Supremo Tribunal Federal • 10 julgados • 17 de nov. de 2005
Inexiste razão para a realização de exames psicológico ou antropológico se presentes, nos autos, elementos suficientes para afastar qualquer dúvida sobre a imputabilidade de indígena, sujeitando-o às normas do art. 26 e parágrafo único do CP. Inexiste razão para a realização de exames psicológico ou antropológico se presentes, nos autos, elementos suficientes para afastar qualquer dúvida sobre a imputabilidade de indígena, sujeitando-o às normas do art. 26 e parágrafo único do CP. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu, em parte, habeas corpus impetrado em favor de índio Guajajara condenado, por juízo federal, pela prática dos crimes previstos nos artigos 12, caput, e § 1º, II e 14 da Lei 6.368/76 e art. 10 da Lei 9.437/97. Pleiteava-se, de forma alternativa, a anulação do processo, ab initio, a fim de que se realizasse o exame antropológico ou a atenuação da pena (Lei 6.001/73, art. 56, parágrafo único), assim como para garantir seu cumprimento no regime semi-aberto em local próximo da habitação do paciente. Tendo em conta que a sentença afirmara a incorporação do paciente à sociedade, considerou-se que ele seria plenamente imputável e que o laudo pericial para a comprovação de seu nível de integração poderia ser dispensado. Asseverou-se que o grau de escolaridade, a fluência na língua portuguesa, o nível de liderança exercida na quadrilha, entre outros, foram suficientes para formar a convicção judicial de que o paciente seria inteiramente capaz de entender o caráter ilícito dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. No tocante à diminuição da pena, ressaltou-se que esta já fora efetuada pelo juízo quando proferida a sentença. HC deferido parcialmente para que o Juiz da Execução observe, quanto possível, o parágrafo único do art. 56 do Estatuto do Índio (Lei 6.001/73: "Art. 56. No caso de condenação do índio por infração penal, a pena deverá ser atenuada e na sua aplicação o juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola. Parágrafo único. As penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se possível, em regime especial de semi-liberdade, no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado.").
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a nulidade de ação penal, garantindo-se a realização de segundo interrogatório a condenado pela prática de crime tipificado no art. 12, c/c o art. 18, III, da Lei 6.368/76. Alegava-se, na espécie, ofensa aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório pela não aplicação dos procedimentos previstos nos artigos 38 e 41 da Lei 10.409/2002 ("Art. 38. Oferecida a denúncia, o juiz, em 24 (vinte e quatro) horas, ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias...; Art. 41. Na audiência de instrução e julgamento, após o interrogatório do acusado e a inquirição das testemunhas, será dada a palavra, sucessivamente, ..."), bem como ocorrência de prejuízo, sustentando, ainda, tratar-se de nulidade absoluta. Ressaltou-se que a citada Lei prevê em seus artigos 38 e 41 a realização de dois interrogatórios: o primeiro antes do recebimento da denúncia e o segundo no curso da instrução criminal. Asseverando que no caso concreto, em interpretação sistemática, houvera a concentração dos interrogatórios em audiência única, entendeu-se que o fato de o primeiro interrogatório implicar a dispensa do segundo não causara prejuízo à defesa. Consideraram-se assegurados a ampla defesa e o contraditório, já que garantida ao paciente a oportunidade para requerer esclarecimentos (CPP, art. 185, com a redação dada pela Lei 10.792/2003), não havendo reclamação do advogado, que fizera os questionamentos que julgara pertinentes. Vencido o Min. Marco Aurélio que, por considerar ocorrente o prejuízo à defesa, deferia o writ para anular o processo a partir do momento em que não fora observado o art. 41 da Lei 10.409/2002.
A Turma recebeu embargos de declaração opostos por prefeito, entretanto, por maioria, indeferiu o seu pedido de extensão, a co-réu, da decisão que, em recurso ordinário em habeas corpus, anulara somente a fixação da pena, mantida a condenação, uma vez constatado que o exercício do aludido cargo, integrante da própria definição legal do crime previsto no art. 1º do Decreto-lei 201/67, fora também considerado como circunstância judicial na dosimetria da pena. Pretendia-se, na espécie, a extensão dos benefícios a co-réu que exercia cargo comissionado, sustentando-se que ele deveria ter o mesmo destino do ora embargante, tendo em conta o princípio da proporcionalidade das penas e da lógica processual, não obstante a ausência de identidade de situações entre ambos. A Turma, asseverando tratar-se de crime próprio, considerou que o juiz pode, na individualização da pena, graduar a cooperação de agente estranho ao tipo. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, relator, que anulava a fixação da pena para que outra fosse aplicada.
