, com modulação da eficácia, contra os votos dos Ministros Ricardo Lewandowski, que o reputava improcedente, e Marco Aurélio, que o acolhia na íntegra. Ocorre que, no dia seguinte, a Advocacia-Geral da União formulara questão de ordem no sentido de que o Supremo estabelecesse prazo de sorte a permitir que o Congresso Nacional adaptasse o processo legislativo de tramitação das medidas provisórias à nova decisão, haja vista o elevado número de medidas provisórias convertidas em lei. Acatou-se sugestão do relator segundo a qual a orientação fixada pelo Tribunal deveria ser aplicada, de imediato, às novas medidas provisórias, com ressalva das que já tramitaram e das que estariam em curso. Destacou-se despicienda a outorga do lapso solicitado pela AGU, pois esta Corte teria sinalizado, incidentalmente, a inconstitucionalidade dos preceitos da Resolução 1/2002, que autorizariam a atuação monocrática do relator da comissão mista. O Presidente acenou que, doravante, a Casa Legislativa teria liberdade para obedecer ao art. 62, § 9º, da CF, sem a observância daquele diploma, o qual não mais vigeria. Diante disso, o Min. Gilmar Mendes propugnou pela mudança da proclamação do resultado do julgamento, com a improcedência do pleito, uma vez que se estaria assentando a inconstitucionalidade a partir de momento futuro. A Min. Cármen Lúcia ressaltou que a solução proposta valeria para os Poderes Judiciário e Legislativo e que, dessa forma, manter-se-ia o ICMBio sem a necessidade da convalidação fixada na assentada anterior. Vencidos o Presidente e o Min. Marco Aurélio, que julgavam procedente a pretensão pelos motivos expostos.
CF, art. 62, §9º.
Número do Processo
4029
Tribunal
STF
Data de Julgamento
08/03/2012
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O art. 16 da Lei n. 10.826/2003 (Estatuto do desarmamento) prevê gravosas condutas de contato com "arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito", vindo seu parágrafo único a acrescer figuras equiparadas – em gravidade e resposta criminal. Dessa forma, ainda que algumas das condutas equiparadas possam ser praticadas com armas de uso permitido, o legislador as considerou graves ao ponto de torná-las com reprovação criminal equivalente às condutas do caput . No art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 8.072/1990, com redação dada pela Lei n. 13.497/2017, o legislador limitou-se a prever que o delito descrito no art. 16 da Lei n. 10.826/2003 é considerado hediondo. Assim, como a equiparação é tratamento igual para todos os fins, considerando equivalente o dano social e equivalente também a necessária resposta penal, salvo ressalva expressa, ao ser qualificado como hediondo o art. 16 da Lei n. 10.826/2003, as condutas equiparadas devem receber igual tratamento.
Salienta-se preliminarmente que, no caso, foi facultada à Defensoria Pública da União a sua atuação nos autos como amicus curiae. Contudo, a DPU postulou a sua intervenção como custos vulnerabilis, ou seja, na condição de "guardiã dos vulneráveis", o que lhe possibilitaria interpor todo e qualquer recurso. O art. 1.038, I, do Novo Código de Processo Civil, estabelece que o relator poderá solicitar ou admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia, considerando a relevância da matéria e consoante dispuser o regimento interno. A Defensoria Pública, nos termos do art. 134 da CF/88, é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal. Segundo a doutrina, custos vulnerabilis representa uma forma interventiva da Defensoria Pública em nome próprio e em prol de seu interesse institucional (constitucional e legal), atuação essa subjetivamente vinculada aos interesses dos vulneráveis e objetivamente aos direitos humanos, representando a busca democrática do progresso jurídico-social das categorias mais vulneráveis no curso processual e no cenário jurídico-político. A doutrina pondera ainda, "que a Defensoria Pública, com fundamento no art. 134 da CF/88, e no seu intento de assegurar a promoção dos direitos humanos e a defesa [...] de forma integral, deve, sempre que o interesse jurídico justificar a oitiva do seu posicionamento institucional, atuar nos feitos que discutem direitos e/ou interesses, tanto individuais quanto coletivos, para que sua opinião institucional seja considerada, construindo assim uma decisão jurídica mais democrática". Assim, tendo em conta que a tese proposta no recurso especial repetitivo irá, possivelmente, afetar outros recorrentes que não participaram diretamente da discussão da questão de direito, bem como em razão da vulnerabilidade do grupo de consumidores potencialmente lesado e da necessidade da defesa do direito fundamental à saúde, a Defensoria Pública da União está legitimada para atuar como custos vulnerabilis.
