Aplicação do art. 115 CP quando réu atinge 70 anos entre sentença e embargos
Esta Corte Superior entende que, "por expressa previsão do art. 115 do CP, são reduzidos pela metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, na data da sentença, maior de 70 anos, situação jurídica que não se apresenta no caso" (AgRg no AREsp 1.420.867/RJ, relator Ministro Olindo Menezes, Desembargador convocado do TRF 1ª Região, Sexta Turma, DJe 21/3/2022). Saliente-se que, sendo opostos embargos de declaração contra a sentença condenatória, e entre a sentença condenatória e o julgamento dos embargos o réu atinge a idade superior a 70 anos, é possível aplicar o art. 115 do Código Penal, tendo em vista que a decisão que julga os embargos integra a própria sentença condenatória. No caso, o sentenciado completou 70 anos em 13/2/2020, de modo que na data da sentença (16/1/2018), ainda não possuía a referida idade, o que, portanto, afasta a aplicação da redução pela metade do prazo prescricional. Ademais, é irrelevante o fato de o Tribunal ter mantido ou modificado a pena do réu, tendo em vista que o Código Penal é expresso em determinar que a aferição da idade deve ser feita na data da sentença condenatória.
Conexão Processual Penal exige liame circunstancial de interferência ou prejudicialidade
A ação penal que originou o conflito visa apurar a responsabilidade criminal pela prática dos crimes de organização criminosa, descaminho e lavagem de dinheiro, tendo em vista a aquisição de ouro ilegalmente extraído de garimpos no território nacional para a sua remessa clandestina ao exterior e posterior internalização de joias prontas ao Brasil. O Juízo Federal carioca rejeitou a denúncia com relação a dois acusados da imputação do crime de organização criminosa e, diante da conclusão acerca da ausência de conexão, declinou da competência em relação à prática, em tese, de crimes de descaminho e lavagem de dinheiro. O Juízo Federal paulista, por outro lado, concluiu pela necessidade de reunião dos feitos com base no reconhecimento da conexão probatória e intersubjetiva. No entanto, tendo o Juízo Federal carioca demonstrado que os réus não fazem parte da organização criminosa ali investigada, o fato de eles terem tido eventuais relações comerciais com a organização criminosa não implica, necessariamente, configuração de conexão intersubjetiva se não há uma dinâmica delitiva diretamente interligada. Nesse sentido, a alteração da competência originária só se justifica quando devidamente demonstrada a possibilidade de alcançar os benefícios visados pelo instituto da conexão, sendo certo que não basta, para a verificação da regra modificadora da competência, o simples juízo de conveniência da reunião de processos sobre crimes distintos. No caso, não foi demonstrada a conexão que justificasse fossem os delitos julgados pela Justiça Federal do Rio de Janeiro relativos à organização criminosa em conjunto com os crimes de descaminho em tese praticados pelos réus. Ademais, considerando que o Juízo Federal carioca indicou que os réus não fazem parte da organização criminosa ali investigada, o fato de a acusada ser "cliente eventual", já que "mantinha contato com eles e recorreu aos serviços da organização criminosa para descaminhar joias estrangeiras" não é suficiente para caracterizar a conexão. Com efeito, da peça acusatória e das razões do Juízo Federal paulista, não há a exposição de um liame circunstancial que demonstre a relação de interferência ou prejudicialidade entre as condutas dos citados réus com a organização criminal investigada no Rio de Janeiro, mas apenas uma relação meramente comercial. Conforme as informações prestadas, são acusados de crimes de descaminhos sem nenhuma relação com a organização criminosa carioca e, ao que tudo indica, integrariam uma organização criminosa independente. A única circunstância que ligaria os referidos crimes seria o fato de a apuração deles ter sido iniciada a partir da mesma diligência, o que não implica, necessariamente, existência de conexão. Por fim, importante destacar que, se no decorrer da instrução, houver a confirmação concreta de conexão entre os fatos, nada impede a unificação dos procedimentos criminais.
