Este julgado integra o
Informativo STF nº 656
Em conclusão, a 2ª Turma, por maioria, denegou habeas corpus no qual denunciado pela suposta prática do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido pleiteava o trancamento de ação penal — v. Informativos 601 e 612. Entendeu-se que, após a entrada em vigor da Lei 10.826/2003, a hipótese seria de crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importaria o resultado concreto da ação. Aduziu-se que a referida lei, além de tipificar o simples porte de munição, não exigiria para a configuração do crime sob análise que a arma estivesse municiada, de acordo com que se extrairia da redação do art. 14 daquele diploma legal. Avaliou-se, ainda, que o trancamento de ação penal seria medida reservada a situações excepcionais, como a manifesta atipicidade da conduta, a presença de causa de extinção da punibilidade do paciente ou a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas, inocorrentes na espécie. Para evitar supressão de instância, não se conheceu da alegação, não apreciada pelo STJ nem pelo tribunal estadual, de que o paciente fora autorizado, por presidente da Corte estadual, a portar arma, a qual só não estaria registrada em seu nome porque, à época dos fatos, ainda vigoraria o prazo legal para o devido registro. Não obstante, explicitou-se que esse prazo, espécie de vacatio legis indireta, teria sido destinado aos proprietários e possuidores de arma de fogo (Lei 10.826/2003, art. 12), e não àqueles acusados de porte ilegal (art. 14) . Vencido o Min. Celso de Mello, que concedia a ordem por entender destituída de tipicidade penal a conduta imputada ao paciente.
Lei 10.826/2003, arts. 12 e 14.
Número do Processo
96759
Tribunal
STF
Data de Julgamento
28/02/2012
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As mudanças ocorridas no Direito, principalmente a partir da universalização dos direitos humanos e da criação consensual de instâncias supranacionais para protegê-los e punir os responsáveis por suas violações, implicou a progressiva e lenta reestruturação do processo penal moderno, para um modelo incriminatório universal em que as fronteiras não sejam obstáculo para a justiça ou refúgio para a impunidade. Uma dessas mudanças diz respeito aos limites de aplicação do ne bis in idem , a um primeiro olhar mais restritos quando aplicados no âmbito da jurisdição transnacional do que em sua corrente incidência dentro de cada ordenamento jurídico. Nesse contexto, pela análise de normativas internacionais incorporadas e vigentes no ordenamento jurídico brasileiro, constata-se a regra de que é a sentença definitiva oriunda de distintos Estados soberanos - e não a existência de litígio pendente de julgamento - que pode obstar a formação, a continuação ou a sobrevivência da relação jurídica processual que configuraria a litispendência. Prevalece, portanto, que a pendência de julgamento de litígio no exterior não impede o processamento de demanda no Brasil, até mesmo porque, como é cediço, no curso da ação penal pode ocorrer tanto a alteração da capitulação ( emendatio libeli ) como, também, da imputação penal ( mutatio libeli ), o que, por si só, é suficiente para exigir maior cautela na extinção prematura de demandas criminais em Estados soberanos distintos. Seria temerário, pois, também sob esse aspecto, aniquilar o cumprimento da pena no território brasileiro. Além disso, poderá incidir o art. 8º do Código Penal, que, embora não cuide propriamente da proibição de dupla punição e persecução penais, dispõe sobre o modo como deve ser resolvida a situação de quem é punido por distintos Estados soberanos pela prática do mesmo delito, nos seguintes termos: "A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas".
Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as condições da ação, aí incluída a legitimidade, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial. Na hipótese, o administrador foi demandado pelo fato de ter realizado a liquidação do fundo de investimento, mediante distribuição do patrimônio líquido entre os cotistas, sem o prévio pagamento de um suposto passivo. No entanto, a Instrução CVM n. 391/2003, que primeiro tratou especificamente dos Fundos de Investimento em Participações (FIPs), já incluía entre as obrigações do administrador o dever de "cumprir e fazer cumprir todas as disposições do regulamento do fundo" (art. 14, XV). Desse modo, a satisfação integral do passivo antes da partilha do patrimônio líquido entre os cotistas está, em regra, inserida entre as atribuições do administrador, sendo dele a responsabilidade, em tese, por eventuais prejuízos que guardem nexo de causalidade com a sua inobservância.
