Supremo Tribunal Federal • 14 julgados • 03 de nov. de 2005
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O Tribunal recebeu denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal em que se imputa a Deputado Federal a suposta prática de crime de corrupção ativa em concurso de pessoas (CP, art. 333 c/c art. 29). Na espécie, o então relator do processo, Min. Sydney Sanches, com ba¬se no disposto na redação primitiva dos §§ 1º e 2º do art. 53 da CF, solicitara licença à Câmara dos Deputados e ordenara a suspensão do curso do prazo prescricional, tendo, posteriormente, em face da publicação da EC 35/2001, determinado a notificação do denunciado para oferecer resposta. Inicialmente, afastou-se a alegação de prescrição da pretensão punitiva. Considerou-se que o termo a quo da prescrição tivera início na data em que o crime supostamente se consumara, suspendendo-se com o despacho de solicitação da licença à Casa Legislativa, conforme precedentes da Corte, à luz do disposto na redação primitiva do art. 53, § 2º, da CF, retomando seu curso com a publicação da EC 35/2001. No mais, entendeu-se haver indícios suficientes de autoria e materialidade do crime e que a denúncia atende aos pressupostos do art. 41 do CPP, com a exposição do fato criminoso e todas as suas circunstâncias e a classificação do delito.
O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Confederação Nacional do Comércio - CNC contra o art. 1º da Lei 7.844/92, do Estado de São Paulo, que assegura aos estudantes o pagamento de meia-entrada do valor cobrado para o ingresso em eventos esportivos, culturais e de lazer. Inicialmente, afastou-se a inconstitucionalidade formal alegada, ao fundamento de que os Estados-membros e o Distrito Federal, por força do disposto no art. 24, I, da CF, detêm competência concorrente para legislar sobre o direito econômico. Asseverou-se que, no caso, inexistindo lei federal regulando a matéria, o Estado-membro editou a lei em questão no exercício de competência legislativa plena (CF, art. 24, § 3º). Da mesma forma, foram rejeitados os argumentos quanto a vícios de inconstitucionalidade material. Esclareceu-se que, para que sejam realizados os fundamentos do art. 1º e os fins do art. 3º, da CF, é necessário que o Estado atue sobre o domínio econômico, sendo essa intervenção não só adequada, mas indispensável à consolidação e preservação do sistema capitalista. Considerou-se, destarte, que, se de um lado a Constituição assegura a livre iniciativa, de outro determina ao Estado a adoção de providências tendentes a garantir o efetivo exercício do direito à educação, à cultura e ao desporto (CF, arts. 23, V; 205; 208; 215 e 217, § 3º), ressaltando que, na composição entre esses princípios e regras, há de ser preservado o interesse da coletividade. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso que julgavam procedente o pedido.
Em conclusão de julgamento, o Tribunal proveu agravo regimental em mandado de segurança impetrado contra decreto do Presidente da República — que declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural —, para reconhecer a legitimidade do impetrante, promitente comprador do imóvel, para figurar no pólo ativo da demanda — v. Informativo 389. Entendeu-se que, tanto à luz do novo Código Civil quanto da legislação civil a ele anterior, o promitente comprador, quando efetua o registro da promessa de compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis, passa a ter direito real à aquisição do bem, oponível erga omnes, com o poder de seqüela que é próprio dos direitos dessa natureza. O Min. Joaquim Barbosa, relator, reajustou seu voto.