Plano de saúde inclusão e cobertura obrigatória do recém-nascido neto do titular
1ª Tese: É ilícita a conduta da operadora de plano de saúde que nega a inscrição de recém-nascido no plano de saúde de titularidade de avô, sendo a genitora dependente/beneficiária desse plano. Cinge-se a controvérsia a definir se a operadora é obrigada a inscrever o recém-nascido, filho de dependente e neto do titular, no plano de saúde, na condição de dependente, quando houver requerimento administrativo. Deve-se assegurar a inclusão no plano de saúde obstétrico, na condição de dependente, do recém-nascido filho do consumidor, o qual, por sua vez, pode ser do consumidor titular ou do consumidor dependente (arts. 12, III, "b", da Lei nº 9.656/1998; 23, II e III, da RN-ANS nº 428/2017, e 21, II e III, da RN-ANS nº 465/2021). A opção de inscrição do recém-nascido no plano de saúde é para filho do titular, bem como para filho de seu dependente. A lei emprega o termo "consumidor", possibilitando a inscrição não só do neonato filho do titular, mas também de seu neto no plano de saúde, na condição de dependente e não de agregado. Independentemente de haver inscrição do recém-nascido no plano de saúde do beneficiário-consumidor, da segmentação hospitalar com obstetrícia, possui o neonato proteção assistencial nos primeiros 30 (trinta) dias depois do parto, sendo considerado, nesse período, um usuário por equiparação, ao lado, portanto, de seu genitor titular ou genitor dependente (art. 12, III, "a", da Lei nº 9.656/1998). Assim, conclui-se que é ilícita a conduta da operadora de plano de saúde que nega a inscrição do recém-nascido no plano de saúde de titularidade do avô, seja a genitora dependente/beneficiária de plano individual ou coletivo. 2ª Tese: É abusiva a atitude da operadora que tenta descontinuar o custeio de internação do neonato que seja filho de dependente e neto do titular ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias de seu nascimento. Cinge-se a controvérsia a definir se a operadora de plano de saúde deve continuar a custear tratamento médico de recém-nascido - filho de dependente e neto do titular - internado em UTI neonatal devido a problemas decorrentes de parto prematuro, quando ultrapassado o 30º (trigésimo) dia de seu nascimento. O esgotamento do prazo de 30 (trinta) dias após o parto não pode provocar a descontinuidade do tratamento médico-hospitalar, devendo haver a extensão do trintídio legal até a alta médica do recém-nascido. O recém-nascido sem inscrição no plano de saúde não pode ficar ao desamparo enquanto perdurar sua terapia, sendo sua situação análoga à do beneficiário sob tratamento médico, cujo plano coletivo foi extinto. Em ambas as hipóteses deve haver o custeio temporário, pela operadora, das despesas assistenciais até a alta médica, em observância aos princípios da boa-fé, da função social do contrato, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana. Nessas situações, exaurido o prazo legal, o neonato não inscrito, a título de contraprestação, deve ser considerado como se inscrito fosse, mesmo que provisoriamente, o que lhe acarreta não o ressarcimento de despesas conforme os valores de tabela da operadora, mas o recolhimento de quantias correspondentes a mensalidades de sua categoria, a exemplo também do que acontece com os beneficiários sob tratamento assistencial em planos extintos. Manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da avença. É abusiva a atitude da operadora que tenta descontinuar o custeio de internação do neonato após ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias de seu nascimento.