1ª tese: Em contrato de promessa de compra e venda de imóvel na planta, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para os beneficiários das faixas de renda 1,5, 2 e 3, na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância. Convém destacar, inicialmente, que as circunstâncias econômicas especiais do Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV não são benéficas apenas para os adquirentes. São elas também muito favoráveis às empresas, que diversamente do que ocorre nas operações convencionais do SFH, passam a ter acesso à parte do crédito tão logo ele é aprovado pelo agente financeiro, seja no início ou durante a realização da obra, o que diminui a necessidade do uso de capital de giro da empresa. A possibilidade de comercialização de unidades futuras, antes do início das obras, também permite à incorporadora melhor planejamento do processo construtivo como um todo, inclusive sob o aspecto financeiro. Desse modo, considerando o número de unidades vendidas, poderá a empresa avaliar a necessidade de contratar um mútuo com o agente financeiro, que lhe permita entregar a construção no prazo estipulado. Essa providência, em princípio, nem sequer lhe trará maiores ônus, uma vez que os encargos decorrentes desse tipo de operação só começarão a ser pagos após a conclusão da obra, e com os recursos obtidos com as vendas dos imóveis. É forçoso reconhecer que, tratando-se de contratos que regulam as relações de consumo, o aderente só se vincula às disposições neles inseridas se lhe for dada a oportunidade de conhecimento prévio do seu conteúdo (CDC, arts. 4º, 6º, III, 46 e 54, § 4º). Ademais, os contratos de promessa de compra e venda de imóvel caracterizam-se como de adesão, uma vez que suas cláusulas e condições são redigidas de forma unilateral, segundo o interesse das incorporadoras, cabendo ao aderente apenas aceitá-las ou não em seu conjunto, o que restringe, sensivelmente, a própria autonomia da vontade. De nada adianta, por conseguinte, a estipulação de um prazo certo e expresso, se ele for fixado de maneira apenas estimativa e condicional, ficando vinculado, ainda, a um evento futuro, no caso, à data de obtenção do financiamento pelo adquirente ou àquela que for determinada pelo agente financeiro no referido contrato. Isso acaba por atribuir à incorporadora o direito de postergar a entrega da obra por prazo excessivamente longo e oneroso para o comprador, a ponto de afastar, inclusive, o próprio risco da atividade, que pertence à empresa. Vale lembrar, ainda, que durante o prazo regular de construção, é permitida a incidência de atualização monetária pelo INCC (Índice Nacional da Construção Civil), bem como de juros de obra. Logo, quanto maior for o prazo contratual para a conclusão das unidades, em consequência, maior será a exposição do consumidor à cobrança dos referidos juros e à aplicação de correção monetária de acordo com o índice setorial, o que redundará em situação que lhe será desfavorável, também sob o ponto de vista econômico. Por sua vez, embora o início da construção dependa da reunião de um grupo de adquirentes, a tese a ser fixada no presente julgamento, será aplicada apenas às faixas de renda 1,5, 2 e 3, em relação às quais as contratações muito se assemelham às realizadas no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. Logo, para estes seguimentos específicos, é importante acentuar, as unidades futuras são transacionadas não apenas no início da construção, mas também ao longo ou ao seu final, razão pela qual esse período destinado à captação dos promissários compradores já faz parte do planejamento inicial do projeto como um todo, por se tratar de algo inerente à própria natureza da negociação. Por fim, deverá ser acrescido, tão somente, o prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias, já admitido pela jurisprudência desta Corte e agora incorporado ao nosso sistema jurídico - para os contratos futuros - pelo art. 43-A da Lei n. 13.786/2018 (que alterou a Lei n. 4.591/1964), dentro do qual a empresa poderá superar eventuais imprevistos relacionados a fortuitos internos como falta de mão de obra, entraves burocráticos ou fatores climáticos. 2ª tese: Em contrato de promessa de compra e venda de imóvel na planta, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para os beneficiários das faixas de renda 1,5, 2 e 3, no caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma. A Jurisprudência desta Corte entende é pacífica quanto ao cabimento de lucros cessantes, no âmbito de financiamento pelo SFH, em razão do descumprimento do prazo para entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, incidindo a presunção de prejuízo do promitente comprador. O fato de o imóvel ter sido adquirido sob a disciplina do Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV não afasta a presunção de prejuízo, mesmo porque, na linha dos precedentes desta Corte Superior, a condenação da vendedora por lucros cessantes independe, até mesmo, da demonstração da finalidade negocial da transação. A indenização deve corresponder, por isso, à privação injusta do uso do bem e encontra fundamento não necessariamente na interrupção da percepção dos frutos ou pela frustração daquilo que razoavelmente poderia lucrar, mas na própria demora pelo cumprimento da obrigação (CC, art. 389). Isso porque a moradia é fato dotado de expressão econômica aferível, ainda que o beneficiário não tenha que, diretamente, despender recursos para tal. Por suas peculiaridades, no âmbito do PMCMV, o prejuízo material decorrente do atraso na entrega de imóvel está mais próximo de um dano emergente do que de lucros cessantes, embora essa questão, todavia, não se afigure de maior relevância, dado que, sob o ponto de vista pragmático, conforme sublinhou a Ministra Maria Isabel Gallotti, são ambos "as duas faces da mesma moeda", pois "o dano, seja em qual dessas rubricas for classificado, será o mesmo: a privação da fruição do imóvel" (AgInt no AgRg no AREsp n. 795.125/RJ, Quarta Turma, DJe de 19/11/2018). Insta salientar, outrossim, que nos