Concluído julgamento de mandado de segurança impetrado contra decreto do Presidente da República, que demitira o impetrante do cargo de fiscal do trabalho, do Ministério do Trabalho, pela prática de diversas infrações previstas na Lei 8.112/90, apuradas por comissão de inquérito. O impetrante alegava ser vítima de trama planejada por desafeto seu, com participação dos membros da referida comissão, e que o processo administrativo contra ele instaurado estaria eivado de ilegalidades — v. Informativo 380. O Tribunal, por maioria, indeferiu a ordem. Entendeu-se que a análise do conjunto probatório produzido em sede administrativa, necessária à verificação da procedência da primeira alegação, é incompatível com a via eleita, devendo o impetrante, para tanto, recorrer às vias ordinárias. Ressaltou-se que, apesar de o relatório final apresentado pela comissão de inquérito conter redação inadequada à boa técnica administrativa, com trechos em que há referências pejorativas sobre o impetrante, tal inconveniente, por si só, não macularia o procedimento administrativo realizado, já que as conclusões a que chegara o mencionado relatório não vinculariam a autoridade julgadora, conforme precedente da Corte (MS 21280/DF, DJU de 20.3.92). Além disso, a censura, quanto a esse ponto, feita pelas diversas instâncias administrativas pelas quais tramitara o processo consistiria numa demonstração de que a autoridade julgadora não teria sido influenciada pelas impropriedades contidas no relatório. Por fim, asseverou-se não ter ocorrido cerceamento de defesa, porquanto não arroladas como testemunhas as pessoas que o impetrante afirmara não terem sido ouvidas pela comissão. Vencidos os Ministros Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence, que, vislumbrando ofensa ao devido processo legal, deferiam a segurança.
Considerando configurada a afronta aos artigos 2º; 37, XXI; e 175, da CF, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Governador do Estado do Espírito Santo para declarar a inconstitucionalidade da Lei Estadual 7.304/2002, resultante de iniciativa parlamentar, que exclui as motocicletas da relação de veículos sujeitos ao pagamento de pedágio e concede aos estudantes desconto de 50% sobre o valor do mesmo. Afastou-se, primeiramente, a alegação de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa, uma vez que os casos de limitação da iniciativa parlamentar estão previstos, numerus clausus, no § 1º do art. 61 da CF, que trata de matérias relativas ao funcionamento da Administração, em especial as atinentes a servidores e órgãos do Poder Executivo, não se podendo ampliar o rol para qualquer situação que gere aumento de despesas para o Estado-membro. Por outro lado, entendeu-se que a lei em análise, ao conceder isenções sem prever nenhuma forma de compensação, afetou o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão celebrado entre a Administração capixaba com a empresa concessionária, avançou sobre a política tarifária estabelecida contratualmente e sob o controle do poder concedente, e introduziu elemento novo na relação contratual, incorrendo em indevida ingerência do Poder Legislativo na esfera própria das atividades da Administração Pública.
A propositura de ação civil pública com pedido de declaração de inconstitucionalidade com efeitos erga omnes decorrente do próprio objeto do pedido e não como causa de pedir, usurpa a competência do STF para julgar ação direita de inconstitucionalidade O Tribunal, por maioria, julgou procedente reclamação ajuizada contra tutela antecipada concedida por juiz federal de seção judiciária de São Paulo, que suspendera a aplicação do art. 1º da Medida Provisória 14/2001, convertida na Lei 10.438/2002. Salientou-se, inicialmente, a existência de ação direta em que se objetiva a declaração da inconstitucionalidade da citada lei e de que a ação civil pública em questão - em que se impugna a validade de encargo tarifário (seguro anti-apagão) - fora proposta antes da conversão e do ajuizamento dessa ADI. Entendeu-se que a decisão impugnada usurpou a competência privativa do Supremo para julgar ação direta de inconstitucionalidade que tenha como parâmetro a Constituição Federal, uma vez que, no caso, a ação civil é proposta contra a União e a ANEEL e a declaração de inconstitucionalidade com efeitos erga omnes é posta como o próprio objeto do pedido e não como causa de pedir. Vencido o Min. Marco Aurélio que não reconhecia a usurpação da competência da Corte por considerar que o pronunciamento, afastando a incidência da lei, seria restrito e indispensável à acolhida da medida acauteladora. Rcl julgada procedente para cassar a medida liminar concedida, declarar a incompetência do reclamado e determinar o arquivamento da ação civil pública.