Notificação prévia ao consumidor por correspondência para negativação em cadastro restritivo veda meios exclusivamente eletrônicos
O propósito recursal consiste em dizer se a notificação prévia à inscrição do consumidor em cadastro de inadimplentes, prevista no § 2º do art. 43 do CDC, pode ser realizada, exclusivamente, por e-mail ou por mensagem de texto de celular (SMS). Como é de conhecimento ordinário, a vulnerabilidade do consumidor, presumida pelo CDC, não decorre apenas de fatores econômicos, desdobrando-se em diversas espécies, a saber: a) vulnerabilidade informacional; b) vulnerabilidade técnica; c) vulnerabilidade jurídica ou científica; e d) vulnerabilidade fática ou socioeconômica. Assim, admitir a notificação, exclusivamente, via e-mail ou por simples mensagem de texto de celular representaria diminuição da proteção do consumidor - conferida pela lei e pela jurisprudência desta Corte -, caminhando em sentido contrário ao escopo da norma, causando lesão ao bem ou interesse juridicamente protegido. A regra é que os consumidores possam atuar no mercado de consumo sem mácula alguma em seu nome; a exceção é a inscrição do nome do consumidor em cadastros de inadimplentes, desde que autorizada pela lei. Está em mira a própria dignidade do consumidor (Art. 4º, caput, do CDC). De acordo com a doutrina, "os arquivos de consumo, em todo o mundo, são vistos com desconfiança. Esse receio não é destituído de fundamento, remontando a quatro traços básicos inerentes a esses organismos e que se chocam com máximas da vida democrática contemporânea, do Welfare State: a unilateralidade (só arquivam dados de um dos sujeitos da relação obrigacional), a invasividade (disseminam informações que, normalmente, integram o repositório da vida privada do cidadão), a parcialidade (enfatizam os aspectos negativos da vida financeira do consumidor) e o descaso pelo due process (negam ao 'negativado' direitos fundamentais garantidos pela ordem constitucional). Por isso mesmo, submetem-se eles a rígido controle legal". Em outras palavras "apesar de facilitar a circulação de informações aptas a subsidiar a concessão de crédito, notou-se que a atividade da coleta, do armazenamento e do fornecimento de dados sobre os hábitos de consumo põe em risco os direitos da personalidade dos consumidores. Há, de fato, manifesta tensão entre os proveitos econômicos da atividade de coleta de dados e a proteção constitucional aos direitos da personalidade e à dignidade da pessoa humana, razão pela qual se vislumbrou interesse público em sua regulação" (REsp n. 1.630.659/DF, Terceira Turma, julgado em 11/9/2018, DJe de 21/9/2018). Desse modo, não há como se admitir que a notificação do consumidor seja realizada, tão somente, por simples e-mail ou mensagem de texto de celular, por se tratar de exegese ampliativa que, na espécie, não deve ser admitida. Além disso, do exame dos precedentes que deram origem à Súmula 404 do STJ, constata-se que, muito embora afastem a necessidade do aviso de recebimento (AR), não deixam de exigir que a notificação do § 2º do art. 43 do CDC seja realizada mediante envio de correspondência ao endereço do devedor. Não se pode olvidar que a referida súmula, ao dispensar o aviso de recebimento (AR), já operou relevante flexibilização nas formalidades da notificação ora examinada, não se revelando razoável nova flexibilização em prejuízo da parte vulnerável da relação de consumo sem que exista justificativa alguma para tal medida. Nesse sentido, em âmbito doutrinário, é comum a afirmação de que, para o cumprimento da exigência prevista no § 2º do art. 43 do CDC, embora não seja necessário o aviso de recebimento (AR), "basta a comprovação de sua postagem para o endereço informado pelo devedor ao credor".
Discricionariedade administrativa na fixação da quantidade de servidores liberados para mandato classista
Trata-se de mandado de segurança contra ato do Procurador Geral de Justiça do Estado de Sergipe que deferiu o afastamento de apenas 1 (um) membro da Diretoria do Sindicato. Defende haver direito líquido e certo dos dirigentes sindicais à liberação de carga horária nos termos do art. 278 da Constituição do Estado de Sergipe, o qual não restringiu o afastamento a (apenas) 1 (um) servidor público. Assevera, ademais, que o próprio TJSE libera três diretores em tempo integral com todos os direitos e vantagens e sem prejuízo algum da remuneração. A redação do art. 278 da CE/SE não é restritiva ao ponto de determinar que a liberação é de três ou de seis servidores em carga horária reduzida. Além disso, não deixa explícita a legitimidade de quem é a atribuição de definir a quantidade de servidores com carga horária reduzida ou dispensada. Ademais, como destacado pelo Ministério Público estadual, o art. 8º, VII, da Constituição Federal não garante a dispensa do empregado ao cumprimento de sua jornada de trabalho. Por outro lado, entre os princípios da administração pública, estão a continuidade do serviço público e a impessoalidade. Logo, a fim de não prejudicar a prestação do serviço público, deve-se considerar que a expressão "até" no art. 278 da CE/SE é comando normativo que confere discricionariedade à administração pública. A propósito, a jurisprudência do STJ, em hipóteses semelhantes, já reconheceu o poder discricionário da administração pública na definição de quantos servidores públicos podem ser dispensados do cumprimento de sua carga horária no cargo público.