Pagamento em município diverso não afasta decadência do art. 173, I, do CTN
A obrigação tributária não declarada pelo contribuinte no tempo e modo determinados pela legislação de regência está sujeita ao procedimento de constituição do crédito pelo fisco, por meio do lançamento substitutivo, o qual deve se dar no prazo decadencial previsto no art. 173, I, do Código Tributário Nacional, quando não houver pagamento antecipado, ou no art. 150, § 4º, do CTN, quando ocorrer o recolhimento de boa-fé, ainda que em valor menor do que aquele que a Administração entende devido, pois, nesse caso, a atividade exercida pelo contribuinte, de apurar, pagar e informar o crédito tributário, está sujeita à verificação pelo ente público, sem a qual ela é tacitamente homologada. No caso, a Corte estadual compreendeu que o recolhimento do tributo a município diverso daquele a quem seria efetivamente devido seria suficiente para a aplicação do regime do art. 150, § 4°, do CTN, independentemente do momento do conhecimento, pelo outro ente federativo, acerca do fato gerador, bem como de qualquer recolhimento do tributo aos seus cofres. Vê-se que, pela própria natureza do lançamento por homologação, faz-se necessário que a edilidade tenha conhecimento da ocorrência do fato gerador, seja através da declaração formal promovida pelo contribuinte ou do recolhimento do tributo aos seus cofres. Na hipótese, é incontroverso que o contribuinte declarou e recolheu o ISS relativo aos serviços prestados por terceiros a outros municípios que não o município devido, o qual apenas teve conhecimento dos fatos geradores no momento da fiscalização tributária. Não se está a afirmar a competência deste ou daquele município para a tributação, mas apenas que, para a aplicação da regra do art. 150, § 4°, do CTN ao município devido, no caso concreto, a declaração do contribuinte ou o recolhimento, ainda que parcial, do ISSQN dos fatos geradores tributados deveriam ter sido feitos. In casu, as instâncias ordinárias aplicaram a regra do art. 150, § 4°, do CTN independentemente do momento do conhecimento do município acerca do fato gerador e de qualquer recolhimento do tributo aos seus cofres, sendo insustentáveis as conclusões por elas adotadas.
Apelação prematura ratificada sem assinatura constitui irregularidade sanável e não acarreta inexistência
O STJ possui consolidado entendimento no sentido de que os recursos dirigidos à instância especial sem assinatura do signatário da petição são considerados inexistentes, não sendo possível, nesta instância, a abertura de prazo para a regularização. No caso, após o julgamento dos aclaratórios, sem efeito modificativo, a Fazenda Pública apresentou petição de ratificação da apelação interposta prematuramente no primeiro grau de jurisdição, não havendo assinatura do referido documento. Hipótese, portanto, em que cabe a distinção dos precedentes deste Tribunal: em primeiro lugar, não se cuidava de petição dirigida à instância especial, porque dirigida ao juízo a quo; em segundo, a petição apócrifa não se tratava do recurso propriamente dito, que, pelo que consta do acórdão, teria atendido todos os requisitos formais; por fim, a petição sem assinatura foi a de ratificação da apelação interposta prematuramente, sendo certo, ainda, que nem sequer houve modificação da sentença após o julgamento dos aclaratórios opostos pela parte contrária. Na espécie, a petição de ratificação teria tão somente a função de confirmar a recurso anteriormente interposto, o qual, este sim, havia atendido todos os requisitos formais, existindo, portanto, uma relação de complementariedade/integração entre as peças, sendo que a primeira já atendia a condição de existência, e a segunda seria somente confirmatória. Deste modo, a ausência de subscrição da segunda petição não a tornaria inexistente, mas revelaria irregularidade formal que poderia ser sanada pela parte peticionante, nos termos do art. 13 do CPC/1973.