Com base no art. 40, § 8º da CF — que determina a extensão aos inativos de quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade — a Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental para negar provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de São Paulo contra acórdão que estendera, por sua generalidade, a servidores aposentados a Gratificação por Atividade de Suporte Administrativo - GASA, instituída pela LC estadual 876/2000. Reconheceu-se o direito dos servidores inativos a terem incorporada em seus proventos a referida gratificação, tendo em vista tratar-se de vantagem deferida de forma geral. O Min. Sepúlveda Pertence asseverou que a não incorporação da GASA aos proventos não a transformaria em gratificação precária, passível de ser subtraída de servidores. Vencido o Min. Eros Grau, relator, que negava provimento ao agravo regimental. O Min. Cezar Peluso retificou o voto proferido em 21.9.2004.
Por falta de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para fulminar procedimento instaurado contra titular de ofício de registro de imóveis acusado pela suposta prática do crime de desobediência (CP, art. 330). No caso concreto, o paciente, em dúvida sobre a possibilidade de registrar carta de adjudicação emanada de Vara do Trabalho, questionara Juiz de Direito da Vara dos Registros Públicos, o qual consignara o acerto da sua recusa em proceder ao imediato registro. Após as providências cabíveis, o título fora registrado e o Juízo da Vara do Trabalho acionara o Ministério Público. Entendeu-se que o paciente limitara-se a cumprir dever imposto pela Lei de Registros Públicos. Ressaltou-se, ainda, a viabilidade de se ter como agente do crime de desobediência pessoa que implemente atos a partir de função pública, na espécie, delegatário de poder público (CF, art. 236).
A Turma negou provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado do Espírito Santo e manteve acórdão do Tribunal de Justiça do respectivo Estado que reconhecera a aquisição de estabilidade, nos termos do art. 19 do ADCT, de servidora nomeada em substituição e que permanecera no cargo por mais de 10 anos. Sustentava o recorrente a violação ao art. 37, caput, da CF, e ao art.19, § 2º, do ADCT — que excepciona que a estabilidade é inaplicável aos ocupantes de cargos, funções e empregos que a lei declare de livre exoneração —, enfatizando que a recorrida não ocupava cargo efetivo, mas em substituição. Ressaltando que a estabilidade é a aderência à integração ao serviço público a qual não se confunde com efetividade, que é atributo do cargo, entendeu-se que o fato de a servidora estar no exercício de substituição não retira dela o direito à estabilidade. Considerou-se, ademais, que o Estado não comprovara que ela estivesse em alguma das hipóteses de exceção previstas no art. 19, § 2º, do ADCT.
A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Estado do Rio de Janeiro, com base no art. 102, III, a e c, da CF, contra acórdão do Tribunal de Justiça daquele Estado que deferira mandado de segurança para garantir a defensores públicos, procuradores de Estado e delegados de polícia a percepção de reajustes concedidos, a título de abonos, aos servidores públicos do referido ente federativo, bem como para assegurar-lhes a observância do teto limite remuneratório fixado em Decreto Legislativo estadual — v. Informativos 363 e 373. A Turma não conheceu do recurso pela alínea c, por entender que o referido Decreto não fora contestado perante a Constituição Federal, mas apenas servira de funda¬mento ao acórdão recorrido para invalidar ato do Poder Executivo local que fixara a remuneração dos secretários de Estado, este sim questionado em face do art. 49, VIII, da CF. No tocante ao fundamento previsto no art. 102, III, a, da CF, considerando que somente os artigos 2º e 37, X, da CF foram prequestionados, conheceu-se do recurso e a ele negou-se provimento. Asseverou-se que, no caso, tendo o tribunal de justiça examinado os decretos estaduais e concluído tratar-se de revisão geral, haveria óbice, em recurso extraordinário, em se concluir de forma diversa e reinterpretar direito local. Assim, estabelecida a premissa de se estar diante de revisão geral, e não de hipótese de reajuste setorial, aplicou-se o precedente firmado no RMS 22307/DF (DJU de 13.6.97), no qual, com fundamento na auto-aplicabilidade do art. 37, X, da CF, em sua redação original, afastou-se o Enunciado 339 da Súmula do STF para garantir a todos os servidores públicos federais o reajuste concedido aos servidores militares pelas Leis 8.622/93 e 8.627/93. Vencido o Min. Joaquim Barbosa que, considerando prequestionados os artigos 2º e 37, X e XI, da CF, conhecia do recurso apenas pela alínea a, julgando o apelo extremo prejudicado no que concerne à alínea c; e aplicava o Enunciado 339 da Súmula do STF (“Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento da isonomia”), entendendo violado o princípio da separação dos poderes (CF, art. 2º), uma vez que o acórdão impugnado estendera aos recorridos, com o argumento de haver tratamento discriminatório, aumento que não lhes fora concedido pelos atos normativos questionados.
