Supremo Tribunal Federal • 8 julgados • 30 de set. de 2004
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O Tribunal concluiu julgamento de mandado de segurança impetrado por oficial da Marinha contra ato do Presidente da República e do Diretor de Pessoal da Marinha, consistente na negativa de autorização de posse do impetrante no cargo de professor na Universidade Federal do Estado do Ceará, para o qual fora habilitado por meio de concurso público, tornando insubsistente ato de posse autorizado anteriormente pelo Ministro da Administração Federal, que determinara a agregação do impetrante para fins de reserva remunerada — v. Informativo 352. Indeferiu-se, por maioria, a segurança e cassou-se a liminar concedida com base na jurisprudência do STF no sentido de que a investidura de militar em novo cargo, com sua conseqüente transferência para a reserva remunerada, está subordinada à autorização do Presidente da República, de acordo com o § 3º do art. 98 da Lei 6.880/80, norma recebida pelo § 9º do art. 42 da CF, na sua redação original, que expressamente remete, à lei ordinária, o estabelecimento das condições de transferência dos militares para a inatividade. Vencido o Min. Marco Aurélio que concedia a segurança por considerar que, diante das peculiaridades do caso, e em prol da segurança jurídica, não se poderia admitir que os procedimentos administrativos anteriores, que autorizaram a posse e passagem do impetrante para reserva remunerada, não tivessem gerado efeitos válidos.
O Tribunal concluiu julgamento de sentença estrangeira contestada proposta por italiano contra brasileira, em que se pretendia a homologação de decisão do Tribunal de Roma, Itália, que declarara as partes legalmente separadas por mútuo consentimento e homologara o acordo firmado para a separação consensual — v. Informativo 353. O Pleno, por maioria, deferiu o pedido, em parte, excetuando da homologação a divisão de bens imóveis existentes no Brasil (CPC: “Art. 89. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;”). Ressaltou-se, com base em jurisprudência da Corte, que a sentença homologanda, proposta em data anterior à decisão que decretara o divórcio entre as partes no Brasil, por já ter transitado em julgado, deveria prevalecer sobre esta última, ainda pendente de recurso. Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, Cezar Peluso e Celso de Mello que indeferiam integralmente o pedido por considerarem que o acordo estabelecido perante a Corte italiana atentava contra os princípios inerentes à própria soberania nacional e a ordem pública, e por julgarem que se deveria dar precedência à decisão proferida pelo Poder Judiciário brasileiro, ainda que não transitada em julgado.
O Tribunal julgou procedente pedido de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado do Amapá contra o art. 29 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição estadual (“Art. 29. Os assistentes jurídicos pertencentes ao quadro do extinto Território Federal do Amapá, sob a subordinação da Procuradoria-Geral e da Defensoria Pública do Estado, que optarem pelo quadro de servidores estaduais, serão denominados Procuradores ou Defensores Públicos do Estado, assegurado o direito de integrar os respectivos quadros de carreira.”) e contra os artigos 85, 86 e 87 da Lei Complementar estadual 8/94 (“Art. 85 - Na forma do disposto no art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado do Amapá, os Assistentes Jurídicos, pertencentes ao Quadro do extinto Território Federal do Amapá, e que à data da promulgação da Constituição do Estado do Amapá estavam em efetivo exercício na Defensoria Pública do Estado, poderão, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a partir da Publicação desta Lei Complementar, fazer opção pelo Quadro de Defensores Públicos do Estado do Amapá, no cargo efetivo de Defensor-Público do Estado de Categoria Especial. Art. 86 - É assegurado aos ocupantes de cargos efetivos de Assistentes Jurídicos, lotados na Defensoria Pública do Estado, o ingresso, mediante opção, na carreira de Defensor-Público do Estado de 1ª Categoria, no prazo previsto no artigo anterior. Art. 87 - Enquanto não preenchidos os cargos de Carreira da Defensoria Pública do Estado, o Defensor-Público Geral, as Chefias de Defensorias, Núcleos Regionais e da Corregedoria serão exercidas pelos Assistentes Jurídicos, com direitos e vantagens previstos nos artigos 59 e 64 desta Lei.”). O requerente alegava ofensa aos artigos 5º, caput; 37, caput, II e V, da CF. Declarou-se a inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados por se considerar que os mesmos violavam o princípio do concurso público (CF, art. 37, II: “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”), assegurando-se, no entanto, os direitos provenientes do art. 22 do ADCT da CF/88 (“Art. 22. É assegurado aos defensores públicos investidos na função até a data de instalação da Assembléia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira, com a observância das garantias e vedações previstas no art. 134, parágrafo único, da Constituição.”).
O Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado contra ato da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - CPMI do BANESTADO, que investiga evasão de divisas e outros crimes, consubstanciado na determinação de quebra de sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático dos impetrantes. Alegava-se a nulidade do ato coator, por ausência de fundamentação, uma vez que a quebra fora determinada sem que estivesse embasada em um mínimo de provas. Entendeu-se que a alegação era improcedente, já que a quebra em questão apresentara lastro fático suficiente a demonstrar, a princípio, o envolvimento dos impetrantes com os fatos investigados pela CPMI. Ressaltou-se que a comissão parlamentar de inquérito, por atuar na fase meramente investigatória, prescinde, para determinação de quebra de sigilo de dados, de fundamentação exaustiva, equiparável à exigida dos órgãos judiciais, destinando-se a levantar dados acerca de determinados fatos, para que, se for o caso, sejam os mesmos encaminhados ao titular da ação penal.
O Tribunal negou provimento a recurso extraordinário interposto, com fundamento na alínea b do inciso III do art. 102 da CF, contra acórdão do TRF da 4ª Região que entendera ser devido o pagamento, pelo INSS, de honorários advocatícios em execução contra ele movida e não embargada, tendo em conta precedente da Corte Especial daquele Tribunal, no qual se declarara a inconstitucionalidade do art. 1º-D da Lei 9.494/97, na redação que lhe foi dada pela Medida Provisória 2.180-35/2001 (“Art.1o-D. Não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas.”) por não se vislumbrar a presença dos requisitos de relevância e urgência previstos no art. 62 da CF. Inicialmente, ressaltou-se a devolutividade ilimitada da análise da constitucionalidade da norma quando interposto o recurso extraordinário pela alínea b do permissivo constitucional. Em seguida, declarou-se, por maioria, incidentemente, a constitucionalidade da Medida Provisória 2.180-35/2001, com interpretação conforme de modo a reduzir-lhe a aplicação à hipótese de execução, por quantia certa, contra a Fazenda Pública (CPC, art. 730), excluídos os casos de pagamentos de obrigações definidos em lei como de pequeno valor, objeto do § 3º do art. 100 da CF (“Art. 100. À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. ... §3º O disposto no caput deste artigo, relativamente à expedição de precatórios, não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor que a Fazenda Federal, Estadual, Distrital ou Municipal deva fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado.”). Entendeu-se que a norma impugnada veio a socorrer situação relevante e emergencial de urgência legislativa, tendo em conta a explosão da litigiosidade contra certas áreas da Fazenda Pública. Ressaltou-se a peculiaridade da execução por quantia certa contra esta movida, na qual ela estaria obrigada, mesmo que quisesse adimplir a condenação de outra forma, a pagar pelo sistema de precatórios, salvo a partir do advento da EC 20/98, que excetuou dessa regra os precatórios de pequeno valor. Concluiu-se que, no caso concreto, o recurso deveria ser improvido por se estar diante de hipótese de execução dessa última modalidade. Vencidos, na questão prejudicial de constitucionalidade, os Ministros Carlos Velloso, relator, Carlos Britto e Marco Aurélio, que declaravam a inconstitucionalidade formal e integral da norma impugnada. (CPC: “Art. 730. Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor embargos em 10 (dez) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras: I - o juiz requisitará o pagamento por intermédio do presidente do tribunal competente; II - far-se-á o pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito.”).