Inexistência de Incidência do ICMS-Comunicação na Prestação de Serviços de Capacidade Satelital
Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, "a incidência do ICMS, no que se refere à prestação dos serviços de comunicação, deve ser extraída da Constituição Federal e da LC 87/1996, incidindo o tributo sobre os serviços de comunicação prestados de forma onerosa, através de qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza (art. 2º, III, da LC 87/1996)" (REsp 1.176.753-RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 28/11/2012, DJe 19/12/2012). A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 816.512-PI, julgado na sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973, decidiu que o ICMS somente incide sobre o serviço de telecomunicação propriamente dito, e não sobre as atividades-meio e serviços suplementares. De acordo com regulamento dos serviços de telecomunicações da ANATEL (Resolução n. 73/1998), o serviço de provimento de capacidade de satélite não constitui serviço de telecomunicações (art. 3º, I). Do mesmo modo, expressando a categoria suplementar ou de serviço-meio do provimento de capacidade de satélite, a Resolução n. 220/2000 da ANATEL afirma, em seu art. 49, que "a exploradora de satélite somente poderá prover capacidade espacial à entidade que detenha concessão, permissão ou autorização para exploração de serviços de telecomunicações ou às Forças Armadas". Vale dizer, portanto, que quem explora a capacidade de satélite serve, como meio, às entendidas que possuem concessão, permissão ou autorização para explorar serviços de telecomunicação. Na mesma Resolução n. 220/2000 da ANATEL, art. 9º, XI, está o conceito de provimento de capacidade espacial: "o oferecimento de recursos de órbita e espectro radioelétrico à Prestadora de serviços de telecomunicações". Vê-se que o provimento de capacidade de satélite não presta serviço de comunicação, mas se coloca como suplemento deste. Os satélites disponibilizados não passam, portanto, de meios para que seja prestado o serviço de comunicação, sendo irrelevante para a subsunção tributária que se argumente no sentido que há retransmissão ou ampliação dos sinais enviados. Primeiro porque os satélites refletem as ondas radioelétricas que sobre eles incidem, espelhando-as tão somente; segundo, porque não tem participação no tratamento das informações, não contratando com o emissor ou receptor destas; em terceiro lugar, segundo a doutrina, "porque nada recebe pela reflexão em si mesma considerada, não se podendo falar, portanto, em serviço autônomo da cessão onerosa da capacidade espacial, muito menos em serviço de comunicação".
Impossibilidade de extensão automática do REINTEGRA às vendas destinadas às Áreas de Livre Comércio
Esta Corte de Justiça possui o entendimento de que o REINTEGRA não pode ser estendido de forma automática para as vendas destinadas a toda e qualquer Área de Livre Comércio - ALC, porque cada área possui legislação própria, devendo ser analisada tal possibilidade e compatibilidade caso a caso. Nesse contexto, a venda de mercadorias para empresas situadas nas ALCs de Boa Vista/RR e Bonfim/RR são equivalentes a uma exportação, sendo o caso de fruição do REINTEGRA em razão das mercadorias destinadas a esta área. Por outro lado, conforme já decidido pela Segunda Turma deste Superior Tribunal de Justiça, no Resp 1.861.806/SC (Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 21/09/2020), se a venda de mercadorias para empresas situadas nas ALCs de Tabatinga/AM, Guajará-Mirim/RO, Brasileia, Cruzeiro do Sul e Epitaciolândia/AC, Macapá e Santana/AP deixou de ser equivalente a uma exportação, não há que se falar em fruição do REINTEGRA em razão das mercadorias destinadas a esta área. Nesse sentido: V - Ainda que se ingressasse no fundo da matéria em discussão, tem-se que o Superior Tribunal de Justiça fixou que a venda de mercadorias para empresas situadas na Zona Franca de Manaus - ZFM equivale, para efeitos fiscais, à exportação de produto brasileiro para o estrangeiro, segundo interpretação do Decreto-Lei n. 288/1967. VI - Neste particular, foi editado Enunciado Sumular n. 640/STJ, segundo o qual: "O benefício fiscal que trata do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (REINTEGRA) alcança as operações de venda de mercadorias de origem nacional para a Zona Franca de Manaus, para consumo, industrialização ou reexportação para o estrangeiro". VII - Lado outro, afastando a tese defendida pela contribuinte, o Superior Tribunal de Justiça entende que o REINTEGRA não pode ser estendido de forma automática para as vendas destinadas a toda e qualquer Área de Livre Comércio - ALC, porque cada área possui legislação própria, devendo ser analisada tal possibilidade e compatibilidade caso a caso. VIII - No caso, não há falar em fruição do REINTEGRA em razão das mercadorias destinadas às ALC de Tabatinga - AM, Guajará-Mirim - RO, Brasiléia - AC, Epitaciolândia - AC, Cruzeiro do Sul - AC, Macapá - AP, Santana - AP, conforme o entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça, de que não diverge o acórdão recorrido, segundo se pode verificar do seguinte acórdão: REsp 1.861.806/SC, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 21/9/2020. IX - Agravo interno improvido. (AgInt no REsp n. 1.898.953/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 29/4/2021)
