Este julgado integra o
Informativo STF nº 696
Ao salientar a singular gravidade do cenário fático-jurídico da situação em apreço, o Plenário, por maioria, deu provimento a agravo regimental para revogar medida liminar concedida pelo Min. Luiz Fux, em mandado de segurança do qual relator. Trata-se de writ impetrado por deputado federal contra ato da Mesa Diretora do Congresso Nacional consubstanciado na aprovação de requerimento de urgência para exame do Veto Parcial 38/2012, aposto pela Presidente da República ao Projeto de Lei 2.565/2011, que dispõe sobre a distribuição entre os entes federados de royalties relativos à exploração de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos. Sustenta-se, em síntese, violação ao devido processo legislativo por inobservância ao art. 66, §§ 4º e 6º, da CF (“Art. 66. ... § 4º - O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores, em escrutínio secreto. ... § 6º - Esgotado sem deliberação o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final”) e a dispositivos do Regimento Comum do Congresso Nacional. A decisão agravada determinara àquele órgão que se abstivesse de deliberar acerca do veto presidencial antes que se procedesse à apreciação, em ordem cronológica de recebimento da respectiva comunicação, de todos os vetos pendentes com prazo constitucional de análise expirado até a data da concessão da medida acauteladora. De início, assentou-se a legitimatio ad causam do impetrante, bem como a adequação da via eleita. Destacou-se jurisprudência do STF segundo a qual o parlamentar no pleno exercício de mandato eletivo ostentaria legitimidade para impetrar mandado de segurança com a finalidade de prevenir atos no processo de aprovação de leis e emendas constitucionais incompatíveis com o processo legislativo constitucional. O Min. Luiz Fux aduziu inexistir alegação de inconstitucionalidade como causa de pedir, mas sim de pleito que visaria obstar a prática de ato em desacordo com a Constituição. Os Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello ressaltaram a pertinência do instrumento escolhido e o direito público subjetivo de deputado federal invocar a tutela jurisdicional do Estado quando não atendidos os ditames constitucionais do processo legislativo. O Min. Celso de Mello acresceu que a índole política dos atos e dos procedimentos parlamentares, por si só, não bastaria para subtraí-los à esfera do controle jurisdicional. O Min. Gilmar Mendes, por sua vez, afirmou que o caso não envolveria a defesa de direito líquido e certo, porém diria respeito a mandado de segurança com perfil especial, utilizado para resolver típico conflito de atribuições. Em divergência, os Ministros Teori Zavascki e Rosa Weber consignavam o não cabimento do mandado de segurança como meio de controle preventivo de constitucionalidade, formal ou material, de atos normativos, em especial, se o impetrante não estiver incluído no rol de legitimados previsto no art. 103 da CF. O Min. Teori Zavascki frisou não estar em jogo tutela a direito líquido e certo ameaçado ou violado por ato de autoridade (direito subjetivo) e, tampouco, a prerrogativa do cargo de parlamentar, já que o impetrante objetivaria a proteção da higidez do processo legislativo. No tocante ao exame da liminar, prevaleceu o voto do Min. Teori Zavascki. Obtemperou que os argumentos de ofensa a normas regimentais não mereceriam consideração, notadamente em juízo de delibação. Quanto às cláusulas constitucionais que disciplinariam a votação sobre o veto presidencial (CF, art. 66, §§ 4º e 6º), concordou com