Revista íntima ilegal na busca domiciliar não acarreta nulidade automática das provas

STJ
854
Direito Processual Penal
Geral
2 min de leitura
Atualizado em 25 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STJ 854

Tese Jurídica

A ilegalidade da revista íntima durante a busca domiciliar não invalida, por si só, as provas obtidas na residência.

Comentário Damásio

Resumo

A essência da teoria dos frutos da árvore envenenada ( fruits of the poisonous tree ), de origem norte-americana, consagrada no art. 5º, LVI, da Constituição Federal, proclama a mácula de provas supostamente lícitas e admissíveis, obtidas, porém, a partir de provas declaradas nulas pela forma ilícita de sua colheita. A inadmissibilidade das provas derivadas das ilícitas, todavia, não se estende a todas as provas do processo. Tendo em vista o disposto no art. 157, § 1º, parte final, e § 2º, do CPP - que consagram exceções concebidas também no direito norte-americano - é necessário averiguar (a) se a prova ilicitamente obtida seria inevitavelmente descoberta de outro modo ( inevitable discovery ), a partir de outra linha legítima de investigação, ou (b) se tal prova, embora guarde alguma conexão com a original, ilícita, não tem relação de total causalidade em relação àquela, pois outra fonte a sustenta ( independent source ). No caso, policiais civis compareceram à residência da acusada para cumprir mandado de busca domiciliar. Durante a execução do mandado, policiais femininas realizaram revista íntima na acusada. Na delegacia de polícia e no estabelecimento penal, foram realizadas mais duas revistas íntimas. Nenhuma prova foi apreendida em decorrência das revistas íntimas. Na residência, por sua vez, apreenderam-se drogas, dinheiro e pesticidas. Conforme pontuado pelas instâncias ordinárias, são ilícitas as três revistas íntimas a que foi submetida, desnecessária e injustificadamente, a acusada, de modo a configurar grave violação à dignidade da pessoa humana por agentes de Estado. Entretanto, a despeito da manifesta gravidade da ilicitude das três revistas íntimas, tal ilicitude não tem por consequência a inadmissibilidade de todas as provas colhidas durante a execução do mandado de busca domiciliar, em razão da inexistência de nexo de causalidade entre o meio de obtenção de prova declarado ilícito e as provas mencionadas. Com efeito, para a definição das provas inadmissíveis em razão da ilicitude dos meios de obtenção empregados, é necessário, à luz do art. 157, § 1º, do CPP, verificar a existência de nexo de causalidade entre o meio de obtenção de prova declarado ilícito e as provas produzidas nos autos. Como reconheceu o Tribunal de origem, nenhuma prova foi apreendida em decorrência das revistas íntimas - seja daquela realizada incidentalmente à busca domiciliar, seja daquelas realizadas posteriormente, na delegacia de polícia e no estabelecimento penal. Todas as provas constantes nos autos foram localizadas durante a busca na residência, de modo que não há nenhum nexo causal entre a apreensão das provas localizadas na residência e as revistas íntimas declaradas ilícitas. Além disso, a inexistência de nexo causal entre as revistas íntimas ilícitas e as provas apreendidas pode ser mais bem evidenciada a partir de um juízo hipotético de eliminação, típico da apuração da causalidade simples (causa como conditio sine qua non do evento): se as revistas íntimas não tivessem sido realizadas, ainda assim as provas incriminatórias (as drogas, o dinheiro e os pesticidas) teriam sido produzidas, pois elas foram encontradas no interior na residência (em decorrência da busca domiciliar), e não no corpo da acusada (em decorrência das revistas íntimas). Ademais, mesmo em relação à revista íntima realizada no interior da residência, vale destacar que, de acordo com o art. 244 do CPP, é admissível a execução de busca pessoal incidental à busca domiciliar, independentemente de mandado prévio. Todavia, eventual ilegalidade na execução da busca pessoal incidental não acarreta, por derivação, a ilegalidade de toda a busca domiciliar. Assim, embora sem ignorar ou mesmo mitigar a gravidade da ilicitude verificada no caso, é imperativo reconhecer que são admissíveis as provas derivadas da busca domiciliar, pois não derivadas das revistas íntimas ilícitas, na forma do art. 157, § 1º, do CPP.

Conteúdo Completo

A ilegalidade da revista íntima durante a busca domiciliar não invalida, por si só, as provas obtidas na residência.

Informações Gerais

Número do Processo

REsp 2.159.111-RS

Tribunal

STJ

Data de Julgamento

06/05/2025

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