Impenhorabilidade do bem de família legal perante quaisquer obrigações do devedor
A controvérsia consiste em definir se o imóvel adquirido no curso da demanda executiva pode ser considerado bem de família, para os fins de impenhorabilidade. O bem de família legal (Lei n. 8.009/1990) e o convencional (Código Civil) coexistem no ordenamento jurídico, harmoniosamente. A disciplina legal tem como instituidor o próprio Estado e volta-se para o sujeito de direito - entidade familiar -, pretendendo resguardar-lhe a dignidade, por meio da proteção do imóvel que lhe sirva de residência. O bem de família convencional, decorrente da vontade do instituidor, objetiva, primordialmente, a proteção do patrimônio contra eventual execução forçada de dívidas do proprietário do bem. O bem de família legal dispensa a realização de ato jurídico, bastando para sua formalização que o imóvel se destine à residência familiar. Por sua vez, para o voluntário, o Código Civil condiciona a validade da escolha do imóvel à formalização por escritura pública e à circunstância de que seu valor não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente no momento da afetação. Nos termos da Lei n. 8.009/1990, para que a impenhorabilidade tenha validade, além de ser utilizado como residência pela entidade familiar, o imóvel será sempre o de menor valor, caso o beneficiário possua outros. Já na hipótese convencional esse requisito é dispensável e o valor do imóvel é considerado apenas em relação ao patrimônio total em que inserido o bem. Nas situações em que o sujeito possua mais de um bem imóvel em que resida, a impenhorabilidade poderá incidir sobre imóvel de maior valor, caso tenha sido instituído, formalmente, como bem de família, no Registro de Imóveis (art. 1711, CC/2002) ou, caso não haja instituição voluntária formal, automaticamente, a impenhorabilidade recairá sobre o imóvel de menor valor (art. 5°, parágrafo único, da Lei n. 8.009/1990). Com efeito, diz-se que o destaque da instituição voluntária será percebida na realidade de múltiplas propriedades, pela simples razão de que, sendo o executado proprietário de apenas um imóvel, utilizado para residência, a condição de bem de família já recaía sobre ele, antes mesmo de registrada a opção. Ou seja, mesmo que exista apenas um bem sob o domínio do instituidor, este poderá, sim, oficializar sua vontade de que, verdadeiramente, recaia sobre ele a característica de bem família, situação em que serão coincidentes as vontades Estatal e privada. No que se refere às dívidas sobre as quais o escudo protetivo incidirá, para o bem de família instituído nos moldes da Lei n. 8.009/1990, a proteção conferida pelo instituto alcançará todas as obrigações do devedor, indistintamente, ainda que o imóvel tenha sido adquirido no curso de uma demanda executiva. Por sua vez, a impenhorabilidade convencional é relativa, uma vez que o imóvel apenas estará protegido da execução por dívidas subsequentes à sua constituição, não servindo às obrigações existentes no momento de seu gravame. Ressalte-se que a indistinta proteção, no que respeita ao momento em que a obrigação fora contraída, legitima-se tão somente num cenário em que se evidenciado o uso regular do direito. É que, independentemente do regime legal a que está submetido o instituto, não se admitirá a proteção irrestrita se isso significar o alijamento da garantia, contrariando a ética e a boa-fé, indispensáveis em todas as relações negociais. Exatamente esse o comando do art. 4° da Lei n. 8.009/1990. Nessa linha, mister reconhecer que só o fato de ser o imóvel residencial bem único do executado, sobre ele, necessariamente, incidirão as normas da Lei n. 8.009/1990, mormente a impenhorabilidade questionada. De fato, ainda que se tratasse de imóvel voluntariamente instituído como bem de família (regime do Código Civil), conforme demonstrado alhures, tendo em vista tratar-se de único bem imóvel do executado, a proteção conferida pela Lei n. 8.009/1990 subsistiria, de maneira coincidente e simultânea, e, nessa extensão, seria capaz de preservar o bem da penhora de dívidas constituídas anteriormente à instituição voluntária. É que a proteção viria do regime legal e não do regime convencional.