o Relator que teriam sido descumpridas. Mencionou que a sanção acarretada pelo não atendimento do prazo fixado na Constituição (prazo peremptório) atrairia, de forma automática e sem formalidade ou necessidade de manifestação de vontade, a colocação do veto na ordem do dia, sobrestadas as demais proposições até sua votação final. Registrou, no ponto, que essa imposição alcançaria não apenas a votação de outros vetos, mas sim todas as demais proposições de competência do Congresso Nacional. Aludiu a informações sobre a inércia parlamentar, tendo em vista a existência, nos dias de hoje, de mais de 3000 vetos pendentes de análise, alguns com prazo vencido há cerca de 13 anos. Assinalou que esse quadro mostrar-se-ia mais grave quando levado em conta que a estrita observância dos preceitos constitucionais do processo legislativo configuraria pressuposto de validade dos correspondentes atos normativos. Dessumiu que a aplicação rígida dos referidos artigos constitucionais, com eficácia retroativa, não apenas imporia futuro caótico para a atuação daquela Casa Legislativa — a paralisar nova deliberação, exceto a de vetos pendentes por ordem de vencimento —, assim como causaria insegurança jurídica sobre as deliberações tomadas pelo Congresso Nacional nos últimos 13 anos. Ademais, explicitou a relação de compatibilidade material que deveria ocorrer entre a decisão liminar e a sentença final, a limitar o juízo de verossimilhança, que consistiria na alta probabilidade de atendimento pela sentença definitiva da providência objeto de antecipação. Reputou que a questão em debate seria semelhante à enfrentada pelo STF no julgamento da ADI 4029/DF (DJe de 27.6.2012), razão pela qual tudo estaria a indicar o acolhimento de solução similar. A par disso, concluiu que, embora a Corte pudesse vir a declarar a inconstitucionalidade da prática até agora adotada pelo Congresso Nacional no processo legislativo de apreciação de vetos, dever-se-ia atribuir à decisão eficácia ex nunc. Excluir-se-iam as deliberações tomadas, os vetos presidenciais apreciados e os que já tivessem sido apresentados, mas pendentes de exame. Alinhavou que, sendo essa a decisão definitiva mais provável, a medida liminar deveria, desde logo, com ela se compatibilizar. Desse modo, a improbabilidade de êxito retiraria da impetração o indispensável requisito da verossimilhança. A Min. Rosa Weber acentuou, com relação às normas regimentais, jurisprudência do Supremo no sentido de que sua eventual afronta caracterizaria matéria interna corporis. O Min. Dias Toffoli acrescentou que o pedido final cingir-se-ia à afirmação de existência de fila de vetos em ordem cronológica, histórica ou, ao menos, na presente sessão legislativa. Nesse tocante, não vislumbrou, da leitura do § 6º do art. 66 da CF, a imposição de ordem cronológica de votação, de maneira a subtrair-se do Congresso Nacional a pauta política de votar o veto quando e na ordem que lhe aprouvesse. Evidenciou que, na espécie, o prazo constitucionalmente previsto não estaria exaurido e, portanto, teria dificuldades em proferir decisão que impediria outro Poder de deliberar. O Min. Ricardo Lewandowski, outrossim, não entreviu exigência de ordem cronológica na apreciação de vetos. Ressaiu que o constituinte ao referir-se à ordem cronológica, fizera-o em termos explícitos (CF, art. 100; ADCT, art. 86, §§ 1º e 3º; art. 97, §§ 6º e 7º). Sinalizou dúvida sobre o termo inicial em que se contaria o prazo de 30 dias para trancamento da pauta: se da comunicação do Presidente da República ao Presidente do Senado