A norma processual que possibilita a declaração da prescrição, de ofício, pelo juiz, estabelecida no Código de Processo Civil de 1973, em seu art. 219, § 5º, não encerra um dever do magistrado. Trata-se, pois, de matéria circunscrita à disposição das partes, sobre a qual o juiz não pode se sobrepor, ainda que motivado pela celeridade/efetividade processual, sob pena de incorrer em manifesto desvirtuamento do instituto, o qual se relaciona, intrinsecamente ao direito material das partes interessadas. Aliás, a matéria afeta à prescrição, caso não reconhecida de ofício pelo juiz, há de ser suscitada pela parte a que beneficia -, caso queira valer-se dessa exceção substancial -, necessariamente, até o exaurimento das instâncias ordinárias, não sendo mais possível o conhecimento da matéria na instância especial. Veja-se, portanto, que, a despeito de a prescrição ser passível de ser reconhecida de ofício, pode precluir no bojo do processo em que a pretensão de exigir a realização de uma prestação é exercida pela parte lesada. Com mais razão, ante a superveniência da sentença transitada em julgado, opera-se, por conseguinte, a preclusão máxima, mediante a conformação da coisa julgada. Desse modo, o fato de o magistrado não reconhecer, de ofício, a prescrição não redunda na ofensa à literalidade do § 5º, do art. 219 do CPC/1973, a subsidiar ação rescisória, com fulcro no art. 485, V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015), pois, como assentado, ao juiz não se impõe o dever de deliberar sobre a matéria de livre disposição das partes litigantes. Por fim, não se pode deixar de reconhecer que a violação literal de lei, como fundamento da ação rescisória, pressupõe que o órgão julgador, ao deliberar sobre a questão posta, confira má aplicação a determinado dispositivo legal ou deixe de aplicar dispositivo legal que, supostamente, segundo a compreensão do autor da rescisória, melhor resolveria a controvérsia. Em uma ou outra situação, é indispensável que a questão aduzida na ação rescisória tenha sido objeto de deliberação na ação rescindenda.
De acordo com o art. 16, VII, da Lei n. 9.656/1998, os planos de saúde podem ser contratados por meio de três regimes diferentes: individual/familiar, coletivo empresarial ou coletivo por adesão. A exclusão de beneficiários de plano de saúde coletivo após a cessação do seu vínculo com a pessoa jurídica estipulante está disciplinada por lei e por resolução da agência reguladora e só pode ocorrer após a comprovação de que foi verdadeiramente assegurado o direito de manutenção. Hipótese diversa, entretanto, é aquela em que a pessoa jurídica estipulante rescinde o contrato com a operadora, afetando não apenas um beneficiário, senão toda a população do plano de saúde coletivo. Para situações desse jaez, a ANS estabelece que se extingue o direito assegurado nos artigos 30 e 31 da Lei n. 9.656/1998, pelo cancelamento do plano de saúde pelo empregador que concede este benefício a seus empregados ativos e ex-empregados. Assim, independente de o pagamento da contribuição do beneficiário ter sido realizado diretamente em favor da pessoa jurídica estipulante por mais de dez anos, a rescisão do plano de saúde coletivo ocorreu em prejuízo de toda população anteriormente vinculada. Nesta hipótese, as operadoras que mantenham também plano de saúde na modalidade individual ou familiar deverão disponibilizar este regime ao universo de beneficiários, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência, nos termos da Resolução n. 19/1999 do Conselho de Saúde Suplementar.
O art. 1.015, I, do CPC/2015, deve ser lido e interpretado como uma cláusula de cabimento de amplo espectro, de modo a permitir a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias que digam respeito não apenas ao núcleo essencial da tutela provisória, mas também que se refiram aos aspectos acessórios que estão umbilicalmente vinculados a ela, porque, em todas essas situações, há urgência que justifique o imediato reexame da questão em 2º grau de jurisdição. Todavia, por maior que seja o espectro da referida cláusula de cabimento, não se pode incluir nela questões que não se relacionem minimamente com o núcleo essencial da tutela provisória, sob pena de serem desnaturados institutos jurídicos ontologicamente distintos e verdadeiramente inconfundíveis. Embora exista, evidentemente, uma natural relação de prejudicialidade entre a ação de conhecimento em que se impugna a existência do título e a ação executiva fundada nesse mesmo título, é preciso esclarecer que a suspensão do processo executivo em virtude dessa prejudicialidade externa não está fundada em urgência, nem tampouco a decisão que versa sobre a suspensão do processo versa sobre tutela de urgência. Com efeito, o valor que se pretende tutelar quando se admite suspender um processo ao aguardo de resolução de mérito a ser examinada em outro processo é a segurança jurídica. Desse modo, a decisão interlocutória que versa sobre suspensão do processo por prejudicialidade externa, fundada em segurança jurídica, em nada se relaciona com a decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória, fundada em urgência ou evidência, não sendo o mero risco de prolação de decisões conflitantes ou a hipotética e superveniente perda de objeto elementos hábeis a comprometer o resultado útil do processo. Nesse contexto, bastaria o ajuizamento de ação autônoma de impugnação do título em que se funda a execução para criar, inclusive artificialmente, o suposto risco ao resultado útil do processo e, assim, paralisar o andamento da ação executiva, o que, além de contrariar expressa disposição de lei - art. 784, § 1º, do CPC/2015 -, também representaria inegável retrocesso em termos de efetividade da execução e consequente violação à norma fundamental prevista no art. 4º do CPC/2015.