A Turma referendou decisão do Min. Carlos Britto, relator, em ação cautelar, para conceder eficácia suspensiva a recurso extraordinário e garantir a permanência dos requerentes-recorrentes no serviço ativo da Força Aérea Brasileira – FAB. Na espécie, os recorrentes, militares temporários, licenciados ex officio da Corporação, pleiteiam o direito à estabilidade no serviço ativo da FAB, nos termos do art. 50, IV, da Lei 6.880/80 (“Art. 50. São direitos dos militares:... IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas: a) a estabilidade, quando praça com 10 (dez) ou mais anos de tempo de efetivo serviço;”). O recurso extraordinário fora interposto contra acórdão do TRF da 2ª Região, que reformara sentença, proferida em ação cautelar inominada, na qual se reconhecera a mencionada estabilidade e se determinara a reintegração dos militares, tendo em conta a comprovada prestação de cerca de dez anos de serviço militar e a ausência de devida motivação da autoridade militar para interromper “a carreira das armas”. Entendeu-se presente o periculum in mora, consubstanciado na edição de “ato administrativo revigorando o licenciamento e o desligamento” dos requerentes-recorrentes e o fumus boni iuris, em razão da satisfação, em princípio, do requisito a que se refere o dispositivo legal aludido para aquisição da estabilidade. Ressaltou-se, ainda, que o voto já proferido no recurso extraordinário é pelo seu provimento e que está em jogo a situação funcional dos requerentes-recorrentes, com reflexo direto na sua remuneração, de natureza alimentar.
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a nulidade de acórdão de turma recursal de juizado especial criminal que indeferira idêntica medida e mantivera decisão de juízo singular que determinara o desarquivamento de inquérito policial instaurado contra o paciente pela suposta prática de lesões corporais simples. No caso concreto, o Ministério Público requerera o arquivamento do inquérito, por falta de interesse processual, em face da não localização da vítima para realização de exame complementar de corpo de delito, o que fora acolhido pelo juízo. Posteriormente, em decorrência da manifestação da vítima informando a existência de erro no endereço constante do mandado de intimação, o mesmo órgão ministerial pedira o desarquivamento do feito, o que também fora deferido. Sustentava o impetrante que o desarquivamento se dera em afronta ao art. 10, XXXIII, da Lei Complementar 28/92, do Estado do Rio de Janeiro (“Cabe ao Procurador-Geral requisitar autos arquivados, promover seu desarquivamento e, se for o caso, oferecer denúncia ou designar outro órgão do Ministério Público para fazê-lo.”), e, ainda, ao Enunciado 524 da Súmula do STF (“Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.”). Esclareceu-se, de início, que o art. 72 da Lei 9.099/95, ao exigir a presença da vítima para audiência preliminar, criou, implicitamente, na hipótese da mesma não ser localizada para tanto, nova modalidade de arquivamento das peças informativas diversa daquelas previstas no art. 18 do CPP, na Súmula 524 e na norma estadual invocada (Lei 9.099/95, art. 72: “Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.”; CPP, art. 18: “Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia.”). Entendeu-se que, sendo hipótese de crime condicionado à representação do ofendido, o arquivamento do feito somente seria considerado definitivo se a vítima, ciente deste, se mantivesse inerte, o que não ocorrera na espécie. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por considerar que, em homenagem à segurança jurídica, a existência da premissa errônea não seria suficiente, por si só, para acatar o pedido de reconsideração do arquivamento.
A Turma, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de Minas Gerais contra acórdão do tribunal de justiça do mesmo Estado que, reformando sentença, entendera ser a recorrida, professora convocada da rede estadual de ensino, beneficiária da estabilidade prevista no art. 19 do ADCT (“Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público”). O recorrente alegava que o instituto da convocação seria modalidade de contratação sob regime especial e por tempo determinado não amparado pelo art. 19 do ADCT e que não teria havido exercício contínuo da função no período a que alude o referido dispositivo constitucional. Entendeu-se, tendo em conta a singularidade do caso, que os breves intervalos verificados nas contratações firmadas com a recorrida, decorrentes da própria natureza da atividade prestada (magistério), não descaracterizariam o direito da servidora. Asseverou-se, ainda, que o art. 19 do ADCT visou beneficiar aqueles que vinham prestando serviço continuado e não mencionou a exigência de que o serviço fosse prestado por período ininterrupto. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que dava provimento ao recurso por considerar que se deveria dar interpretação restritiva ao requisito a que alude o art. 19 do ADCT, norma transitória e exceção à regra do art. 37, II, da CF, no sentido de que o mesmo exigiria, para obtenção da estabilidade, a prestação do serviço pelo prazo de cinco anos contínuos e ininterruptos.