Reprodução acadêmica de fatos de interesse público em boa-fé e a inexistência de responsabilidade civil

STJ
860
Direito Civil
Direito Constitucional
Geral
2 min de leitura
Atualizado em 27 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STJ 860

Tese Jurídica

A reprodução de fato de relevância pública, ainda que sensível, quando feita em contexto acadêmico, de boa-fé, com finalidade científica, sem promover acusação pessoal, não configura abuso de direito nem enseja responsabilização civil.

Resumo

Cinge-se a controvérsia em verificar a eventual responsabilização civil de autoras de artigos científicos que mencionarem, em suas obras, acusação de crime, feita por terceiro em rede social, sem posterior comprovação da veracidade dessa imputação. No caso analisado, uma mulher fez uma postagem em mídia social relatando que sofreu diversos tipos de crimes de violência de gênero por parte de seu antigo professor universitário e então empregador, motivo pelo qual decidiu retirar a própria vida. Pouco tempo depois da postagem, ela cometeu suicídio. Posteriormente, a publicação, que citava expressamente o nome do acusado, foi retirada da mídia social. Todavia, o conteúdo da mensagem já havia se difundido nas redes sociais, chegando a diversos meios de comunicação, inclusive livro eletrônico. Ocorre que não foram comprovadas as acusações feitas. Por essa razão, o professor requereu a exclusão de qualquer menção, direta ou indireta, ao episódio, com nova publicação do livro e retirada de circulação da versão original, entre diversos outros pedidos reparatórios. As liberdades de informação, de expressão e de imprensa, conquanto garantias essenciais ao regime democrático, não autorizam o abuso. São vedadas, por exemplo, críticas com propósito exclusivo de atacar a honra ou a imagem de terceiros, desprovidas de interesse público legítimo. Para o direito à informação, não se exige uma verdade absoluta, mas sim uma versão séria e honestamente construída dos acontecimentos, obtida por meio de apuração diligente. A responsabilização, nesse campo, decorre da negligência na verificação dos fatos ou da intenção deliberada de propagar falsidade. É preciso distinguir os contornos jurídicos da liberdade de expressão quando exercida pela imprensa - notadamente por veículos jornalísticos - daqueles aplicáveis à produção acadêmica, sendo esses últimos especialmente representados pelos artigos científicos. O interesse público, que já é presumido na divulgação de informações verídicas pela imprensa, quando divulgado com fins acadêmicos, torna-se ainda mais latente, em razão de sua função intelectual, didática e não lucrativa. O Tema n. 995/STF, embora traga parâmetros relevantes sobre a responsabilização por reprodução de imputações falsas feitas por terceiros, não se aplica de forma automática ou integral à situação em comento, pois se discute menções feitas em produção científica voltada à análise crítica de fenômenos sociais. Assim, embora o precedente tenha como foco a atuação jornalística, a lógica subjacente da exigência de má-fé para fins de responsabilização civil também pode ser aplicada analogicamente à hipótese, respeitadas as especificidades da atividade científica. Nesse sentido, se para fins jornalísticos, a replicação de informação dada por terceiro gera a responsabilidade da empresa jornalística de indenizar se comprovada a má-fé, somente poderia um pesquisador ser responsabilizado por citar uma afirmação feita por terceiro se houver prova inequívoca da má-fé. Dessa forma, a simples replicação de manifestação alheia não configura abuso do direito de informação nem autoriza a responsabilização civil dos autores de artigo científico.

Conteúdo Completo

A reprodução de fato de relevância pública, ainda que sensível, quando feita em contexto acadêmico, de boa-fé, com finalidade científica, sem promover acusação pessoal, não configura abuso de direito nem enseja responsabilização civil.

Informações Gerais

Número do Processo

Segredo de justiça I - Info 860

Tribunal

STJ

Data de Julgamento

12/08/2025

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