Supremo Tribunal Federal • 4 julgados • 19 de set. de 2003
Concluído o julgamento de habeas corpus em que se discutia o alcance da expressão “racismo”, contida no inciso XLII do art. 5º (“a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”). Tratava-se, na espécie, de habeas cor¬pus impetrado em favor de condenado como incurso no art. 20 da Lei 7.716/89 (na redação dada pela Lei 8.081/90) pelo delito de discriminação contra os judeus, por ter, na qualidade de escritor e sócio de editora, publicado, distribuído e vendido ao público obras anti-semitas, delito este ao qual foi atribuída a imprescritibilidade prevista no art. 5º, XLII, da CF (v. Informativos 294, 304, 314 e 318). O Tribunal, por maioria, acompanhou o voto proferido pelo Min. Maurício Corrêa no sentido do indeferimento do writ, sob o entendimento de que o racismo é antes de tudo uma realidade social e política, sem nenhuma referência à raça enquanto caracterização física ou biológica, refletindo, na verdade, reprovável comportamento que decorre da convicção de que há hierarquia entre os grupos humanos, suficiente para justificar atos de segregação, inferiorização e até de eliminação de pessoas. Vencidos os Ministros Moreira Alves, relator, e Mar¬co Aurélio, que deferiam a ordem para declarar a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado, por entenderem não caracterizada na espécie a prática do delito de racismo. O Min. Marco Aurélio, ao pro¬ferir seu voto, salientando a necessidade do exame da causa em face da realidade social brasileira — na qual não há predisposição para a prática de discriminação contra o povo judeu, diferentemente do que ocorre com o negro, para o qual a CF/88 conferiu a proteção prevista no inciso XLII do art. 5º —, e tendo em conta a colisão entre os direitos fundamentais da liberdade de ex¬pres¬são e da proteção à dignidade do povo judeu, considerou não demonstrado que a conduta do paciente pudesse resultar em incitação à prática de discriminação ou colo¬car em risco a segurança do povo judeu, a justificar limitação do direito à liberdade de ex¬pres¬são. Vencido, também, o Min. Carlos Britto, que concedia a ordem de ofício para absolver o paciente, por reconhecer a atipicidade da conduta a ele imputada.
A Turma deferiu habeas corpus para restabelecer a de¬¬cisão que rejeitara a denúncia oferecida contra o paciente pela suposta prática do crime previsto no art. 219 do CPM, por ter narrado, em livro de sua autoria, fatos tidos por ofensivos ao Exército. Considerou-se não evidenciado na espécie o dolo necessário à configuração do tipo penal, já que a denúncia não demonstrara que o paciente veiculara fatos que sabia inverídicos, salientando-se, ainda, que os citados fatos não seriam aptos a prejudicar a imagem das Forças Armadas junto à opinião pública (CPM, art. 219: “Propalar fatos, que sabe inverídicos, capazes de ofender a dignidade ou abalar crédito das Forças Armadas ou confiança que esta merecem do público...).
Tendo em conta a possibilidade de desistência de mandado de segurança independentemente da anuência do impetrado, a Turma, por maioria, manteve decisão do Min. Ilmar Galvão, relator, que homologara, em sede de re¬curso extraordinário, pedido de desistência de mandado de segurança requerido pela impetrante. Ressaltou-se, na espécie, o fato de que não havia ainda julgamento definitivo do mérito, haja vista a pendência da apreciação do recurso extraordinário. Vencido o Min. Marco Aurélio por entender que, uma vez prolatada a sentença, não seria possível a desistência, pois, estar-se-ia dando caráter de ação rescisória à vontade do impetrante.
Entendendo que a questão submetida à apreciação da Corte deverá ser examinada pelo juízo da execução, a Turma negou provimento a agravo regimental em recurso extraordinário, em que titulares de contas vinculadas ao FGTS questionam decisão que determinara a repartição e a compensação das custas e dos honorários advocatícios na proporção das sucumbências.