ou se do recebimento do veto pelo Plenário do Congresso Nacional. Destacou que, entre esses marcos, haveria iter complexo, disposto no art. 104 do Regimento Comum daquela Casa. Além disso, sublinhou que o impetrante não trouxera informação sobre a existência de data definida para o exame do referido veto presidencial. A Min. Cármen Lúcia distinguiu os requisitos da liminar em mandado de segurança — expressos taxativamente no art. 7º, III, da Lei 12.016/2009 — de outras formas cautelares no processo civil em geral. Realçou a necessidade de ocorrência de relevante fundamento para que se transcendesse o aguardo do julgamento final. Entendeu que a manutenção da liminar poderia gerar conjuntura mais gravosa ao Parlamento, à sociedade brasileira e ao Direito. O Min. Gilmar Mendes sobressaiu que, se a Corte estivesse a apreciar o mérito, pronunciar-se-ia pelo não recebimento do §1º do art. 104 do Regimento Comum do Congresso Nacional (“§1º O prazo de que trata o §4º do art. 66 será contado a partir da sessão convocada para conhecimento da matéria”). De igual modo, também não inferia da Constituição a necessidade de observância cronológica. Vencidos os Ministros Luiz Fux, Marco Aurélio, Celso de Mello e Joaquim Barbosa, Presidente, que mantinham a decisão agravada. O Relator considerava inconstitucional a deliberação aleatória dos vetos presidenciais pendentes de análise legislativa, cuja simples existência subtrairia do Poder Legislativo a autonomia para definição da respectiva pauta política (CF, art. 66, §6º). Ressurtia ser necessária a deliberação dos vetos presidenciais em ordem cronológica de comunicação ao Congresso Nacional, a resultar na apreciação do Veto Parcial 38/2012 somente após a análise daqueles com prazo constitucional expirado. Aludia, ainda, à cognoscibilidade, em sede mandamental, das assertivas de transgressão à disciplina das regras dos regimentos das Casas Legislativas. Pontuava que, pela qualidade de normas jurídicas, elas reclamariam instrumentos jurisdicionais idôneos a resguardar-lhes a efetividade. Repelia, em consequência, a doutrina das questões interna corporis ante sua manifesta contrariedade ao Estado de Direito (CF, art. 1º, caput) e à proteção das minorias parlamentares. Arrematava que a leitura do citado veto, em regime de urgência, violaria as disposições regimentais que impediriam a discussão de matéria estranha à ordem do dia e a deliberação do veto sem prévio relatório da comissão mista. O Min. Marco Aurélio ressaltava que a concessão da liminar não teria implicado o trancamento da pauta do Congresso. O Min. Celso de Mello reiterava que nenhum Poder da República teria legitimidade para desrespeitar a Constituição ou para ferir direitos públicos e privados de seus cidadãos. Além disso, consignava que o debate envolveria típica situação de inconstitucionalidade por omissão, a comprometer a força normativa da Constituição. Mencionava a prática institucional em que o Congresso Nacional diminuir-se-ia perante o Poder Executivo ao não exercer o dever que lhe incumbiria, pela Constituição, de apreciar os vetos presidenciais, o que os transformaria, de superáveis e relativos, em absolutos. Nessa mesma linha, pronunciou-se o Presidente ao citar que se estaria diante de exemplo da hipertrofia do Poder Executivo, em face da abdicação, pelo Congresso Nacional, de suas prerrogativas.
CF, arts. 1º, caput; 66, §§ 4 e 6º; 100; 103. ADCT, arts. 86, §§ 1º e 3º; 97, §§ 6º e 7º. Lei 12.016/2009, art. 7º, III. Projeto de Lei 2.565/2011. Regimento Comum do Congresso Nacional, art. 104, §1º.