O Tribunal julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro contra a alínea c do § 1º do art. 9º e do art. 165, ambos da Lei Complementar estadual 106/2003 - Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, que, respectivamente, estabelece a inelegibilidade para o cargo de Procurador-Geral de Justiça dos Procuradores e Promotores de Justiça que ocupem cargo ou função de confiança e deles não se desincompatibilizem, por afastamento, pelo menos 60 dias antes da data de eleição; e assegura aos membros do Ministério Público, admitidos antes da promulgação da CF/88, o que dispõe o § 3º do art. 29 do ADCT ("Art. 29. Enquanto não aprovadas as leis complementares relativas ao Ministério Público... § 3º - Poderá optar pelo regime anterior, no que respeita às garantias e vantagens, o membro do Ministério Público admitido antes da promulgação da Constituição, observando-se, quanto às vedações, a situação jurídica na data desta."). Entendeu-se que o primeiro preceito atacado não autoriza o exercício de outros cargos ou funções de confiança, tal como alegado, em ofensa ao art. 128, II, d, da CF, mas tão-só determina que os que os ocupem, e desejem concorrer à eleição de Procurador-Geral de Justiça, deles se afastem, pelo menos 60 dias antes do pleito. Rejeitou-se também a apontada inconstitucionalidade relativa ao segundo preceito, ao fundamento de que este apenas repete o disposto no art. 29, § 3º, da CF, não havendo previsão, nem na Constituição Federal nem na Lei Orgânica do Ministério Público União, acerca do prazo para o exercício da opção nele veiculada.
O Tribunal concedeu habeas corpus impetrado em favor de acusada pelo crime de lesão corporal leve (CP, art. 129) contra acórdão de Turma Recursal de Comarca do Estado de Minas Gerais que denegara igual medida. Sustentava a impetração a falta de justa causa para ação penal, já que a vítima teria manifestado seu desinteresse no prosseguimento do feito; a nulidade do referido acórdão, tendo em conta a participação da autoridade apontada como coatora no julgamento do habeas corpus impetrado perante aquela Turma Recursal; e a inconstitucionalidade do dispositivo do Regimento Interno das Turmas Recursais do Estado de Minas Gerais que permite que o prolator da sentença integre a turma julgadora. Afastou-se a alegação de ausência de justa causa, porquanto a vítima só se retratara após o oferecimento da denúncia (CPP, art. 25). Por outro lado, concedeu-se a ordem por se entender violado o inciso LIII do art. 5º da CF, que impede a participação, em julgamento de um recurso ou de um remédio constitucional, da própria autoridade prolatora do ato impugnado. HC deferido para anular o acórdão da Turma Recursal e declarar a inconstitucionalidade do § 3º do art. 6º do Regimento Interno das Turmas Recursais do Estado de Minas Gerais, com a redação dada pela Instrução nº 1/2002. Precedentes citados: HC 72042/AL (DJU de 30.6.2005); HC 72876/SP (DJU de 3.11.95); HC 74756/AL (DJU de 29.8.97).
Por vislumbrar ofensa à reserva de iniciativa privativa da União para legislar sobre trânsito (CF, art. 22, XI), o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Distrito Federal para declarar a inconstitucionalidade da Lei Distrital 2.929/2002, de iniciativa parlamentar, que dispõe sobre o prazo para vigência da aplicação de multas a veículos em virtude da reclassificação de vias do sistema viário urbano do Distrito Federal e, especialmente, sobre o cancelamento de multas. Vencidos, integralmente, o Min. Marco Aurélio, que julgava o pleito improcedente, e, em parte, o Min. Joaquim Barbosa, que declarava apenas a inconstitucionalidade do art. 1º da referida lei.
Entendendo caracteriza a afronta ao art. 22, XI, da CF, que reserva à União a competência privativa para legislar sobre trânsito, o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Governador do Rio Grande do Sul para declarar a inconstitucionalidade da Lei Estadual 12.064/2004, de iniciativa parlamentar, que autoriza o Poder Executivo a parcelar, em até oito prestações, os débitos provenientes de multas de trânsito aplicadas pelos órgãos locais e não quitadas até o vencimento. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que davam pela improcedência do pedido.
Considerando violada a reserva de iniciativa privativa da União para legislar sobre trânsito (CF, art. 22, XI), o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Distrito Federal para declarar a inconstitucionalidade da Lei Distrital 2.959/2002, de iniciativa parlamentar, que dispõe sobre a apreensão e leilão de veículos automotores conduzidos por pessoas sob a influência de álcool em nível acima do estabelecido no Código de Trânsito Brasileiro, ou de substância entorpecente que determine dependência física ou psíquica.
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Governador do Estado do Espírito Santo para declarar a inconstitucionalidade da Lei Estadual 7.755/2004, de iniciativa parlamentar, que proíbe a comercialização de veículo automotor de via terrestre, alienado ou leiloado como sucata, como irrecuperável ou como sinistrado com laudo de perda total, e dá outras providências. Entendeu-se que a norma em questão usurpa a competência privativa da União para legislar sobre trânsito (CF, art. 22, XI), bem como viola a reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo para leis que disponham sobre atribuições de órgão da Administração Pública (CF, art. 61, § 1º, II, e c/c art. 84, VI).
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Pará para declarar a inconstitucionalidade da Lei 6.570/2003, do referido Estado-membro, que dispõe sobre serviço de loterias no âmbito daquela unidade federativa. Entendeu-se, na linha do que decidido no julgamento da ADI 2847/DF (DJU de 26.11.2004), que a norma impugnada afronta a competência privativa da União para legislar sobre sistemas de consórcios e sorteios (CF, art. 22, XX) e sobre direito penal (CF, art. 22, I). Vencido o Min. Marco Aurélio que, reportando-se ao voto que proferiu no julgamento da mencionada ADI, julgava improcedente o pleito. O Min. Sepúlveda Pertence, ressalvou seu entendimento apenas quanto à afronta ao inciso I do art. 22, por considerar não se tratar de matéria penal.