Concluído julgamento de habeas corpus em que se pretendia a nulidade de processo penal pelo qual o paciente fora condenado por atentado violento ao pudor (CP, art. 214) e por resistência (CP, art. 329), sob a alegação de ofensa, na espécie, ao art. 225, caput, do CP, dado que o Ministério Público não possuiria legitimidade para propor ação penal, em face da ausência das hipóteses previstas no § 1º, I e II, do mesmo dispositivo — v. Informativo 404. Entendendo incidente, na espécie, o inciso I do § 1º do art 225 do CP (miserabilidade), a Turma indeferiu o writ. Asseverou-se não haver nada documentado no processo a comprovar que a vítima e sua representante tivessem condições financeiras para não se enquadrarem naquela situação, mas, que dos autos, infere-se que a última é trabalhadora doméstica, circunstância já reconhecida por este Tribunal como suficiente para presumir a hipossuficiência, além do que é divorciada, sendo falecido o pai do menor. Quanto à representação para ação penal pública, considerou-se ser suficiente a demonstração inequívoca do interesse na persecução criminal, e que, por tratar-se de notícia-crime coercitiva, qual a prisão em flagrante, bastaria a ausência de oposição expressa ou implícita da vítima ou de seus representantes, de tal modo que, pelo contexto dos fatos e da condução do processo, se verificasse a intenção de se prosseguir no processo, como no caso.
Compete à Justiça Federal o processamento e julgamento da ação penal proposta para apurar a prática do crime de parcelamento irregular de terras pertencentes à União. Com base nesse entendimento, a Turma, anulou, desde o recebimento da denúncia, processo penal pelo qual o requerente, Prefeito de São Francisco de Guaporé/RO, fora condenado, pela Justiça Estadual, à prestação de serviços à comunidade pela prática do referido delito.
A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STM que condenara general pela prática do crime de estelionato (CPM, art. 251). Na espécie, a acusação se dera porque o paciente, diante da sua transferência de unidade, por necessidade do serviço, solicitara as indenizações de transporte e ajuda de custo, previstas nos arts. 34 e 35 da Lei 8.237/91, mas não as utilizara para o fim requerido. Além disso, posteriormente à assunção do novo comando, solicitara sua transferência para a reserva. Entendeu-se atípica a conduta, por ausência de dolo antecedente, já que a transferência se dera por necessidade de serviço e as indenizações estavam fundadas em normas legais que dispensavam, inclusive, prestação de contas. HC deferido para restabelecer a sentença absolutória.
A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática dos crimes previstos nos artigos 309 e 311 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, cuja denúncia não mencionara os elementos integrantes do segundo tipo penal. Asseverou-se que a inicial, além de descrever a conduta do art. 309 do CTB (“Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano”), limitara-se a relatar a circunstância de o paciente haver trafegado com o veículo na contramão, causando acidente. Destarte, entendeu-se que o fato do qual se defendera o paciente não consta como núcleo do art. 311 do CTB (“Trafegar em velocidade incompatível com a segurança nas proximidades de escolas, hospitais, estações de embarque e desembarque de passageiros, logradouros estreitos, ou onde haja grande movimentação ou concentração de pessoas, gerando perigo de dano”). HC deferido para excluir da condenação o crime do art. 311 do CTB.