Número do Processo
31816
Tribunal
STF
Data de Julgamento
27/02/2013
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A controvérsia principal dos autos está em definir acerca dos limites da liberdade de imprensa em artigos jornalísticos críticos à atuação e ao estilo profissional de certa pessoa em postagens realizadas no portal eletrônico de notícias. Trata-se do instigante conflito aparente entre direitos fundamentais, consagrados na Constituição Federal de 1988 e regulamentados pela legislação infraconstitucional, quais sejam a liberdade de imprensa - corolário da liberdade de informação e da liberdade de manifestação do pensamento - e os direitos da personalidade, como a privacidade, a honra e a imagem, envolvendo em ambos polos da ação experientes jornalistas. Vale ressaltar que o exercício do direito de informar apenas será digno de proteção quando presente o requisito interno da verdade, revelado quando a informação conferir ciência da realidade. Advirta-se, contudo, que não se exige, para a proteção anunciada, uma verdade absoluta, mas, sim, a chamada "verdade subjetiva" que se extrai da diligência do informador, a quem incumbe apurar de forma séria os fatos que pretende tornar públicos. Assim, "para haver responsabilidade, é necessário haver clara negligência na apuração do fato ou dolo na difusão de falsidade". A "veracidade do fato" consubstancia um compromisso ético com a informação verossímil - o que pode, eventualmente, abarcar informações não totalmente precisas -, que figura como um dos parâmetros legitimadores do exercício da liberdade de informação. Por outro lado, o requisito da verdade não subordina o direito de expressão (em sentido estrito), que consiste na liberdade básica de expressar qualquer manifestação do pensamento humano, tais como ideias, opiniões, críticas e crenças. A conceituação é mesmo intuitiva: trata-se de poder manifestar-se favorável ou contrariamente a uma ideia, mediante a realização de juízo de valor e de crítica, garantindo-se a participação efetiva dos cidadãos na condução dos assuntos públicos do país. A liberdade de imprensa, nesse cenário, constitui modalidade qualificada das liberdades de informação e de expressão; por meio dela, assegura-se a transmissão das informações e dos juízos de valor pelos jornalistas ou profissionais integrantes dos veículos de comunicação social de massa, notadamente emissoras de rádio e de televisão, editoras de jornais e provedores de notícias na internet. Destaque-se que a liberdade de imprensa - também chamada de liberdade de informação jornalística - tem conteúdo abrangente, compreendendo: (i) o "direito de informar" e o "direito de buscar a informação" (ambos decorrentes da liberdade de informação que, como pontuado, tem compromisso com a verdade ainda que subjetiva); e (ii) o "direito de opinar" e o "direito de criticar", que refletem a liberdade de expressão em sentido estrito. Conquanto seja livre a divulgação de informações, conhecimento ou ideias - mormente quando se está a tratar de imprensa -, tal direito não é absoluto ou ilimitado, revelando-se cabida a responsabilização pelo abuso constatado quando, a pretexto de se expressar o pensamento, invadem-se os direitos da personalidade, com lesão à dignidade de outrem. Assim, configurada a desconformidade, o ordenamento jurídico prevê a responsabilização cível e criminal pelo conteúdo difundido, além do direito de resposta. Nessa linha de raciocínio, não se pode olvidar que, além do requisito da "verdade subjetiva" - consubstanciado no dever de diligência na apuração dos fatos narrados (ou seja, o compromisso ético com a informação verossímil) -, a existência de interesse público também constitui limite genérico ao exercício da liberdade de imprensa (corolária dos direitos de informação e de expressão), Como de sabença, pessoas públicas estão submetidas à exposição de sua vida e de sua personalidade e, por conseguinte, são obrigados a tolerar críticas que, para o cidadão comum, poderiam significar uma séria lesão à honra; tal idoneidade não se configura, decerto, em situações nas quais imputada, injustamente e sem a necessária diligência, a prática de atos concretos que resvalem a criminalidade. Nesse contexto, não caracteriza hipótese de responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística que narre fatos verídicos ou verossímeis, embora eivados de opiniões severas, irônicas ou impiedosas, sobretudo quando se trate de figuras públicas que exerçam atividades tipicamente estatais, gerindo interesses da coletividade, e a notícia e crítica referirem-se a fatos de interesse geral relacionados à atividade pública desenvolvida pela pessoa noticiada.