contratos submetidos à modalidade do PMCMV é desinfluente que o comprador fique impossibilitado de alugar ou vender o imóvel, antes de sua quitação, nos termos do que dispõe o art. 7º-B, I e II, da Lei n. 11.977/2009, haja vista que essa proibição tem o intuito, tão somente, de evitar eventual desvio de finalidade, uma vez que a subvenção econômica concedida pelo Governo Federal tem por único objetivo viabilizar o acesso das famílias, destinatárias do programa, ao primeiro imóvel. Entretanto, essa circunstância diz respeito apenas à relação jurídica estabelecida entre o adquirente e o órgão estatal, não podendo, por isso, seus efeitos irradiarem para o negócio de compra e venda celebrado com a incorporadora, que é regido por regras protetivas específicas. Com efeito, o termo final da indenização deverá corresponder à data do recebimento da unidade pelo adquirente, mediante a entrega das chaves, por ser o momento em que ele tem a efetiva posse do imóvel, fazendo cessar, por conseguinte, o fato gerador do dever de reparação, salvo disposição contratual diversa, que lhe seja mais favorável (AgInt no REsp n. 1.723.050/RJ, Relator o Ministro Lázaro Guimarães, Desembargador Convocado do TRF 5ª Região, Quarta Turma, DJe de 26/9/2018. Ficando evidenciado, portanto, o atraso injustificado na entrega da obra, é devido o pagamento de indenização ao comprador desde a data fixada no contrato, a qual será acrescida apenas do prazo de tolerância, a ser calculada com base no valor locatício de imóvel assemelhado, a ser apurado em liquidação de sentença. 3ª tese: Em contrato de promessa de compra e venda de imóvel na planta, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para os beneficiários das faixas de renda 1,5, 2 e 3, é ilícito cobrar do adquirente juros de obra ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância. Na disciplina do Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV, sob a modalidade do crédito associativo, é legal a incidência de juros de obra durante o período de construção do imóvel, cessando a sua aplicação com a entrega da unidade, quando terá início a fase de amortização do saldo devedor do financiamento contratado com o agente financeiro. Durante esse período, o valor a ser financiado permanece congelado, e até que a obra seja concluída o promissário comprador pagará tão somente encargos que contemplam os juros, atualização monetária, seguro de vida e de danos ao imóvel e, se for o caso, taxa de administração. Após a entrega do bem, inicia-se efetivamente a fase de abatimento da dívida. Todavia, havendo atraso na entrega do empreendimento, afigura-se descabido imputar ao adquirente o ônus de arcar com juros de evolução da obra no período de mora da ré até a efetiva entrega das chaves, uma vez que não se pode penalizar o mutuário com referida incidência, considerando não ter sido ele quem deu causa ao atraso. Entendimento diverso teria o efeito de postergar, de maneira injustificada, o pagamento de valores que são próprios da fase de construção da obra, em seu período regular. Contudo, impõe-se considerar que, superado o período de entrega das chaves, o comprador passa a ter a legítima expectativa de destinar recursos à amortização do saldo do seu débito. Deve-se ter como norte, nessas circunstâncias, o princípio de que quem dá causa ao inadimplemento do contrato não pode se beneficiar da situação, sob pena de o atraso da obra poder representar a possibilidade de vantagem financeira indevida em detrimento do adquirente do imóvel, o que seria de todo inadmissível. 4ª tese: Em contrato de promessa de compra e venda de imóvel na planta, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para os beneficiários das faixas de renda 1,5, 2 e 3, o descumprimento do prazo de entrega do imóvel, computado o período de tolerância, faz cessar a incidência de correção monetária sobre o saldo devedor com base em indexador setorial, que reflete o custo da construção civil, o qual deverá ser substituído pelo IPCA, salvo quando este último for mais gravoso ao consumidor. Vale observar, de início, que se a construtora deixa de entregar a unidade autônoma no prazo previsto, pode o adquirente sustar as parcelas do preço que se vencerem no mesmo prazo e em datas posteriores a tal prestação, invocando a exceptio non adimpleti contractus , prevista no art. 476 do CC. Contudo, a suspensão da exigibilidade das parcelas do preço não afasta a incidência da atualização monetária sobre o saldo devedor, salvo nas hipóteses em que o mencionado atraso derivar de comprovada má-fé da empresa. Os valores das parcelas devem ser atualizados desde a data de vencimento prevista no contrato até o efetivo pagamento, como simples modo de preservação do valor real da moeda, sem representar, portanto, um benefício para a parte inadimplente ou punição para o adquirente. Nesse sentido, ambas as Turmas que integram a Segunda Seção desta Corte firmaram o entendimento de que, embora o descumprimento do prazo de entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra não constitua causa de suspensão da incidência de correção monetária sobre o saldo devedor, tal fato autoriza a substituição do indexador setorial, em regra, o INCC (Índice Nacional de Custo de Construção), pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), índice oficial calculado pelo IBGE, salvo se aquele for menor. Essa solução mostra-se adequada ao reequilíbrio da relação contratual, nos casos de atraso na conclusão da obra, não devendo ser implementada a substituição do indexador específico do saldo devedor pelo geral apenas quando o índice previsto contratualmente for mais favorável ao consumidor, avaliação que se dará com o transcurso da data limite estipulada no contrato para a entrega da unidade, incluindo-se eventual prazo de tolerância. Inviável, portanto, a tese de utilização do INCC (Índice Nacional de Custo da Construção) como fator de correção monetária, durante todo o período necessário para a finalização da unidade imobiliária, independentemente de descumprimento do prazo para a construção.