Trata-se de Mandado de Segurança impetrado em face de ato do Ministro de Estado da Justiça que, ao declarar o impetrante anistiado político, fixou a reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada, cujo valor fora obtido em pesquisa de mercado e não levara em consideração a perda do cargo público, por motivação exclusivamente política, como reconhecido no processo administrativo pertinente. O art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988 assegura ao anistiado político, atingido profissionalmente, por motivação política, a indenização correspondente ao valor que receberia se ainda estivesse na ativa, e a Lei n. 10.559, de 13/11/2002, em seus arts. 6º e 7º, ao regulamentar o referido dispositivo constitucional, estabeleceu duas formas de reparação econômica, de caráter indenizatório, devidas aos anistiados e não cumuláveis entre si: (I) prestação única; e (II) prestação mensal, permanente e continuada, sendo a primeira devida àqueles anistiados que não puderam comprovar vínculo com atividade laboral, e a segunda, àqueles com vínculo profissional à época da perseguição política, que não optarem por parcela única. As normas que disciplinam a matéria asseguram, aos anistiados que tiveram interrompida a sua carreira profissional, a indenização equivalente aos rendimentos mensais que perceberiam, caso não tivessem sofrido perseguição política, respeitados, ainda, os regimes jurídicos, as graduações e as promoções que seriam alcançadas, assim como demais direitos e vantagens relativos à categoria. Nos termos do art. 6º, § 1º, da Lei n. 10.559/2002, para a fixação do valor da prestação mensal devem ser utilizadas informações prestadas por empresas, sindicatos, conselhos profissionais, entidades da administração indireta a que o anistiado político estava vinculado ao sofrer a punição, sobre o valor que hoje receberia ele, caso não tivesse sido alvo de perseguição política, ou prestadas pelo órgão em que atuava o servidor público. Dessa forma, o Setor de Recursos Humanos dos órgãos públicos pode atestar, oficialmente, a carreira, o cargo e o posicionamento do servidor, com todas as referências específicas que ele atingiria, no quadro funcional. Nessa perspectiva, a fixação do quantum indenizatório por pesquisa de mercado, baseado em informações disponibilizadas por institutos de pesquisa, deve ser supletiva, utilizada apenas quando não há, por outros meios, como se estipular o valor da prestação mensal, permanente e continuada, o que não ocorre, no caso, seja ante a determinação do art. 6º, caput , da Lei n. 10.559/2002, no sentido de que "o valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse", seja porque, na forma do art. 37, X, da CF/1988, a remuneração de servidor público só pode ser fixada ou alterada por lei específica, seja, enfim, porque o cargo do impetrante não foi sumariamente extinto, mas, por força de lei, transformado em outro.
Trata-se de conflito de competência em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho que tem como fundamento a falta de cumprimento pela empresa requerida de condições de trabalho que lhe permitiriam receber o Selo de Responsabilidade. Assim sendo, o que se verifica é que a causa tem como questão de fundo o respeito às relações de trabalho e tem como pedidos a observância de normas destinadas a promover as relações de trabalho. Dados os pedidos e a causa de pedir, resulta que é competente a Justiça do Trabalho, nos termos do art. 114 da Constituição da República, notadamente de seus incisos I e VII. É nessa linha que são os precedentes desta Corte Superior, os quais frisam que a definição do juízo competente é dada pelos termos em que a demanda é formulada. Confira-se: CC 89.207/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, DJe 1/9/2008. Além disso, o Tribunal Superior do Trabalho, no julgamento do RR-1060-06.2012.5.15.0079, apreciando a mesma controvérsia, reconheceu a competência daquela Justiça Especializada para o exame da questão referente à cassação do selo de responsabilidade social "empresa compromissada", bem como impedir a concessão sucessiva de novos selos de responsabilidade às Usinas, sem a análise concreta do cumprimento das obrigações trabalhistas descritas no Termo de Responsabilidade.
Inicialmente cumpre salientar que o art. 290 do CPC dispõe que "será cancelada a distribuição do feito se a parte, intimada na pessoa de seu advogado, não realizar o pagamento das custas e despesas de ingresso em 15 (quinze) dias". Observa-se, desse modo, que o não recolhimento das custas iniciais - que representa importante pressuposto processual - conduz ao cancelamento da distribuição. Trata-se, a rigor, de hipótese de indeferimento da petição inicial em virtude da incorreta propositura da demanda por ausência de preparo inicial do processo em formação. Nesse contexto, ressalte-se que o cancelamento da distribuição prescinde da citação da parte ré, bastando a constatação da ausência do recolhimento das custas iniciais e da inércia da parte autora, após intimada, em regularizar o preparo. Não bastasse ser indevida a citação da parte adversa, é imperioso observar que, nesse momento procedimental, em regra, qualquer alusão à intimação da outra parte revela-se tecnicamente imprecisa, ante a inexistência de relação jurídica processual triangular ou angular: o réu ainda não integra o processo. Desse modo, constatada a ausência de recolhimento das custas iniciais e quedando-se inerte o autor após intimado para regularizar o preparo, deve o juiz, sem a oitiva da outra parte - que, em regra, sequer integra a relação jurídica processual -, cancelar a distribuição do processo, extinguindo o feito sem resolução do mérito.
A controvérsia refere-se à validade do pedido de quebra de sigilo telefônico e telemático em que se determinou a interceptação de determinados terminais telefônicos mediante a habilitação temporária de S IMCARD S indicados pela autoridade policial em substituição às linhas do investigado. A Lei n. 9.296/1996 - que regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5.º da Constituição Federal - trata da interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, inclusive do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática, disciplinando os limites dessa ingerência estatal na esfera de direitos fundamentais dos indivíduos. Na situação em análise, o acórdão recorrido foi preciso ao concluir que "não se trata do procedimento previsto na Lei n. 9.296/96, que não autoriza a suspensão do serviço telefônico ou do fluxo da comunicação telemática mantida pelo usuário, tampouco a substituição do alvo da investigação e titular da linha por agente indicado pela autoridade policial". De fato, a ordem judicial, endereçada à concessionária de telefonia, consistiu na determinação de viabilizar à autoridade policial a utilização de " SIMCARD " (cartão "SIM", sigla em inglês da expressão S ubscriber Identity Module - módulo de identificação do assinante -, comumente referido no Brasil como " chip "), em substituição ao do aparelho celular do usuário investigado, "pelo prazo de 15 (quinze) dias e a critério da autoridade policial, em horários previamente indicados, inclusive de madrugada." Pretendeu-se que a operadora de telefonia, quando acionada, habilitasse o c hip d o agente investigador, em substituição ao do usuário, a critério da autoridade policial, que teria pleno acesso, em tempo real, às chamadas e mensagens transmitidas para a linha originária, inclusive via WhatsApp . Ora, esse procedimento, claramente, não encontra respaldo nos artigos da lei que disciplina a interceptação telefônica, além de gerar insuperáveis inconvenientes, para dizer o mínimo. Isso porque, a ação, se implementada, permitiria aos investigadores acesso irrestrito a todas as conversas por meio do WhatsApp , inclusive com a possibilidade de envio de novas mensagens e a exclusão de outras. Se não bastasse, eventual exclusão de mensagem enviada ou de mensagem recebida não deixaria absolutamente nenhum vestígio e, por conseguinte, não poderia jamais ser recuperada para servir de prova em processo penal, tendo em vista que, em razão da própria característica do serviço, feito por meio de encriptação ponta-a-ponta, a operadora não armazena em nenhum servidor o conteúdo das conversas dos usuários. Há relevantes diferenças entre como se daria a quebra do sigilo telefônico e telemático, em conformidade com a lei de regência, e a forma de acesso e intervenção na linha telefônica e nos dados do investigado da forma como determinada no caso em exame. Com efeito, ao contrário da interceptação telefônica, no âmbito da qual o investigador de polícia atua como mero observador de conversas travadas entre o alvo interceptado e terceiros, na troca do chip habilitado, o agente do estado tem a possibilidade de atuar como participante das conversas, podendo interagir diretamente com seus interlocutores, enviando novas mensagens a qualquer contato inserido no celular, além de poder também excluir, com total liberdade, e sem deixar vestígios, as mensagens no WhatsApp . E, nesse interregno, o usuário ficaria com todos seus serviços de telefonia suspensos. Dessa forma, mostra-se irretocável a conclusão do Tribunal de origem, no sentido de que, "[t]ratando-se de providência que excepciona a garantia à inviolabilidade das comunicações, a interceptação telefônica e telemática deve se dar nos estritos limites da lei, não sendo possível o alargamento das hipóteses previstas ou a criação de procedimento diverso."