Cinge-se a controvérsia a definir se é da Justiça Militar ou da Justiça Federal a competência para apurar o possível cometimento de delitos decorrentes da acumulação de aposentadoria por invalidez permanente recebida da Marinha do Brasil, nos termos do art. 108, V, do Estatuto dos Militares (Lei n. 6.880/1980), com vencimentos de cargo público exercido, na mesma ocasião, na Empresa Brasileira de Infraestrutura (INFRAERO), assim como da prestação de informação falsa perante a Marinha do Brasil, negando a acumulação de cargos públicos. Registre-se, inicialmente, que o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a possibilidade de cumulação de proventos de aposentadoria militar com vencimentos de cargo público civil ou mesmo com proventos de aposentadoria civil, desde que a aposentadoria do militar tenha ocorrido ainda na égide da Constituição Federal de 1967, como na hipótese. Entretanto, mesmo tendo em conta esse entendimento, remanesce questionável a legalidade da cumulação de proventos de aposentadoria por invalidez permanente com qualquer outro tipo de trabalho exercido posteriormente pelo aposentado, tanto mais quando o art. 110, § 1º, do Estatuto dos Militares (Lei n. 6.880/1980) estabelece que o militar julgado incapaz definitivamente é considerado impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho. Sobre a questão, o artigo 78 do Decreto n. 4.307/2002 é claro em determinar a suspensão do pagamento do auxílio-invalidez se ficar constatado que o militar exerce qualquer outra atividade remunerada. Diante desse quadro, não há como se negar que, na eventualidade de se verificar que a percepção de rendimentos por qualquer trabalho exercido pelo investigado é legalmente incompatível com o recebimento concomitante de proventos da reforma por invalidez permanente, terá o investigado causado prejuízo à Marinha do Brasil. De outro lado, mesmo que se chegue à conclusão de que a legislação admitia ao reformado por invalidez voltar a trabalhar e receber remuneração em razão de seu labor, não se pode desconsiderar que o investigado apresentou declaração falsa perante a Marinha do Brasil, o que também implica óbvio prejuízo causado à Administração Militar. Assim sendo e reconhecido que as condutas investigadas delineiam, até o momento, quadro de prejuízo causado a patrimônio sob a Administração Militar, na forma do art. 9º, III, "a", do Código Penal Militar, é de se reconhecer a competência da Justiça Militar para conduzir o inquérito.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Representativo da Controvérsia analisado em 25/02/2015, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, firmou o entendimento de que "Não incide IPI sobre veículo importado para uso próprio, tendo em vista que o fato gerador do referido tributo é a operação de natureza mercantil ou assemelhada e, ainda, por aplicação do princípio da não cumulatividade. " Todavia, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 723.651/PR, em repercussão geral (Tema n. 643/STF), firmou tese de que "incide o imposto de produtos industrializados na importação de veículo automotor por pessoa natural, ainda que não desempenhe atividade empresarial e o faça para uso próprio." Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça, diante do efeito vinculante dos pronunciamentos emanados em via de repercussão geral, passou a adotar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal segundo o qual incide o IPI na importação de automóvel por pessoas físicas para uso próprio, haja vista que tal cobrança não viola o princípio da não cumulatividade nem configura bitributação. Nesse panorama, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, com esteio no art. 927, § 4º do CPC/2015 e art. 256-S, do RISTJ, revisa-se a tese fixada no REsp n. 1.396.488/SC (Tema n. 695/STJ) para adequação com o entendimento formulado no RE n. 723.651/PR, em repercussão geral (Tema n. 643/STF).